Olá, seja muito bem-vindo a mais um episódio do nosso talk show. Hoje estamos com o professor, que é mestre em Filosofia e doutor em Filosofia pela Universidade de São Paulo, e tem especialização em Teologia. Ele tem ampla experiência no ensino de Filosofia e Teologia, com ênfase em História da Filosofia Medieval, Cristianismo, Ética, Antropologia Filosófica, Filosofia da Religião e Teologia Cristã.
Professor na Academia Atlântico e no Instituto de Teologia Maria Mater Eclesia, filiado ao Ateneu Pontifício Regina Apostolorum, estamos aqui com o professor Joel Gracioso. Seja muito bem-vindo! — Até aqui no nosso programa!
Muito obrigado, querido. — Eu que agradeço essa oportunidade, né, de poder estar aqui conversando, dialogando sobre assuntos e temas que me parecem tão pertinentes, tão importantes, né? Principalmente no momento que nós vivemos hoje na nossa sociedade, às vezes de tanta dúvida, tanta confusão, né?
Tantas pessoas, tanta gente falando tanta coisa, né? E, às vezes, de fato, isso gera muito barulho, muita confusão. Então, para mim, é uma alegria poder compartilhar um pouco das coisas que eu venho estudando já há algum tempo, né, e, enfim, colocar isso à disposição de outros irmãos.
— Com certeza, professor! Este programa é um pouco mais voltado, né, para a saúde da alma, né? E como eu sei que o senhor conhece muito Santo Agostinho, ele gosta muito dele, nós sabemos que ele teve essa busca incessante e incansável pela verdade, certo?
Tem até aquela frase famosa dele, né, tipo: "Nos fizeste para Ti, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousar em Ti. " Então, como que essa busca pela verdade de Santo Agostinho, que ele teve, pode, nessa busca pela transcendência, influenciar na nossa vida, na nossa saúde, digamos assim, nossa saúde mental? Você poderia explicar um pouquinho mais sobre isso?
— Sim, sim. Santo Agostinho é um autor, né, ali do contexto da Patrística, ou seja, nasceu em 354 e morreu em 430. É esse período áureo da Patrística, considerado mestre do Ocidente, então um dos grandes padres da Igreja, principalmente no contexto latino, contexto ocidental.
E essa frase, né, que você fez referência, está justamente ali nas suas "Confissões". No início das "Confissões", no primeiro parágrafo, ele fala justamente sobre isso. A questão da busca da verdade é algo extremamente importante e central no pensamento agustiniano.
Lógico que, para ele, buscar a verdade, no fundo, no fundo, ele vai chegar à conclusão, né, depois de um tempo, evidentemente dentro do processo de conversão que ele passou, de mudança, de amadurecimento. Ele vai ver que a busca pela verdade, no fundo, é a busca por Deus, né? E que, no fundo, essa verdade, ou esse bem, ou esse belo que o ser humano tanto quer, tanto busca, é Deus.
Porque a gente não só foi criado por Deus, mas foi criado para Deus, né? Então, esse "para" aí, do ponto de vista agostiniano, tem um peso muito grande, né? Ou seja, dizer que eu fui feito por Deus, por um lado, daquela história: Deus me chamou à existência, Ele é meu Criador, Ele é a causa eficiente; Ele me chamou à existência.
Mas não é só isso, né? Ou seja, fui feito para Ele. Então, quer dizer que eu só vou encontrar a plenitude da minha identidade, da minha forma, né, e da felicidade tão almejada em Deus.
Então, Ele também é como se fosse a causa final, né? Ou para onde eu estou indo. Então, é aquela história: Ele me criou, fez ali a matéria, me deu a forma humana, mas a plenitude dessa forma Deus não me deu.
Eu preciso percorrer todo um caminho e atingir esse fim último, que é contemplar a Deus, etc. Esse repouso almejando, né, que é o repouso no sentido justamente de encontrar essa paz, essa realização plena, ou seja, a plenitude da minha identidade, da minha forma, etc. Então, por um lado, quando Agostinho fala isso, é lógico que junto com isso vem um problema paralelo, né?
