Irmãos, prosseguimos a nossa leitura da primeira carta de São João. E mais uma vez, São João reafirma quanto havia dito anteriormente e acrescenta algo que amplia um pouco mais o seu ensino: caríssimos, quanto a nós, amamos a Deus porque Ele nos amou primeiro. Se alguém disser: "Ama a Deus", mas, entretanto, odeia o seu irmão, é mentiroso.
Pois quem não ama o seu irmão, a quem vê, não poderá amar a Deus, a quem não vê. E este é o mandamento que dele recebemos: aquele que ama a Deus, ame também o seu irmão. Todo aquele que crê que Jesus é o Cristo nasceu de Deus.
Essa palavra, no grego, tem muito mais a ver com ser gestado por Deus. E há uma diferença, porque o nascimento é instantâneo, a gestação não; a gestação é um processo. Então, todo aquele que crê que Jesus é o Cristo foi gestado por Deus.
E quem ama aquele que gerou alguém, amará também aquele que dele nasceu. Ele está repetindo as mesmas ideias: o amor, a caridade, como sinal de que nós cremos que Jesus é o Filho de Deus. A fé não é uma confiança atemática, uma confiança genérica; a fé é adesão a um fato real, a uma verdade real, que é que Deus se encarnou em Cristo para se fazer vítima de expiação pelos nossos pecados.
Quando nós levamos isso a sério, a graça produz em nós uma transformação. Nós nascemos de novo, nós somos gestados de novo, e o resultado disso é que nós amamos. Mergulhados no amor de Deus, nós transbordamos o amor de Deus para todas as pessoas.
Podemos saber que amamos os filhos de Deus quando amamos a Deus e guardamos os seus mandamentos. Nós já vimos que em 1 João 3:23 ele explica qual é o seu mandamento: é crer em Cristo, né? Como está aqui, nós lemos.
Vale a pena citar textualmente: "Este é o seu mandamento: que creiamos no nome do seu Filho, Jesus Cristo, e nos amemos uns aos outros, de acordo com o mandamento que ele nos deu". Esse é o seu mandamento. Então, ele diz que se nós guardamos o mandamento da fé e da caridade, se nós subimos pela fé e descemos pela caridade e amamos, mas não com o nosso amor natural, sim com um amor infuso por Deus em nós, isso significa que nós amamos, que nós temos o Ágape de Deus, que nós nascemos de novo.
Pois isto é amar a Deus: guardar os seus mandamentos, quer dizer, amar a Deus não é também uma coisa genérica. Se você perguntar na rua: "Você ama a Deus? ", todo mundo vai dizer que ama.
Mas é um amor retórico; é como alguém dizer assim: "Eu amo todos os moradores do Turcomenistão". Você pergunta: "Você já foi alguma vez lá? Não conhece alguém de lá?
" Nenhum. Bom, assim é fácil. Ora, o amor, a divina caridade, o Ágape do Novo Testamento, é um amor real.
Eu acho interessante que algumas pessoas se confessam e dizem assim: começa a confissão e dizem: "Não amei a Deus sobre todas as coisas". Isso não significa quase nada. Por quê?
Bom, quem ama a Deus, mesmo queima de amor por Ele. Isso é algo tão genérico que não significa praticamente nada, porque é o estado habitual em que a maior parte das pessoas vive, ou seja, tem um relacionamento distante, frio com Deus. Mas São João aqui diz algo que, aqui sim, é uma novidade: ele diz que "isto é amar a Deus: observar os seus mandamentos".
E os seus mandamentos, o mandamento da vida espiritual, não são pesados. O que é uma coisa que aqui a coisa começa a complicar. Uma das coisas que eu mais escuto é que "nossa, é tão pesado cumprir os 10 mandamentos".
É tão pesado cumprir as obrigações de um cristão. É pesado, "nossa, é difícil". Ele está dizendo que seus mandamentos, referindo-se aos dois mandamentos da vida espiritual, a fé e a caridade, não são pesados.
Pois todo aquele que foi gestado por Deus conquistou o mundo. Mais uma vez, aqui nas traduções, mesmo na Vulgata de São Jerônimo, traduz por "venceu", mas o texto grego dá mais a ideia de um processo. Mais uma vez, vencer é o ato de um instante; conquistar não é.
Conquistar é um processo: todo aquele que foi gestado por Deus conquistou o cosmos, o mundo. E esta é a conquista: que conquistou o cosmos, a nossa fé. O que São João está querendo dizer aqui?
