[Música] Boa noite a todos. Muito obrigado, é uma satisfação estar novamente aqui no CDB, desta vez para apresentar a obra "Temores Insanos: Escrúpulos e Transtorno Obsessivo Compulsivo", do professor Rordan Abudt. O interessante tomista argentino, jovem, deve ter, acredito, menos de 50 anos, e uma obra que traça paralelos entre o vício da escrupulosidade e a doença que está catalogada mundialmente, em todos os manuais de psiquiatria e psicologia, como transtorno obsessivo compulsivo, o famoso TOC. Eu vou começar a aula. Eu escolhi começar a aula enumerando algumas consequências dos escrúpulos na alma de uma pessoa, consequências nefastas,
já que os escrúpulos são uma atribuição indevida de peso a algo em uma determinada circunstância. A alma escrupulosa, a pessoa escrupulosa, carrega o mundo às costas. Por linharias e por Linhares, muitas vezes se perde nas suas relações consigo mesma, nas suas relações com as demais pessoas, nas suas relações com o Estado, nas suas relações com Deus. Então, os escrupulosos medem mal a realidade e vivem numa espécie de perene temor de estar infringindo alguma norma. O que a princípio parece ser uma preocupação com o bem agir, uma preocupação em não infringir uma norma, muitas vezes esconde
uma soberba. Este anseio de perfeição, quando exagerado, às vezes, como nós vamos ver aqui na leitura de um trecho do professor, do mestre, do teólogo Rôio Marin, às vezes oculta a soberba. Por isso, Santo Afonso de Ligório, ao retratar as consequências das cruzes da alma ou as características dos escrúpulos, ele diz que a primeira delas é a pertinácia de opinião. O sujeito, cabeça dura, prefere seguir o seu parecer a ter que ouvir algum conselho de um mestre, ainda que seja um mestre consagrado pela tradição. Então, é uma espécie de teimosia existencial do escrupuloso. E em
matéria opinável, em toda coisa que suscita em nós dúvidas, nós não devemos ser obstinados. Nós devemos estar abertos à mudança de opinião, de acordo com o que alguém nos apresente da realidade. Então, ter certeza na opinião é de uma alma escrupulosa. Uma opinião, por sua própria natureza, pela própria natureza da opinião, ela não se coaduna, não concorda com a certeza, porque opinar, segundo nosso mestre Santo Tomás de Aquino, é a adesão do intelecto a uma proposição qualquer, com certo temor de que ela não seja verdadeira. Então, a opinião traz sempre consigo uma zona de sombra,
uma aura de dúvida. Ninguém opina com certeza, só no Brasil e na política. Aí, as pessoas têm certeza. As pedras e matérias opináveis são capazes de, na sua consciência tribunalística, julgar e condenar qualquer um que não pense como elas. É próprio da opinião estar aberta a outra coisa que não seja ela. Então, uma pertinácia de opinião é um péssimo sinal que pode ser ou um sintoma da nossa boa e velha escrupulosidade, ou algo muito pior, que é a soberba. O soberbo ama-se desordenadamente, portanto, nesse déficit amoroso radical que há nele, o seu amor próprio está
além do que é devido. Ele acaba por aquilatar mal a realidade externa. Então, as consequências dos escrúpulos na alma são várias. Eu não verei aqui algumas. Perfeccionismo equivocado. O que eu quero dizer com isto é que quando a pessoa quer ser perfeita nos meios, mas se esquece dos fins. Os meios, em boa filosofia moral, existem para a consecução de fins que os transcendem. Então, se eu vou rezar o Ângelos, se eu cumpro a devoção de rezar o Angelus, não importa se eu vou fazer isso em latim, com a pronúncia restituída, no latim com a pronúncia
eclesiástica ou no nosso português. O que importa é a intenção de cumprir aquela devoção. E devoção, etimologicamente, implica sacrifício. Um devoto é aquele que se sacrifica ou sacrifica algo em si, em ordem a um bem maior do que ele. Então, quando alguém é devoto, seja de um santo, do próprio Cristo, seja lá do que for, isso implica que, em ordem a aquele bem, é capaz de sacrificar coisas que para ele próprio são importantes. Então, o perfeccionismo equivocado é esse peso excessivo que se dá aos meios, com consequente esquecimento dos fins. Os fariseus não são outra
coisa senão isso. Aqueles de quem Cristo diz: "Para longe de mim, raça de víboras, que coam um mosquito e engolem um camelo". A benevolência nossa, com a tradução consagrada desde Júnior, eles são escrupulosos em matéria religiosa. Então, perfeccionismo equivocado, julgamento de intenção, julgamento de intenção imprudente. Os escrupulosos já que têm uma baliza de perfeição extraordinária na sua alma e têm grande dificuldade de realizar isso, porque vivem em um mundo de irrealidade, do irrealizável, se aproximam muito dos filósofos históricos, daqueles que achavam que era possível chegar a um equilíbrio perfeito, um alto domínio perfeito, a entrada
em terra. Seria o alto domínio perfeito em uma vida que é contingenciada por falhas, por carências, por decepções, por perdas, por tristezas. Você achar que vai ter a mesma reação sempre, uma reação ideal e, de preferência, impossível, ser afetado por nada, é ilusório. Uma pessoa que acredita numa pataquada dessas necessariamente vai se transformar em julgadora das demais. Primeiro, ela vai ficar deprimida por ver que na prática não consegue realizar e pode até chegar ao ponto de achar que o bem é algo irrealizável e até chegar ao ponto, portanto, de se auto-despulpar daquilo que não realiza.
Ela tem diretamente a julgar que, já que ela, que é tão seguidora dos preceitos, então atenta às minúcias etc., não realiza, ela julga que os outros, então, muito menos. Seu imposto a voz em retrotão, na hora de rezar, qual um monge medieval. "Esse fulano aí, coitadinho, que não sabe ler concreto, não acerta uma concordância." Vai estar melhor do que eu, não vai? Então, o escrupuloso é um julgador dos outros, porque ele aplica a eles os critérios errôneos que aplica a si mesmo. É uma quase consequência natural, é uma desgraça, é uma desgraça na verdade. Então,
refazendo, perfeccionismo equivocado, julgamento de intenções imprudentes: uma oração, muitas vezes, quase que como por um reflexo, né, do seu estado de alma. O escrupuloso murmura, ele murmura com relação ao proceder da lei, porque ele julga que não está correto, né? É isso, é um drama, é um drama, porque esta mentalidade o vai dominando a ponto de ele distorcer toda a realidade. Os escrúpulos já, Santo Afonso de Ligório sabia, são talvez uma das… talvez o terreno em que mais a alma deve ter atenção e atacar, ou a alma, sobretudo, que se volta para as coisas religiosas,
porque se ela percebe em si mesma esse "frame" do interior que a faz julgar as coisas de maneira excessiva, indevida, ela não pode alegar inocência absoluta, né? Porque nós somos dotados de inteligência e vontade e, portanto, neste tipo de matéria, como diziam os teólogos, neste tipo de coisas, na aparvidade de matéria, você não pode dizer que é completamente ignorante, porque, ainda que desconheça os preceitos gerais, as normas gerais da ação humana, certas coisas pertencem àquele âmbito da nossa alma que Aristóteles chamava de "sinderesis". Santo Tomás, comentando, também chama, que é algo interior em nós, que
é a captação instintiva, digamos assim, dos primeiros princípios da razão prática. Isso não se apaga em nós. Eu posso ter a minha consciência obliterada pela ignorância, obliterada pelo erro, cauterizada pelos vícios etc. Porém, algo em nós, ainda que a consciência esteja lá, quase que apagada, não se apaga. Nós ainda, quando estamos equivocados, desejamos para nós mesmos o bem. Uma criança mal chegada à Idade da Razão, se alguém faz assim o movimento de lhe bater, ela levanta o braço. É nosso instinto existencial humano de defesa. Não é à toa que o direito à vida é uma
decorrência dessa captação pelas "sinderesis", né, do bem universal que é viver. É um bem universal. Ele só não é, como querem crer alguns, fazer crer alguns dos vitalistas filósofos que acham que o que importa na vida é a vida, mesmo e acabou. Se com Munity, por exemplo, se vitalismo e racionalista, esquece que para nós não nos basta viver. Nós não somos animais. E racionais. Nós precisamos chegar ao que Cícero dizia: ser a vida boa, que é do homem eticamente, moralmente bem informado, que é aquele que é profundo, porque é o que deve ser ou procura
ser o que deve ser. A noção de dever para ele é das mais importantes. Disse que havia lá no Oráculo de Delfos, né, uma frase atribuída a Píndaro: "Homem, torna-te o que tu és." E muito se perguntou hoje como alguém pode se tornar o que já é, né? Isto é muito profundo, porque nós somos talvez a única realidade no universo de todos os entes que, para ser o que é, precisa entender o que deve ser. Por isso o Padre Antônio Vieira, num belo sermão, diz que as coisas não são apenas o que são, são o
que foram, e o que é um dizer, né? Lembrando que o Sermão da Quarta-feira de Cinzas, que nós somos pó, porque fomos pó, e havemos. Então, nós somos o que fomos e o que há. Ora, no caso do homem, ele só é o que é quando entende que precisa fazer determinadas coisas. O dever-ser para ele é uma categoria imperiosa. É quem vive apenas querendo entender os seus direitos, são as sociedades contemporâneas, né, em que não se estudam os deveres e obrigações; em lugar destes, estuda-se só os direitos. O que é uma tragédia, né? É uma
sociedade de senhoritos satisfeitos, né, regalados, é o homem massa do tag HC, né? O sujeito tem um super, para que eu vou entender o drama que é comer? Por exemplo, eu ainda sou de uma geração que pegou abatedouros, né? Eu tenho essa memória infantil. Queria comer um franguinho, era galinha ao molho pardo, e tinha uma abatedouro. O dono dizia assim: "O senhor escolhe aí. Você pode escolher a galinha, né? O senhor quer? Eu quero aquela ali, que a bata aqui." Ou "Vou bater em casa." Ah, não quero bater em casa, que era mais barato, né?
