A fórmula de Nietzsche para amar a vida | AMOR FATI

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Ludoviajante
O que é Amor Fati? Hoje mergulharemos na filosofia de Friedrich Nietzsche para encarar o niilismo e ...
Video Transcript:
Olá, pessoa amável da internet. Eu queria começar esse vídeo de um jeito diferente. Eu vou contar uma história pessoal, e vai parecer um pouco aleatório, mas prometo que no final vai fazer sentido.
Vai encaixar com a premissa desse vídeo. Uma vez, quando eu era criança, minha família viajou pra Bahia. Eu devia ter menos que 9 anos de idade, e foi uma mudança brusca de cenário porque, eu nasci na cidade, e esse lugar que a gente visitou ficava completamente no meio do roça.
Não tinha eletricidade, as estradas eram todas feitas de terra e existia uma distância considerável entre uma casa e outra. A gente foi visitar o meu avô, e todo mundo na região era muito querido, então eis que um dia minha mãe pede pra eu ir até a vizinha buscar uma tigela de tapioca. Eu já tinha ido até lá outras vezes acompanhado, então não era algo muito difícil, mas não deixou de ser assustador porque dessa vez eu precisava ir sozinho E aquelas estradas de terra eram estranhamente silenciosas.
[som de lugar deserto] Então lá estou eu, fazendo esse trajeto, completamente sozinho, não tem uma alma no caminho, até que eu escuto um barulho. [folhas mexendo] Eu pensei “bom, não deve ser nada”, então eu continuei andando, só que aí o mato mexeu de novo, dessa vez mais forte. .
. como se tivesse alguma coisa me seguindo. Nesse momento, eu travei, porque eu pensei: mano do céu, eu não conheço a vida rural, e se pá, eu já vi uma onça nas histórias do chico bento.
Só que aí eu tomei um baita dum susto, porque enquanto eu tava lá pensando nisso uma coisa pulou pra fora do mato. Felizmente, não era uma onça, aleluias! era uma raposa.
Só que isso não serviu pra me tranquilizar muito, porque, novamente: eu era uma criança criada a leite com pêra, e até onde eu lembrava, no cocoricó, existia uma raposa que vivia tentando comer as galinhas. . .
Essa é a raposa? Ô Lôla! Ela não parece tão assustadora assim.
Mas ela pega, mata e come! Hum. Então eu comecei a me questionar: será que essa besta selvagem consegue me distinguir de um frango?
Até que os nossos olhos se encontraram, os meus e os da raposa. Por uns bons 5 segundos ela ficou parada, na minha frente, me encarando, e nesse momento eu percebi uma coisa: Eu nunca tinha visto um bicho tão bonito na minha vida. O pelo dela era laranja, mas não qualquer laranja, era um laranja reluzente, e ali naquele cenário bucólico - céu claro, terra vermelha, silêncio absoluto - eu não pude deixar de me sentir inserido numa pintura.
Logo a raposa pulou pro outro lado da estrada e sumiu completamente, mas eu lembro de me sentir estranhamente feliz, porque algo me dizia que eu nunca ia esquecer aquele momento. Às vezes começa a dar tudo errado na sua vida, você se sente só, confuso, sua CPU começa a esquentar, seu gato começa a morrer, sua webnamorada decide mudar de pronomes. E é bem nesse momento que aparece aquela sua tia evangélica, sabe aquela que fez campanha pro birocreuzo?
E ela diz: Calma, meu filho! Você precisa ter mais fé! Tudo acontece por uma razão”, e ouvir isso é quase insultante porque honestamente, vai se f*, tia Jandira!
Não tem emprego, as coisas tão um absurdo de caro e a cada dia que passa esse país afunda mais num buraco de estupidez. Talvez você esteja certa, tudo acontece por uma razão, e a razão é que você e o tio Genival decidiram votar num Hitl3r com menos cromossomos. Velha estúpida.
Obviamente, ninguém diz isso. A gente diz: “amém! que Deus te abençoe, titia, e que ele possa perdoar as minhas piadas capacit1sta, em minha defesa eu estava falando de quem tem MENOS cromossomos, e pra isso você precisaria ser um platelminto desprovido de cérebro.
Essa era a piada. [risada plateia] Aleluia! ” Bom, existe um jeito um pouco mais saudável de lidar com esse nó na garganta sem precisar ofender sua tia ou explicar suas piadas, e começa com esse conceito: "TUDO ACONTECE POR UMA RAZÃO" Se você é uma pessoa cética, e por cética eu me refiro a cínica e sem amigos, essa frase deve soar como uma grande baboseira.
Pelo menos num sentido sobrenatural. Afinal, convenhamos: eu e você somos macacos com ansiedade presos a uma pedra amaldiçoada flutuando pelo vazio. Ainda que existisse uma razão pra tudo isso, quem pode afirmar que conhece?
Claro, você pode ter fé, é até bom que você tenha porque assim quando aquele seu primo ateu chato aparece, você pode dizer pra ele: se deus não existe, quem tirou essa foto? Mas - até o mais idealista de nós vai ter dificuldade de olhar pro mundo quebrado e dizer que existe uma justificativa pra tanto sofrimento. Não parece justo.
