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Video Transcript:
Muito boa noite, meus caros! Sejam bem-vindos à nossa conversa desta sexta-feira, hoje, dia 25 de outubro. A Igreja celebra Santo Antônio de Santana Galvão, Frei Galvão, o nosso primeiro Santo brasileiro. Aqui, para quem está nos acompanhando nesta noite, e que, porventura, não tenha ainda assistido à aula sobre Frei Galvão aqui no canal, existe uma playlist com algumas lives, algumas aulas sobre os santos brasileiros, e lá vocês encontram conteúdo sobre Frei Galvão. Então, quem quiser meditar um pouquinho no dia de hoje ou amanhã a respeito da vida desse grande Santo brasileiro pode encontrar um conteúdo
aqui, né, no canal. Rafael tem lá bonitinho, né, sobre Frei Galvão, esse conteúdo. Tá bom? Então, que possamos, nesta noite, desenvolver aqui um pouquinho esse tema. Qual é o tema da noite? A teologia da libertação e os seus impactos sobre a Igreja na América Latina. Vamos falar diretamente sobre isso, né? Para quem está chegando, se você não me conhece ou não conhece o canal, eu sou o professor Rafael Tonon. Sou professor de História e Filosofia, e toda sexta-feira, às 21 horas, nós temos alguma conversa aqui a respeito de fé, a respeito da história geral, história
do Brasil, história da Igreja, enfim, temas que sejam do nosso interesse e que sirvam ao nosso crescimento. E hoje vamos falar da teologia da libertação. Muito bem, então, pedindo a Deus que nos abençoe nessa noite, nessa nossa conversa, vamos fazer aqui uma breve oração e já entramos no nosso tema. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém. Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é convosco. Bendita sois vós entre as mulheres e bendito é o fruto do vosso ventre, Jesus. Santa Maria, Mãe de Deus, rogai por nós, pecadores, agora e na hora
de nossa morte. Amém. Que o Senhor Todo-Poderoso nos abençoe, nos livre de todo mal e nos guarde hoje e sempre. Santo Antônio de Santana Galvão, rogai por nós. Nossa Senhora Aparecida, rainha e padroeira do Brasil, rogai por nós. Senhor, nos guarde e abençoe, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém. Muito bem, meus caros! Aproveito aqui para acolher quem já tá por aqui, né? Vejo aqui alguns nomes já por aqui, né? Que estão chegando: aqui, a Letícia, o Luís, o Fernando, que também já está por aí, né? A Ana Maria também está
aqui, a Sandra também. Vamos ver quem mais... A Silvia Muniz, a Maril Aparecida lá de Santa Catarina, muito bem! A Cristina também já está por aí. Seja muito bem-vinda! O Fábio Vergal isso aí, meu Fábio, é meu vizinho aqui, né, de cidade. Muito bem! O Marcelo Augusto de Carvalho, o Padre Diego Bal, sua bênção, Padre, muito boa noite! O Francisco de Assis dos Santos tá por aí, muito bem, e todos os outros que estão chegando, e aqueles que ainda entrarão aqui, né, nessa conversa. Taciana também tá por aqui, a Cristi Ferr também. Ah, tá aí
agora, apareceu, né? Quem mais? André Mendonça, muito bem! Sejam todos aí muito bem-vindos nesta noite! Lá no comecinho hoje, assim que coloquei aqui a live no ar, eu coloquei para vocês aqui uma referência que eu vou até... Isso vai entrar aí na tela para vocês, é a referência de um livro que vai servir de base para a nossa conversa esta noite. O livro é esse aqui: opa, deixa eu mostrar de cá, né, para a câmera, que aí aparece melhor. "A crise da Igreja Católica e a teologia da libertação", do Frei Clodovis Maria Boff. Frei Clodovis
Boff foi aqui no Brasil um dos grandes nomes da teologia da libertação nos anos 70 e 80, e ainda nos anos 80 muito forte, mas, nos anos 2000, Frei Clodovis Boff reviu a sua posição e passou a fazer uma análise crítica daquilo que ele mesmo havia defendido durante anos. Essa análise crítica partiu muito da análise dos frutos. Então, ele era um grande defensor da teologia da libertação e, de repente, começou a olhar para os frutos. Quais são os frutos que a teologia da libertação deu, né? Por onde ele passou como padre. E, na hora em
que ele começou a colocar isso na balança, começou a perceber que os frutos, quando existiam, eram deficitários e, na maioria das ocasiões, o que acabou acontecendo? Onde ele tentou implantar a teologia da libertação, ele percebeu... A conclusão que ele chegou é que ele tentou falar de uma revolução social usando o Evangelho como pano de fundo, e o que ele fez foi falar deste mundo e não falar como deveria falar de Deus, da vida eterna. E, por consequência natural, as pessoas começaram a procurar quem falava. Então, em muitos lugares onde a teologia da libertação entrou, a
teologia da libertação fez um grande trabalho que foi entregar de bandeja muitas e muitas almas para diversas seitas, sobretudo as seitas neopentecostais protestantes. Por quê? Estas seitas, bem ou mal, também de maneira deficitária e incorreta, mas, bem ou mal, ainda falavam de vida eterna, ainda falavam de Jesus, enquanto em muitas Igrejas católicas só se falava de política e revolução social. Então, isso é um balanço! Não sou eu que estou dizendo. Frei Clodovis Boff fez esse balanço. Muitas das comunidades onde ele atuou como padre, o fruto mais concreto foi o esvaziamento das paróquias e comunidades. E
essas pessoas que saíam dessas paróquias iam para as igrejas evangélicas, e aqueles que ficavam perdiam a fé, e aí as igrejas viravam uma ONG e perdiam totalmente a sua finalidade, que é imanente — acontece nesse mundo — mas é transcendente. Então, aqui está o problema. Por isso, eu recomendo vivamente esta obra aqui, ó: "A crise da Igreja Católica e a teologia da libertação". Quem escreveu a obra foi o Frei Clodovis Maria Boff. Organizou esta obra e acrescentou alguns textos, algumas análises, e fez a apresentação da obra. Foi o Padre Leandro Razeira, atualmente do clero da
Diocese de Piracicaba, né? Aqui do lado, né? O Padre Leandro Razeira eu não o conheço pessoalmente, mas tive a oportunidade de conversar com ele, de trocar alguma ideia com ele, e, enfim, tem um trabalho aqui impecável de análise, uma análise serena. É importante dizer isso: é uma análise serena dos fatos ligados à teologia da libertação. Então, o meu objetivo hoje aqui é justamente esse: vamos falar primeiramente do contexto da teologia da libertação, a época em que ela surgiu, alguns dados históricos básicos, né? A minha intenção aqui nem de longe é me aprofundar num tema tão
complexo em uma hora de live, mas de ser aqui um começo de conversa. E aí, então, eu vou fazer primeiro esse apanhado histórico, depois nós vamos olhar para o que é a teologia da libertação, vamos olhar para aquilo que ela causou de impacto na Igreja, na América Latina, sobretudo, e vamos falar um pouquinho das perspectivas hoje em dia. Para isso, eu vou lançar mão do que o Frei Clodovis diz aqui no seu livro. Certo? Então, esta é a ideia da noite, e vocês viram aí que eu deixei o link, aqui ó, né, para vocês. Esse
é o link da minha livraria; esse livro aqui, do Frei Clodovis Boff, está lá na livraria Rafael Tonon. Na descrição desse vídeo, você consegue tocar lá e clicar, entrar na livraria. Depois dessa live, ou agora mesmo, durante a live, se você clicar aqui nesse comentário — é o primeiro comentário, tá lá em cima no chat —, se você clicar, você já cai na página da minha livraria e consegue adquirir o livro. O livro, salvo engano aqui da minha parte, ele está a R$ 37, e há mais o frete da sua região. Mas é um livro
assim fundamental, né? Todo católico que quer entender o caminhar da Igreja no Brasil hoje em dia tem que ler essa obra para ter um panorama geral. Mas hoje a gente vai fazer aqui uma introdução. Muito bem, então vamos falar aqui da teologia da libertação para além da paixão, né, pessoal? No sentido assim de dizer: “Isso aí está errado” e tudo mais, e já partir para condenação, ou como muitos fazem, partir para uma defesa cega. O melhor a se fazer é buscar o contexto histórico. É por isso que a história traz um equilíbrio às coisas. Quando
nós olhamos o contexto, nós conseguimos analisar melhor, nós conseguimos tomar distância, pensar racionalmente, pensando com a cabeça e não com o fígado. Porque aqueles que defendem a teologia da libertação são extremamente intolerantes com qualquer crítica. E vejam bem, isso aqui eu falo não porque alguém me disse: “Ah, Rafael, mas quem é você para dizer?”. Eu sou um ex-seminarista que estudou num seminário cuja formação vinha da teologia da libertação. Então, não é uma coisa que alguém me contou ou algo que eu li nos livros; eu vivi. E a experiência, quando nós temos a experiência, isso é
uma coisa que ninguém nos tira, né? A experiência nos dá autoridade para falar daqui porque é concreto, ninguém tira isso da gente. Uma coisa é você discutir ideias etéreas, né, que estão lá no mundo das ideias, nos livros; outra coisa é você falar de experiência. E aqui eu falo com a experiência. Então, tem muitos que são defensores da teologia da libertação e que ficam cegos a qualquer crítica, como se esta fosse a única teologia possível e todo o resto estivesse errado, devesse ser recusado, devesse ser abafado. Então, é interessante, né? Por exemplo, eu tive na
minha formação dentro do seminário formadores, reitores de seminários que eram defensores da teologia da libertação e que odiavam — e eu não estou exagerando aqui — odiavam a teologia de Santo Tomás de Aquino, odiavam a teologia dogmática tradicional, como se tudo estivesse errado. Então, é como se a teologia tivesse surgido na Igreja a partir da teologia da libertação. Na cabeça desses defensores, desses sacerdotes, desses teólogos, existe a Igreja antes da teologia da libertação e depois da teologia da libertação. Então, quer dizer, é uma defesa passional; ela não é racional. E aí nós temos aqui um
problema, porque o sujeito já não pensa, ele abraçou isso como um ídolo. Então, não se trata nem propriamente de teologia, porque teologia é ciência, e a ciência, enquanto tal, exige o quê? Estudo, especulação, comparação. Mas, antes de tudo, teologia, por tratar de um tema tão delicado, que é Deus, Deus mesmo, o objeto da teologia é Deus. O que a teologia estuda é a ciência que estuda Deus, as coisas de Deus, tudo que tem relação com Deus. Fazer teologia sem oração é loucura. O próprio Frei Clodovis Boff diz assim: “Fazer teologia sem oração é heresia.” E
Frei Clodovis Boff tem toda a razão ao dizer isso. Ao pensar isso, é realmente a teologia feita somente com estudo, com conhecimento, com aplicação de um instrumental teórico aqui. Ela vai desembocar em heresia, entendeu? Então, não é possível fazer teologia sem espiritualidade, sem oração, sem fé. Então, senão a teologia começa a ser tratada como um saber, né? Um saber abstrato que eu vou buscando conhecer na medida em que eu aplico ali os instrumentos corretos. É o que é feito na filosofia, entendeu? Isso se faz muito na filosofia, mas na teologia nós não podemos fazer esse
tipo de coisa, né, sem correr o risco, né, de cair em erro. Certo? Então, isso para a gente ter uma ideia aqui do tamanho do problema. Então, de um lado, nós temos... Eh, nós temos aí os defensores cegos da teologia da libertação e, do outro lado, nós temos aqueles que, no afã, no desejo de preservar a tradição e a integridade da teologia católica, odeiam com todas as forças a teologia da libertação e ficam também igualmente cegos na hora de argumentar. Então, nós temos que buscar aí um equilíbrio, uma visão prudente. A igreja católica, desde seu
início, desde a sua fundação por nosso Senhor Jesus Cristo, desde aquele momento até hoje, a igreja se sustenta sobre três pilares que são a tradição. Então, para fazer teologia, para falar de Deus, para falar de doutrina católica, eu não posso ignorar aquilo que os santos, aquilo que os padres da igreja, aquilo que os primeiros autores cristãos, aquilo que os documentos dizem. Eu não posso ignorar a tradição, eu não posso ignorar o magistério, aquilo que os Papas ensinaram anteriormente; não posso jogar fora isso. E eu não posso ignorar a própria escritura. Então, eu preciso, eu preciso,