Hoje em dia as pessoas fazem piques, as pessoas mal dão valor ao dinheiro, as pessoas vivem… Elas comem fast food, perderam a noção de que a vida, se você não sabe nem que quer matar um animal para comer, né? Você vê que é um frescalhão, né? Viver machuculado é um homem contemporâneo. É o senhorito satisfeito, né? Não sabe nada de dever e é uma máquina de direitos. Ele acha que tem direito a tudo, até ao que não existe, até achar que é o que não é. E mais, achar que o Estado é o Deus que
vai dizer que quem não concordar com ele é um criminoso. Então é uma situação, é uma época de trevas. Qualquer pessoa de bom senso não é necessário ser nenhum Santo Tomás, nenhuma Aristóteles, entende ao olhar o cenário contemporâneo que o vetor é de pior a progressiva, em escala de progressão geométrica, aliás, né? O otimismo, agora, o otimismo político, moral ou civil, né, é uma forma sutil, muitas vezes, de covardia. Às vezes é melhor pensar que está tudo bem e, portanto, não se sentir no dever de fazer nada para melhorar, do que enxergar o caos, olhar
o mal de frente e ver que é preciso fazer algo. Quem olha a realidade de frente entende o que é preciso fazer. É a primeira coisa para acabar não só com os estupros, como com qualquer noção equivocada a respeito das coisas: é tentar entender as coisas. Como elas são e não como nós gostaríamos que elas fossem. O mundo é o que é e não o que o meu ego cogitante, como pensava, projeta sobre ele. As coisas são o que são. Então, descemos aqui, mas há murmuração, perfeccionismo equivocado, julgamento de intenção, murmuração, desprezo do próximo, que
é quase uma consequência dos demais, né? Se eu, que me julgo cumpridor das normas, falo tanto desse Zé Mané aí, é muito mesmo. A tendência dos grupoulosos é desprezar o próximo; desprezar o próximo fará isaimo e religião, que eu já mencionei aqui. Ou seja, eu começo a dar aos meios da religião uma importância maior do que os fins. O que é um drama, né? Isso pode ser aplicado a várias coisas, ao sacramento; isso pode ser aplicado ao modo de rezar, por exemplo. Houve uma questão que, na Idade Média, era muito debatida e que já era
uma preocupação desde a época dos Padres Apostólicos: eu, para rezar, preciso me recolher. Estar recolhido em um lugar para minha oração teria eficácia? Será necessário eu estar em silêncio e em um lugar sem ninguém por perto para poder meditar? Será necessário que eu entenda cada palavra de maneira profunda? Muitos se pronunciaram em favor desta tese ou hipótese, né? Santo Tomás, que era um mestre do bom senso, diz que não, né? Na verdade, Deus, que é o nosso Deus, o Deus universal, é benevolente; ou seja, ele quer o nosso bem, a benevolência. Ele não é um
ser que está com a Suma Teológica na cabeça dos fiéis. Se você não cumprir não sei o que, vai para o inferno, meu filho. Não é um fariseu! Basta a intenção de rezar. Se eu estou me sentindo mal, né? Eu vou rezar uma Ave Maria. Eu já passei perto da morte várias vezes na minha vida: por questões de saúde, por acidente, por assalto. Sou um carioca praticante, no bom e no mau sentido, né? Assim, às vezes você reza até numa situação de profunda dor, né? Na hora, você não vai pensar que está no CTI, morrendo
de dor, mal consegue respirar. Eu vou ter a qualidade contemplativa de um São João da Cruz no alto do Monte Carmelo? Não, espera aí! Basta a intenção de rezar, né? Porque nessas coisas tudo opera ex opere operato; ou seja, as coisas operam por si mesmas. É basta eu querer fazer e não com rigor em relação aos meios. Os grupos têm uma tendência ao farisaísmo, que é muito dramaticamente torturante para ele e para as pessoas que estão próximas dele, porque ele tende a influenciar quem é próximo. Ou seja, "pô, se o Fornão está dizendo, pois estudou,
leu os padres dizendo isso, deve ser." Daqui a pouco, tá todo mundo com questões relativas a minúcias: "Ah, não será que eu posso dar aula de polo? Eu não estou pelado, graças a Deus, né?" Seria uma correria. Mas assim, questões como estas, né? Porque ele não entende que na moral há coisas perdoáveis, que são princípios universais, e há coisas que mudam, a coisas mutáveis. A moral humana não é um código. Eu digo isso aqui na apresentação da Teologia Moral de Santo Afonso, linguagem que eu fiz aqui. Eu sugeri o CDB e os meninos seguiram a
minha sugestão; aliás, quando seguem a minha sugestão, é um sucesso editorial. Eu digo ali na apresentação que a moral não é um conjunto de regrinhas que um demônio ditou e que temos que seguir por causa disso ou de um Deus pagão. A moral é a inteligência que se projeta à realidade a partir de critérios objetivos de certo e errado, bom e mal, melhor e pior. A moral tem a sua fonte nas coisas e a forma na nossa inteligência. Por isso que o direito natural é a expressão dessa natureza das coisas na nossa mente. Não é
um conjunto de regrinhas; até se expressa por meio de regras, mas não é assim. A coisa é mais plástica, senão nossa liberdade seria precária, né? O rigorismo moral é para os fariseus de uma religião. Rigorismo em moral, ou seja, o sujeito tem a etiqueta da modéstia na sua mente, né? Todo o modo de vestir, as circunstâncias que se seguem, né? Estão lá apontadas, inclusivamente, ele acorda às 6:30 da manhã, ele tem lá nas gavetas as cuecas para segunda-feira, para terça, com as cores devidas. Elas pensam, né? Ele tem um PowerPoint para pagar o seu débito
conjugal com as suas forças, né? Como um momento A a ponto B. Os cursos e a face no momento, se ela chora de emoção. Ou seja, é um sujeitinho ordinário, né? Que acha que a vida humana é um conjunto de regrinhas miseráveis, né? Que droga, né? Para não dizer outra coisa, porque está sendo filmado, porque o meu vocabulário pode chegar a perímetros semânticos que eu diria não serem tão agradáveis. Quem já me viu no Maracanã torcendo pelo Fluminense sabe muito bem disso. A primeira vez que minha portuguesa teve essa experiência especial, a primeira reação dela
foi dizer: "Não digas asneiras, brasileiro!" É palavrão, né? Eu não posso dizer o que eu lhe respondi, mas então, a vida é dinâmica. A vida é regida antes pelo bom senso do que por um conjunto de uma coleção de regrinhas. É basta o bom senso. Olha, durante a nossa crise mundial sanitária, a mim só me bastou um critério, né? Que, aliás, Santo Afonso de Ligório traz à luz em matéria grave: agir com a... Consciência duvidosa é pecado, é roleta russa. É roleta russa! Se eu não tenho certeza, a matéria é gravíssima. Eu espero até adquirir
uma certeza moral. Se eu não posso ter a certeza científica, ainda a certeza moral basta para a ação. Agora, se nem a certeza moral eu tenho, eu não devo agir. E as pessoas agiram; muitas foram coagidas, mas agiram sem certeza em matéria grave. Naquela ocasião, não importa o que o mundo diz; o mundo sempre nos oprime de alguma maneira. A questão é saber se nós vamos nos deixar. O primeiro interiormente, e até que ponto ditador da vez ou o conjunto de ditadores tem direito à nossa verdade interior. Então, se nós temos o bom senso preservado,