Ele está querendo dizer o seguinte: quando a vida espiritual é verdadeira e não apenas aquela exterioridade sem força, sem o fogo do amor, sem a luz da sabedoria eterna, quando a vida espiritual é fraquinha, você não é de nada, você não consegue nada. A vida espiritual, quando não é levada a sério e quando nós não entendemos o Evangelho, ele penetrou em nós, ele nos atropelou e nós somos transformados pela cruz de Cristo. Então, nós aprendemos a nos jogar em Cristo com todo nosso ser.
Quando a vida espiritual não é um mergulho em Deus, efetivamente, para nós, é tudo difícil. É difícil rezar, é difícil a missa, é difícil fazer uma leitura espiritual, é difícil guardar os mandamentos; é tudo difícil, porque eu estou fazendo com a minha força humana natural. Estou usando a minha carne fraca para uma batalha que é muito mais forte.
Ao contrário, quando eu mergulho na fé e na caridade, a força da graça começa a agir em mim, e ela age, vai crescendo, ela vai poderosamente me transformando, me habilitando a agir conforme a medida da fé. E a graça então vai produzindo um homem novo, vai gestando em mim uma nova identidade, uma identidade voltada para as coisas do Espírito, uma identidade na qual eu sou levado pelo próprio Espírito Santo. Então, além.
. . De nada.
Ser pesado, a gente vence o Cosmos, a gente vence o mundo; essa é a força da fé! Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé. Mas Jesus.
. . Jesus!
São João não está falando aqui em termos de uma ortodoxia, digamos, confessada, né? A essa vitória que vem deste mundo, a nossa fé. Então, vou rezar o credo, eu vou fazer o curso de catecismo, eu vou saber a fé dogmática perfeitamente.
Até vou gritar triunfalmente, como se fosse um soldado da fé. Não é disso que ele está falando. Fé aqui é ser gerado de novo mesmo, é ter uma nova natureza, mesmo, é ser possuído por Deus intensamente.
Quando aparece alguém assim no mundo, ele desorganiza o mundo. Desorganiza, eu digo, o consenso do mal. Quando a gente pensa, por exemplo, num São Francisco de Assis, com uma vida espiritual tão alta, ele abalou toda uma civilização, ou um São Bento, ou um Padre Pio, ou um São João Maria Vianei, que, enquanto sacerdote, abalou a França toda e boa parte da Europa; e assim por diante.
Esta é a vitória que vence o mundo: a fé elevada à piedade, à vida espiritual. Por que é importante nós sabermos isso? Tem muita gente querendo lutar, mas é assim: você tem de um lado o inferno e de outro lado um monte de crianças.
Não preciso dizer que não vai dar certo; vai causar apenas barulho. Muita gente se matando, suicídio espiritual à torto à direito, suicídio ministerial, muita vaidade, muita intriga humana, porque não tem vida espiritual verdadeira. É tudo fajuto, é falso, é apenas casca.
Por dentro, o que tem é o que diz Jesus no evangelho: “Por fora sois túmulos caiados, mas por dentro rapina, podridão. ” Não foi nascido de novo, é morto. E é impressionante que, quando São João diz que esta é a vitória que vence o mundo, nós não podemos nos esquecer do que ele diz no capítulo 2: "Filhinhos, não ameis o mundo nem as coisas que há no mundo, porque tudo o que há no mundo é concupiscência da carne, concupiscência dos olhos, soberba da vida.
" O que significa vencer o mundo? Vencer o mundo não significa que eu tenho um exército poderoso e que eu vou massacrar todos os opositores e vou colocar uma bandeirinha em cima: "Venci! " Não tem nada a ver com o evangelho.
"O meu reino não é deste mundo," disse Jesus. Vencer o mundo significa, para começar, não ser dominado pela tríplice concupiscência: a concupiscência dos olhos, ou seja, o que eu vejo, o que eu cobiço. A avareza tem que ser subjugada, vencida.
Mas o que está mais cheio de gente no mundo são pessoas querendo lucrar, pessoas querendo vender, pessoas querendo enfiar no próprio bolso. Escuta, mas onde é que está a generosidade da fé em que eu entrego, em que eu sou generoso? Eu sou desapegado, eu abro mão, eu não fico calculando.
Vencer o mundo é vencer a concupiscência da carne. Mas a maior parte das pessoas não querem ultrapassar o limite da sua comodidade; estão apoltronadas, cercando-se de conforto e, cada vez mais, enchendo-se de prazeres e satisfações, garantindo que aquilo seja cada vez mais aconchegante. Portanto, aquilo que tira o meu prazer, aquilo que tira o meu conforto, aquilo que tira a minha comodidade já não serve mais.
Vencer a concupiscência da carne significa não voltar atrás nem por um segundo, avançar por Cristo, mesmo que isso exija de nós as maiores incomodidades. Mas, sobretudo, a soberba da vida! Como é difícil vencer a vaidade!