para ter um pensamento católico, para fazer teologia católica, eu preciso dessas três coisas. Agora, se eu quiser jogar uma dessas coisas fora, ótimo, pode até ser teologia, mas não é católica. Aí já é um outro tipo de teologia, uma outra abordagem, mas a teologia católica parte desses pressupostos. E aí eu não posso jogar fora isso. Agora, o que acontece? Como que esta forma de teologia, essa modalidade de teologia surgiu e em que contexto ela surgiu? Bom, vamos pensar no seguinte: lá no fim do século XIX, o que já estava acontecendo na igreja? No mundo, havia
uma corrente teológica chamada de nova teologia. A nova teologia, essa nova teologia, é uma corrente que começou ali na França, mas foi se espalhando pela Europa toda e depois vai chegar aqui também na América. Só que é interessante que, aqui na América, essa nova teologia chega bem mais fraca; isso é interessante, né? E aqui no Brasil, mais fraca ainda. Aí eu vou explicar por quê. Então, o que é essa nova teologia? É um compilado de erros teológicos, de heresias até, que começam a entrar sutilmente na igreja. Então, um primeiro erro que vai começar a entrar
nos seminários e mesmo na mente dos teólogos católicos foi o liberalismo. O liberalismo teológico, o liberalismo do pensamento. O liberalismo é o fruto do quê? Daquele pensamento surgido no século XVII com o movimento iluminista. É aquela ideia de que não pode haver uma autoridade, seja ela divina, eclesiástica, acima da autoridade e das conclusões que eu, ser humano, homem racional, posso chegar. O iluminismo trouxe muito essa ideia de que a luz da razão vai iluminar as trevas da ignorância e o iluminismo era um movimento essencialmente anticlerical, era contrário à hierarquia da igreja. Então, a ideia é
que não, você pode alcançar o conhecimento por você mesmo, você pode fazer isso. O protestantismo bebeu também muito dessa ideia, né? Lutero, antes do liberalismo, lá do século XVII, já tinha falado do livre exame das sagradas escrituras. Então, a teologia luterana e depois a teologia das outras tradições protestantes já traziam esse elemento humano, antropocêntrico, o homem é a medida de todas as coisas. O protestantismo é a religião do homem, né? Por quê? Porque é o homem que escolhe quem é que vai dizer o que está certo e o que está errado. Não é o papa,
não é a igreja. Lutero dizia que na igreja dele, cada cristão era o seu próprio papa e que o Espírito Santo iluminaria individualmente cada mente. Só que depois o próprio Lutero vai ver que isso aí não deu certo, porque dentro da própria comunidade dele existiam visões divergentes. O próprio Lutero, por exemplo, ele não era a princípio contrário ao culto das imagens, mas Melanchton, que era um teólogo companheiro de Lutero, odiava a ideia da veneração às imagens. Então, Lutero fez uma concessão por conta de Melanchton e passou a condenar o culto às imagens, que a princípio
ele não condenava. Então, foi um jogo político de acomodações doutrinárias, porque o critério é o homem, o critério não é autoridade divina, não é a igreja, a instituição divina deixada no mundo por nosso Senhor Jesus Cristo, que vai balizar as escolhas. Não é mais isso, entendeu? Agora é o homem, é a escolha do homem. E aí, lá no século XVII, essa doutrina foi se desenvolvendo no campo da filosofia, do pensamento. Quando chega lá no século XVI, o que estão dizendo? A luz da razão vai iluminar as trevas da ignorância. O pensamento iluminista, que depois será
absorvido por duas grandes revoluções que aconteceram no mundo: a Revolução Americana, que quis a independência dos Estados Unidos, e a Revolução Francesa. Ambos os movimentos fomentados por um grupo, por uma sociedade nascida a partir desses ideais do iluminismo, que é a maçonaria. A maçonaria é a materialização na sociedade, de forma organizada, das ideias iluministas, das ideias liberais. Então, o que o iluminismo vai defender com unhas e dentes? Vai defender a ideia de que as duas grandes instituições que representavam autoridade na sociedade tinham de ser derrubadas. Quais eram simbolicamente essas instituições? O altar e o trono:
a igreja e a monarquia. Então, nós temos que derrubar a monarquia absoluta, ou seja, onde os reis tinham uma autoridade máxima, onde os reis exerciam essa autoridade sozinhos. Então, eles diziam: "não, nós temos que derrubar essa barreira para que, no campo político, possamos fazer tudo aquilo que a maioria acha que deve ser feito." Então, agora o critério não é mais o certo e o errado, o bem e o mal; o critério é o quê? O critério agora é a maioria, a opinião da maioria. Então, essa ideia do liberalismo não parte mais da realidade. Mas ela
cria a realidade. Então, eu não vou defender uma coisa porque ela é naturalmente boa; eu vou defender porque a maioria quer. Se a maioria quer, o poder não vem de Deus. Mas essa é a concepção de sociedade que os iluministas começam a ter, né? Então, o poder não é mais divino; o poder é humano. E quem é que vai definir o certo e o errado? A maioria de votos. Então, aquilo que a maioria quiser deve ser feito. Só que os iluministas sabiam bem disso, e a maçonaria também sabia bem disso: que as pessoas, justamente por
não possuírem uma igualdade de condições de educação, de formação moral e de conhecimento, né? Conhecimento assim, né? Quando eu falo da educação, educação na família, nem todos conseguem ter essa educação, nem todos conseguem ter acesso ao conhecimento e nem todos têm a formação moral para aprender a escolher. Eles sabiam disso, e eles sabiam que seria fácil manipular aquilo que as pessoas querem. Então, você lança essa ideia que aparentemente é muito boa, de que o poder emana do povo; isso tá até na nossa Constituição: o poder emana do povo, o poder não vem de Deus, né?
Então, não existe uma autoridade acima de nós; a autoridade está em nós, e democraticamente nós é que vamos estabelecer o que é a verdade. A verdade será estabelecida por maioria de votos e não pela realidade. Não é mais a realidade que se impõe a nós; somos nós que construímos a realidade. Nós somos artífices da realidade. Em parte, nós podemos, é claro, mudar a mudar a realidade. Isso é verdade, ninguém nega isso, que a gente pode fazer isso, mas acreditar que nós podemos definir tudo, controlar tudo, né? E fazer isso com pressão, com clareza, é algo
que exige uma fé muito maior do que acreditar em Deus. Entendeu? Então, é interessante: eles não querem admitir essa autoridade de Deus, mas admitem o absurdo de que o ser humano não precisa se adequar em nada à realidade, mas ele pode produzir a realidade 100% do começo ao fim. Acontece que isso não acontece, né? O que acontece é que não acontece. Esse é o problema. Mas vem, então, essa gama de ideias, e essas ideias começam a ser defendidas em livros, em peças teatrais, em letras de música, canções populares. Pouco a pouco, essas ideias vão entrando
no imaginário das pessoas, e as pessoas vão julgando que realmente é melhor derrubar o trono se o trono não quiser se adequar a essas mudanças, a essa diminuição de poder. Agora, uma coisa é verdade também na história da humanidade: Deus governa o mundo, e se tem coisas que Deus permite que deixem de existir ou que caiam, é porque essas coisas não estão cumprindo a sua finalidade. Então, por que as monarquias católicas começam a cair no século XVII, sobretudo da Revolução Francesa para frente? Porque certamente essas monarquias não estavam sendo tão católicas quanto deveriam. Então, Deus
permite que caiam. Aliás, essa é a lógica de Deus para tudo, né? Hoje em dia, muita gente olha para as congregações religiosas e vê a crise de vocações. Fala: "Nossa, a congregação tal, a congregação outra não tem vocações, estão acabando." Se estão acabando, é porque não estão vivendo o seu carisma, traíram o seu fundador, traíram o santo fundador, traíram o próprio carisma fundacional, não estão cumprindo a sua missão, não estão fazendo o que deveriam fazer. Então, Deus permite que acabe, que caia mesmo, né? Então, esses sinais de decrepitude, de falência das instituições, quando Deus permite
que isso aconteça na história, é um sinal muito claro. O que Deus está dizendo? Se está acabando, é porque não está cumprindo sua função. E as monarquias católicas foi o que aconteceu com elas. Por da Idade Média para frente, as monarquias católicas foram passando por um processo de corrupção. Os reis foram se mundanizando, já não respeitavam a Igreja tanto quanto deveriam, já não viviam a fé como deveriam viver, já não se orientavam na hora de tomar suas decisões pela fé e pela doutrina da Igreja, mas se orientavam pelo seu desejo de dinheiro, de poder, disso,
daquilo. Os reis começam a ter uma vida nem um pouco exemplar. Se a gente olhar para a Idade Média, nós vemos muitos Reis Santos. Nós vemos um São Luís na França, nós vemos outros Reis que não foram canonizados, mas que tiveram um comportamento, uma ação heróica. Mas acontece que agora já não vemos isso. Então, o que acontece? Essas monarquias já não estavam cumprindo a sua função. Já não estavam cumprindo mais a sua função. Então, são reis que eram para derramar até o seu sangue, se fosse necessário, pela vida do povo, mas que na hora de
governar viviam em festas, banquetes, com dezenas de amantes, e que depois compareciam às missas, às cerimônias religiosas. Acontece que de Deus não se zomba; de Deus não se zomba. E se uma monarquia é católica, ela tem um dever de atuar a partir da doutrina, a partir da fé da Igreja. Então, os grandes causadores da ruína das monarquias católicas europeias foram os próprios monarcas católicos que começaram a trair a sua fé. Então, nós olhamos, por exemplo, quando vemos um Luís X da França. Era um rei católico, foi batizado, recebeu o sacramento. É um homem que teve
acesso a gente muito santa na França, mas é um homem que foi adquirindo cada vez mais hábitos que se tornaram até uma espécie de neurose, porque ele criou uma etiqueta extremamente complexa para a vida da corte e esse homem começou a viver de banquetes em banquetes, de prazeres em prazeres, começou a gastar boa parte do seu dinheiro com as suas amantes enquanto o povo passava necessidade de coisas básicas. Mas em dado momento ele percebe... Isso é entre idas e vindas. Ele tentava ser até um bom rei; havia um resquício ali que a fé deixou nesse
homem. Então, Luís XVI, por exemplo, ele atendia pessoalmente os seus súditos. Havia um dia na semana em que ele recebia os seus súditos, como na Idade Média. São Luís I e outros reis fizeram isso. Ele recebia, ele julgava crimes, ele tentava, de alguma maneira, ajudar o seu povo. Só que, passava um tempo, ele voltava de novo à sua vida de luxúria e desbanque. Um único banquete dado por Luís XVI poderia alimentar um quarto da França; com o que se gastava em um banquete, dava para alimentar um quarto do país durante uma semana. Então, quer dizer,
era um gasto imenso, mas ao mesmo tempo ele tentava ali ajudar. Então, essas monarquias foram criando vícios. Foi no reinado de Luís XVI, por exemplo, um rei católico, que Jesus apareceu a santa Margarida de Alacoque e pediu que ela escrevesse ao rei e solicitasse ao rei que consagrasse a França ao Sagrado Coração de Jesus. Isso nunca foi feito; só que o conteúdo desta carta era conhecido dos reis da França, era conhecido 100 anos antes da Revolução Francesa. Jesus pediu a consagração da França para salvar a França. O que os reis da França fizeram? Ignoraram solenemente.