Ou seja, se a felicidade só está em Deus, na verdade, se eu só encontro a plenitude da minha forma, do meu ser, quando eu reencontro isso, então vamos imaginar o contrário. Quer dizer, o contrário é o quê? É o pecado, é a mentira, é a falsidade, né?
E então, o ser humano, quando ele diz "não" para Deus, quando ele se afasta de Deus, quando ele vira de costas para Deus, ele começa um processo, então, de deformação. Então, se Deus. .
. É interessante esse linguajar que Agostinho usa, né? Porque se Deus não só me criou, mas criou para Ele; ao me criar, Ele fez a matéria, me deu uma forma.
Eu só encontro a plenitude dessa forma quando realizo aquilo que ele chama de "converso", né, de retorno, quando eu me volto para Deus e oContemplo. Vou me reaproximando dEle, e aí que eu vou encontrando essa plenitude. Então, a saúde, para ele, é interessante que ele joga também com os termos saúde, né?
Ou seja, ligando saúde com salvação. Ou seja, então, o pecado gera uma deformação. Ou seja, o pecado vai me afastando da minha forma.
Então, Deus me deu ali a forma humana e me chama à plenitude. O pecado, ele deforma. Por quê?
Ele vai me desfigurando, ou seja, ele vai me desumanizando. Então, eu vou me tornando cada vez mais longe da minha forma, vou me desfigurando, vou me deformando, ou seja, cada vez menos parecido com aquilo que Deus sonhou, com aquilo que Deus pensou para mim enquanto ser humano. Portanto, buscar a verdade é imprescindível.
Ou seja, não tem como o ser humano ser feliz se ele não atinge a plenitude do seu ser, da sua forma. E não tem como ele atingir a plenitude do seu ser se ele está longe da verdade. Porque, no fundo, no fundo, essa.
. . A verdade é o próprio Deus, né?
Eh, e aí entra num ponto muito interessante, né? Porque, do ponto de vista agustiniano, ele narra isso nas suas Confissões, né? Ele mostra como que ele fala primeiro das suas misérias, pecados, paixões desordenadas, um monte de coisas que ele viveu e, enfim, um monte de vícios, né?
E dificuldades que ele foi tendo, até que, num determinado momento, ele vai reencontrando Deus na sua vida. Ele leu uma obra de Cícero, que foi um orador romano, um grande pensador e político romano. Agostinho lê essa obra; isso mexe com ele, né?
E ali ele começa um processo de conversão. Por isso, muitos dizem que a conversão de Santo Agostinho é uma conversão mais intelectual, né? Porque, de fato, as primeiras coisas que aconteceram foram no âmbito da mente, da inteligência.
Então, porque ele tinha um modo muito racionalista, materialista de pensar a realidade, de pensar Deus, de encarar vários problemas. E aí ele leu o Hortensio de Cícero, que desperta para essa coisa no meio da filosofia: tem que buscar a sabedoria, tem que buscar a verdade, entendeu? Porque esse livro, Hortensio de Cícero, era como se fosse um elogio, uma exortação à filosofia: "Olha, busque a sabedoria!
Você não pode ficar, sei lá, só escravo das suas paixões, dos seus prazeres, né? Do que é fugaz. " Aquilo mexe com o jovem Agostinho e ele começa a buscar essa verdade, essa sabedoria, né?
Por isso, ele procura na Bíblia, no primeiro momento acha a Bíblia ridícula, não gosta muito do negócio. Depois, passa pelos maniqueus, tem a sua fase meio cética, então ele faz um itinerário, né? Até que, de fato, ele chega à conclusão ou começa a chegar à conclusão que essa verdade, essa sabedoria que ele tanto buscava, estava ali no cristianismo, estava no catolicismo, etc.
E isso ocorre principalmente na cidade de Milão, onde, pelos sermões de Santo Ambrósio e outras pessoas, Agostinho, aos poucos, vai sendo ajudado e consegue, né, aderir, né? E passa a ser um neocatecumenato, essa fé, até chegar a ser padre, bispo, enfim, toda a história que nós sabemos. Então, o elemento central, que também é esse, né?
