Esses pontos no meio do deserto da Arábia Saudita podem ser vistos até do espaço. São agroglifos - plantações em círculo que cultivam o que seria incultivável numa região assim. E tem também turbinas eólicas que fazem chover onde quase nunca chove.
Elas ajudam a combater um problema do qual pouco se fala: a expansão dos desertos. Os solos do nosso planeta estão se degradando em desertos a um ritmo sem precedentes, com consequências catastróficas. Mas, e se pudéssemos recuperar as áreas que foram perdidas?
Cientistas estão pesquisando maneiras de tornar o deserto verde. E, cada vez mais, parece ser possível impedir que a areia avance. Este é o deserto que mais cresce no planeta.
Gobi – que significa "lugar sem água", em mongol – se estende pela Mongólia e China. Ele devora cerca de 6 mil quilômetros quadrados de pastagens por ano, engolindo aldeias e transformando paisagens em terrenos inabitáveis. Dezenas de milhares de pessoas se tornaram "migrantes ambientais" e se viram forçadas a fugir pra outro lugar.
A razão pelo qual o Gobi e outros desertos estão se expandindo se deve, em parte, às mudanças nos ciclos climáticos que afetam as chuvas. Mas o aquecimento global causado pelo homem também está alimentando esse processo. A cerca de 3 mil quilômetros de Gobi, fica o Mar de Aral, entre os desertos do Cazaquistão e do Uzbequistão.
Ele está secando, principalmente por causa da agricultura industrial. Além disso, secas extremas, desmatamento e pecuária degradaram severamente um solo que antigamente era fértil. Essa destruição causada pelo homem é chamada de desertificação.
E ela está acontecendo em escala global. Até meados deste século, 25% do solo do mundo será afetado. Este é Barron Joseph Orr.
Ele é cientista chefe da agência das Nações Unidas para o combate à desertificação. O trabalho dele é achar soluções para ajudar quem é afetado pela desertificação. Ou seja, atualmente meio bilhão de pessoas, além de outras 500 milhões que estão sob risco iminente.
A maioria vive no Sudeste Asiático, Oriente Médio, região do Saara e Norte da África. A boa notícia é que existe esperança. Lembra dos pontos verdes que falei no início do vídeo?
Por menores que pareçam, cada um é na verdade um campo, no formato circular, de 1 quilômetro de diâmetro, bem no coração do deserto. Eles são um símbolo da expansão agrícola na Arábia Saudita desde a década de 1970. Agora, o trigo e outras culturas cobrem vastas áreas.
Mas o cultivo nesta região requer um grande consumo de água. Os agricultores retiram a água do subsolo, a um quilômetro de profundidade. Mas, obviamente, há um problema.
A monocultura provoca a exaustão do solo, fazendo com que ele não consiga reter água por muito tempo. E isso é fundamental. Como a precipitação média anual é de apenas alguns centímetros, o volume de chuva não consegue reabastecer os aquíferos.
Por isso, especialistas estimam que as bombas d’água precisarão ser desligadas em cerca de 50 anos na Arábia Saudita. Mas existem formas mais sustentáveis de usar a água no deserto. Na costa oeste da Arábia Saudita está acontecendo um experimento diferente.
Uma iniciativa – chamada de projeto Al Baydha – desenvolveu um sistema para regenerar a terra usando inundações repentinas. Sim, você ouviu certo: alagamentos no meio do deserto. Esses vídeos compartilhados nas redes sociais, em 2021, mostram como podem ser as chuvas na Arábia Saudita.
Mas a maior parte da valiosa água doce da região escoa ou evapora. Este é Neal Spackman. Ele é especialista em agricultura regenerativa e ex-diretor do projeto Al Baydha.
Junto com a comunidade local, Neal Spackman e outros especialistas em agricultura vêm construindo barragens e quilômetros de valas. A ideia é canalizar e reter a água da enchente onde ela é necessária. Estes são métodos que o povo inca já usava há centenas de anos no Peru.
No início, a irrigação artificial era necessária para promover o crescimento das plantas e reiniciar o ciclo ecológico. Mas ao captar as inundações repentinas, mais água poderia ser colocada no solo em vez de ser retirada. Árvores, arbustos e gramíneas nativas conseguem sobreviver a uma seca de 30 meses, sem irrigação adicional.