Depois de Luís XVI, vem Luís XV, que vai governar por 50 anos. Quando Luís XV morre, assume o trono seu neto, Luís XVI. Quando Luís XVI já tinha sido preso e já estava destronado, não era mais o rei da França. Na prisão, ele fez o voto de consagrar a França ao Sagrado Coração de Jesus. Ele já não era mais o rei. O Sagrado Coração de Jesus pediu a Santa Margarida Alacoque que ele queria que o rei da França consagrasse a França. Luís XVI já não era mais o rei; ele já havia perdido o trono. Já
era tarde demais; já não era hora mais da consagração 100 anos antes. Então, quer dizer, isso em um país católico, de tradição católica. E outra coisa: o absolutismo, que é essa coisa do rei governar sozinho, sem repartir poder, centralizando tudo nas suas mãos. Isso foi um vício, um vício que se criou nas monarquias europeias. Por quê? Na Idade Média não era assim; na Idade Média existiam muitos problemas. Não vamos pensar também que a Idade Média era um período sem defeitos, sem problemas, e que, pelo fato de a Igreja ter uma influência maior na Idade Média,
tudo era lindo e maravilhoso. Não era! Mas, pelo menos em termos de leis, em termos de princípios gerais, podemos dizer que era melhor, sim. Mas existiam muitos problemas, muitas incoerências, muitos pecados, muitos abusos. Mas agora, na Idade Moderna, nós teremos o quê? Problemas, vícios. Então, quer dizer, aquela ideia do rei medieval, que era visto como o pai da nação, como aquele que foi investido por Deus para presidir aquele povo e que deveria governar junto dos nobres... O que acontece? Isso foi deixado de lado, foi esquecido. Os reis centralizaram o poder, então, quer dizer, eles provocaram
um mal, é um vício, é um erro que foi causado por esse modelo de monarquia. Então, isso foi causando uma corrupção, e tudo isso justificado em nome do direito divino de governar. Realmente, os reis têm um direito; se os reis estavam no trono, é por permissão divina. Aliás, tudo que acontece no mundo é por permissão divina. Mas esta associação de uma monarquia corrompida com a justificativa de direito divino... Olha que interessante! Prestem bem atenção nessa análise aqui. Isso começou a causar, na mente de muitos pensadores lá no século XVI, um ranço, uma raiva pela própria
Igreja, dizendo: "Mas a Igreja legitima isso?" O que acontece é que a Igreja não estava legitimando esses erros; a Igreja legitimava, sim, a monarquia enquanto monarquia legítima; a Igreja coroava os reis. Mas isso não significa que a Igreja endossava todo o mal que os reis faziam. Mas, para as pessoas, é isso que, às vezes, se passava assim como uma espécie de informação oculta, inconsciente. Então, vamos derrubar esse modelo de monarquia. Se for para ter monarquia, que ela seja constitucional. Acima do rei, estará a lei. Então, já é uma modificação que a Revolução Americana trouxe, a
Revolução Francesa também. Mas aí vem o outro lado. Qual é a outra instituição que baliza, que equilibra a sociedade? A Igreja. A Igreja nos diz o que devemos fazer, o que não devemos fazer, o que está certo, o que está errado. Então, nós temos que derrubar o altar; nós temos que criar um Estado laico. A Igreja não tem direito de cidadania; Deus está fora da vida pública. É a apostasia das nações. As nações começam a negar a sua identidade religiosa. A França vai fazer isso; a França foi a primeira nação, o primeiro país do mundo
a se tornar inteiramente católico. A França era chamada, não sem razão, de a filha primogênita da Igreja católica, e é justamente esta França católica que vai negar os direitos de Deus na vida social com a Revolução Francesa. Qual era a ideia? A Igreja é vista, então, como uma promotora de obscurantismo; a Igreja atrasa o avanço do homem. E aí começam a surgir aqueles argumentos de que a Igreja foi repressora, de que a Inquisição era para perseguir cientistas, que a Igreja era inimiga da ciência, enfim, atrasou o avanço da humanidade. Então, era necessário que a luz
da razão viesse para iluminar aquilo que a Igreja obscureceu. Começa uma narrativa; isso foi repetido, repetido, repetido. E aí a Revolução Francesa vai ser implantada como Revolução Francesa; ela tinha como lema "Liberdade, Igualdade e Fraternidade". Lema: três elementos que ela não praticou definitivamente. Liberdade era liberdade para quem pensasse igual aos revolucionários; se você pensa igual, ótimo. Você tem liberdade; se você pensa diferente, você vai ser guilhotinado. Essa é a liberdade revolucionária: liberdade de pensar igual a eles. Então, liberdade. Mas é uma liberdade que não é tão livre assim: a liberdade que te direciona para a
Revolução, para a rebelião. Você não pode defender nem a autoridade do governo, nem a legitimidade da fé católica naquela sociedade: uma liberdade sem rei e sem Deus. Essa é a liberdade, e quem ousar não ser livre morre. É o caso icônico das Carmelitas de Copien. Copien é uma cidade perto de Paris. Os revolucionários, durante a Revolução Francesa, invadiram o Carmelo de Copien, arrancaram a grade do coro e disseram: "Irmãs, podem tirar essas roupas e podem sair. As senhoras estão livres." A superiora disse: "Mas ninguém nos prendeu aqui, nós estamos aqui porque queremos e vamos continuar
aqui." O que aconteceu com essas religiosas? Foram todas presas porque recusaram a liberdade da revolução. Foram presas, foram condenadas à morte e foram guilhotinadas as 16 freiras, começando pela Madre Maria de Santo Agostinho. E, aliás, ela foi a última, né? Começando pelas outras e terminando com a Madre Maria de Santo Agostinho, que foi a última delas: 16 freiras guilhotinadas porque se recusaram a ser livres. Elas não podiam pensar como queriam; elas tinham que pensar como a Revolução. Essa revolução que pregou liberdade, mas guilhotinou a Olimpe de Gouges. Quem era Olimpe de Gouges? Uma mulher que,
ouvindo os revolucionários falarem tanto de liberdade, pediu a palavra numa das assembleias e sugeriu que as mulheres pudessem votar. Ela defendeu o voto feminino e foi guilhotinada em nome da liberdade. Então é interessante que, hoje em dia, o pessoal exalta a Revolução Francesa como se a Revolução Francesa fosse a coisa mais linda, fosse um marco da liberdade na humanidade. Pois é, a Revolução Francesa que guilhotina mulheres que queriam votar, a Revolução Francesa que guilhotinou padres, bispos e religiosas porque usavam um hábito, a Revolução Francesa que guilhotinou o cientista Lavoisier porque o cientista criticou a violência
da Revolução e foi guilhotinado. E olha que esta revolução dizia que a Igreja Católica matava cientistas, que a Igreja perseguia cientistas lá na Inquisição, mas essa mesma revolução guilhotinou todo mundo que discordou dela. A Revolução Francesa foi um banho de sangue. Basta a gente olhar para o massacre da Vendeia, onde católicos resistiram para defender a sua fé e foram massacrados: homens, mulheres, crianças, sem sobrar ninguém. Ninguém! E eles se orgulhavam de dizer que mataram covardemente até mesmo idosos que não tinham defesa nenhuma. Mataram até mesmo crianças! Então, isso é para a gente entender: a liberdade
é a igualdade para ser igual ao que eles pensavam. Não é uma igualdade natural, não é uma igualdade feita pela maioria de votos ou feita pelo grupo que domina. E a fraternidade: fraternidade é viver como irmãos, mas entre aqueles que pensam igual. E é curioso ver que essa mesma revolução, que na França derrubou Luís XVI e guilhotinou o rei, que matou padres e bispos, que confiscou os bens da Igreja, que profanou altares e cemitérios, é esta revolução que, quando a sua colônia aqui na América, o Haiti, vendo esses ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, se
encantou com isso. Aí, no Haiti, veio um movimento de independência. O que os franceses, os revolucionários franceses, fizeram? Mandaram seu exército para invadir o Haiti e mataram todos aqueles que queriam uma república no Haiti. Porque é liberdade, é igualdade, é fraternidade para nós, mas para vocês, que são colônia, não. Voltaire, um dos filósofos que defendeu o Iluminismo, etc. e tal, serviu de base para a Revolução Francesa. Voltaire ganhava dinheiro com o mercado de escravos, mas pregava a ideia da liberdade. Olha que bonito, né? Então, quer dizer, são incoerências absurdas. O pai da pedagogia moderna veio
do Iluminismo: quem é Jean-Jacques Rousseau, que escreveu o livro "Emílio", que fala sobre pedagogia? É a base para o estudo da pedagogia em boa parte das faculdades de pedagogia hoje em dia. Todo mundo estuda as teorias de Rousseau sobre pedagogia. E Rousseau não educou o próprio filho; ele abandonou o próprio filho. Então, quer dizer, a base da pedagogia moderna são os ensinamentos de um sujeito que não educou nem o próprio filho. A base do pensamento liberal moderno vem de um sujeito como Voltaire, que ganhava dinheiro com o mercado de escravos. Então, esta é a revolução
tão celebrada como sendo um avanço para a humanidade e que, na verdade, foi uma carnificina. Foi a legalização do terrorismo dentro de uma sociedade. Aí, vejam o que sai da Revolução Francesa: o liberalismo, essa ideia de que as autoridades não podem balizar, e aí seja autoridade política ou seja uma autoridade divina. Porque o Estado é laico, essas ideias vão entrando no campo da teologia. Então, não é a Igreja, com o Papa, com os bispos, com a sua hierarquia, que irá se colocar como a intérprete autorizada da palavra de Deus, mas os teólogos podem ter as
suas intuições. Isso já era comum no meio protestante e foi entrando também no campo da teologia católica. E aí a nova teologia foi absorvendo várias vertentes, várias ideologias. Então, por exemplo, nós vemos, no fim do século XIX, padres católicos normatizando e normalizando o conceito de que mais importante que o texto bíblico, a exegese, você analisar o texto dentro do seu contexto, mais importante que isso é o sentido geral da palavra de Deus. Aí isso é uma coisa muito elástica; você puxa para onde quer. Mas de onde veio essa ideia? Veio lá de Lutero. O Lutero,
quando traduziu a Bíblia, o que que... Lutero fez. Ele dizia que mais importante do que o texto em si é o sentido. Quinhentos anos atrás, aí no fim do século X, já tinha teólogo católico dizendo que isso é ponto pacífico. O Papa Pio IX, em 1870, publicou o Syllabus, uma encíclica condenando os erros do mundo moderno. Ele fez uma lista dos erros do mundo moderno e condenou, inclusive, erros ideológicos e teológicos. Aí Pio IX já vai condenar o marxismo. Claro que o marxismo não estava ainda tão bem elaborado, né? Porque Marx criou a teoria quando
escreveu "O Capital", mas depois outros autores desenvolveram e expandiram essa compreensão do marxismo. O Antônio Gramsci, por exemplo, um italiano, vai expandir, vai desenvolver, e vai jogar o marxismo não só para o campo da economia e da política, mas vai entrar sobretudo no campo da cultura. Então, outros autores expandiram ainda mais a reflexão sobre Marx, mas a condenação ao princípio materialista do marxismo já estava lá em Pio, entendeu? Então, isso já aparece lá. Pio fez uma lista dos erros e, aí, ele vai dizer que o liberalismo econômico, que é a exploração do mais rico sobre
o mais pobre, isso é condenado pela Igreja. O liberalismo é pecado, assim como o comunismo é pecado. Então, na verdade, Pio IX bate nas duas coisas. Ele diz que o liberalismo, que é a exploração desavergonhada do mais simples, do mais pobre, é pecado. É pecado! Mas o comunismo, que iguala tudo à força, tomando um Estado que confisque tudo e seja o gestor, aquele que vai gerir os bens dentro da sociedade, como se ele fosse uma espécie de consciência da sociedade, também está errado. O liberalismo está errado, o comunismo também está errado. Ele condena os dois.