Eu busco a verdade, mas, na realidade, é porque antes a verdade me encontrou, né? Esse é um ponto central. Tem dois pontos aqui que são muito interessantes: do ponto de vista agustiniano, né, o ser humano tem um desejo natural, né?
A uma algo que pulsa em nós naturalmente. Por que o ser humano é inquieto? Essa é a questão, né?
Porque a frase que ele diz é: "Fizeste-nos para Ti, Senhor, e inquieto está o nosso coração enquanto não repousar em Vós. " Então, há uma inquietude, há uma dimensão da inquietude que não tem nada a ver com o pecado. Ou seja, o meu coração é insatisfeito, ele é inquieto porque eu fui criado não só por Deus, eu fui criado para Deus.
Então, na realidade, Deus me seduz, Deus me atrai na medida em que eu fui feito para Ele; nada consegue satisfazer meu coração. Então, por isso que o ser humano está sempre inquieto, ele sempre está insatisfeito, porque o único que pode satisfazê-lo é aquele que o criou. Porque eu não só fui feito, eu fui feito para, e esse para gera uma necessidade ontológica, existencial, em todos os aspectos.
Então, é lógico que existe a possibilidade do ser humano se negar a fazer esse movimento, sim. Ele tem o desejo, ele sente o impulso, ele sente falta de algo, não sabe do que, né? Ou até aquela história: "Eu quero a verdade, quero o bem, quero a beleza.
" Mas, no fundo, no fundo, é Deus. Mas eu posso chegar e me negar a tudo isso, dizer: "Não, não quero saber disso, não. Eu quero saber do prazer, uhum!
Quero saber da, sei lá, da fama, da honra, da glória," né? E aí é lógico, vê as consequências. Então, no entendimento dele, no pecado original, foi isso: o ser humano, em vez de realizar o movimento natural em direção a Deus, esse para, o que o ser humano fez?
Primeiro, negou realizar o movimento: "Não vou fazer esse movimento. " Uhum. E o que é pior, teve o segundo ponto: ele não só não realizou o movimento como ele foi para baixo, como ele foi em direção às criaturas.
Quer dizer, por isso que aquela ideia do pecado não só como uma aversão a Deus, mas uma conversão às criaturas. Então, ele disse não para Deus, mas, ao mesmo tempo, ele disse sim para as criaturas, sejam as outras criaturas ou ele mesmo, enquanto criatura, né? Se preferiu em vez de Deus.
Então, vê as consequências: o ser humano se afastou de si mesmo, se afastou de Deus. E isso gerou um duplo esquecimento. Ou seja, na medida em que ele se afasta de si, se afasta de Deus, né?
Ou vai se afastando de Deus e de si, ele esquece quem é Deus também, ele esquece quem ele é. Eu não sei mais quem eu sou. Ou seja, eu vivo errante, desorientado, não sei quem é Deus, não sei quem sou eu, e, portanto, também não sei qual é a razão nem da minha existência, nem da existência das outras coisas, né?
E eu vivo nesse contexto. Então, eu vou me tornando escravo de um monte de coisas, eu vou me deformando, né? E tudo isso vai me desfigurando até o momento em que eu existo, mas não sei nem por que existo e nem consigo existir do modo e da maneira como Deus gostaria que eu existisse, enquanto um ser humano que foi feito à imagem e semelhança dele.
Então, isso é muito forte. Ou seja, o ser humano, o problema com o ser humano se afastou, virou de costas para Deus, se afastou de Deus. Se afastou.
De si esqueceu quem é Deus, esqueceu quem é Ele, biva rante, né? Caiu sozinho, mas não consegue voltar sozinho. Uhum, aí entra toda a questão da necessidade da Graça, que Agostinho vai bater muito.
Precisamos de Deus, precisamos da Graça; por isso que ele vai chegar à conclusão: se buscamos a verdade, encontramos a verdade, é porque antes de tudo, a verdade nos encontrou. É a verdade que nos encontra, a verdade que já tinha nos encontrado desde a criação, mas aí nos afastamos. Ela nos.
. . ela.
. . de fato.