Pois é, Enzo, seu quadro piorou. Infelizmente, de hoje você não passa. Mas não se preocupa: TUDO ACONTECE POR UMA RAZÃO!
Então qual a razão disso tá acontecendo comigo? A razão é que você é pobre. Né, da próxima vez tenta nascer um pouco mais rico, que aí sua família consegue pagar um tratamento bem melhor.
Inclusive, seu pai não vai chegar a tempo porque os ônibus tão de greve e o Uber não chega onde vocês moram. Então é importante ver isso tb: quando for reencarnar, tenta escolher uma família que tem carro. Ou pelo menos um skate.
Boa noite meu querido. Só que aí aparece um cara bigodudo e ele propõe uma ideia ousada: estender essa frase. “Tudo acontece por uma razão, e a razão sou eu que crio”.
Isso gera uma dinâmica interessante porque nos tira da passividade e nos coloca num papel ativo. De repente encontrar um sentido pras merdas da vida vira um exercício de criatividade. E isso é maravilhoso porque dentro de você existe um artista entediado.
Você deve conhecê-lo: é aquela voz que quando você olha pro céu, ela diz: "uau, o que é aquilo nuvens? " uma tesoura sem ponta? Nietzsche sugere que a gente abrace essa voz criativa e ouça o que ela tem a dizer nos momentos difíceis.
Como? Através da afirmação da vida. Nietzsche escreve: “Se afirmamos um único momento, afirmamos não apenas a nós mesmos, mas toda a existência.
Porque nada é auto-suficiente, nem em nós, nem nas coisas; e se nossa alma tremeu de felicidade e soou como uma corda de harpa uma única vez, toda a eternidade foi necessária para produzir este evento - e nesse momento toda a eternidade foi justificada. ” O que ele quer dizer com isso? Ele quer dizer que um acontecimento sempre tá ligado ao outro.
Por exemplo: para que você nascesse, foi necessária toda uma sucessão de eventos, coincidências e até mesmo tragédias. Se uma folha não tivesse caído onde ela caiu, pode ser que seu pai nunca tivesse conhecido a sua mãe. Se um átomo estivesse fora do lugar, pode ser que o universo não tivesse começado quando ele começou.
Então Nietzsche pede pra que a gente repare em tudo isso e dê uma chance pra gratidão, não num sentido genérico e passivo, mas num sentido de enxergar o quanto nossa existência é preciosa, incluindo os momentos ruins. Pra sintetizar tudo isso, ele usa um conceito filosófico: Amor Fati, que numa tradução livre significa amor ao destino. Não destino num sentido que tá tudo pré-determinado, essa é outra discussão, nesse contexto, amor ao destino seria abraçar tudo aquilo que você não pode mudar.
Porque veja bem: de certa forma estamos destinados ao sofrimento. É quase um paradoxo porque esse é o preço de ser livre: em algum momento você vai escolher errado, ou alguém vai fazer más escolhas e isso vai afetar você. Amor fati seria então o supremo ato de amor próprio: você olha pra sua vida e reconhece que, pra você ser quem você é hoje, tudo precisou acontecer do jeito que aconteceu.
E sim, algumas coisas foram tremendamente injustas, outras te deixam acordado de noite pensando: “e se fosse diferente? ”, mas no fim, cada uma dessas dores te ensinou alguma coisa e por essa razão elas merecem o seu amor. Não porque elas foram boas, mas porque elas são parte de você.
E talvez você nem esteja feliz com quem você é hoje, mas é aí que tá: graças ao que te aconteceu, agora você sabe que precisa mudar e também que não vai ser fácil. Eu comecei esse vídeo com a história da raposa. No ano em que isso aconteceu, a minha vó tinha falecido, se não fosse isso, a gente não teria ido visitar o meu avô na Bahia.
É obvio que eu nunca trocaria minha vó por raposa nenhuma, mas essa é a questão: algumas coisas simplesmente tão fora do nosso controle. Pra todos os efeitos, o encontro com aquele animal não significou nada. Ela devia tá morrendo de medo e já faz tanto tempo que eu devo lembrar de um jeito bem mais florido do que realmente aconteceu.
Mas na real, não importa. Se nesse instante, o tempo parasse e o relógio começasse a voltar, eu ia ficar contando os dias pra ver aquela raposa de novo. Isso me faz lembrar que a felicidade é muito simples, e que mesmo que o presente seja opaco e sem cor, nada impede que o futuro seja brilhante.
Tão brilhante quanto o laranja daquela raposa. Tudo acontece por uma razão. Precisou de toda uma eternidade de eventos pra que você chegasse aqui hoje e clicasse nesse vídeo.
Muito obrigado. Seja lá o que te mantém acordado a noite, eu espero que você consiga perceber que, parando pra pensar, não podia ter sido diferente. É impossível ter controle de tudo.
Muito obrigado por ter assistido. Caso você tenha interesse em mais teorias filosóficas, eu recomendo esse vídeo sobre Nietzsche e ignorância. E caso você goste do meu trabalho, com 3 reaizinhos você pode fazer parte do meu apoia-se, em troca você ganha acesso a vídeos extras, um podcast de filosofia e eu consigo continuar fazendo esses vídeos.
Eu dependo bastante dessa ajuda, então muito obrigado a quem puder dar uma olhadinha ♥ Um abraço e. . .
Bebam água.
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