Vários prazos já foram dados para erradicar os lixões no Brasil, mas o problema continua. Ainda existem cerca de três mil deles no país. E não é uma questão só brasileira.
Olha o que aconteceu na Índia. Um enorme incêndio começou no aterro sanitário de Ghazipur, em Nova Déli, em abril deste ano. O local deveria ter encerrado as atividades em 2002, mas as autoridades continuaram enviando 700 caminhões de lixo por dia para lá.
Os detritos formaram uma montanha quase tão alta quanto o Taj Mahal, aquele monumento da Índia. Quando o lixo se decompõe, ele libera metano, que é um gás altamente inflamável. É por isso que os lixões podem pegar fogo facilmente.
Mas o metano também é um gás de efeito estufa superpotente que acelera o aquecimento do planeta. O problema do lixo é mundial, mas já existem várias soluções para lidar com isso. Neste vídeo, eu vou te mostrar algumas delas.
Restos de comida, garrafas plásticas, caixas de pizza. . .
Pensa em quantas coisas você joga fora todos os dias. Dependendo de onde você mora e do seu estilo de vida, isso pode variar muito. O indiano médio joga fora 500 gramas de lixo por dia.
O brasileiro gera o dobro, cerca de um quilo por dia. Para o americano, são 2 quilos e duzentos gramas. Aliás, os Estados Unidos são os campeões mundiais em geração de lixo per capita.
Essa pilha de resíduos cresce junto com as cidades e o aumento do padrão de vida. Isso foi parte do problema em Ghazipur. Em 1984, quando o aterro sanitário foi inaugurado, a população de Nova Déli não chegava a 7 milhões de habitantes, mas agora são cerca de 34 milhões.
As autoridades não estavam preparadas para isso. E no planeta, neste momento, somos 8 bilhões de pessoas produzindo 2,1 bilhões de toneladas de lixo todos os anos. De acordo com este estudo da ONU, 38% do lixo vai parar onde não deveria.
É um número bem parecido com o do Brasil, onde 38,9% dos resíduos vão parar nos 3 mil lixões dos quais a gente falou. Mas aqui é importante fazer uma distinção entre lixões e aterros sanitários. Quando chove, a água escorre através do lixo e forma o chorume – um coquetel tóxico de muitos produtos químicos pesados e bactérias, entre outras coisas.
E é debaixo dessa montanha de lixo, onde não há oxigênio, que as bactérias estão decompondo o lixo orgânico e produzindo metano, um dos piores gases de efeito estufa. Para vocês terem ideia, no curto prazo, ele é 80 vezes mais potente para aquecer o planeta do que o dióxido de carbono. Do outro lado, temos os aterros sanitários, que têm mais controles ambientais e tentam mitigar alguns desses problemas.
Eles começaram a evoluir no século 20, especialmente na segunda metade – também porque o material usado nos produtos que a gente consome se tornou muito mais tóxico para o meio ambiente. Por isso, os operadores de aterros sanitários têm que proteger o solo. Para isso, eles começam com um grande buraco no solo revestido com camadas gigantes impermeáveis de material sintético.
É como uma enorme piscina vazia com um grande lençol de plástico dentro. No fundo, há um sistema de drenagem para remover o chorume gerado. Sensores também podem ser colocados na camada inferior para detectar possíveis vazamentos.
Depois que o chorume é tratado, ele é transformado em água reutilizável. Atualmente, um aterro sanitário com tecnologia de ponta também pode capturar a maior parte do metano emitido, fazendo uma espécie de "lasanha de lixo", que impede que a maior parte do gás vá para a atmosfera. À medida que o lixo é despejado, tratores pesados compactam o resíduo e depois o cobrem com uma camada impermeável.
E repetem isso várias e várias vezes. Em seguida, uma espécie de sistema de bombas suga a maior parte dos gases gerados, inclusive o metano. Nesse ponto, há duas opções: o metano capturado pode ser queimado por meio de um processo chamado flare, que o transforma de um gás de efeito estufa super nocivo em um gás menos nocivo, o CO2.
Mas isso é um grande desperdício! Aqui vem a segunda opção: o metano pode gerar calor, eletricidade ou gás natural renovável e abastecer veículos, por exemplo. Essa técnica promete reduzir as emissões de metano em 60 a 90%.
Muitos aterros sanitários dos EUA fazem isso, e juntos eles produzem energia equivalente para abastecer 1 milhão de casas. Atualmente, os Estados Unidos têm mais de 2. 600 aterros sanitários.
Metade do lixo produzido pelos americanos ainda vai parar em um deles. E é lá que fica o maior aterro sanitário do mundo. De acordo com o Guinness World Records, é o APEX, que fica nos arredores de Las Vegas.