nós temos anticorpos para agir em várias circunstâncias extraordinárias ou ordinárias. E aqui, situa Aristóteles lá na Ética Nicomaco, Livro 2, né? Se não me falha a memória, lição número 3. Aristóteles nos diz maravilhosamente que a virtude se dá no horizonte das dores e dos prazeres; ou seja, a alma virtuosa nem se derrota pelas dores nem se ensoberbece pelos prazeres. Porque diz o próprio Aristóteles: muitas pessoas, por prazer, fazem o mal para si mesmas e para outrem, e por dor deixam de fazer o bem, né, para si mesmas ou para outros. O exemplo também se aplica
ao caso recente da crise sanitária mundial. É, por fim, obsessão em psicologia, né? O sujeito que é tomado por escrúpulos acaba por descambar numa obsessão. Como está gravando, eu vou só abrir um parênteses para dizer o que eu afirmei antes de a aula começar: foi o seguinte: escrúpulo é uma palavrinha que vem do latim, "scrúpulos", que, entre outras coisas, está lá no dicionário Saraiva, que é o grande dicionário de latim-português que nós temos, e diz que é "pedrinha", "pedrisco", "seixo". E, no caso da filosofia moral, se aplica esse peso: a pedrinha tem um peso pequeno,
é um peso excessivo dado a coisas que não têm esse peso. Então, isso é escrúpulo. O escrupuloso calcula mal a realidade e, portanto, lida mal consigo mesmo e com os demais. E, portanto, não haverá de ser um bom cidadão. E, portanto, se for religioso, também meterá os pés pelas mãos, porque certos vícios anímicos se espraiam para todos os perímetros da nossa ação humana. Então, eu vou sair aqui dos quatro, porque você está achando que a página 503; e tem aqui um trechinho do meu cosmogonia, foi um artigo escrito em 2010: "Malefícios da escrupulosidade". E aqui,
página 506, livrinho bom. É assim: cai da mão, quebra os dedos do pé. Até que meandros da ignorância, malefícios da escrupulosidade, dizia o Padre Garrigou-Lagrange que um dos problemas das pessoas religiosas reside em oscilar entre dois extremos: uma espiritualidade sem vida intelectual, que resulta no estéreo pietismo. É o sujeito piegas, né? Acredita em qualquer coisa com ardor, e uma vida de estudos não acompanhada de genuína piedade, o que gera homens para quem a graça talvez até seja um elevado conceito abstrato, mas não uma realidade beatificante. Certamente, o grande teólogo francês não padecia de nenhum desses
dois males, né? Aí, em pororó, eu dizia o seguinte: o escrupuloso é um sujeito imerso no universo mental tenso, pois a sua vida interior é acossada por imagens que produzem um estado de ofuscamento habitual da razão, dado o contínuo e infundado temor de estar sempre prestes a infringir alguma regra capital. Uma alma neste estado atormenta-se a si mesma e a todos os que estão à sua volta, pois costuma tirar, nas costas das demais pessoas, um fardo ainda maior do que aquele que carrega. Por essas razões evidentes, os escrúpulos não são um juízo racional e prudente
sobre a bondade ou maldade dos nossos atos, mas um estado de dúvida não apoiado em motivos sólidos. Então, os escrúpulos são um estado de dúvida não apoiado em sólidos motivos. Por mais que os escrupulosos tentem melhorar o seu estado, a sua tendência é ficar consultando autoridades interminavelmente; eles nunca se satisfazem com uma explicação razoável, né? Santo Afonso, ele guardo lá no capítulo, no Livro 1 da Teologia Moral, vou pegar um trechinho para ler daqui a pouco. Ele diz que um dos sintomas dos escrúpulos, primeiro, é essa pertinácia de opinião. O segundo ou terceiro é esse
oscilar de opiniões, que é o extremo oposto. O sujeito, hora acha aquilo; aí vem alguém que diz outra coisa, ele passa a achar; ele não tem, ele nunca chega ao estado de certeza provável. Ele oscila entre possíveis certezas, e a sua vida é um verdadeiro drama. Então, estamos no horizonte, como se vê, doente; no horizonte de agonia, no horizonte de tendência à infelicidade. E se pensarmos que a felicidade é um estado... a felicidade não é uma soma de momentos gozosos, é um estado anímico. A pessoa se diz feliz, né, quando habitualmente ela consegue, digamos assim,
ter acesso ou entrar na posse dos bens que deseja, desde que esses bens sejam ordenados pela inteligência de maneira reta. Querer bens de maneira irrazoável acaba por levar as pessoas ao vício, ao erro, à mentira, ao engodo, etc. Não é possível, segundo o nosso bom Aristóteles, ser feliz no erro; ser feliz desinteligentemente. E o próprio Santo Tomás já nos diz na Suma Teológica, em certa altura, que é: felicidade aquela beatífica perfeita, é um ato do intelecto; está na inteligência. Não é somente um ato; não é um ato da vontade, não é um ato, não é
um movimento das emoções ou do aparato sensitivo nosso, né? Nós somos felizes na contemplação fruitiva do bem. Isso é felicidade, ainda quando certos males nos acossam. Porque, como eu disse há pouco, se Aristóteles está certo ao afirmar que a virtude se dá no horizonte das dores e dos prazeres, ora, essa vida é cheia de dores. Isso significa que... Por meio da aquisição de virtudes, eu vou entender que as dores ou serão instrumentos de perfeição para mim, de aperfeiçoamento pessoal. Se eu conseguir entender que às vezes elas são implacáveis, às vezes elas são inexoráveis, etc., mas
elas aconteceram fatalmente para mim, quando eu entendo isso e começo a oferecer isso... Aristóteles não diz que ele não era cristão, mas podemos dar um passo adiante e dizer que, com o cristianismo, se pegamos as nossas dores e as oferecemos em uma espécie de sacrifício no altar, pode ser o meu que está ali, né? Hoje, os celulares são possuídos pelo demônio, não tenha dúvida disso, né? Deitei a vontade própria. Então, se nós entendemos isso, nós oferecemos a Deus as nossas dores. O que podemos oferecer a Deus? Nossas conquistas, as nossas conquistas na ciência, nossas conquistas
na virtude. A única coisa que nós podemos oferecer a Deus, meus amigos, são os nossos pecados, nossas falhas, né? E pedir a Deus misericórdia, implorar a Ele que nos melhore, né? E que nos melhore aqui agora e que não permita que nós nos encaminhemos, né, para o funesto fogo da janela, que é um lugar onde alguns escorpulosos estarão, segundo Cristo diz na Escritura, que são os fariseus, aqueles que filtram, né, como miudezas, né, e engolem enormidades. Sua vida é um perene e reiterado aquilatar do mal da realidade. Então, nesta obrinha aqui, o professor Abud traça
um paralelo entre esse vício que é moral, que é psicológico, que é espiritual. Esse vício que nos afeta, que afeta as pessoas que são carcomidas por ele de uma maneira tão decisiva que elas passam a desenvolver, como que secretamente, uma tendência ao desespero. Quem vive querendo encontrar a perfeição perfeitíssima, né, a superlativa perfeição nesta vida de imperfeições, tende ao desespero. Uma boa maneira de desequilibrar uma alma é oferecer para ela uma proposta de aperfeiçoamento escrito, né, uma espécie de calendário de atos a partir dos quais ela alcançará a perfeição nesta vida. Porque a tendência será,
