De 1850 a 1913, a Amazônia era a única fonte de borracha de alta qualidade no mundo. Por 63 anos, o mercado mundial era dominado por esta região. Até que a produção gerada por milhares de sementes contrabandeadas do Brasil e plantadas nas colônias asiáticas da Inglaterra ultrapassou a venda da chamada borracha natural, da nossa seringueira nativa.
Olá, amigos da História. O aventureiro inglês Henry Wickham foi o homem que roubou, atenção, 70 mil sementes de seringueira amazônica, bem debaixo do nariz dos brasileiros. E que ajudou a acabar com o ciclo da borracha do nosso país.
É claro que, antes dele, outros estrangeiros já haviam tentado, mas só ele conseguiu essa proeza em um dos casos de biopirataria mais lucrativos e bem-sucedidos da História. Já a partir de 1827, o Brasil começou a exportar a borracha, matéria-prima para a indústria mundial. O crescimento da exploração das seringueiras no Amazonas exigia muita mão de obra e atraiu imigrantes, principalmente nordestinos.
E aí houve um aumento da população, que pulou de 3 mil para 50 mil habitantes em poucas décadas. O que também levou desenvolvimento e prosperidade para a região Norte do país. Em Manaus, considerada então a "Paris dos Trópicos", o majestoso Teatro Amazonas, de 1896, é uma das construções que simbolizam as riquezas geradas na região.
Naquela época, até as ruas ao redor do teatro foram calçadas com tijolos de borracha, para que o barulho do lado de fora, do tráfego de carruagens, fosse abafado e não atrapalhasse os espetáculos para elite, que eram apresentados lá dentro. Em 1906, o Brasil exportava mais de 80 mil toneladas de látex. No mundo, a nossa borracha era usada principalmente nos moderníssimos aros pneumáticos, ou seja, os pneus.
Os Estados Unidos consumiam de setenta a oitenta por cento da borracha mundial, a maior parte ia para a indústria automobilística. No início do século 20, o próprio Henry Ford adquiriu uma extensa área de floresta ao longo do rio Tapajós, no Pará, para construir uma cidade norte-americana no meio da selva amazônica. E plantar mudas de seringueiras na Fordlândia, um sonho agroindustrial que não prosperou porque as árvores do Ford foram plantadas próximas demais umas das outras.
E para fazer esse cultivo, uma parte da mata virgem ao redor também foi derrubada. Tudo isso favoreceu a alteração no clima e também o ataque da praga de ferrugem. Aqui no canal já tem um vídeo só sobre a cidade fantasma que virou a Fordlândia depois, com o abandono do local.
E você pode conferir no link aí em cima. Mas, antes disso, já havia ocorrido algumas expedições secretas de americanos, explorando a bacia amazônica na busca de prováveis lugares para o cultivo de seringais. A borracha enriqueceu alguns poucos e mudou o destino de várias nações, onde pessoas foram escravizadas para trabalhar na produção do látex.
É o caso de países da África como o Congo Belga, onde houve a aclimatação da seringueira brasileira. Também tem um vídeo aqui no canal sobre esse período do sanguinolento rei Leopoldo. E é só clicar aí no link.
A seringueira, árvore gigante que pode atingir até 30 ou 40 metros de altura, é originária da bacia hidrogáfica do Amazonas. E é da extração da seiva, do látex coletado no tronco, que sai a matéria-prima para a fabricação da borracha. Tida como árvore sagrada pelos índios das tribos que se consideravam guardiãs das seringueiras.
Portanto, o Brasil, sendo a terra natal dessa árvore, onde ela cresce naturalmente sem precisar plantar, chamou logo a atenção de vários aventureiros que tentaram, sem sucesso, fazer com que ela produzisse fora daqui. Só que onde muitos falharam, o explorador e botânico inglês Henry Wickham foi mais esperto. Conseguiu contrabandear uma espécie de planta que só existia no Brasil e acabou com o monopólio da borracha em nosso país.
Primeiro ele parece ter tido um sonho de produzir a borracha. E se mudou para a selva amazônica com toda a família, mas amargou a morte de vários parentes por causa da malária. Ele mesmo foi atacado por insetos e chegou a se perder na floresta.
Suas plantações também teriam dado errado em duas tentativas. Passou pela Nicarágua, Venezuela e, enfim, chegou ao Brasil. Por aqui, passeava pela floresta com o pretexto de procurar penas de aves.
Penas coloridas e chamativas para o comércio da moda feminina, para enfeitar os chapéus das damas. Mas tudo indica que ele fazia mesmo era espionagem a serviço da Coroa Britânica da rainha Vitória, a partir de Santarém, no Pará. Diz a lenda que o inglês levou o sementes escondidas até em solados falsos dos sapatos, enganando as autoridades portuárias.
E que ele ainda se gabava disso, de ter feito tudo na frente, na mira dos canhões brasileiros. Esperava chegar a noite para guardar as sementes em um navio cargueiro que havia sido sequestrado quando fazia a viagem de Liverpool a Manaus, uma sorte aí que ele deu. E em maio de 1876, o Henry Wickham partiu levando secretamente 70 mil sementes de seringueira, que ele transferiu para o porão de um transatlântico chamado Amazonas, e que foram entregues ao Jardim Botânico Real, nos arredores de Londres.
Desse total, apenas duas mil sementes conseguiram germinar. Mas foi o suficiente para fazer um estrago na economia da região amazônica naquela época. As mudas da planta foram enviadas para as colônias do Império Britânico na Ásia, principalmente a Malásia, onde foram transplantadas.
E daí essas seringueiras se multiplicaram e acabaram superando a produção brasileira. Foi o início do fim do chamado ciclo da borracha no Brasil. Pelo feito, Henry Wickham ficou famoso, mas teve um destino não muito honroso.
Considerado um picareta pelo diretor do Jardim Botânico, o inglês foi impedido de realizar o intento de coordenar essas plantações nas colônias asiáticas, e daí ficar muito rico. Recebeu apenas 700 libras e depois vagou pelo mundo como um condenado, até ser abandonado pela esposa na Nova Guiné, numa região habitada por canibais. Somente 30 anos depois, quando as árvores nascidas daquelas duas mil sementes germinadas começaram a produzir o látex, é que ele conseguiu provar que estava certo.
E virou o "Sir" Wickham, cavaleiro da rainha. Se você quiser saber mais detalhes sobre esse caso, pode ler o livro "O ladrão no fim do mundo", um trabalho de pesquisa importante do jornalista americano Joe Jackson. E é isso, pessoal.
Espero que vocês tenham gostado desse vídeo. Por favor, se inscrevam, acompanhem o canal para mais novidades e até a próxima com uma História a mais.