Ele é grande o suficiente para receber resíduos pelos próximos 250 anos. Mas mesmo os aterros sanitários superavançados têm grandes problemas. Usando câmeras especiais de infravermelho em aviões e satélites, pesquisadores detectaram vazamentos substanciais de metano.
Eles descobriram que os aterros sanitários americanos emitem 40% mais gases de efeito estufa do que é relatado oficialmente. Mas nem tudo são más notícias: esses dados podem ajudar os responsáveis a detectar vazamentos e reduzir as emissões imediatamente. Mas há caminhos mais simples.
O IPCC recomenda uma técnica muito mais simples e direta para reduzir as emissões de metano dos aterros sanitários: reduzir a quantidade de resíduos orgânicos neles. Porque, como a gente viu, o metano vem exatamente da decomposição da matéria orgânica em locais sem oxigênio, nos subterrâneos dos lixões. Em países como a Índia, onde cerca de 50% do lixo é orgânico, evitá-lo em aterros sanitários pode ser realmente eficaz.
Vamos pegar a cidade de Miçor como exemplo. Com uma população de mais de 1 milhão de habitantes, a cidade produz entre 400 e 500 toneladas de lixo diariamente. As autoridades projetaram um sistema descentralizado, no qual o lixo é coletado, segregado e compostado dentro dos bairros.
Para isso, o coletor vai de porta em porta. Se os moradores não separarem o lixo, eles são multados. As autoridades dizem que só 5% do lixo vai para o aterro sanitário.
A meta deles é o desperdício zero. O composto produzido é vendido para os agricultores locais e para o departamento de horticultura e resolve outro grande problema do país. Quase um terço das terras agrícolas da Índia sofre com a degradação do solo, em parte por conta do uso intenso de fertilizantes químicos.
Agora, o composto orgânico está sendo usado nas fazendas para restaurar essa terra. Esse é um ótimo exemplo de como subir na escada da "hierarquia de resíduos". Você já ouviu falar nela?
Na base da hierarquia está a pior maneira possível de se livrar do lixo: a queima a céu aberto ou os lixões. Depois vem o descarte sem recuperação de energia, como alguns tipos de aterro sanitário ou a incineração. Em seguida, vem a transformação de resíduos em energia, que é um termo genérico para alguns métodos diferentes, como aqueles aterros sanitários dos EUA que geram eletricidade a partir do metano.
No degrau de cima fica a reciclagem, e é aqui que estão os exemplos de compostagem. Melhor ainda é reutilizar as coisas e nem deixar que elas cheguem à lata de lixo. E no topo está a prevenção e a redução, que pode ser atingida pelo consumo consciente.
Essa parte depende muito dos produtores de resíduos – tanto as empresas quanto os consumidores individuais, como eu e você. Então, quando a gente fala em gestão de resíduos, essa pirâmide costuma ser a referência, e fechar lixões significa subir degraus nela. Nesse sentido, um caso que ficou famoso em todo o mundo foi o do Rio de Janeiro, que já teve o maior lixão da América Latina, o Jardim Gramacho.
O local recebeu mais de 80 milhões de toneladas de lixo em 30 anos. O manguezal ao redor foi devastado pelo chorume. Então, em 1997, foi construída uma barreira para coletar esse chorume.
O chorume é tratado e depois despejado na Baía de Guanabara. Então, isso me deu condições de recuperar os manguezais. Nesses 30 e poucos anos de trabalho quase contínuo, recuperamos a maior área de mangue da Baía de Guanabara, que é de 130 hectares de mangue.
O manguezal captura uma enorme quantidade de CO2. Esse tipo de vegetação pode absorver até quatro vezes mais carbono do que outras florestas. E agora, o lixo do Rio vai para um aterro sanitário fora da cidade.
O local captura a maior parte de suas emissões de metano. De acordo com o operador do local, ele gera energia suficiente para abastecer uma cidade de 90 mil habitantes. O chamado Centro de Tratamento de Resíduos de Seropédica custou cerca de meio bilhão de reais e colocou o Rio no alto do ranking de cidades quando o assunto é política de resíduos sólidos.
Mas mesmo o Rio ainda tem um longo caminho pela frente. Em torno do antigo lixão de Gramacho, ainda se pode ver lixões ilegais, e a taxa de reciclagem da cidade é bem baixa, assim como a do Brasil inteiro. Neste momento, só 4% do lixo gerado no país é reciclado.
E sempre se fala muito do quanto custa para resolver o problema dos lixões, mas as pesquisas mostram que, no longo prazo, um gerenciamento do lixo bem feito reduz custos, abre mercados e gera empregos. Quanto mais alto na pirâmide de resíduos você subir, mais dinheiro pode se ganhar com o lixo – por exemplo, produzindo energia ou revendendo o lixo como adubo. A gente vai continuar acompanhando esse assunto.
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