Por isso que Agostinho vai dizer nas Confissões, né? Livro 10, né? "Tarde te amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde mais eu te amei.
Eis que estava dentro de mim, mas eu estava do lado de fora; eu me afastei de Ti, mas o Senhor não se afastou de mim. " Então, quer dizer, eu posso ter esperança por causa disso. Deus, Deus não se afasta, né?
Porque, ontologicamente falando, principalmente né, se Deus se afastar de nós, se a gente não tiver nenhuma relação e nenhum vínculo ontológico do nosso ser com o ser d'Ele, a gente volta por nada. Porque Deus não só nos criou; Ele continua nos conservando, sustentando-nos. Senão, a gente deixa de existir.
Então, no fundo, eu não só existo porque Ele quis; eu continuo existindo porque Ele quer, né? Porque Ele me sustenta. Então, há um vínculo que nem o pecado consegue romper, nem o pecado consegue quebrar esse vínculo ontológico, né?
Que é o que muitos vão chamar depois de presença de imensidade ou de presença natural, que autores medievais vão discutir mais. E lógico, uma outra discussão é se esse vínculo ontológico, essa presença natural, ela é suficiente para a pessoa se salvar. Aí é uma outra discussão, né?
Por isso que, depois, muitos vão frisar que também existe a presença da Graça e a presença espiritual, que é outra coisa, entendeu? Então, são dois tipos de presença diferentes, né? Mas Agostinho também vai falar evidentemente dessa questão da Graça, mas ele também deixa bem claro: há uma presença natural.
Deus está presente em tudo que Ele criou, porque, no sentido de que tudo que existe, toda criatura, tem um vínculo com Ele. Então, na realidade, a gente que vira as costas para Ele se afasta d'Ele, mas Ele tá ali, onde sempre esteve, sustentando, vinculado a nós. Ele está presente em nós, nesse sentido criatural, nesse sentido ontológico.
Lógico que o pecado atrapalhou tudo isso daí. Aí eu preciso de uma outra presença, né? Então, quando entra na questão, quando você fala da saúde mental, isso é fundamental, segundo Santo Agostinho.
Por isso que não é por acaso que ele escreve As Confissões, né? É interessante esse termo, porque ele não começa As Confissões falando sobre quem é Deus; não, ele começa falando com Deus. Então, há um aspecto dialógico nas Confissões.
Lógico que para quem não tem fé e acha estranho: "o cara tá falando com quem? ", né? "Não tá falando com outra pessoa?
" Não, para Agostinho, tá! Deus existe, ele crê e ele está falando com Deus. Então, ele começa As Confissões falando com Deus e confessando, ou seja, reconhecendo a grandeza de Deus e reconhecendo a pequenez do ser humano, né?
Ele começa mostrando que há um abismo entre Deus e os homens. Há um abismo, ou seja, fomos criados por Ele para Ele, mas o abismo existe. O pecado entrou no meio, houve um afastamento, houve um esquecimento, houve consequências de tudo isso daí, e o ser humano sozinho não consegue superar esse abismo.
Então, repito, quando a gente entra nesse jogo da saúde, por isso que para ele é uma articulação profunda de saúde e salvação. Por isso que ele vai dizer: "Cristo é o nosso salvador. " E aí, dentro de toda tradição bíblica e patrística, vai aparecer essa ideia também de Jesus como o médico.
Uhum, ele é o médico dos médicos, né? Por quê? Porque ele vem nos curar nas nossas raízes mais profundas.
Ele não veio simplesmente curar de uma gripe ou porque eu tô com a perna quebrada ou porque eu tô, sei lá, com câncer. Ele veio trazer a cura daquilo que é o grande problema do ser humano, que é o pecado, né? Que é a não possibilidade de salvação, ser condenado, enfim, junto com o pecado, é lógico, o mal, o Demônio, a Morte, todas as questões.
Então, a raiz está ali; o grande mal é esse, e é o grande remédio que trouxe foi nesse contexto. Uhum. E aí entra um ponto muito interessante porque o verbo confess, no contexto dele, tem uma tríplice significação: é confessar os próprios pecados, que é o mais comum, né?