quando as coisas começarem a não ficar tão bem, será a amargura, né? O travo amargo que nós chamamos de amargo, né? Uma espécie de defeito na nossa captação do paladar das coisas. Não é que as coisas sejam amargas. Neste caso da amargura, nós aqui vertemos o nosso amargor às coisas. Nós não estamos, se cairmos nesse estado, habilitados a apreciar o sabor da vida. A vida é saborosa, é extraordinária, né? O sol está ali, diferentes os nossos medos, sejam eles em Santos ou São, não interessa, né? As borboletas continuam a... os gatos a miar, os nossos
esôfagos continuam, enquanto somos vivos, a levar os alimentos mastigados até o estômago. Pois a natureza é aquilo que sempre ou quase sempre alcança o mesmo fim a partir dos seus próprios princípios. Então, a natureza é esplendorosa, é maravilhosa. E quando nós realmente chegamos a esse pasmo com a harmonia que há nas coisas naturais, nós temos o sabor da realidade. Agora, quando tentamos torcer a natureza das coisas para moldá-la, para amoldá-la aos nossos critérios, ainda que sejam, em seus princípios gerais, bons critérios, tudo vai perder o sabor, né? O caminho é tristeza, depressão, no sentido mais
técnico do termo, que é uma espécie de atingimento no âmbito físico. A tristeza, quando vertida para a pessoa, torna-se, digamos assim, inerte, inclusive a apreciar o bem das coisas. Já que as coisas não são bem, como elas não se realizam bem nela, como ela projetava, tudo vai perdendo o sabor. Então, isso tem muito desse transtorno obsessivo-compulsivo. Eu anotei aqui a página do livro do Abud para ler, em que ele faz uma digressão sobre a obsessão. Nós, católicos, sabemos que, por exemplo, em termos espirituais préternaturais, página 68, seguinte à obsessão diabólica. Mas o que é uma
obsessão, né? O que é um pensamento que acomete uma alma a ponto de não sair dela senão com muito esforço? Vamos lá! Ele faz uma crítica ao mecanicismo de algumas, ao pragmatismo, ao caráter, digamos assim, tecnicista de algumas formulações do DSM, que é o catálogo de transtornos mentais. Ele diz com razão que algumas das definições ali padecem de vícios de um cientificismo de cunho quase evolucionista, embora sejam parcialmente verdadeiras. Ele vai dizer o seguinte: mecanicismo de lado, porque a inteligência não é uma mera processadora de informação, também é preciso fugir do racionalismo cartesiano, como apontamos.
É irreal pensar na dinâmica cognoscitiva sem unir a esta atividade o movimento afetivo e passional, e até mesmo o impacto comportamental. O sofrimento do obsessivo se capta conhecendo seus pensamentos, mas também esquadrinhando o impacto emocional que eles implicam e detectando as consequências diretas de ambos na vida diária. Costumam distinguir diferentes componentes neste transtorno: psicofisiológicos, taquicardia, né? Taquipneia, rubificação, espécies, ruborizar-se, já que eu estou sempre achando que sou o maior pecador do mundo e que estou infringindo normas. Se eu tenho consequência física, né? De achar que estou sendo exposto por minha massa, que é o rubor.
A vida moral às vezes vai do temor ao rubor. É óbvio que entre o pudor e a vergonha há uma distinção. O pudor é uma defesa psicológica, segundo o próprio Aristóteles, é um conceito interessante. A vergonha é o pudor, digamos assim, quando a soma já foi praticada, aí a pessoa se ruboriza. Então, obsidiado por esse transtorno, quando relacionado a esse rigor quanto às normas, ele tem a lubrificação como um dos aspectos: transpiração, tremor e, às vezes, transtornos de sono comportamentais. Esses primeiros são fisiológicos, comportamentais, controle. Quero controlar tudo, controle, ver e barra verificação. Né? Eu
quero controlar e verifico para ver se o meu controle deu certo. Aquele quadro na parede não está como eu acho que está, um pouco inclinado, tá? Micro, é pouco inclinado numa instância micro de medição, micrológica, digamos assim. Mas eu... Aquilo. Me incomoda. Eu vou lá verificar. Então, controle, barra, verificação, condutas evitativas, né? A pessoa escrupulosa acaba por disseminar uma mentalidade misantropa, que é a misantropia. É uma certa aversão ao contato social. O ministro tem certo ressaibo, né, no seu trato com as demais pessoas, a ponto de muitas vezes se afastar. Então, condutas evitativas, superstição, rituais,
né? Os grupos... É capaz! Eu conheci uma pessoa que, até conhecedora de Santo Tomás, né, pessoa bacana, né, potencialmente boa, não sente a potência para ser uma pessoa excepcional. Mas ela é capaz de, por exemplo, desmarcar uma reunião se choveu ou se teve um trovão. É capaz de mudar todo um percurso, até um trato que fez com alguém, se algo fizer pensar que era um sinal. Tá? Não, não aconteceu. Não é possível. Tá errado comigo. Se isso aconteceu, a culpa é minha. E agora, alguns casos podem chegar a patologias graves. Machado de Assis, na bela
novela que é "O Alienista", quem não leu, leia. É uma obra-prima da nossa literatura. Acerta à altura. O Simão Bacamarte é o sujeito, é o alienista, o cerebelo estudioso da alma humana que vai definir novos perímetros para o bem e o mal no agir humano. E ele começa a botar na Casa Verde, que é o hospício lá de Itaguaí, todo mundo. Né? O sujeito pagou uma dívida. Não é maluco, não. Você pagou de Casa Verde, né? O sujeito não trai a mulher. Casa Verde nele. Ele vai botando todas as pessoas lá, até que, enfim, depois
ele atira e começa a botar outras com outros perfis. Evidentemente, ele, no final, ele próprio se coloca lá na Casa Verde, né? Esse vale a pena o spoiler, porque não altera em nada. É tão rica a novela. Importante é o que ele vai dizendo e fala muito dessa mentalidade cientificista que invadiu a psicologia. A chamada psicologia moderna é filha de uma visão que foi parida no laboratório. Viu? Um psicólogo do século XIX, que lá em Leipzig, na Alemanha, fez um laboratório experimental. E ali, a psicologia pós-moderna e moderna é fruto dessa visão cientista. Então, achava-se
que a psicologia abordava só os estados da mente. A psicologia aborda, em tese e de fato, tudo que diz respeito à alma e não apenas processos mentais ou cerebrais, neurológicos, né? Então, O Alienista diz muito dessa mentalidade que, ainda hoje, infelizmente, predomina na nossa psicologia, mesmo quando os psicólogos são formados e deformados nas universidades, né? E, às vezes, até sem saberem juntar verbo, sujeito e predicado, né? Repetem mantras ideológicos que certos professores ensinam, né? E, às vezes, vão ali tratar pessoas no consultório sem nem saber nem o que é a alma. Que a filha de
uma amiga minha, que estava fazendo psicologia, estava no sétimo período. Eu fui, minha filha, mas qual é o conceito de alma? Ah, não, isso a gente não estuda! Que maravilha, né? Psicologia, o estudo da alma, não tem nenhum conceito de alma. Que que é a alma humana? Só existe a alma humana. Os vegetais têm almas, os animais irracionais têm alma. Quais são as potências da alma humana? As potências motrizes, as potências coletivas, sensitivas, né, cognoscitivas? Isso não se estuda? Então, comportamentais é daí para baixo. Condutas reparatórias. Poxa, eu fiz isso, agora eu tenho que pagar,
