Novos casos da varíola dos macacos estão surgindo pelo mundo e todo mundo se pergunta, afinal, que doença é essa? Eu sou Giulia Granchi, da BBC News Brasil, em São Paulo, e respondo nesse vídeo a quatro perguntas. E, antes de mais nada, resumo a avaliação dos cientistas até agora.
A Organização Mundial da Saúde se diz confiante de que o surto atual vai ser contido, porque a varíola dos macacos não tem o poder de causar uma pandemia como a covid. Mas sim estamos vendo um comportamento atípico de uma doença que em geral é leve, mas pode se tornar mais grave. E isso, claro, tem de ser levado a sério.
Vamos entender melhor. Começo com uma básica. Que vírus é esse?
Ele pertence à família dos poxvírus e tem esse nome porque foi identificado pela primeira vez em macacos, em 1958 - mas provavelmente seu hospedeiro original é uma espécie de roedor. Ou seja, o nome varíola dos macacos não é muito preciso. É importante destacar que a varíola dos macacos é parente da varíola comum, uma doença devastadora que foi erradicada pela vacinação em 1980.
Mas a varíola dos macacos tende a ser bem menos transmissível entre humanos, causa sintomas mais leves e é menos mortal que a sua terrível “prima”. . E quais são os sintomas da varíola dos macacos?
Geralmente os sintomas começam com uma mistura de febre, dores de cabeça, dores musculares, dores nas costas, calafrios, exaustão e linfonodos inchados. Linfonodos são os gânglios linfáticos, que costumam inchar no pescoço, nas axilas e virilha quando temos uma infecção no corpo. Passada a febre, pode surgir uma espécie de coceira dolorida, que causa lesões na pele um a três dias depois.
Na maioria das vezes, isso começa no rosto e depois se espalhando para outras partes do corpo, incluindo os órgãos genitais. Essas feridas na pele passam por diferentes estágios, e podem ser confundidas com catapora ou até sífilis. No estágio final, elas formam uma crosta, que depois cai.
A doença dura de duas a quatro semanas e os sintomas podem aparecer de cinco a 21 dias após a infecção. Em geral, o corpo se cura por conta própria. Terceira pergunta.
Como a varíola dos macacos é transmitida? De várias maneiras, eu listo algumas. - pelo contato com lesões na pele, bolhas ou casquinhas infectadas - Pela boca ou sistema respiratório por secreções infectadas, tosse ou espirro - Pelo contato com roupas, lençóis e toalhas usadas pessoas com o virus A OMS ressalta que o vírus não é tratado como uma doença sexualmente transmissível, mas pode ser passado durante a relação sexual pela proximidade entre as pessoas envolvidas - pelo contato pele a pele.
Mas o fato de novos casos estarem surgindo em áreas incomuns do mundo faz os cientistas se questionarem se a varíola dos macacos pode estar encontrando novas formas de se propagar - e as relações sexuais são um dos pontos investigados. Muitos dos casos recentes foram detectados em homens que têm relações sexuais com outros homens. O que ainda não se sabe é se isso revelaria uma nova forma de contágio, por via sexual, ou se simplesmente seria resultado do contágio pelo contato mais próximo e prolongado.
Andy Seale, conselheiro da OMS, diz que pode haver uma explicação mais simples: de que o grupo demográfico é mais cauteloso com doenças que possam se assemelhar às sexualmente transmissíveis e por isso é mais proativo em reportar os sintomas. Qual o risco da doença? A varíola dos macacos "geralmente é uma doença leve e autolimitada, e a maioria das pessoas se recupera em algumas semanas", informa a agência de saúde do Reino Unido.
Para Colin Brown, diretor de infecções clínicas e emergentes da agência, “é importante enfatizar que a varíola dos macacos não se espalha facilmente entre as pessoas e o risco geral para o público em geral é muito baixo". A médica , da OMS, afirmou que a situação atual é “controlável” por enquanto. Há duas cepas principais da varíola dos macacos: a cepa do Congo, que é a mais grave — com até 10% de mortalidade — e a cepa da África Ocidental, que tem uma taxa de mortalidade em cerca de 1% dos casos.
E é essa última que foi identificada no Reino Unido. Ainda não está claro qual cepa foi encontrada em outros países. De modo geral, a OMS estima que a doença leve à morte em 3% a 6% dos casos, ou seja, o risco pode ser relativamente alto, mas o baixo contágio tende a limitar as mortes.
O maior risco de casos graves é entre crianças pequenas e pessoas com sistema imunológico comprometido. A varíola dos macacos durante a gravidez também pode levar a complicações como varíola congênita ou natimorto. Por isso, é com esses públicos que as autoridades de saúde estão mais preocupadas.
Existe tratamento? Qual é a melhor forma de se prevenir? Hoje, não há tratamento específico para a varíola dos macacos e, como eu falei, a doença geralmente desaparece por conta própria.
Mas medicamentos como antivirais podem ajudar. Alguns países já estão determinando ou sugerindo quarentena de 21 dias para pessoas infectadas, para evitar que elas espalhem o vírus. A melhor forma de prevenção é com a vacina da varíola comum, que tem uma alta eficácia, de 85%, na prevenção da varíola dos macacos.
O problema é que, como a varíola comum foi declarada erradicada há mais de 40 anos, não há mais vacinação em massa. A OMS disse que por enquanto não existe a necessidade de imunizar a população em geral - possivelmente só se vai recomendar a vacina da varíola comum para alguns grupos sob risco. E já existe uma vacina específica para a varíola dos macacos aprovada nos Estados Unidos, Canadá e União Europeia, ou seja, a situação é completamente diferente da enfrentada com o coronavírus causador da covid.
Até o momento, não há indícios de que o vírus original da varíola dos macacos tenha passado por mutações. Esse vírus, aliás, não se modifica tão facilmente quanto o novo coronavírus, por exemplo. Mas por que está acontecendo um surto agora?
Os cientistas ainda não conseguem explicar esse contágio em países atípicos. Vários dos pacientes infectados no Reino Unido, onde os primeiros casos europeus foram identificados, não têm conexão conhecida entre si. Isso claro gera preocupação de que o contágio tenha ocorrido por transmissão comunitária, ou seja, em um novo território, sem relação direta com uma viagem à região de origem do vírus.
Apenas o primeiro caso de varíola dos macacos no Reino Unido havia viajado recentemente para a Nigéria. É possível que o aumento das viagens internacionais esteja ajudando o vírus a circular, ou que tenha acontecido um grande evento superespalhador - em que pessoas desconhecidas entre si tenham se contaminado em um mesmo local. Isso tudo está sendo investigado.
E é possível que o vírus tenha ganhado uma oportunidade de se espalhar entre populações mais jovens que nunca foram vacinadas contra varíola comum. E pode ser também que a varíola dos macacos esteja encontrando novas formas de se propagar. Ciência é assim, há respostas, mas também muitas perguntas em aberto que vão ser respondidas com mais pesquisas.
Eu fico por aqui. A gente vai continuar acompanhando as informações sobre essa doença. Até a próxima!