Aquele que é vaidoso, ele acha que ele é a solução. "Eu sou a solução, então eu vou resolver, porque eu tenho as melhores intenções do mundo e eu não estou equivocado. " E aí, justamente, essa pessoa cega está fazendo o trabalho do diabo.
Por quê? O que diz o evangelho sobre Jesus? Ele não quer cana rachada, nem apaga o pavio que ainda fumega.
O que significa isso? A cana está rachada, a tentação do homem vaidoso. Qual é?
Ah, quebra logo assim; nós vamos parar com as máscaras, com as falsidades! Vê se a coisa acontece! Ele é um revolucionário, ele quer fazer tudo se mover, ver segundo a sua vontade.
Tem uma chaminha fumegando, mas ele não quer. Ele quer aquele fogo cheio de um falso zelo, então ele vai lá e apaga a chama pequena, apaga a chama da fé. Este é o trabalho do diabo.
Mas vejam como uma pessoa pode dizer: "Olha, não, essa lampadinha fraca aí já não tem mais nada a ver. Deixa isso para lá. Essa cana tá rachada, vamos logo rachar, vamos logo acabar com isso, vamos logo parar, porque o importante é ser fiel, é mostrar que eu estou certo.
Nós estamos no caminho da verdade, todo mundo que não está conosco está errado, todo mundo! " Como se todo mundo tivesse o mesmo chamado, a mesma vocação. "E eu vou vencer o mundo!
" Não vai. O mundo já venceu você! O mundo já venceu você por causa da sua vaidade, o mundo já venceu você por causa do seu fraco pelo prazer, porque, no fundo, você está correndo atrás de comodidade, um caminho mais fácil.
O mundo já venceu você porque você vai ser um escravo de quem paga mais. Esta é a vitória que vence o mundo: a nossa fé, a fé que opera pela caridade. Como diz São Paulo, essa fé é, como diz Jesus no evangelho, pequena como um grão de mostarda, mas ela se torna maior de todas as hortaliças.
Essa fé pode ser pequena como um grão de mostarda, mas, quando eu digo para o monte "Vai daqui para colar! ", ele se move. Eu sou capaz de transportar montanhas pela palavra da fé.
Essa fé, como diz o final do capítulo 11 da carta aos Hebreus. . .
É a coisa mais extraordinária que existe. Por essa fé, eu tapo a boca dos leões, eu passo pelo fogo e não sou queimado. Eu enfrento o mundo inteiro, sou martirizado e não volto atrás, porque é uma fé que age pela medida da caridade.
É uma fé verdadeira, é uma fé cheia de amor, é a fé em Cristo mesmo. Porque é muito fácil, né? As pessoas hoje em dia são muito assim: "Olha, vou te aplaudir, vai lá!
O Fulano tá lá se destruindo, se queimando, e tá todo mundo aplaudindo porque ele é o bode expiatório. " Como é fácil isso! As pessoas dizem muitas vezes para mim: "Nossa, Padre, o senhor, e você, você tá só na torcida, é isso?
" Ah, como é fácil, né? Você está sentado no Coliseu, enquanto tem um cristão sendo devorado pelos leões. É tão fácil isso!
A vitória que vence o mundo enfrenta os leões; a vitória que vence o mundo, a vitória da fé, da força da fé, é uma vitória que começa pela vitória sobre mim mesmo. Que o Senhor nos leve, queridos, a experimentar isso em nossa vida: a experimentar a força da fé unida à caridade. A experimentar, de verdade, a mergulhar de verdade, a ter uma vida espiritual séria, não esse devocionismo exterior, né?
Bolinha, bolinha, bolinha, bolão. Ave Maria! Aquela vida espiritual só do lado de fora: eu vou lá à missa e tal, e respondo e comungo, mas de maneira fria, confissão protocolar, sem arrependimento verdadeiro.
Que haja uma espiritualidade! Porque, quando há uma espiritualidade real, feita de uma fé e de uma caridade ardente que queima, incandescente, aí nós podemos começar a falar de que, de fato, há alguém que começou a vencer o mundo. Que o Senhor nos faça experimentar a força da vida espiritual.
Senão, nós ficaremos a vida inteira arrastando os pés e dizendo: "Ai, é tão difícil rezar o terço todo dia! Ai, é tão difícil ler a Bíblia! Ai, é tão difícil jejuar!
Ai, é tão difícil fazer uma vigília! É tão difícil, é tudo tão difícil! " Não, não é que é difícil; é você que é um fracote, e é pelo único motivo de que a sua fé ainda não subiu necessariamente para a vida espiritual.
Você crê da boca para fora.