né? Eu me autopuno ou então vou punir os outros pelo que eu julgo que cometeram de errado, né? Consultas médicas frequentes é hipocondria. Um caramba, né? Eu tô com um probleminha aqui. Não, o sujeito vai ao médico. Se o médico não receitar um remédio ou um conjunto de remédios, é mal médico, né? A Kalia me conta de uma amiga lá em Portugal, médico receitou nada. Quem tá assim de dor sou eu. Ou seja, é a mentalidade dos escrupulosos. Quando os seus estudos alcançam os seus cuidados com a sua própria saúde, né? Condutas de proteção, isolamento,
perda do Padre Marcelo. Social, higiene! Tem que lavar a mão 35 vezes por dia, né? Guaraná, durante a crise sanitária mundial, né? O sujeito, antes de trair a mulher, ele passava álcool gel. Ou seja, que desgraça! Antes de cometer a maior atrocidade do ponto de vista moral, ele limpava-se. Era um sujeito higiênico, né? Paulo, não dizer outras coisas que não é próprio dizer que estou sendo gravada. Elas não é próprio nem dizer, né? Talvez não seja o próprio pensar, mas dá vontade de desprezar, porque a caricatura tem um caráter catártico, né? Você, quando faz a
caricatura, às vezes a pessoa que não tá entendendo, aqui meu filho, aqui ó, é isso, né? Aí ela entende. A caricatura tem um condão curativo, sobretudo para mentalidades que foram adestradas a não perceber o mundo real, como é o caso dos escrupulosos, né? Compulsões motoras, em geral. Então, os primeiros foram psicofisiológicos. Comportamentais, os segundos e cognitivos. Dúvidas persistentes. Meu Deus do céu, né? De fazer isso, aquilo, aquilo outro, né? Ah, não, agora acho que o melhor é aquilo. Um talvez ainda tenha errado. Nunca se resolve! Os escrupulosos são sujeitos que entraram em guerra com a
sua própria possível autorrealização. Tendem à auto-sabotagem. A maneira de uma pessoa... Há várias maneiras, uma pessoa não dá certo. Uma delas é a auto-sabotagem. E uma das maneiras de auto-sabotagem, sofisticadíssima, é ter ideias mirabolantes, projetos extraordinários, e realizá-los. Não vão dar certo mesmo, né? Pô, era muito difícil! Tem um amigo meu que eu não vou dizer o nome, até porque eu gosto muito dele. Ele é expert em criar projetos extraordinários. Ele nem entende os projetos. Mas é assim, é um negócio interessante de ouvir. Você fica enredado naquilo. E eu, como amigo, um amigo que é
amigo, não é o sujeito, né, que vai dar os tapinhas nas costas, né? Que hoje em dia as pessoas acham que a amizade é beber um chopp ali no bar da esquina. Eu tentei... Usar do humor para ver se às vezes ele, agora, mas ele realmente, ele, ideia: coisas realizáveis, né? Pensamento mágico, que é isso que eu faria a superstição. Se eu passar aqui debaixo da escada, vai me acontecer alguma coisa! Eu vou cartomante! Leiam também o conto "A Cartomante", do Machado; outro conto sensacional. Esse eu não vou dar o spoiler para quem não leu.
O final é maravilhoso, né? É dúvida moral, reiterada, culpa indevida, hipocondria, ideia superestimada, contaminação na realidade, características todas em torno de obsessões ou compulsões mentais. Poderíamos também agrupar sintomas emocionais, com a ressalva de que, estando neste grupo, seriam realidades, pressões mistas e afetivas. Tudo dinamismo humano. Por exemplo: ansiedade, angústia, insegurança, têm perplexidade. Abro um parêntesis aqui para citar mais. Que define o medo, o temor, no latim, da seguinte maneira: "temor" é de um mal futuro. O medo é de um mal futuro. Quando nós temos medo de algo, é porque se apresenta à nossa consciência como
mal em si, futuro, né? Mas um futuro relativamente próximo. Porque se é um futuro distante... "Olha, vai cair um cometa na Terra, segundo o astrofísico fulano de tal, no ano de 5.930." Eu não vou temer, né? Então, esse mal futuro é relativamente próximo, presumivelmente invencível para mim, porque, se eu posso suplantar o mal com Peteleco, não vou temer. E esse mal, nesse caso, será patológico. Tenho medo de uma formiga? Não dá! Tem que ser algo que presumidamente vai me afetar. Ora, pensamos aí; vou citar novamente essa situação que é contemporânea. Nossa, uma sociedade que vai
morrendo do medo de morrer é uma sociedade que exalta a vida como um bem absoluto, e não a vida moral, e não a vida ética, e não a vida da inteligência. Quem vive por viver e para viver são os animais ditos irracionais, né? Que têm vida orgânica. Eles não estatuem, não estabelecem princípios, não pautam suas ações em normas gerais de ação aplicadas às circunstâncias particulares. Eles vão vivendo os seus. As suas dores não são como as nossas. Uma coisa é alguém ter uma dor física forte. Eu agora, meu sangue tá quente, tô com um problema
mais ou menos grave aqui na coluna lombar. Vem pra cá com a dor, pedir para a aula ser de pé, até dar uma certa naturalidade, né? Melhor ficar sentado, olhando para a câmera. É uma coisa de entediar qualquer um. Mas porque não tô mal, consigo me sentar cinco minutos, consigo levantar. Tô com dor. Agora, isso é um animal. Pode ter uma dor na coluna. Meu gatinho lá, tá quase morrendo, coitadinho, tá cheio de problemas. O Boécio, meu gato filósofo, agora, ele não tem sofrimento no sentido profundamente humano; ele não tem um bem superior a realizar
em sua vida. Ele não é capaz de se sacrificar por muitos, só por amor. Ele não é capaz de ensinar, né? Se vocês virem amanhã um conjunto de formiguinhas, estão na juras, rezando diante de uma árvore porque deu muitos frutos daquele verão, né? Vocês podem ter certeza que estão possuídas pelo demônio, porque a formiga não é capaz dele, não é capaz de Deus. O homem é capaz de Deus porque tem inteligência e tem vontade. Então, esses medos, quando se pautam só em coisas relativas ao nosso bem-estar anímico, físico ou à nossa própria vida orgânica, podem
nos levar a viver da pior maneira possível. Eu disse aqui no início bem propriamente a Cícero que o homem é o que deve. Ele é o que é quando se torna o que deve ser. A noção de dever é o livro de "O Finibus", uma obra clássica deste romano extraordinário que Santo Tomás amou. Quem leu "Summa Theologica" já viu em várias passagens, sabe, Tomás referir-se a Cícero como Túlio, quase um amigo, né? Segundo Túlio, né, que é Marco Túlio Cícero. Então, nós temos esse horizonte de dever. O escrupuloso também tem, porém distorce, amplificando esta noção
de dever e começa a assumir culpas que não são suas. Não são suas. Eu disse no videozinho que me pediram para fazer, para... Como é que é o nome daqueles vídeos curtos que vão aí para coisa bonita, né? Realmente, ainda bem que eu tô velho, mas eu disse nesse vídeo de um minuto: o mundo contemporâneo é bacana! Alguém pede que você tenha que resolver a questão em um minuto para nós. Aristóteles, se vivo fosse, ia ter que fazer um Wilson Santos, tem que vender isso rapidamente no Instagram, mas a gente faz o que pode. Eu
