O conflito entre Israel e Palestina é muito complexo. Durante décadas, essa disputa causou dezenas de milhares de mortes e milhões de refugiados. E transformou o Oriente Médio em um barril de pólvora que está sempre à beira de explodir.
Mas por que israelenses e palestinos lutam? Eu sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e adianto que a resposta não é simples. Por isso, dividimos a resposta em 3 vídeos.
A origem do conflito e as fronteiras, os assentamentos judaicos e a questão de Jerusalém. Vamos começar pelo início. Para entender essa história, é preciso voltar no tempo, até o início do século 19, quando o sionismo se espalhou pela Europa.
O principal objetivo desse movimento nacionalista era a criação de um Estado para todos os judeus do mundo, que acabaria com milênios de perseguição e exílio. O movimento apareceu em parte como uma resposta ao anti-semitismo que estava crescendo pela Europa naquela época. Um anti-semitismo que teve sua expressão máxima e brutal com o Holocausto, durante a Segunda Guerra Mundial.
Foi quando cerca de seis milhões de judeus foram exterminados pelo estado nazista. E onde eles queriam criar esse estado judeu? Havia diferentes opções: Uganda, Argentina ou mesmo uma região da Sibéria chamada Birobidzhan (Birobidjan), na fronteira entre a Rússia e a China.
E havia partidários, é claro, da criação de um Estado no território onde se situara o reino de Israel histórico, na área geográfica conhecida na época como Palestina Quero dizer, aqui: Nesta faixa de terra de cerca de 400 km de extensão entre o Mar Mediterrâneo e o vale do rio Jordão. E qual seria o problema? Bom, esta região não estava vazia e é considerada sagrada não apenas pelos judeus, mas também por muçulmanos e cristãos.
Além disso, quando a criação deste Estado judeu começou a ser considerada, essa área pertencia ao Império Otomano. E, apesar de existir uma pequena comunidade judaica lá, a população era predominantemente árabe. Então aconteceu algo que mudou tudo: a Primeira Guerra Mundial.
No final da chamada Grande Guerra, o Império Otomano foi derrotado e se desintegrou. As potências européias que venceram a guerra dividiram entre si vários de seus territórios. Entre outras partes do Oriente Medio, os britanicos passaram a controlar a região da Palestina.
Isso é importante, porque naquela época o governo britânico deu um passo fundamental em apoio à causa sionista: a Declaração de Balfour. Uma carta em que, pela primeira vez, o governo britânico apoiou a criação de "um lar nacional para o povo judeu" na região da Palestina. Mas deixando claro o seguinte: "nada deve ser feito que possa prejudicar os direitos civis e religiosos das comunidades não-judias na Palestina".
Ou seja: os direitos dos árabes e de outras etnias deveriam ser respeitados. Mais tarde veremos por que os árabes não se sentem exatamente respeitados. O fato é que, nas décadas de 1920 e 1930 milhares de judeus se estabeleceram nessa região.
E houve tambem o êxodo de quem conseguiu escapar ou sobreviveu ao Holocausto nos anos seguintes. Logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, os judeus que viviam na Palestina somavam cerca de 600 mil. Este número representava cerca da metade da população árabe naquele momento.
E logo as tensões entre as duas comunidades aumentaram. Para resolver a situação e buscar uma possível convivência, em 1947 a ONU propôs um plano. Em que ele consistia?
Bem, na criação de dois estados independentes: um árabe e o outro judeu, enquanto Jerusalém teria um regime especial. Os judeus que viviam lá aceitaram a oferta, mas os palestinos não estavam dispostos a ceder seu território. O plano da ONU foi aprovado, mas nunca foi implementado.
E detonou uma sucessão de eventos que mudariam a história. Uma data se destaca: 14 de maio de 1948. Duas coisas aconteceram nesse dia.
O chamado mandato britânico da Palestina encerrou oficialmente: o governo britânico havia informado meses antes que concordava com o plano de partilha da ONU, mas que não iria implementá-lo, marcando uma data para a saída. Também foi quando o líder judeu David Ben-Gurion proclamou o estabelecimento do Estado de Israel. No dia seguinte, cinco países árabes vizinhos declararam guerra ao recém-criado país e invadem o novo estado judeu.