Quando a gente fala confissão, todo mundo pensa em confessar pecado; lógico, já tem sentido. Para os antigos, era muito estranho; os romanos ficavam doidos com isso: "Como é que pode? O confissionário é o único tribunal onde a pessoa reconhece, ela confessa que fez a lambança e sai A.
B. vida. Como é que pode isso?
", né? Então, assim, não tem lógica, não tem sentido do ponto de vista, porque se reconheceu: "Não, eu sou culpado mesmo, eu fiz isso", né? Então, tá bom, então ser punido, né?
Uhum, é mais lógico. Não, ali não. Ali tá bom, tá perdoado, já que você reconheceu, tem um bom propósito, etc.
, e aí você sai absolvido. Enfim, pros romanos e até hoje, muita gente não engole muito essa coisa, né? Fica uma coisa meio estranha, pessoal, né?
Do ponto de vista, hum, evidentemente falando. Mas além da confissão dos próprios pecados, tem a confissão de fé, né? Ou seja, assumir a sua fé em Deus, em Cristo, enfim, na questão da Igreja, e tem a confissão de louvor, que é essa coisa de você enaltecer alguém, né?
Fazer. . .
Algum tipo de panegírico, né? E exaltando, reconhecendo, eh eh, todos os benefícios, tudo que aquele ser, aquela pessoa, sei lá, tem de grandioso, né? E, no caso de Deus, mais ainda.
Então, você vê nas confissões, interessante, geralmente, a confissão dos pecados e a confissão de louvor; ou seja, ele começa reconhecendo a grandeza de Deus e falando da péssima humana. Isso vai se reproduzir constantemente nas confissões. Me parece que, junto com isso — porque que eu entrei nesse assunto — uhum, me parece que tem um ponto aqui central, entendeu?
Parece que Santo Agostinho também tá querendo dizer o seguinte: olha, todos nós, em um determinado momento da nossa vida, nós vamos ter que fazer um exercício do ato confessional. O confessar significa que, num determinado momento, você vai ter que se colocar perante a verdade; você vai ter que colocar sua pessoa, a sua vida, perante a verdade e se permitir ver a realidade tal como ela é. Isso é um processo fundamental, e ele passou por isso.
Então, Santo Agostinho é um dos poucos autores onde você vê que, quando ele escreve, toda a produtividade intelectual dele — lógico que tem influência de uma tradição filosófica que ele recebeu, claro, né? Principalmente mais platônica ali, mas via a cultura romana. Ele é um romano.
Então, muitos elementos da cultura romana, latina, estão presentes nele, né? A tradição bíblica, a tradição patrística anterior a ele, que ele conheceu, alguns textos estudou; então, tudo isso influencia. Mas, junto com isso, você vê nitidamente que a experiência vivida, o que ele passou na vida dele, entra muito no pensamento.
Ele leva muito em consideração. Então, eu falo isso muito para as pessoas, né? Ou seja, hoje em dia, graças a Deus, muitas pessoas estão retornando à igreja, né?
Enfim, aderindo a Cristo. Mas é um processo, e chega um momento que, me parece, é um dos momentos mais difíceis, que é quando a gente tem que se colocar perante a verdade, né? Porque, por mais que você fale: "tá bom, Deus é misericórdia".
E, com certeza, é; não tô discutindo isso. Santo Agostinho fala muito da questão da misericórdia de Deus, né? Eh, da providência de Deus, da bondade de Deus.
Mas, ao mesmo tempo, é aquela história: Deus vai te dar a graça para que você, de fato, se coloque, exerça a confissão; você precisa exercitar confissão em todos os sentidos, né? É aquela história: sei lá, eu tenho 40 anos de idade e, na minha vida, tive um monte de pensamentos errados, atitudes erradas, coisas absurdas, atrocidades, não sei mais o quê. A gente sabe que uma das piores coisas da vida é ter que olhar pro passado e ressignificar-se, reconciliar-se com o seu passado, uhum, entendeu?