disse lá no meu vídeozinho de um minuto que a noção de escrúpulo, o problema da escrupulosidade, está ligado a outros dois problemas que lhe são correlatos: o problema da culpabilidade e o problema da responsabilidade. O escrupuloso julga-se responsável por coisas que não estão sob sua responsabilidade, se culpa por isso, né? Por esta razão, vai se desagregando interiormente. E assim, imaginemos nós, a pessoa dá azar de se casar com o escrupuloso. A quantidade de vezes que o escrupuloso vai julgar mal o seu cônjuge, né? Judicando as suas intenções, seja por um gesto, seja por uma roupa,
seja por uma palavra, né? E a relação vai se tornando verdadeiramente insuportável. A quantidade de vezes que isso sucede é assim, digamos, potencialmente infinita. Então, os escrupulosos fazem mal a si mesmos, fazem mal a todos que estão com eles. E aqui, diz o Abud: pois bem, surge a necessidade de contar com critérios classificatórios, não só para efeitos nominativos, ou seja, de nome, mas também para estabelecer uma gradação em outros termos. Quando certo traço é patológico e quando não? Qual é a medida para estabelecer que, alcançando um certo nível, entramos no âmbito da enfermidade? Como qualidade
do sujeito? Qualidade má. O enfermo da alma tem um conjunto de qualidades que o deformam e dificultam a sua auto-realização. A clínica moderna em... Sua grande maioria é que parou: saúde e funcionalidade e enfermidade, disfuncionalidade. Olha que tragédia, apelando ao claro e cru critério adaptacionista. Ou seja, a pessoa saudável é que é funcional. Quem já não ouviu-se nas empresas: “seja funcional, todo mundo”. Essa criança hoje está no colégio e não queria ter um filho de 8 anos. Hoje é globalismo puro na veia, que se passa em qualquer colégio, desde os colégios vizinhos públicos até colégios
como a escola Suíça e a escola Americana. O garoto com 8 anos já vai entender de política internacional, direitos da verdade, não vai entender de direitos nenhuns, né? O que vai ser passado para ele é um conjunto de critérios ideológicos que ele vai absorver como verdade e vai moldar sua mentalidade a partir daquilo. O próprio DSM-4, que é o catálogo dos transtornos mentais, hoje DSM-5, está repleto de orientações pragmatistas, critérios geralmente usados para regra de medição, como se adoecer fosse principalmente funcionar mal. E como, recorrendo ao seu manual de uso, pudéssemos isolar partes, retificar componentes
e estipular frias datas de vencimento que pautam a duração, prazos e recidivas dessa coisa tão humana e, paradoxalmente, complexa e simples, que é adoecer. Ser humano é ter potência para passar mal, para descer. Se não entendemos que isto nos constitui fundamentalmente, estamos mal. Nós não somos saúde plena. Nós não somos entes que têm a intuição fulgurante das verdades supremas. A verdade para nós é uma aquisição paulatina e dificultosa, e é, por uma espécie de abstração dos conceitos a partir das coisas que os sentidos captam. Chegar à verdade para nós é sempre algo trabalhoso, e não
é a verdade abstrata, mas a verdade com relação a nós mesmos, aos nossos sentimentos, aos nossos critérios de escolha, etc. Uma pessoa engana-se com relação a si mesma, enormemente, muitas vezes mais do que supõe. Então, entre o nosso intelecto e a realidade, já que o nosso intelecto é precário e finito, há sempre uma zona de sombra, de coisas desconhecidas. É uma pretensão cientificista achar que eu vou descobrir tudo da ordem do ser. Por mais que a ciência progrida, já que o ser é inesgotável, sempre haverá uma infinitude de coisas por conhecer. Santo Agostinho, no seu
comentário ou credo, o comentário religioso, diz que nenhum filósofo até o tempo dele – e eu diria até hoje – esgotou nem sequer a essência de uma mosca. Uniu os muisc, porque, ainda que eu soubesse tudo a respeito de todas as moscas classificadas pela biologia, ainda restaria por saber um conjunto de coisas. Por exemplo: por que existe a mosca? Por que a mosca e não o nada? Heidegger fez a pergunta: “Por que o ser e não nada?” Essa é uma pergunta que pode ser aplicada, pode aplicar-se a qualquer coisa. Entendamos que, sem essa capacidade de
olhar para coisas ruins em si mesmo, na realidade exterior, etc., e ver que são instrumentos de aperfeiçoamento e não pedras de tropeço, porque isso aqui é só um conjuntinho de pequenas características do que a curiosidade faz à alma de uma pessoa. O perfeccionismo equivocado, de acordo com o que eu defini, é um julgamento de intenções prudentes, né, com relação às suas próprias intenções, que são sempre verificadas a do infinito e com relação às intenções alheias. Desprezo do próximo, faria Isaías: religião, rigorismo, imoralidade, obsessão e psicologia, etc. A alma escrupulosa tende a jogar na cabeça dos
outros a mesma placa de concreto que aplica a si mesma. Ela não consegue entender que a vida humana é dinâmica, lida mal com as suas próprias falhas e tende a ser muito rigorosa com as falhas dos outros, invertendo sempre na relação entre fins e meios o valor que é devido a cada uma dessas realidades. O que é meio, instrumento para a consecução do fim? Os grupos acabam por supervalorizar o meio e jogar na latrina o fim. Foi o que os exemplos que eu dei aqui são bastante. Continuamos com o Abud, né? Assim é que o
critério moderno diz que, neste quadro, seus sintomas devem causar um desestresse acentuado, consumir mais de uma hora por dia ou interferir significativamente no funcionamento habitual, ocupacional ou social, e não ser devidos a efeitos fisiológicos diretos de uma medicação, substância ou condição médica geral. Então, aqui vale o parênteses. Nosso autor entende que são realidades distintas os escrúpulos e o transtorno obsessivo-compulsivo. Mas, catálogo e identifica, no transtorno, no TOC, aspectos gerais da cripulosidade que são dramaticamente destruidores da alma, daquelas potências superiores da alma, e dos grupos, e que ele acaba por cair, digamos assim, numa espécie de
rede difícil de sair. Vou só à última coisa que eu trouxe para ler aqui. Pedi para os meninos separarem um trechinho da Teologia Moral do Royom Marinho, página 234 e seguinte, em que ele fala dos grupos e alguns dos seus remédios, que nós vamos ver que são remédios muitas vezes aplicáveis a circunstâncias quaisquer. Não interessa se esses remédios são prudenciais no âmbito da moral ou se são precisos no âmbito clínico. O fato é que, se forem aplicados devidamente, trarão uma saúde para a alma que até então estava doente. Estava doente, infelizmente, para algumas psicologias contemporâneas
o próprio conceito de cura é impróprio. Algumas psicanálises de raiz freudiana entendem a cura como algo irreais. Não é papel do psicanalista curar o paciente, e sim entender quais são as suas crises internas, pulsionais, etc. Ele não está ali para resolver um drama; está ali para ouvir. É um diálogo ao modo monológico, digamos assim. O paciente fala, o terapeuta ouve e intervém pouco ou nada, né? Mas a sua conta bancária vai ordinariamente, né, porque ele emprestou os seus ouvidos sapienciais e vai se tornando mais ou menos gorda a consciência escrupulosa. Antônio Royom Marinho, noção, né?
