A Ucrânia é no momento o principal ponto de discórdia entre a Rússia e o Ocidente. O último capítulo dessa escalada de tensão envolve o crescente interesse por parte da Ucrânia em se juntar à Otan - a Organização do Tratado do Atlântico Norte. Uma movimentação que, para o Kremlin, ultrapassaria uma linha vermelha.
Sou Nathalia Passarinho, da BBC News Brasil em Londres, e neste vídeo eu vou explicar o que é a Otan e por que a Rússia não quer que a Ucrânia se junte a ela Primeiro, vamos lembrar que já existe um conflito em andamento envolvendo Rússia e Ucrânia. E que também tem relação com essa disputa de forças entre Rússia e as potências ocidentais. A relação entre Rússia e Ucrânia tem origens históricas, mas um ponto chave para a escalada de tensão atual aconteceu alguns anos atrás.
No final de 2013, o então presidente ucraniano Viktor Yanukovych desistiu de assinar um tratado de livre comércio com a União Europeia. Por outro lado, Yanukovych havia manifestado o objetivo de estreitar relações comerciais com a Rússia. Manifestantes favoráveis a uma maior integração da Ucrânia com o bloco europeu realizaram uma série de protestos que culminaram na destituição de Yanukovych em 2014.
Em meio a essa crise, Moscou anexou o território da Crimeia, uma península onde a maioria das pessoas têm origem russa. O território tinha feito parte do império russo entre o século 18 a 1954, quando foi transferido para a Ucrânia pelos soviéticos. Em março de 2014, o Kremlin enviou suas tropas e iniciou o processo de ocupação, que teve apoio de separatistas.
O território foi anexado através de um referendo contestado. Além disso, o Kremlin também tem apoiado militarmente grupos separatistas pró-Rússia na região de Donbass, no leste e sudeste da Ucrânia. Estima-se que cerca de 14 mil pessoas já morreram nessa guerra.
Mas o que a Otan tem a ver com esse conflito? Para entender melhor esse jogo de influência, a gente precisa voltar aos anos pós-Segunda Guerra Mundial. Naquela época, o mundo estava dividido entre duas potências que lutavam pela hegemonia mundial: Estados Unidos e União Soviética, da qual faziam parte Rússia e Ucrânia.
Tanto americanos como soviéticos viam com grande preocupação os planos expansionistas do outro lado. Em resposta a uma expansão soviética pelos vizinhos no leste europeu, foi assinado em 4 de abril de 1949 o tratado de Washington, que firmava a criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte – a Otan. No início, a organização era formada por potências mundiais com acesso à região norte do Oceano Atlântico – daí o seu nome.
No total, são 12 membros fundadores, entre eles os Estados Unidos, Canadá, França, Itália, Reino Unido e outros países da Europa. O princípio fundamental da Otan é o de segurança coletiva, que se mantém até hoje. Ele diz que se um dos países da organização for atacado, os outros países membros se juntam para defendê-lo.
O objetivo principal era o de proteger esses países de possíveis ataques da União Soviética em um contexto de Guerra Fria. O bloco soviético, por sua vez, respondeu com o Pacto de Varsóvia, a aliança militar de países comunistas do leste europeu formada justamente para contrapor a Otan. O Pacto de Varsóvia acabou com o fim da União Soviética, em 1991.
A questão é que, mesmo após a queda do muro de Berlim, em 89, e o fim do bloco soviético, a Otan não deixou de existir. Mais do que isso, a organização se expandiu. Hoje, ela reúne 30 países–membros e é considerada a aliança estratégica político-militar mais importante do mundo.
A organização diz ter como objetivo impedir o ressurgimento do militarismo nacionalista na Europa, além de promover a integração política europeia. Nas últimas décadas, a Otan liderou operações militares em países como Bósnia, Kosovo, Iraque e Afeganistão. A Ucrânia, que se tornou independente em 1991, tem se aproximado do ocidente - e consequentemente da Otan.