E o que dizer, então? Qualquer caminho intermediário pode ser tomado? Então, a Igreja não vai dizer: "Olha, faça isso, faça aquilo", mas vai dizer o que não fazer. O liberalismo parte de um princípio de exploração que está errado, mas o comunismo é a outra face da mesma moeda, porque em nome da não-exploração, você cria uma exploração do Estado como uma superestrutura que comanda a vida das pessoas e manda em tudo. Então, isso aí já estava lá em 1870. Em 1891, o Papa Leão XIII escreveu a encíclica "Rerum Novarum". A encíclica "Rerum Novarum" vai falar do
quê? Da doutrina social da Igreja. E qual é a via que Leão XIII propõe? Ele propõe uma via de superação do liberalismo, desse capitalismo exacerbado, desse capitalismo selvagem sem limite nenhum. Ele propõe, então, um meio-termo entre esse capitalismo e entre o comunismo radical. E, na época de Leão XIII, as teorias não giravam só em torno do comunismo. Tinha muita teoria sobre anarquismo, que é a ausência de governo, ou socialismo utópico. Existiam várias correntes de pensamento que queriam resolver os problemas da sociedade, né? Algumas partindo dessa visão socialista em que o Estado confisca tudo e tudo
é estatizado; todos os meios de produção, todas as empresas são do Estado. O Estado gere tudo, o Estado controla tudo, e aí você instala um Estado ateu e implanta uma visão materialista. Essa é a visão de Karl Marx, o materialismo. Ou seja, como vamos resolver os problemas da humanidade? Vamos resolver aqui esse terrestre. Então, nós vamos fazer aqui um plano econômico, um plano político. Quando o mundo entrar nesse esquema, pronto, tudo estará resolvido. Karl Marx dizia que era necessário começar com o socialismo e depois avançar para o comunismo. O que seria o socialismo? Seria a
fase intermediária para chegar ao comunismo. Então, como você faz o socialismo? Através de uma revolução. Você pega a classe operária, aqueles mais pobres que são oprimidos, explorados pelos mais ricos. Esses mais pobres se organizam, se unem e fazem uma revolução, e tomam o poder. E aí esses mais pobres vão implantar o quê? Uma ditadura do proletariado, uma ditadura dos operários. E essa ditadura dos operários, segundo Karl Marx, tudo é confiscado. Todos os meios de produção, as terras, as empresas, tudo é do governo, tudo é do Estado. O Estado vai distribuir casa, trabalho para todo mundo;
tudo será igualitário. E, segundo Marx, com o passar dos anos, as pessoas iriam se acostumando, porque, segundo ele, esse mundo mais justo traria justiça, progresso, traria benefícios. E as pessoas, naturalmente, dentro de algumas décadas, se acostumariam com essa vida. Assim, naturalmente, as pessoas migrariam do socialismo, essa sociedade de tudo para todos, e evoluiriam para o comunismo, que seria o Estado ideal de governo. Isso aqui eu estou resumindo bem a história, né? Isso aí é basicamente a teoria do Marx. E aí, Marx vai dizer que existia uma... Luta de classes, uma luta constante, né? Então, é
entre aqueles que são explorados e aqueles que exploram. Os que exploram lutam para poder continuar explorando e continuar lucrando e lutam para manter os explorados na mesma situação de ignorância e na alienação. Os explorados, por sua vez, segundo Marx, deveriam tomar consciência da sua situação, se organizar e fazer uma revolução, que seria a revolução do proletariado. E essa revolução seria para se libertar dessa opressão. Então, basicamente, seria isso a teoria do Marx. Agora, o Papa Leão XIII, o que ele vai propor? Ele diz assim: "Bom, essa teoria aí fala da luta de classes. A Igreja
propõe como caminho a Concórdia de classes." Então, veja bem, olhe o caminho por onde a Igreja vai. A Igreja não está dizendo que o rico não pode ser rico; ele pode ser rico, mas ele deve se orientar pela virtude da justiça. O que é justiça? Dar a cada qual aquilo que lhe compete. Então, um empresário católico deve pagar salário justo, deve repartir. O Leão XIII diz que isso é justo: que a empresa reparta parte de seus lucros com os operários, porque, afinal de contas, é graças a eles que a empresa pode avançar. E aí então,
o Leão XIII vai propondo o que? Uma Concórdia, ou seja, aqueles que trabalham, aqueles que são operários, devem ter seus direitos garantidos, e aqueles que empregam devem também ser salvaguardados, mas devem ser justos no tratamento com seus operários. Então, uma Concórdia de classes. Outra coisa que Leão XIII vai dizer é que o Estado, o aparelho estatal, seja uma monarquia, seja uma república, deve estar a serviço do povo. Então, o que Leão XIII vai dizer? Que o Estado, ao invés de fazer tudo para uma só sociedade, deve, na verdade, fomentar as boas ideias surgidas, por exemplo,
na iniciativa privada. Então, Leão XIII está falando do quê? Ele está falando daquilo que depois Chesterton e Belloc, né? São dois autores, dois católicos ingleses, vão elaborar melhor numa doutrina política chamada distributismo. O que basicamente é o distributismo? Vamos dar um exemplo aqui. Essa é a proposta social da Igreja Católica. Então, seria mais ou menos assim: ao invés de ter um Estado, um país com presidente, uma câmara de deputados, um Senado, milhares e milhares de funcionários públicos, qual que é a ideia da Igreja? Ter uma máquina mais enxuta, uma quantidade de funcionários menor, que atuem
valorizando aquilo que é de bom na iniciativa privada. Vamos supor, eu tenho um colégio privado. Vamos supor que no meu colégio eu tenho 300 vagas e ele só funciona no período da manhã. Eu tenho todas as vagas completas no período da manhã, só que a prefeitura da cidade precisa de 300 vagas para os alunos da escola pública. A prefeitura, ao invés de construir um colégio do zero, colocar outro prédio em pé, gastar dinheiro, aplicar dinheiro, fazer tudo isso, o que a prefeitura poderia fazer? Ela poderia fazer uma parceria comigo, que sou dono da escola. Ao
invés de a prefeitura construir a escola, ela pode vir e conversar comigo: "Olha, você consegue colocar quantos professores seus no período da tarde?" "Ah, eu consigo colocar todos, todos que dão aula de manhã." "Pode dar aula à tarde, então o prédio tá vazio." Então, meu prédio poderia ser cedido para a prefeitura na parte da tarde, e a prefeitura me pagaria. Eu sou o dono, eu vou receber e vou pagar os meus professores. Só que os alunos, a clientela que virá, é pública; são alunos da rede pública que vão estudar com os mesmos professores da rede
privada, tendo acesso à mesma estrutura e à mesma qualidade de ensino. O que é isso? Fomentar algo que já existe. É o distributismo. E aí o dinheiro que seria gasto na construção de uma escola, a prefeitura constrói outra coisa. E aí a vida das pessoas vai melhorando: a prefeitura, ao invés de construir milhares de escolas, vai construir um metrô, vai construir, sei lá, um hospital, vai construir outra coisa. É o distributismo; você distribui melhor o dinheiro dentro de uma sociedade, usando as estruturas que já estão disponíveis. Ao invés de construir um hospital novo, por que
não a iniciativa pública, eh, pública pagar exames na iniciativa privada? E aí você vai dar exames de boa qualidade para as pessoas do atendimento público, sem gastar um dinheiro imenso que pode ser superfaturado, desviado, etc., na construção de um hospital. É mais ou menos essa a ideia do distributismo. Então, Leão XIII, o Papa Leão XIII, corrigiu um pouco a rota. Só que nesta época, dentro da teologia, já estava entrando o liberalismo teológico, uma certa fluidez no jeito de interpretar a Sagrada Escritura. E já estava entrando também na teologia um certo questionamento em relação ao que
a autoridade da Igreja pode ou não pode definir. Então, começa-se a criticar e a duvidar e a querer mexer em tudo na Igreja, inclusive na liturgia. Então, começa a haver, no fim do século XIX, um certo desprezo pelas formas da liturgia; já se começa a falar numa certa liberdade na hora de ensinar doutrina. Tudo isso lá na Europa estava fermentando por lá. Aqui no Brasil, por que isso não chegou com tanta força no fim do século XIX? Pelo seguinte: no fim do século XIX aqui no Brasil, caiu a monarquia. Então, nós tínhamos a monarquia. A
monarquia caiu, veio a república. A república, do ponto de vista político para o Brasil, foi desastrosa em vários aspectos. Então, quer dizer, na época da monarquia, ainda havia uma relativa qualidade na política nacional. Tinha deputados e senadores ainda realmente preocupados com o bem comum. Quando cai a monarquia, vem a república. A república vira o quê? Uma praça de negócios. Então, os partidos políticos começam a formar bancada para defender interesses de grupos. Se os senhores observarem bem a nossa situação, né, na República Brasileira hoje em dia, nós não evoluímos muito. Nós estamos na mesma do fim
do século XIX para cá. Não mudou tanta coisa. A política brasileira é feita assim hoje, ainda. Então, a república já começa com uma série de vícios políticos, primeiro porque foi um golpe; não foi o povo que quis a república, né? Não houve participação popular alguma. Quem é que decidiu? A elite, os fazendeiros que se revoltaram contra a Princesa Isabel porque aboliu a escravidão e tirou a mão de obra gratuita que eles tinham. Então, se juntam os fazendeiros e os militares que tinham desejo de poder. Esses dois grupos se juntam e derrubam a monarquia de maneira