Estamos diante do primeiro conflito entre árabes e israelenses. Após um ano de batalhas, Israel não apenas vence a guerra, mas também expande seu territorio - e ocupa a parte ocidental de Jerusalém. Enquanto isso, a vizinha Jordânia ocupa a Cisjordânia e a parte oriental de Jerusalém.
O Egito fica com Gaza. Os palestinos, após a saída dos britânicos e com o fim da guerra, continuam sem um país. Essa guerra terminou 70 anos atrás, mas teve duas consequências que persistem ainda hoje.
A primeira é o grande número de pessoas desalojadas. Isso aconteceu com pessoas nos dois lados do conflito, mas o problema afetou principalmente os árabes que viviam em áreas que passaram a ser ocupadas por forças israelenses. Estima-se que 750 mil palestinos tiveram que fugir para outras áreas da região ou para países vizinhos, especialmente a Jordânia.
Os palestinos chamam esse êxodo de Nakba, que em árabe significa "destruição" ou "catástrofe". E marcam a data justamente no dia da criação do Estado de Israel. Hoje, há mais de cinco milhões de refugiados palestinos, filhos e netos dos que foram deslocados na década de 1940 , segundo a ONU.
A segunda consequência que perdura é a divisão do território palestino em dois: a Cisjordânia, que inclui Jerusalém Oriental, e a Faixa de Gaza. Ou seja, foram divididos em dois territorios, sem ligação por terra entre eles. Alguns anos após a primeira guerra entre árabes e israelenses, uma crise no canal de Suez causou outro confronto militar em 1956.
Desta vez entre Egito e Israel, que teve o apoio do Reino Unido e da França. Após 9 dias de conflito, as tropas de Israel, França e Reino Unido se retiraram do território egípcio e as fronteiras permaneceram como estavam. Até junho de 1967, quando ocorreu o terceiro conflito, conhecido como Guerra dos Seis Dias.
Que durou apenas seis dias mesmo - e no final Israel ocupou a Cisjordânia, incluindo a parte oriental de Jerusalém, Gaza e a Península do Sinai, que pertencia ao Egito. A questão de Jerusalém é um caso à parte, também bastante complexo, que vai ser tratada no terceiro vídeo dessa série. Bom, o último conflito dessa série de disputas internacionais entre árabes e israelenses foi a Guerra do Yom Kipur, que em 1973 colocou o Egito e a Síria contra Israel.
A guerra durou 20 dias, mas suas consequências se estenderam por anos e levaram a um evento muito importante para a região: em 1978, o Egito se tornou o primeiro país árabe a assinar a paz com Israel - nos Acordos de Camp David. Dessa maneira, o Egito recuperou o Sinai, mas renunciou à Faixa de Gaza. Apenas a Jordânia, além do Egito, assinou um tratado de paz com o Estado judeu.
Esse foi um ponto de inflexão que também marcou o relacionamento de Israel com os outros países árabes. Até hoje, os outros Estados árabes da região, além do Irã, não reconhecem o Estado de Israel e consideram o território sob ocupação ilegal. No fim das contas, os Acordos de Camp David foram muito importantes porque marcaram o fim da guerra aberta entre Israel e os Estados árabes vizinhos.
E o que isso significa? Que a partir daquele momento o conflito se concentrou não mais na luta entre os Estados árabes vizinhos, de diferentes nacionalidades e Israel, mas na luta entre palestinos e israelenses. Até hoje Gaza e Cisjordânia estão em parte sob controle militar de Israel e, em parte, sob a administração da Autoridade Nacional Palestina e do Hamas, que desde 2007 controla Gaza.
E isso nos leva ao próximo vídeo: sobre os chamados colonos judeus. Ou seja, habitantes de assentamentos israelenses em terras palestinas ocupadas e o papel dessa ocupação no conflito. Para vê-lo, clique aqui ou no link da descrição.
Obrigada e até a próxima!