Em 1994, iniciou uma parceria de paz com a organização, ao lado de outras ex-repúblicas soviéticas. Foi um passo inicial para o país se tornar no futuro efetivamente um membro da Otan. Vale lembrar que, em 1999, passaram a integrar a Otan como membros efetivos a República Checa, Hungria e Polônia, três países que tinham sido membros do Pacto de Varsóvia.
Cinco anos depois, em 2004, mais ex-repúblicas soviéticas passaram a fazer parte da Otan: Bulgária, Romênia, Eslováquia, Eslovênia, além dos estados bálticos Estônia, Letônia e Lituânia. Em 2008, a Ucrânia chegou a entrar no Plano de Ação para Adesão da Otan, destinado a auxiliar possíveis membros a alcançarem os requisitos necessários para fazer parte da organização. Mas a eleição do presidente pró-Rússia Viktor Yanukovych, em 2010, esfriou os planos.
Os protestos conhecidos como Euromaidan e a consequente destituição do presidente, no entanto, fizeram com que a possível adesão da Ucrânia à Otan voltasse à pauta. Em 2020, a Ucrânia foi reconhecida pela Otan como um Parceiro de Oportunidades Aprimoradas, o que na prática é mais um passo para alcançar o status de membro. No mesmo ano, o presidente do país, Volodymyr Zelensky, aprovou o novo plano de estratégia de segurança, em que apontava para um desenvolvimento da parceria com a organização e para o objetivo de se tornar membro.
E em 2021, quando a atual crise já se intensificava, a Otan reiterou a decisão de 2008 para que o país fizesse parte do plano de adesão. Importante citar que uma entrada efetiva da Ucrânia na Otan demandaria a aprovação de todos os países-membros. E muitos especialistas acreditam que isso seria difícil enquanto existir um conflito dentro do país, como o que ocorre agora na região de Donbass.
Ou seja, uma entrada da Ucrânia no bloco poderia colocar a Otan dentro de um conflito no qual a Rússia está envolvida. A Otan defende essa expansão sob o argumento de que cada país é independente e livre para se juntar ao grupo. E afirma que a adesão à organização está aberta a qualquer estado europeu que esteja disposto a apoiar os princípios do seu tratado.
A Rússia, claro, não concorda com essa posição. Moscou se opõe a essa ideia porque vê o avanço da Otan em direção ao seu território como uma ameaça a sua segurança. Putin solicitou à Otan que não seguisse anexando países que pertenciam à União Soviética Entre as linhas vermelhas demarcadas pela Rússia, estão as suas fronteiras mais próximas, que incluem países como Belarús e Ucrânia.
Mas por que, na visão do russos, a Ucrânia tem ainda mais importância em matéria de segurança do que o resto dos países ex-soviéticos? George Friedman, fundador da Geopolitical Futures, explica que a Ucrânia é a fronteira ocidental da Rússia. E, ao longo da história, desde a invasão napoleônica em 1812, a região serviu como zona de proteção para Moscou.
Uma declaração recente de Putin deixa isso bem claro. Ele questionou: “Como os Estados Unidos reagiriam se nós colocássemos mísseis na sua fronteira com o Canadá? ” Até o momento, a Otan ainda não anunciou a Ucrânia como um país-membro.
Mas como deu para perceber, a intenção é clara. O último passo importante para esse processo aconteceu em 2020, quando o país entrou na lista de nações que colaboram estreitamente com a organização que tanto incomoda Putin. Ou seja, uma possível entrada da Ucrânia na Otan é um dos pontos centrais dessa crise.
Com isso, eu fico por aqui. Não deixe de acompanhar a cobertura no nosso site, o bbcbrasil. com e nas nossas redes sociais.
E se inscreva também no nosso canal no YouTube, é só clicar no sininho que fica debaixo do player. Até a próxima!