ilegítima, sem participação popular, sem a vontade do povo. É uma coisa tão absurda, né, que aqui quem tem da minha idade para cima vai lembrar disso. Em 1993, aconteceu no Brasil um plebiscito para escolher se o Brasil continuaria com o presidencialismo, o parlamentarismo ou a monarquia. Se voltaria à monarquia. Por que foi feito esse plebiscito? Porque quando a república foi derrubada... a monarquia foi derrubada, perdão, em 1889, foi instalado no Brasil um governo provisório que ficou provisório até 1993. Então, quer dizer, o povo não tinha validado aquele governo, não tinha validado. Aí, é claro que,
100 anos depois de terem derrubado a monarquia e com muita propaganda republicana contrária à monarquia, é óbvio que o povo não ia querer a monarquia. Aquele plebiscito de 93, eu me lembro; eu era criança. Eu escutava na minha família o pessoal falar: "Imagina, eu vou sustentar rei." Eu lembro do meu avô falando, dos meus tios falando: "Não, vou sustentar rei não, vou votar no presidencialismo para continuar como está mesmo, não sei o quê." E aí é interessante que os brasileiros que não queriam sustentar uma família real sustentam hoje em dia as famílias de todos os
ex-presidentes do Brasil porque é lei aqui no Brasil. Os ex-presidentes brasileiros são financiados por quem? Pelos nossos impostos. Ao invés de sustentar uma família, a gente sustenta um monte alegre e feliz aqui, achando que está tudo lindo. Então, quer dizer, toda essa construção política do Brasil foi confusa desde o começo. Só que para a Igreja Católica, a queda da monarquia trouxe um benefício. E qual foi o grande benefício da queda da monarquia aqui no Brasil? Antes, a Igreja estava unida ao trono, e a Maçonaria tinha uma influência política tremenda sobre a Igreja e travou o
desenvolvimento da Igreja. Quando a monarquia caiu aqui, no Brasil inteiro havia apenas 12 dioceses, só 12. Olha o tamanho do Brasil! Está certo que a população brasileira era menor, mas mesmo assim, 12 bispos para governar o Brasil inteiro é muito pouco. As congregações religiosas não podiam ter noviciado aqui no Brasil. Então, quer dizer, a Igreja foi totalmente travada pela Maçonaria durante o Império. Quando o Império cai, agora se o estado é laico, a Igreja não está ligada; ela não deve respeito à República, né? Ela não deve prestar contas à presidência da república. E aí, o
que acontece aqui no Brasil? Os Papas Leão XI e, sobretudo, São Pio X vão reorganizar a Igreja no Brasil. São Pio X cria várias dioceses aqui no Brasil, e os Papas, tanto Leão XI quanto São Pio X e, depois, Bento XV, vão nomeando como bispos padres que eram muito fiéis a Roma, muito fiéis à doutrina da Igreja. E aí o Brasil vai ter até mais ou menos 1950 um episcopado exemplar. Nós tivemos aqui no Brasil bispos, cardeais; nós tivemos homens de uma estatura imensa, bispos combativos que ensinavam a doutrina, que zelavam pela formação dos padres.
Nós tivemos um florescimento da Igreja Católica no Brasil. Muitas congregações europeias vieram para o Brasil, fundaram casas, fundaram seminários, e os bispos organizando suas dioceses e as vocações aumentando. E então, na Igreja do Brasil, até 1950 mais ou menos, estas ideias teológicas mais atrapalhadas não penetraram com tanta força. Depois da Segunda Guerra Mundial, em 45, algumas ideias teológicas mais atrapalhadas começam a chegar no Brasil. Então, isso entre 45 e 50 já começou a fermentar. E aí o que acontece? Então, nós temos aqui um ambiente de Igreja que floresceu, mas agora começam a chegar essas correntes
teológicas. Então começa a haver uma certa divisão na formação dos padres. Isso já começou a acontecer naquela época, muito antes do Concílio Vaticano II. Depois, quando veio o Concílio Vaticano II, ele foi convocado por João XXIII e foi aberto em 62 e fechado em 65. Esta época dos anos 60, a primeira coisa, o mundo estava em plena Guerra Fria. O mundo tinha saído da Segunda Guerra Mundial. O mundo estava dividido entre capitalistas e comunistas, Guerra Fria, União Soviética de um lado, Estados Unidos do outro, disputas de poder e território. Essa geração que sobreviveu à Segunda
Guerra Mundial, lá em 45, quando chega nos anos 60, esses moços e moças dos anos 60 são aqueles filhos que perderam, às vezes, o pai, às vezes perderam o pai e a mãe na guerra; são aqueles que cresceram órfãos, são aqueles que passaram fome, são aqueles que tiveram dificuldades por conta da guerra. Então, é uma geração decepcionada com a sua cultura, uma decepção geral. Eles tinham decepção com a cultura, com os costumes, com... A religião é uma geração que cresceu com uma certa revolta em relação ao que eles viveram lá no passado, né? Quando crianças
ou quando adolescentes, esse pessoal ficou moço e, nos anos 60, estava nas universidades. Então, isso começou a se refletir. E aí começam a surgir, nos anos 60, os movimentos estudantis que começam a abraçar determinadas doutrinas políticas, principalmente as doutrinas de esquerda, porque as doutrinas de esquerda se baseavam em pautas sociais. Então, quer dizer, uma sociedade dividida, confusa, vivendo os efeitos da crise. O Brasil também viveu muito isso, os efeitos da crise econômica depois da Segunda Guerra. Então, é uma sociedade em que os jovens estavam olhando para o passado, dizendo: "Isso aqui não funcionou, nós queremos
algo novo". E o que era o novo para eles? Era essa visão do socialismo, era essa visão meio ideal, né, de uma sociedade justa e igualitária. Então, eles começam a se apegar nisso e já não querem mais olhar para essa sociedade anterior. Então, é uma mentalidade da época que vai se instalando e se refletindo na cultura. A época do rock aqui no Brasil foi a época da Tropicália, da MPB. Então, são músicas de conteúdo crítico, de conteúdo político, né, um conteúdo mais alinhado à esquerda, mais combativo, aquilo que era visto como conservador: é uma recusa
desta sociedade antiga, entendeu? Então, esse é o ambiente. E, aí, justamente, nessa época, na Europa, esse ambiente era muito pior do que aqui. É nessa época que o Concílio Vaticano II é convocado. Então, o que acontece? Começam a pensar, já nessa época, aqui no Brasil, padres e bispos, que viria uma verdadeira revolução na Igreja, né? Uma verdadeira revolução! Eu tive um professor na faculdade que ele disse que chegou a ficar padre. Ele se ordenou e, depois, abandonou o sacerdócio. Uma vez, conversando com ele, perguntamos: "Mas por que o senhor ordenou? O senhor poderia não ter
recebido a ordenação sacerdotal e saído antes." E o que ele dizia? Ele dizia assim: "Olha, eu acabei me ordenando porque corria entre o clero, entre os padres, a conversa de que ia abolir o celibato". Olha que coisa, né? Ele falou então: "Eu e vários da minha turma nos ordenamos nessa esperança de que o celibato seria abolido. E aí a gente ia poder viver", só que isso não aconteceu. Então, foi uma época em que, em nome do Concílio, muita coisa foi sendo dita e feita. E o Concílio, né? Depois do Concílio, sobretudo, o Papa Paulo VI
tomou algumas decisões administrativas que passaram uma mensagem, que mesmo que não fosse isso que ele quisesse fazer, era assim que isso começou a ser entendido. Por exemplo, em 67, ele aboliu o Índice dos Livros Proibidos. A Igreja tinha o Índice dos Livros Proibidos desde o século X. Tudo que a Igreja considerava como obras teológicas, ou até outras obras que pudessem ser perigosas para os católicos, essas obras iam para o Índice. Em 67, Paulo VI falou: "Não, está abolido o Índice. Vamos confiar no bom senso dos católicos, que orientados pela sua fé vão discernir o que
devem ler ou não." Qual foi a mensagem que isso passou? "Ah, então a Igreja agora não condena mais nada." Então, em termos de teologia, vamos abraçar o que a gente achar que deve abraçar. Então, foi isso que acabou acontecendo. Eles entenderam isso como uma autorização para uma teologia que não precisaria estar tão alinhada ao magistério do Papa, tão alinhada àquilo que Roma dizia. E, na prática, foi o que foi acontecendo, né? Então, no campo da teologia, começaram a ter uma liberdade muito grande. E aí, as Conferências de Bispos, no caso da América Latina, o CELAM,
que tem essa Conferência do Episcopado Latino-Americano, através de vários encontros, começando por Medellín em 1968, depois em Puebla, no México, em 79, e outros encontros até chegar em Aparecida em 2007, essas várias reuniões do Episcopado Latino-Americano começaram a entender que era preciso fazer uma teologia a partir da realidade latino-americana. Então, quer dizer, por um lado, se a gente for olhar, né, é lógico que os bispos e os padres, em comunhão com os bispos, precisam olhar para a sua realidade concreta e buscar um meio eficaz ali de exercer a sua pastoral, de evangelizar aquelas pessoas, de
levar aquelas pessoas para Deus e salvar aquelas pessoas. Mas aí entra o grande problema, porque nessas Conferências dos Bispos Latino-Americanos eles começam a usar como meio para fazer a teologia a leitura marxista da realidade. E aí alguns autores vão começar a elaborar esses princípios. Essa semana agora faleceu o padre dominicano Gustavo Gutiérrez. O padre Gutiérrez é considerado o pai da chamada teologia da libertação, que surgiu nesse contexto dos anos 60 e 70 aqui na América Latina. Então, quer dizer, é uma teologia pensada a partir dos problemas da América Latina, problemas como a pobreza, desigualdade, ditaduras.