O projeto está em andamento desde 2010 e provou que é possível recuperar o lençol freático no deserto. O próximo desafio é aumentar a produção agrícola para tornar as pessoas na região novamente autossuficientes. Porque até o Saara já foi verde um dia.
Milhares de anos atrás, as chuvas das monções tornaram o deserto um lugar habitável. Hoje, o Saara é rochoso e arenoso. Em alguns pontos, eles se expande quase 50 quilômetros por ano.
As atividades do homem tornam as terras áridas adjacentes o lugar mais ameaçado do mundo em termos de desertificação. Esse processo está alimentando conflitos de terra numa região que já é atingida pela pobreza. Os parques solares e eólicos poderiam acabar com isso – não apenas criando energia, mas fazendo até chover.
Modelos climáticos mostram que, se um quinto de todo o Saara fosse coberto por parques solares e eólicos, haveria um volume de chuva cinco centímetros maior na região do Sahel. Isso pode não parecer muito, mas aumentaria a cobertura vegetal da região em quase 20%. Como isso funciona?
Bem, a superfície preta dos painéis solares aquece o ar, e o faz com que ele suba a altitudes mais elevadas. A rotação das turbinas eólicas tem um efeito semelhante. Este é o Safa Mote.
Ele é um físico que pesquisa como prevenir catástrofes ambientais, econômicas e sociais. Teoricamente, pelo menos, o modelo impulsionaria o crescimento das plantas em grande escala, do leste a oeste da África em toda a região do Sahel. O gigantesco parque energético geraria mais de quatro vezes a energia atualmente consumida por ano no mundo.
Os cientistas acreditam que ele poderia ser usado para contribuir para o desenvolvimento de vários setores da África – desde a infraestrutura até a dessalinização da água do mar. Mas, resumindo, a logística e a política de transporte da energia e os custos estimados em cerca de 20 trilhões de dólares tornam o projeto inviável. E há maneiras mais baratas de recuperar o deserto.
No deserto de Kubuqi, na China, por exemplo. O que começou como um projeto para proteger as rotas de transporte de uma mina de sal virou uma enorme operação de reflorestamento. Isso não é apenas propaganda do governo.
O projeto Kubuqi é visto como um dos planos de restauração mais bem-sucedidos do mundo. Novas técnicas de plantio têm desempenhado um papel decisivo no reflorestamento de milhares de quilômetros quadrados desde 1988. Jatos de água especiais fazem um buraco na areia e, ao mesmo tempo, irrigam as mudas de planta.
No deserto de Kubuqi, os agricultores também começaram a colocar palha ao redor das plantas mais jovens nas dunas para protegê-las do vento e para que tenham uma chance real de se desenvolverem. Assim, enormes áreas desertificadas se tornaram verdes novamente – e algumas delas estão sendo usadas agora para pastagem e agricultura. O alcaçuz e outras ervas adequadas para este clima também são cultivadas na região, e elas têm alta demanda na medicina tradicional chinesa.
E a região não consome muito mais água do que recebe das chuvas anuais. Uma enorme variedade de animais retornou à região: gazelas, ouriços, pardais e gansos selvagens. Tornar o Kubuqi verde está ajudando até Pequim, que fica a 800 quilômetros de distância.
Pois a recuperação do deserto diminuiu significativamente a poluição do ar causada por tempestades de areia na capital chinesa. Reverter a desertificação é possível: podemos recuperar o solo, ciclos de água e vegetação para proteger os meios de subsistência de milhões de pessoas – com técnicas naturais ou de alta tecnologia. Mas também está claro que o custo envolvido no processo sugere que nunca seremos capazes de transformar todas as terras desertificadas do mundo em solo fértil.
Para frear a desertificação e a expansão do deserto, cientistas sabem o que precisa ser feito: conter o aquecimento global, a superexploração do solo e o desmatamento em áreas onde o solo corre risco de degradação. Isso manterá o planeta saudável e capaz de sustentar a humanidade – e a si mesmo. Mas não me entenda mal.
Os desertos são ecossistemas absolutamente fascinantes e únicos – e dignos de proteção. Os problemas começam quando o solo fértil se transforma em poeira e areia. E uma curiosidade: a maior fonte de água subterrânea conhecida fica sob o deserto do Saara.
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