Isso é difícil, isso é complicado, porque, primeiro, a soberba grita, né? Então, você tem que reconhecer os seus erros, pecados, misérias, vícios, lambanças, sei lá o quê, né? Caraca, realmente fiz coisas aqui que até Deus.
. . Ouvida.
Segunda coisa: reconhecer que, mesmo assim, o amor de Deus é maior que tudo isso, né? Então, esse processo não é tão simples, ele não é tão simples, mas é necessário, é necessário. Porque acho que é o único caminho onde você vai conseguir ter uma estrutura e uma maturidade psicológica, psicoafetiva, né?
Aonde você não fica com o seu passado sempre te assombrando, sempre te jogando, entendeu? E, então, acho que nesse ponto é fundamental. Incrível, incrível!
E, mediante tudo isso que o senhor falou, então poderemos dizer que, para conseguirmos, em certo sentido, a saúde, né? Teria que ter uma ordenação dos amores em certo sentido, porque tirar essa conversão a criaturas e nos converter para Deus sim, isso é fundamental. Por quê?
Quando perguntam para Santo Agostinho na Cidade de Deus, por exemplo: "mas o que é a virtude? ", é interessante a definição criada: a virtude é a ordem do amor, uhum, né? Ordem do amor, ou seja, não tem como eu ser uma pessoa virtuosa se eu não amo ordenadamente.
E o que é amar ordenadamente? É você amar cada coisa de acordo com o seu grau de perfeição. Por isso que é óbvio: eu tenho que amar Deus acima de tudo, não existe nada mais perfeito que Ele.
E como poderemos definir o amar propriamente? Então, ele usa vários termos, né? Ou seja, para Agostinho, essa questão do amor, que em português perde um pouco, né?
Uhum. Mas, quando ele fala da questão do amor, existem tipos de amor, né? E, falar do ato de amar ou de amor, ele tem uma expressão que ele usa que eu acho que pode nos ajudar a entender isso.
Se eu não me engano, acho que é no livro 12 das Confissões que ele diz assim: "o meu amor é o meu peso". Então, veja que ele parte de uma visão meio cosmológica, meio física, né? Ide que, no mundo, cada coisa tem o seu peso.
E esse peso é o que move e direciona a coisa para algum objeto, para algum lugar, né? Para alguma direção. Se é assim, se cada coisa tem o seu peso, olha, no caso do ser humano, qual é o meu peso?
É o amor! Então, o meu amor é o meu peso, quer dizer o seguinte: o amor é aquilo que direciona a alma. O amor é aquilo que move e nos direciona ou para o objeto X ou para o objeto Y, ou para buscar, sei lá, o eterno, ou para buscar o temporal e o fugidio, uhum.
Então, veja que ele não coloca o amor como sentimento, ele não coloca a questão de amar simplesmente como uma mera emoção, uhum, né? Não que ele não discuta a questão das paixões, ele também discute isso, mas ele vai além. Ou seja, eh eh, e a própria questão da vontade, às vezes também, ele tem as suas.
. . Peculiaridades, né?
Eh, eh, não é tanta a coisa. Ah, é uma faculdade da alma! Não, às vezes ele coloca que a vontade é alma em movimento ou aquilo que move a alma.
Mas o que é importante aqui, seja na questão da alma ou da vontade, nessa discussão, na peculiaridade como ele entende isso, é a questão do amor. É isso que é fundamental. Porque, dependendo do amor que está na tua alma, você vai ser uma pessoa virtuosa ou não.
Porque, quando ele fala "a virtude é a ordem do amor", ele está falando particularmente de um tipo de amor que é a Cáritas, né? Porque eu tenho também a cupiditas, a cupidez, a cobiça, que é um amor desordenado. Uhum.
Então, e porque o que acontece, no entendimento dele, tem o "ut" e o "frui". O "ut" é um tipo de amor também, o "frui" também, só que no "ut" o que acontece é o uso. Eu uso algo como meio para me ajudar, evidentemente, a atingir aquilo que é mais elevado, mais perfeito.
Uhum. E o "frui" é quando eu não uso como meio, mas é como eu. .
. é quando eu busco a fruição e o gozo na própria coisa. É como se ela fosse meio e fim ao mesmo tempo.