Aquele que cita o que eu já disse aqui. Que a palavra "escrúpulo" vem dessa ideia de pedrinha, né? A pedrinha que, na mente dos escrupulosos, recebe um peso maior do que tem. Sinais, a consciência escrupulosa se manifesta por uma multidão de sinais; os principais são os seguintes: medo constante e perturbador de incorrer num verdadeiro pecado caso se permita certas coisas ou ações que se vê realizarem com toda tranquilidade de espírito, outras que vê realizarem com toda tranquilidade de espírito, outras pessoas. Excessiva ansiedade sobre a validade ou suficiência de uma boa ação, principalmente a seca, no
caso religioso, das confissões passadas e dos votos internos. Um sacerdote tem que ter uma paciência bíblica, às vezes, né? Que o sujeito que era escrutinar para ele, ele entra numa espécie de catálogo de todos os seus minuciosos pecados, já perdoados sacramentalmente. Perdoados! Acha santa paciência para suportar uns escrupulosos que acham que o padre é um terapeuta que está ali, né, para ouvir qualquer coisa e não para subministrar o perdão divino. Excessiva ansiedade, longas e minuciosas acusações de circunstâncias que não vêm ao caso é próprio dos culpulosos exagerar no olhar para o que é circunstancial, acidental,
incidental, deixando de lado o essencial. Infelizmente, sua alminha, sua vaquinha, está no brejo, né, com os sininhos balançantes, as patinhas atoladas e mugindo com fúria, uma fúria pertinaz de juízo, e não se tranquiliza com as decisões sapienciais do confessor ou do pedagogo. Ou seja, haja paciência para aconselhar um escrupuloso, que ele vai dizer “não”, mas só que tem isso aqui. Ou seja, é o mesmo problema, só que ele não entende que é o mesmo problema à luz de uma outra circunstância ou de um outro detalhe; então ele multiplica as suas dúvidas e vive enredado nesse
estado que é a sua desgraça. Os estudos costumam revestir duas formas principais: uma de tipo geral, que abarca todo o campo da consciência e se refere a todos os tipos de pecado, e outra especial, que se circunscreve a uma determinada matéria, né, deixando completamente em paz a tranquilidade de todo o restante da vida moral. Por exemplo, o sujeito acha que o único pecado que existe é referente à matéria sexual, né? Invejoso, impertinente, soberbo, vaidoso, avarento; o desgraçado é um compêndio inacreditável de pecados capitais e seus pecados auxiliares, mas ele só acha que está mal se
deu vazão indevida às suas premências sexuais. E aqui também vale dizer: com a sociedade contemporânea que vive à luz do Boston Medical Group, né, de sexo é vida, ela não entende que sexo não é vida. Fazer xixi é vida; sexo não é uma necessidade fisiológica, é uma potência anêmica vestida em um âmbito do nosso corpo. Eu posso viver a vida inteira, né? Se o sujeito é um Robinson Crusoé da vida deserta, ele vai viver, se tiver alimento, anos sem fazer sexo; agora, vai viver uma semana sem fazer xixi, sem fazer o "totô", né? Eu tirei
a vesícula, eu sou um sumário de operações; tive um problema na cirurgia, claro que deu um problema. Tive um problema na laparoscopia, o cara quase teve que mudar o procedimento. Eu tinha 113 pedras na minha vesícula, né? Um negócio de vesícula é uma constelação de pedras nada preciosas. E o sujeito, lá na hora H, deu um nó de marinheiro; um médico da Marinha, meu! Eu virei caso que quis ser apresentado em encontros médicos, né, porque ele deu uma resolução para o meu caso que se devia à sua ciência de marinheiro, digamos assim, tem um nó
de marinheiro nas minhas tripas e evitou que se mudasse o procedimento. Se ele fosse alguém escrupuloso, jamais faria isso, porque os cursos e protocolos, nós vimos agora; a medicina é protocolo. Eu fiquei internado, agora não vou dizer o nome do hospital publicamente aqui no Rio, ano passado, por uma endocardite bacteriana. Dois meses no hospital, tomando infusão de antibiótico na veia todos os dias, né, só protocolos. Os médicos nem tocam no nosso corpo, mas eles mandam fazer exames e analisam os exames. O exame clínico não está em moda. E eu, né? O meu estado de saúde
alentado estava lá em cima, que eu consegui brigar com todo o corpo de enfermagem e com dois dos médicos que me apresentavam soluções protocolares, mas que eram a partir de ideias vagas. Hoje em dia, as pessoas vêem-se internadas, o médico é o senhor da vida e da morte; você não pode questionar nada. Então, o médico me disse assim, por exemplo: “sua válvula tem uma válvula artificial, já foi colocada no meu peito, aqui vai ser trocada em algum momento; sua válvula está doente”. Doutor, minha válvula está velha ou está doente? Porque o outro médico tinha dito
que ela estava normofuncionante. Né? Uma coisa é a pessoa estar velha; um velho não vai bater o recorde olímpico de corrida de 100 metros rasos, agora estar doente não necessariamente. Então, assim, tudo ele mudou a medicação. Queria saber por quê, né? Eu tenho esse direito como paciente, até do nosso SUS, né? Infelizmente, os médicos se tornaram senhores da vida e da morte, você não pode dizer nada. Bom, eu cheguei lá com a certeza de cirurgia imediata, quase desenganado, né, e não fui operado. Não fui operado, mudaram os laudos; foi assim, foram dois meses de terror
psicológico. O que me salvou, entre outras coisas, foi o meu estado de... Bom, isso é uma patologia minha. Estou quase morrendo de graça; eu que não peguei a Covid, né? O que eu fazia, sem o bico desse tamanho? Tinha que caminhar; eu ia para o corredor. Não pode caminhar no corredor. Aí, de madrugada, eu caminhava. Uma das enfermeiras, “o senhor caminha”, falou três vezes, quase como Cristo pediu a Pedro: “tu me amas? O senhor caminha a terceira vez, o senhor caminha.” Falei: "Olha, minha querida, eu tô esticando os músculos para não ficar com as canelas..."