Exatamente, havia muitas ditaduras militares aqui na América nos anos 60 e 70 por conta da Guerra Fria. Então, sob esse pretexto de impedir o avanço do comunismo, muitos países assistiram a esse fenômeno, né, da subida de militares ao poder. Esse era o contexto. Então, a chamada teologia da libertação começa a pensar a teologia a partir do método histórico-crítico de Karl Marx. Só que aqui nós já temos uma contradição em termos. Por que uma contradição em termos? Pelo seguinte: como que eu vou fazer teologia? Teologia eu tô falando do transcendente, eu tô falando de Deus. Deus
não é material. Jesus sim, Jesus é Deus e homem; Jesus tem matéria. Mas Deus Pai, não. Deus Espírito Santo, não. Não. Então, eu estou falando de transcendente. E mesmo Jesus, tendo matéria, Jesus é transcendente porque existe uma distinção muito clara em Jesus. Existem duas naturezas e duas vontades: a vontade humana e a vontade divina, a natureza humana e a natureza divina. Não existe confusão entre as duas. Ah, tem momentos em que Jesus é mais humano, tem momentos em que é mais divino. Não, ele é completamente humano e completamente divino; não existe confusão. O Concílio de
Calcedônia, lá no começo, nos primeiros séculos da Igreja Católica, definiu isso: as duas naturezas. O Concílio de Calcedônia falou da união hipostática. Em Jesus, existe uma união de duas naturezas: a natureza humana e a natureza divina, sem prejuízo uma da outra. Jesus, ao se fazer homem, ele não deixa de ser Deus. Ele é 100% Deus e, sendo Deus, fazendo-se homem, ele em nada deixa de ser homem, ou é menos homem, menos humano do que qualquer ser humano. Não! Ele é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem. E o Concílio de Calcedônia coloca uma questão interessante que diz
assim: não há confusão entre essas duas naturezas. Isso é muito claro. É muito claro para Jesus, isso era muito claro. Aí vem a teologia da libertação, que pega o método histórico-crítico de Karl Marx, que é um método materialista que faz uma análise do mundo e da realidade a partir daquilo que os nossos cinco sentidos captam. Acontece que Deus não pode ser captado pelos nossos cinco sentidos, entendeu? Então, uma pessoa não vai dizer assim: "Ah, eu estou vendo a Deus." Nós não vemos Deus, é claro, extraordinariamente, né, nos casos de revelação privada, etc. Tá, mas isso
é outra coisa. Ordinariamente, nós não vemos Deus; nós conhecemos a Deus pela fé. Então, não é uma experiência sentimental. Aliás, é até errado, é incorreto, até, dizer "experiência de Deus". Né? Ah, eu fiz uma experiência de Deus. Tá. Tudo bem, né? Às vezes a gente fala isso como uma metáfora, uma comparação. Tudo bem, né? Às vezes a pessoa se converte e fala: "Não, eu tive uma experiência de Deus." Beleza, é uma metáfora. Mas, se a gente for pensar estritamente, a ferro e fogo, não é uma experiência, que você tem. Experiência, experimentar é usar os cinco
sentidos para alcançar. Não é uma experiência; é um conhecimento, é um dom sobrenatural que nós chamamos de fé. Nós acreditamos, entendeu? É um dom sobrenatural, né? E então, o que acontece? Nós temos de ter essa consciência muito clara. Agora, se eu estou falando de Deus, que é o transcendente, como que eu vou explicar Deus usando uma teoria filosófica que é o marxismo, que é uma teoria materialista que só fala desse mundo? Para o materialismo marxista, todas as soluções estão aqui, nesse mundo. Então, quer dizer, se eu vou fazer teologia usando materialismo, eu vou jogar fora
tudo que é sobrenatural. Essa é a consequência lógica da teologia da libertação: é desprezar o milagre, é desprezar a espiritualidade, é desprezar a liturgia. Por quê? Porque nada disso importa. O que importa é a transformação da sociedade. E aí o padre vira um agente de transformação social; o padre é o organizador da comunidade, né? E aí eu não tenho mais igreja, eu não tenho capela, eu não tenho paróquia. Eu tenho comunidade eclesial de base. Ou seja, eu faço uma revolução no campo semântico; eu começo a suavizar o sentido das palavras para diminuir a força delas.
Eu não vou dizer paróquia, eu não vou dizer capela, eu vou dizer uma comunidade, porque aí eu dou uma ideia coletivista eclesial. Eu não falo "igreja", porque "igreja" evoca o passado da Igreja Católica. Então, eu falo "comunidade eclesial". Eu diminuo a força de "base". Eu estou falando do quê? Da sociedade. Eu vou trabalhar na base, que é a ideia dos sovietes lá na União Soviética. O que eram os sovietes? Eram os grupos. Você dividia uma cidade, uma região, em vários sovietes. Vários sovietes. Então, eram comunidades, né? E aí, o que acontece? Vai se instalando uma
interpretação da fé que esvazia o conteúdo da fé. Então, você tem a estrutura da igreja, você tem a hierarquia da igreja, mas você vai corroendo por dentro aquilo que é a essência da igreja. E o que é a essência da igreja? Apresentar a salvação trazida por Nosso Senhor Jesus Cristo, entendeu? E aí você começa a falar de uma salvação política, de uma salvação social, de uma salvação aqui, nesse mundo. Você nivela a um nível, né? coloca as coisas num nível muito rasteiro e não olha para o transcendente, entendeu? Então, esse é o grande problema da
teologia da libertação. E aí isso começa a entrar na própria interpretação dos textos bíblicos, na própria maneira de entender a liturgia e na própria maneira de viver a fé. Existe um princípio muito básico na teologia que é "Lex orandi, Lex credendi", ou seja, como eu rezo, eu creio; como eu creio, eu rezo. Então, se eu creio errado, eu começo a rezar errado. Aí, eu não posso dar fruto; se eu não rezo direito, como que eu vou dar fruto? Se eu não rezo direito, se eu não tenho a fé correta? E aí acontece o quê? Pouco
a pouco eu vou deixando de ter a fé católica, aquela fé universal que sempre foi professada de 2000 anos para cá. E aí eu passo a ter uma fé humana, imanente. É um esvaziamento, entendeu? Vou dar alguns exemplos aqui. Aí você vai a uma missa de Corpus Christi, por exemplo. Geralmente, em Corpus Christi, os textos são os textos ligados à multiplicação dos pães ou os textos que falam da Ceia, a Última Ceia, né, nas leituras de Corpus. Cristo, eu me lembro de uma certa ocasião, e vocês também que estão me acompanhando aí, eu tenho certeza
que já devem ter ouvido isso em alguma homilia, em algum momento. E aí você vai ouvir aquela homilia, você ouve o Evangelho da multiplicação dos pães, e houve aquela homilia dizendo assim: "Ah, tá vendo isso aqui, né? Da multiplicação dos pães. Bom, na verdade, não foi um milagre, né? Jesus não fez com que os pães aumentassem ali e servissem a todo mundo. Não, não foi bem isso. Jesus ensinou a partilha, e Ele pregou e deu um exemplo tão bom que todo mundo se sentou, e aí cada um pegou do pouquinho que tinha e repartiu e
todos comeram e se fartaram porque todos repartiram. Olha que lindo, né? Você vai falando: 'Nossa, olha que explicação, ela tem lógica!' Só que ela é falsa, porque não é isso que o texto evangélico está dizendo, não é isso que os primeiros autores católicos lá do começo, lá na Igreja Primitiva, disseram. Se a gente pegar São Clemente Romano, Santo Irineu, São Gregório Magno, nenhum deles afirma isso, né? Nenhum deles afirma isso. Os primeiros autores cristãos falam do quê? O milagre é a intervenção de Deus, a intervenção de Deus, né? E então quer dizer que você não
pode diminuir a intervenção de Deus. Agora, é claro, você pode falar de partilha, pode, você pode falar que a partilha é algo bom, é algo devido, é algo cristão, sim, você pode. O problema é você dizer que o milagre de Jesus não foi milagre, porque aí você nega a transcendência do Filho de Deus feito homem. Esse é o problema, e também é uma interpretação que estica o texto para fazê-lo caber numa explicação humana, negando o milagre. Entendeu? Então aí está o problema. Então quer dizer: ah, o milagre de Cristo é a partilha? Não! O milagre
de Cristo é um milagre! E o que é o milagre? É a suspensão de uma lei da natureza e uma intervenção direta de Deus. É isso, entendeu? Então é um problema. Ou senão, você vai se confessar. Outro exemplo: você vai se confessar, e uma vez aconteceu isso comigo. Eu entrei para me confessar e falei ali a lista dos meus pecados: "Padre, eu fiz isso, fiz isso, fiz isso, isso, isso, isso, né?" Cada coisa que eu ia falando, ele ia dizendo: "Ah, mas isso não é pecado. Ah, não, mas isso é você, jovem. Ah, não, mas
isso aí, assim, com o tempo você vai ver que, né? Ah, não, mas isso você não pode dar muita importância. Ah, não, mas isso se você for ficar pensando assim, você vai ficar sofrendo, e Deus não quer você sofrendo." Resultado: de todos os pecados que eu falei, que eu me acusei, que a minha consciência me apontava como pecado, ele me diz que nenhum era pecado. Ou seja, é como se eu fosse, né? Eu acho que eu e Nossa Senhora, na análise daquele sacerdote, estávamos no mesmo pé, né? Eu estava ali praticamente imaculado, né? Porque tudo
que eu falei não era pecado. Não era pecado, né? E aí, chegou no fim, ele falou para mim: "Então você vai em paz, vai em paz, e Deus te abençoe." Falei: "O senhor não vai me absolver?" Ele falou: "Não, porque não tem pecado." Eu falei: "Não, mas eu quero absolvição, padre." E aí ele falou: "Ah, eu vou te dar uma benção, então." E ele me deu uma benção; ele não me deu absolvição. Eu saí daquele confessionário e entrei em outro e fui me confessar com outro padre. Aí o outro me absolveu. Mas olha onde que