Entendeu? Por isso que ele vai dizer: não, então, no primeiro momento, o único que é digno de fruição, ou seja, que é digno de ser amado por si mesmo, é Deus. É Deus, né?
O restante é útil, mas não é útil. É lógico que, para nós, a palavra "uso" tem um sentido meio pejorativo, né? É uso e joga fora, essas coisas.
Não é isso. Então, lógico que aí também ele vai mostrar em que sentido a gente ama a Deus por ele mesmo. Mas como isso tá vinculado, né?
Que Jesus dizia: amar a Deus, amar o próximo, também vai entrar nessa discussão. Mas o grande problema do ser humano, qual é? Que tá a origem do amor desordenado?
É que a gente tenta fruir, gozar daquilo que é meio e tenta usar como meio aquilo que deveria ser fruído. Em outras palavras, em vez de eu buscar, em vez de eu fluir em Deus e usar a realidade criada para fruir de Deus, eu tento fazer o contrário. Eu tento usar a Deus para poder gozar nas realidades criadas.
Ele diz: é aí que tá a origem do pecado original. Entendeu? Essa que é a increnca.
Ou seja, o ser humano inverteu essas coisas, e isso gera um amor desordenado. E o amor presente na alma, ele te move, ele te direciona. Você entendeu?
Uhum. E aí aquela história: em vez de eu buscar o eterno, por exemplo, o perene, aquilo que é imutável, quero saber muito disso, eu quero saber do mutável, do temporal, daquilo que me dá prazer, daquilo que me dá fama, glória, algum tipo de satisfação: satisfazer os desejos. Enfim, essas coisas.
Então, para ele, isso é muito importante. Ou seja, não tem como você falar nem de saúde nem de salvação se você não tem uma vida virtuosa. As virtudes são importantes.
Lógico que ele vai colocar que existe toda uma dimensão das virtudes que a gente só consegue viver com a ajuda de Deus, com a graça de Deus, sem a graça, né? Agostinho vai bater muito nisso, né? Então, talvez ele, mais do que outros autores, vai frisar que eu preciso da graça para viver determinadas dimensões da virtude.
Uhum, né? Ou seja, tem muita coisa que não vai rolar se eu não tiver a graça, não corresponder à natureza decaída. Então, no fundo, quer dizer, essa coisa da virtude, para Poliana, é ordem do amor.
Por isso que é a famosa frase dele que o pessoal deturpa, né? Aham. Ama, faz o que queres.
Quando ele fala "ama, faz o que queres", tem que ver qual o amor que ele tá falando, né? Uhum. Ele não tá falando de qual que é amor e nem do que a gente entende por amor porque ele tá dizendo o seguinte: ame.
Se você tiver um amor ordenado, que é a Cáritas, que te leva a amar a Deus sobre todas as coisas e o restante de tudo em Deus, então eu tenho que amar a Deus e amar tudo em Deus, né? Porque aí eu vou amar cada coisa de acordo com seu grau de perfeição. Porque aí eu vou ter uma alma ordenada.
Por quê? Porque tá tendo um amor ordenado, virtuoso, que tá presente ali, um amor justo, né? E, portanto, esse é o caminho da reordenação.
Ou seja, mas parece que o ser humano, para sair de um amor desordenado para um amor ordenado, para realmente conseguir ter uma vida virtuosa, uma alma virtuosa, presume esse amor ordenado. Mas sozinho, ele não consegue fazer essa mudança; tem que ser com a graça de Deus. A reordenação dessa alma, dessa vontade, desse amor, pressupõe o toque da graça, pressupõe a ação da graça na alma, na vontade, na vida da pessoa, etc.
Muito bom! Impressionante! Então, bem, vamos terminar por aqui, né?
Esse episódio de talk show. Mas já ative as notificações porque ainda vamos gravar outros episódios. Inclusive, no próximo, vamos comentar um pouco sobre as virtudes, sobre essa ordenação do amor.
Então, já compartilha esse vídeo, comenta, deixa seu like, siga o professor Joel. Nos vemos no próximo episódio!