Aí ela, né, fez aquela cara, o semblante opaco do burro de que não entende. Até menina entendeu o semblante opaco do burro. Tá, mas essa mesma enfermeira disse: "Olha só, Hospital Cardiológico, nós vamos dar uma festa quando o senhor sair daqui." Aí eu disse para ela: "Perdão, mas é para dizer o seguinte: olha só, ou temos uma vida cheia de coisinhas chatinhas, escrupulosas, ou teremos a leveza que a vida, às vezes, exige para nós vivermos saudavelmente." Isso aqui eu tô dando um exemplo pessoal e faço ao modo de testemunho porque é um fato. Ou nós
entendemos que a vida é para ser vivida com alegria, sem exageradas normas, só com normas gerais, entendendo da melhor maneira possível a aplicação dessas normas, mas sem jogar um peso excessivo. Como eu disse aqui, na etimologia da palavra "escrúpulo", a Pedrinhas, né? Ou fazemos essa última coisa e vamos nos desesperar, ou fazemos o contrário e vamos viver com leveza. A única coisa que me ocorreu foi dizer para essa moça que falou que ia dar uma festa. Esse enfermeiro já estava com festa assim no hospital. Eu virei para ela e disse: "Mas vocês vão dar uma
festa se eu sair daqui de Uber ou de rabecão?" Aí, dessa vez, ela entendeu e sorriu, né? Aí eu falei: "Quiz dente! Não sorria mais. A senhora deve sorrir mais!" E foi essa mesma criatura que me deu o antibiótico errado; eu quase morri. É, coisas assim. Eu quero crer que ela fez isso, né, por descuido, negligência, e não por intenção de fazer com que eu, né, abotoasse o paletó, né, que eu chegasse às canelas literalmente. Mas, assim, a negligência é pecado. A negligência... Qual é o antônimo de negligência? Alguém poderia me dizer aqui? Qual é
o contrário de negligência? Diligência! Muito bem, né? O diligente é aquele que, vendo uma necessidade qualquer, age rapidamente para resolver; um negligente deixa de fazer coisas que são do seu ofício. Ele deveria saber, mas não sabe, não faz porque não sabe, então é culpado. É óbvio que, no âmbito da filosofia moral, da Teologia Moral, a negligência vai ganhar um estudo especial, não apenas de Santo Afonso de Ligório, mas de todos os estudiosos da vida moral e religiosa. O culposo, ele geralmente não é negligente; ele é diligente com relação aos meios, mas negligente com relação aos
fins. Então, é por causa de uma norminha que alguém lhe disse que ele deixa de cumprir até com deveres sociais, né, a pretexto de estar fazendo algo sagrado a Deus. O professor Pachelli costuma citar um autor francês que agora me escapa o nome; ele diz, né, que alguns religiosos farisaicos, né, dizem amar a Deus para esconder o seu desprezo pelos homens, né? Isso é mais comum do que podemos imaginar. Muitas pessoas usam da vida religiosa para fugir do mundo; são misantropos, elas não gostam de gente. E assim pensamos em Jesus Cristo: ele andava com prostitutas
para ensiná-las, mas andava; ele não era purinho. Então, assim, os grupos ou ele, ou alguém, lhe ensina a sair desse estado, ou se é um psicólogo, ajuda até medicamente a sair desse estado, ou ele vai pisar nas pessoas por jogar sobre elas o peso que joga sobre a sua própria consciência. Então, são duas; haveria muitas coisas mais a dizer, é claro, né? Eu tô aqui com essa dor na coluna, tô fazendo um sacrifício de não ter ido ao jogo do Fluminense. Não sei quanto estará a esta altura. É, e realmente, você tem um limite; cheguei
no meu limite aqui de dor. É, mas eu acho que o essencial ficou dito, né? E que escrúpulos e o transtorno obsessivo compulsivo são realidades similares; não são idênticas, né? Há uma diferença entre o igual, o idêntico e o semelhante. Parênteses: comentando a metafísica de Aristóteles, diz que o idêntico é o Uno na substância. Toda substância é idêntica a si mesma e distinta de todas as demais. Então, a identidade: nós temos uma carteira de identidade, a nossa digital é repetível. Se me dissessem para tirar, fizesse um registro da nossa íris dos olhos, é única; nunca
se repetiu uma íris. Então, o idêntico é idêntico a si mesmo e distinto de tudo o mais sobre algum aspecto. O igual é o Uno na quantidade. Estas cadeiras são iguais, não são idênticas. O que faz com que esta cadeira aqui seja distinta dessa aqui que é igual a ela? É certa quantidade de matéria, né? Ou seja, a matéria é o princípio de individuação nos entes compostos. Isso aqui pode parecer chato, que metafísica às vezes nos leva a regiões mais abstratas do ser, mas isso se aplica às realidades analogicamente, à realidade de Morais. Então, tenhamos
em vista que ser escrupuloso e ser observado por um transtorno são coisas analogicamente semelhantes, mas não são exatamente a mesma coisa. Muitas vezes, o remédio será igual; basta uma mesma medida. Uma mesma medida é capaz de atingir diferentes. O mesmo remédio atinge diferentes órgãos nossos. Assim também são algumas coisas morais. Às vezes, uma mesma decisão de natureza espiritual atinge o corpo, atinge a vontade, atinge os sentidos, etc., ordena tudo. Então, o remédio muitas vezes pode ser o mesmo. É, o que importa para nós saber que assim é. Óbvio que eu não vou dar o spoiler
do livro aqui, porque isso está sendo gravado e eu acho que é um convite aqui às pessoas: leiam. É um livrinho que foi escrito, provavelmente, sem intenções, como outras obras; com o mesmo autor, escreveu intenções maiores e que não fossem expor um conjunto geral de princípios, normas, etc. Mas assim, fiquemos com algo no nosso horizonte: temos responsabilidade moral para com todos os estados mentais. Que implica a responsabilidade moral, até para com as nossas emoções, a tristeza e as alegrias imorais? É quando alguém se entristece porque não realizou o malefício que intencionava realizar. Essa tristeza é
imoral. Eu disse aqui, citando Aristóteles, no livro 2 da Ética a Nicômaco, que a virtude se dá no âmbito das dores e dos prazeres. A dor não pode ser algo que me leve ao desespero, nem o prazer algo que me leve a escurecer em mim todos os princípios da ação moral. Então, tenhamos no nosso horizonte que cabe sim a nós, né? Primeiro, nós fugimos das curiosidades. O Rui Marinho até aconselha, junto com Santo Afonso de Ligório, que até a companhia de pessoas escrupulosas, às vezes, é bom evitar. Que as pessoas escrupulosas, atentas a detalhes, começam
a citar esses detalhes como se fossem verdades absolutas para terceiros, que estão menos, talvez, habilitados, por desconhecimento das normas, e acabam influenciando outras pessoas. Então, escrupuloso é uma maçã podre dentro do cesto. Então, não convém nem ter a companhia dele. Isso é bom termos no nosso horizonte porque, às vezes, né? Isso aqui pode ser dito a grupos religiosos, numa escola, em qualquer circunstância da vida. Devemos evitar os grupos como peso indevido, dado às coisas, e também evitar, dentro do possível, má companhia de pessoas escrupulosas, a menos que sejam pessoas amigas que estão abertas a ouvir.
Um arremedo, cada vez mais difícil no universo contemporâneo de suscetibilidade. As pessoas não faltam mais; qualquer coisa é um aiuê. Ah, não vou recorrer ao Estado, inclusive! O cara me ofendeu, tô me sentindo, né? Eu tô aqui; ele me xingou. Né? O Tonico me bateu, roubou meu saco de pipoca, mãe! Essa é a sociedade contemporânea, dos Tiradentes de geleia, né? São pequenos tiranos, né? Vontadezinha super satisfeita, senhorita. São pessoasinhas cheias de vontade, né? Vestidas para as coisas da sensibilidade, e ninguém lhes pode dizer nada que cai o mundo. Arde Roma! Arde Roma! Então, eu sei
que é difícil nesse ambiente que tende a piorar entre jovens que já estão mal formados há umas três ou quatro gerações. Isso é um fato. Mas se for uma pessoa amiga, quem nós podemos dizer: "O cara é, não faça isso, pelo amor de Deus!" E ele entende que um arranhão, lascar um osso faz parte da amizade. Amizade só para o chopinho não é amizade. É o amigo que vai dizer desagradável. Se nós não dermos ao amigo o condão de ser desagradável para nos alertar de coisas que devemos mudar em nós, nós não somos amigos de
ninguém. Então, leiam o livro do professor Abuds. Está aqui: "Temores Insanos". É óbvio que tem! Ele é um psicólogo que não confunde o âmbito religioso com o âmbito da psicologia; são ordens distintas: a da graça e a da natureza. É o católico, né? Um viúvo com seis filhos, um jovem viúvo com seis filhos deve ter uma vida difícil, de estudar tudo, publicar um monte de livros, né? E ainda partilhar esses conhecimentos não deve ser fácil. Mas assim, ele sabe o terreno que a psicologia... Ele, como católico, ela cede lugar à ordem da graça. Nós podemos,
por graças especiais, curar mais inclinações que se cristalizaram em nós, ao modo de vício. Agora, se a pessoa não entende o que é uma inclinação, qual é a diferença entre vontade e apetite, e se vai recorrer a alguém que também não entende... Se ela já não entende, já vai recorrer a alguém, seja sacerdote, seja psicólogo, seja professor, que também não entende, né? Serão dois cegos caminhando de mãos dadas na direção do buraco existencial. Tá bom, meus casos? Um agradecimento meu, para mim é bacana estar aqui, eventualmente, no Centro Dom Bosco, tem ouvido menos, né? Até
para não enfadar. A luz, muito... É, mas é sempre uma alegria vir para cumprir aqui, dar cabo, assim, de uma promessa que eu fiz. Não estava me sentindo bem, mas eu falei: "Vou dar uma melhorada." Na hora H, algo acontece e as coisas saem bem. Então, leiam um livro e muito obrigado, viu, gente? Um abraço! [Música]