isso leva! Quer dizer, leva a um relativismo tamanho que não existe o mal, né? Então não existe o pecado pessoal, né? Existe o quê? O pecado social. Na teologia da libertação, ela vem com a ideia de que existem estruturas de pecado. Acontece que a doutrina da Igreja nos ensina que isso não existe, né? Pecado social? Quem confessa o pecado social? O presidente confessa o pecado social? Quem faz penitência do pecado social? Não existe isso! Pecado é algo cometido por alguém que tem nome, endereço e CPF. O pecado é feito por pessoas concretas. O pecado é
a ação do mal e é algo muito concreto. Então essa história de "ah, o pecado social, existem estruturas de pecado na sociedade?" Ué, mas quem cria as estruturas de pecado são pessoas, são pessoas! Então quer dizer que quem criou essas estruturas está cometendo um pecado pessoal, que pode ser somado ao pecado pessoal de vários outros que se juntam para cooperar no mal. Mas isso não é uma estrutura que cai do céu, entendeu? Então é algo concreto. Então, o que essa visão vai causando? Uma relativização do mal, uma negação do inferno. "Ah, o inferno não existe,
o demônio não existe. Isso aí é uma invenção da Igreja. O que existe é o mal no mundo, é a desigualdade." Então vamos acabar com a desigualdade, vamos dialogar. E, né... Aqui, meus caros, olha, eu falo por experiência. Eu tive um reitor de seminário que era o sujeito que mais falava em diálogo, em acolhida, em misericórdia, e era o sujeito do ponto de vista da sua ação pessoal o sujeito mais tirânico que eu já conheci na minha vida. Eu nunca vi uma pessoa que impunha a sua própria vontade através da ameaça, através da chantagem como,
infelizmente, era aquele sacerdote, defensor ferrenho da teologia da libertação, defensor do diálogo, defensor da Igreja aberta, mas que criticava o poder do Papa, criticava o poder dos bispos, mas dentro do seminário fazia valer o seu poder absoluto de maneira tirânica. Então, entenderam onde a coisa vai? É uma coisa, assim, absurda de se ver. Então, isso ainda, infelizmente, produziu esses frutos podres. Árvore, dizia Jesus, vocês conhecerão os frutos. E aí, por isso, quando nós falamos aqui do Frei Clodovis Boff, é importante olhar o que o Frei diz sobre a teologia da libertação. Ele é uma pessoa
que defendia a teologia da libertação, né? Defendia e que depois mudou totalmente de postura porque ele reconsiderou. Ele foi honesto intelectualmente e reconsiderou aquilo que ele defendeu, né? Então, quando nós promovemos uma relativização do sagrado, negamos o milagre, negamos a autoridade do Papa, a autoridade do magistério, a autoridade da tradição, e queremos fazer uma interpretação usando como instrumento para isso o materialismo histórico. Isso é uma extrapolação teórica; do ponto de vista teórico, está errado. Como que eu vou interpretar o transcendente com aquilo que é imanente? Agora, se eu vou usar o imanente — aquilo que
é desse mundo — e imanente é isso, né? Aquilo que é desse mundo. Se eu vou usar o imanente e para mim tudo está aqui nesse mundo, todas as respostas estão aqui, significa que eu não preciso do transcendente, né? Eu me lembro de uma aula que eu tive com um sacerdote que estava ensinando. Ele disse que a ressurreição de Jesus não deve ser entendida como uma retomada da vida. Ah, ele morreu, ele retomou o corpo e saiu vivo? Não, mas é que os ensinamentos de Jesus — olha a heresia! — ele dizia assim pra nós,
numa aula dentro do seminário, que os ensinamentos de Jesus foram tão profundos, tão pujantes, né? Tinha uma potência tão grande que os seguidores de Jesus se reuniam para se lembrar dele. Então, não é que ele ressuscitou de verdade, mas ele ressuscitou na medida em que aquilo que ele ensinou continuou vivo e continuou sendo transmitido pelos seus seguidores. Então a ressurreição de Jesus está em cada um que acredita nele. Olha que absurdo! Isso é um disparate, isso, né? É herético. É a negação daquilo que está na Sagrada Escritura e na tradição da Igreja; é um esvaziamento
da fé. São Paulo fala: se Cristo não ressuscitou, nós somos os homens mais dignos de dó na face da terra. Porque o fundamento da fé católica, da fé cristã, é a ressurreição de Jesus, entendeu? Então, o que acontece? A teologia da libertação vai esvaziando o conteúdo da fé. E aí, por que que a liturgia pode ser rezada de qualquer jeito? Pode ser feita de qualquer jeito? Porque não é importante. A liturgia é o encontro da comunidade; a liturgia não é feita para Deus. Então, por isso que o paramento pode ser de qualquer jeito, a toalha
do altar pode ser de qualquer jeito, a homilia é feita de qualquer jeito, é tudo de qualquer jeito. Por quê? É humano, é uma ação humana. Não se vê como algo para o louvor e a glória de Deus, entendeu? Lex orandi, lex credendi: do jeito que eu creio, eu rezo, e do jeito que eu rezo, eu creio. Quem crê errado, reza errado. Quem reza errado, crê errado, entendeu? Então, é isso que vai acontecendo. E se você forma seminaristas com essa mentalidade, esses seminaristas vão querer formar o povo nessa mentalidade. Aí, o que acontece? Eles vão
relativizando, vão relativizando tudo. Então, nada é pecado. Não, o que vale é o encontro da comunidade. O que vale é fazer o bem e fica tudo muito solto. Mas, como conclusão aqui dessa nossa conversa, dessa noite, nós devemos tirar o seguinte: se a Igreja tivesse sempre zelado — e isso nós, leigos, podemos fazer — se a Igreja zelar por viver a caridade de Cristo, o amor de Cristo, do jeito que Jesus ensinou, essa caridade de Cristo necessariamente vai se refletir no bem feito ao próximo. E quando a gente olha pra história da Igreja Católica, a
gente vai ver que a Igreja sempre se preocupou com o pobre. A teologia da libertação — Gustavo Gutierrez, falecido — foi ele que criou, que cunhou a expressão "opção preferencial pelos pobres". Mas a gente não precisaria de nada desse discurso marxista de insistir, porque a teologia da libertação faz o quê? Ela coloca o pobre em primeiro lugar. Mas na verdade, o que a Igreja Católica sempre fez foi o contrário: ela sempre colocou Cristo em primeiro lugar, e nós, na Igreja Católica, sempre amamos e ajudamos os mais pobres por causa de Cristo. Então, é Cristo que
vem primeiro e o pobre vem depois. Cristo é a razão da ação do católico, e o pobre é o destinatário dessa ajuda, desse amor, dessa caridade, porque amamos a Cristo. Quantos hospitais, quantos orfanatos, quantas obras sociais a Igreja Católica sempre fundou, sempre criou! Quantos e quantos santos! Então, esse negócio de "opção preferencial pelos pobres", a teologia da libertação do jeito que fala, parece que a Igreja nunca se preocupou com os pobres antes do surgimento da teologia da libertação. É falso! A Igreja sempre fez isso, só que a Igreja fazia por causa de Cristo. E agora,
com a teologia da libertação, a ideia é que a Igreja faça isso como justiça social. Só que justiça social uma ONG pode fazer, não precisa de Igreja, né? Quando nós falamos de Igreja, é para salvar o homem todo. Se a gente olhar os grandes santos, olha São Vicente de Paulo, as obras que esse homem fundou. O que São Vicente estava preocupado? Em salvar o homem em dois aspectos: São Vicente queria salvar o corpo, alimentando, cuidando, tirando do frio, mas também queria salvar a alma. Então, a Igreja sempre quis isso. Só que agora a teologia da
libertação quer o quê? O corpo, mas não a alma. Não se fala da salvação da alma. E eu fecho aqui nossa conversa, comentando um fato que eu tomei conhecimento. Eu estive no nordeste esse ano, palestrando numa... Grande cidade do Nordeste, e um sacerdote me relatou esse fato. Esse fato é recente e eu acho esse fato, no mínimo, sintomático. É um fruto da teologia da libertação. Esse sacerdote me contou que o bispo daquela diocese, durante a Semana Santa, resolveu celebrar o Lavapés num presídio da cidade sede da diocese. Muito bem, ele foi até lá; chegou lá
paramentado, o senhor bispo, a celebrar o Lavapés com os irmãos presidiários. Ali, muito bem, assim que o senhor bispo entrou, um presidiário, de dentro de uma das celas, chamou e disse assim: "Padre, né?", sem distinguir, falou: "Vocês vão celebrar, fazer alguma coisa aqui?". Falou: "Sim, sim, nós viemos". E aí ele falou: "Nossa, a gente fica até feliz quando a gente vê vocês, porque vocês são da Igreja Católica, não são?". E aí o bispo disse: "Sim, somos da Igreja Católica". Ele falou: "A gente fica feliz quando a gente vê o pessoal da Igreja Católica". E o
bispo, né, ficou feliz e falou: "Nossa, né, que bom que vocês ficam felizes quando vem gente da Igreja Católica". E o presidiário, na maior inocência, disse assim: "É porque os católicos trazem para nós advogados e os evangélicos trazem Jesus, a palavra de Deus. Que vergonha, que vergonha, né?". Então, você veja o que a teologia da libertação produziu naquela diocese, né? Quer dizer, os católicos vão à cadeia para levar advogado. Por quê? É uma visão da teologia da libertação: "Nós vamos resolver o problema aqui, neste nível rasteiro desse mundo". Não estamos falando em salvação da alma.
E olha o que o presidiário disse lá, na maior inocência: "Porque os evangélicos vêm nos trazer a palavra de Deus, vêm trazer Jesus". Por que o número de igrejas evangélicas no Brasil aumentou absurdamente nos anos 80 e 90? Por conta da teologia da libertação, as pessoas queriam ouvir falar de Deus. Tem um canto antigo, né, um canto católico que falava: "Queremos Deus, queremos Deus", né? E de fato, né? O que as pessoas querem? As pessoas querem Deus. Se a Igreja Católica não cumpre a sua missão, elas vão buscar em outros. Então, meus caros, né, essa
aula, essa fala aqui hoje, foi mais para introduzir aqui a questão. Essa visão teológica foi corrigida pela Santa Sé em 1984. O então cardeal Hinger publicou uma instrução corrigindo a teologia da libertação, ou seja, algumas análises da teologia da libertação podem até ser utilizadas e consideradas corretas, mas algumas outras análises levam a um esvaziamento da fé. Esses documentos do episcopado da América Latina foram caminhando muito nesse sentido de colocar o pobre muito no centro. O documento que corrigiu isso foi o documento de Aparecida, em 2007, quando o Papa Bento XVI veio ao Brasil, ocasião em
que, inclusive, ele canonizou o Frei Galvão. Ele esteve lá em Aparecida, e o documento de Aparecida recolocou as coisas no seu devido lugar. O que o documento de Aparecida vai dizer, né? O documento de Aparecida fala muito do discipulado. Somos discípulos de Cristo. Então, Cristo é o fundamento. E aí, tudo que nós fazemos, inclusive o que fazemos para o pobre, é por causa de Cristo, pois nós amamos a Cristo. Nós fazemos isso pelos nossos irmãos mais empobrecidos, né? Então, essa é a ideia. O documento de Aparecida, de certa forma, corrigiu essa visão um pouco distorcida
da coisa, né? E hoje, em dia, em que pé está a teologia da libertação? Muita gente fala assim: "Ah, os teólogos da libertação estão velhos e estão morrendo". Mas a teologia da libertação não está morrendo, né? Porque, em geral, os seminários, mesmo que às vezes você tenha lá um reitor mais ortodoxo, os professores que vão lecionar nas faculdades de teologia, em geral, eles vão ter muito desse liberalismo, muito de teologia da libertação, muitos desses desvios. Mas, graças a Deus, hoje em dia nós temos uma vantagem: hoje em dia existe um acesso a bons materiais, como
não havia antes. Então, por exemplo, eu me lembro, na minha época em que eu estudei lá no seminário, a gente não tinha tanto acesso a tantas coisas boas. O que me preservou bastante, graças a Deus, é que eu desde a infância, desde a adolescência, eu tive muito acesso a boas leituras e, sobretudo, eu sempre li muito as vidas dos santos. Então, quando eu começava a olhar para as vidas dos santos, falava: "Opa, pera lá, mas se esse santo, que é canonizado, é venerado pela Igreja, ele tem esse posicionamento e essas posturas teológicas estão afirmando o
que está errado, são essas posturas teológicas aqui. Porque se a Igreja sempre acreditou nisso aqui e agora, de uns anos para cá, está dizendo outra coisa, então o que está errado é o que está sendo ensinado agora aqui". Então, isso, graças a Deus, me afetou menos, né? Não que não tenha afetado, que afeta. Você começa a ter análises totalmente erradas. Eu levei, depois, um certo tempo para estudar e colocar as coisas no lugar de novo. Mas, hoje, graças a Deus, muitos seminaristas têm esse acesso a bons cursos, têm acesso a bons livros, à literatura, à
republicação de bons livros católicos, hoje em dia, por várias editoras. É uma iniciativa muito boa. Os canais, né, do YouTube, como a gente está aqui... Nós estamos aqui com quase 700 pessoas, conversando desse tema que, há 20 e tantos anos, atrás, eu entrei no seminário há 25 anos. Então, quer dizer, lá naquela época a gente não tinha essa possibilidade, a gente não tinha nem essa opção de discordar, né? Porque parecia uma linguagem hegemônica. Hoje em dia a gente já vê que essa bolha foi furada e os leigos, os fiéis leigos estão entendendo e estudando. Conhecendo
cada vez mais como que esse problema todo aí se formou, então o que nós podemos tirar de conclusão aqui dessa conversa é que houve um dano produzido por essa visão que é uma visão imanente materialista, que quer resolver tudo aqui nesse mundo, mas faltou a visão transcendente. E aí nós temos que tomar um cuidado de não cair no outro extremo, que é o extremo de abandonar totalmente o imanente e ficar só no mundo espiritual, aí também tá errado, entendeu? Porque algumas formas de espiritualidade católicas, hoje em dia, começam a cair nisso aí. Então, o pessoal
fica muito falando de crise da igreja, disso, daquilo, e lê livro disso, lê daquilo, mas não dá uma catequese na paróquia, não entra numa conferência Vicentina para ajudar a montar cestas para as famílias carentes, não ajuda o seu padre na sua paróquia, na sua capelania, onde você está. Então as pessoas começam a cair de um extremo para o outro: o extremo da teologia da libertação, onde é só fazer, fazer, fazer, e aí às vezes caem no extremo do rezar, rezar, rezar, pensar, pensar, pensar, sem fazer nada, sem fazer caridade nenhuma, sem ajudar ninguém. São os
dois extremos. Qual que é o equilíbrio para a vida de um católico leigo ou para a vida de um sacerdote, de um religioso ou de uma religiosa? O equilíbrio, o equilíbrio está no quê? Para um leigo, por exemplo, está sim em rezar bastante, em viver os sacramentos de maneira séria, em ler, conhecer sobre a sua fé, mas também em fazer apostolado. Nós temos de fazer algum apostolado, um que seja. Quantos e quantos católicos, hoje em dia, criticam a catequese? "Ah, porque a catequese é muito ruim, é deficitária." Ótimo! Então, se você estuda, se conhece, se
ofereça para o seu pároco; eu tenho certeza que o seu padre vai precisar. Aí você vai lá e dá a catequese. Né? Eu, esse ano, que eu não estou dando, não tô com turma de catequese, mas eu dei catequese anos e anos aqui. Né? Então, eu não deixei de dar catequese, de ter turmas de crisma, porque é apostolado. É apostolado, você tem que fazer algo de concreto, ajudar. Ah, mas eu não posso, eu tenho os meus horários tudo muito atrapalhados. Então tá bom, tem realmente às vezes suas obrigações de família, de horário, que não te
permitem. Então você vai fazer o quê? Reze e contribua, de preferência financeiramente, com alguma obra que vai fazer aquilo que você não pode. Então você contribui, você fala: "Puxa vida, eu não posso fazer, mas eu vou contribuir aqui com os Vicentinos, eu vou contribuir com essa pastoral, vou contribuir com um canal de formação, sei lá". Você vai contribuir com alguma obra, porque é uma forma de apostolado, entendeu? É uma forma de apostolado. Então, eu devo conhecer, eu devo rezar, mas eu devo fazer também alguma coisa. Esse é o equilíbrio. O sacerdote é a mesma coisa.
O sacerdote é o administrador da casa de Deus, ele deve administrar os sacramentos, mas ele deve também cultivar uma vida interior muito grande. O padre, naturalmente, já faz muito, porque as obrigações do padre já são muito extensas, mas ele deve também entender que a oração faz parte das suas obrigações sacerdotais, né? E que rezar é um bem para o povo dele. Uma religiosa, a mesma coisa. Então nós devemos buscar o quê? Esse equilíbrio. E devemos também pensar no seguinte: "Ah, mas às vezes a gente vai conhecendo essas coisas, a gente começa a falar: 'Nossa, mas
tal padre é TL, tal padre não confessa bem, não sei o que...'" Muito bem, muitos padres foram formados assim, infelizmente. Foram formados assim. Muitos acreditam que isso é um bem e acham que estão fazendo um bem. Então, o que que a gente pode fazer para mudar isso? Em primeiro lugar, nós devemos rezar e nos sacrificar. O que que eu quero dizer? Nos sacrificar, fazer penitência, oferecer um jejum de vez em quando, oferecer uma penitência de ficar sem comer um doce, sem tomar um café, pelas intenções da santificação do clero, para que Deus chame muitas e
santas vocações. É dever nosso fazer isso. E aí eu digo para vocês: às vezes nós que estamos criticando a teologia da libertação, nós caímos no mesmo erro da teologia da libertação, porque nós começamos a enxergar as coisas só nesse mundo, a gente perde a visão transcendente. A gente começa a pensar: "Ah, não tem jeito, tá tudo perdido." Onde que tá a nossa visão transcendente? Eu tenho de ter fé! Minha oração, ela é ouvida, ela tem um efeito, ela tem um efeito. Nenhuma oração fica perdida, esquecida. Nenhuma! Então, meus caros, tenhamos isso em mente: nós podemos
mudar a igreja através das nossas orações, através das nossas penitências, mas também podemos mudar através da nossa caridade. Amemos os nossos sacerdotes como eles são, apesar às vezes da má formação, apesar da confusão que está na própria cabeça e no próprio coração deles. Amemos os nossos sacerdotes, rezemos pela igreja, e Deus, que é o fundador, né? Jesus é o fundador da igreja, ele prometeu: "As portas do inferno não prevalecerão." E não é só a teologia da libertação que é problema; existem outras correntes de pensamento, existem outras tendências dentro da igreja. Isso sempre aconteceu na história
da igreja. Mas nós temos uma confiança, uma certeza total e absoluta: nada disso acabará com a igreja, porque a igreja é divina e a igreja somos nós. Então façamos a nossa parte. A nossa parte é muito pequenininha; nós somos de tamaninho, mas várias parzinhos. E aí, certamente, Jesus chamará das nossas famílias, Jesus chamará dentre os nossos filhos os próximos que serão padres, que serão bispos, e que, se forem bem educados por nós, se forem bem formados por... Nós, se se tornarem sacerdotes, bispos, religiosos e religiosas, farão muita diferença. Tá bom, meus caros, é isso, né?
Nós temos que voltar nesse tema aqui. Eu vou aqui até fazer um compromisso com vocês: eu vou ver a agenda dele, eu vou conversar com o padre Leandro Razeira, que foi quem organizou aqui este livro junto com Frei Clodovis Bof. Aliás, este livro, se você olhar o primeiro comentário do chat, tá lá o link da minha livraria. Na livraria Rafael Ton, tem este livro aqui, que está com desconto, então, né, aproveitem e adquiram lá. E, adquirindo esse livro, você contribui com o canal aqui, né? E eu tenho certeza, aliás, né, de que tudo aquilo que
eu vou colocando aqui, de alguma maneira, esteja ajudando vocês aí nas suas análises, no seu conhecimento. Então, eu peço encarecidamente que vocês curtam esse conteúdo, porque isso aqui ajuda bastante o canal. O YouTube entende que há uma relevância nesse conteúdo e distribui melhor. E também, né, se você quiser contribuir diretamente com o canal, na descrição desse vídeo tem lá a chave PIX, que você pode fazer uma doação direta pro canal, ou pode adquirir qualquer material da livraria. Adquirindo qualquer material da livraria, você também contribui aqui com o canal. Mas o meu compromisso não é esse.
É outro: eu vou convidar o padre Leandro Razeira para que venha até aqui conversar com a gente aqui no canal sobre a teologia da libertação. E aí a gente vai continuar essa conversa. Então, meus caros, mais do que apenas criticar os males produzidos por essa forma de teologia, o mais importante é entender que o problema existe e entender de onde ele veio. Então, existe um caminho histórico para chegar à formação desse modelo de teologia, mas existe uma solução. E a solução é conhecer aquilo que a Igreja sempre acreditou: conhecer a tradição da Igreja, conhecer o
magistério e conhecer as Sagradas Escrituras. Esses três pilares sustentam a nossa fé. O conhecimento destes três pilares vai nos blindar de qualquer visão que seja contraditória àquilo que nosso Senhor Jesus Cristo quis para sua Igreja. Deus nos abençoe, meus caros. Amanhã, cedinho, às 7 da manhã, nós temos a reflexão, a meditação diária, a partir dos textos de Santo Afonso de Ligório. Agradeço a vocês que ficaram aqui nesta noite de sexta-feira. Passamos de 700 pessoas ao vivo, um prazer tê-los aqui. Se esse conteúdo ajudou você, tenho certeza que pode ajudar outras pessoas também. Compartilhe esse conteúdo
também com outras pessoas que podem se interessar, né? E o nosso objetivo aqui é um só: conhecer mais sobre a nossa Igreja para amar mais a nossa Igreja. O objetivo aqui não é apontar dedo, não é criticar isso ou aquilo, mas o objetivo é conhecer o problema, entender o fundamento do problema, evitar o problema e, sobretudo, fazer aquilo que nós podemos fazer. Conhecer isso, a gente pode através do estudo, rezar e amar a Igreja. E nós fazemos isso por amor, não é simplesmente para criticar, não é simplesmente para apontar o dedo aqui ou ali, não.
Nada disso! Nós fazemos isso porque nós somos membros desse corpo místico. E essas pessoas que são adeptas da teologia da libertação, que estão dentro da Igreja, são nossos irmãos, merecem o nosso amor e as nossas orações, assim como Frei Clodovis Bof entendeu e corrigiu a sua visão. Que também outros tantos possam entender e corrigir a sua visão, né? E que a gente possa fazer aquilo que Jesus pediu, né, na sua oração sacerdotal: "Pai, que todos sejam um." Deus abençoe Frei Galvão, rogai por nós. Abraço e até amanhã cedo, se Deus quiser. Tchau, tchau!
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