Crises, recessões, colapsos financeiros, tudo isso são riscos cotidianos com que temos que conviver na complexidade da economia global atual. Já tivemos crises do petróleo, crises ocasionadas por guerras ou pandemias, bolhas estourando em diversos mercados, e uma série de desastres econômicos que nos fazem perguntar como tudo isso ainda tá de pé. Mas poucas foram tão assustadoras pros economistas quanto uma das mais recentes: a Recessão de 2008 Mesmo que você fosse alguém que não entendesse tanto de economia na época, com certeza você deve lembrar que esse era o único assunto que dominava completamente os jornais, dia e noite.
E não é à toa, a Grande Recessão começou em 2008, como uma das mais graves crises econômicas da história. O temor, na época, era de que as pessoas estivessem vivendo uma nova grande depressão, se desenrolar bem na frente dos seus olhos. O marco inicial da crise aconteceu em setembro de 2008, quando um dos mais tradicionais bancos de Wall Street, com mais de 150 anos de funcionamento, simplesmente colapsou e declarou falência.
Dez anos após a crise já haviam sido produzidos mais de 15. 500 artigos e 850 livros escritos exclusivamente sobre a crise, sendo, sem dúvidas, um dos episódios mais estudados pelas ciências econômicas mundiais. Se na época você não entendeu muito bem qual era o grande problema daquilo tudo, hoje é o dia de você ver a verdadeira gravidade daquele desastre financeiro, e como podemos ter passado muito perto de uma catástrofe econômica global.
Hoje, vamos mergulhar de cabeça em um dos episódios mais importantes do século 21: A Grande Recessão que impactou o mundo. . Apesar de ter atingido o mundo todo, a crise de 2008 aconteceu principalmente nos Estados Unidos, tendo origem mais especificamente nos corredores de Wall Street.
O grande estopim dessa crise foi o mercado imobiliário norte-americano, mas pra entender o que exatamente aconteceu por lá, precisamos voltar pra década anterior, os anos 90, quando a economia americana fervia e parecia imparável. Nesse período, a política americana facilitava o acesso a crédito e permitia o surgimento de instituições financeiras massivas, principalmente quando a lei Glass-Steagall foi revogada. Existe uma parte de especialistas que defendem que a revogação dessa lei foi essencial para o surgimento da crise e não é difícil encontrar artigos sobre essa visão, que por sinal foi muito divulgada nas eleições americanas de 2008.
Por outro lado, como vemos no artigo do Cato Institute, a ideia de que podemos dizer que a revogação foi a causa pode ser considerada como um mito. Apenas uma falácia para um mercado já em declínio buscando os culpados. A lei Glass-Steagall, em si, foi criada lá em 1933, logo nos primeiros anos da grande depressão, como uma resposta à crise gerada pelo crash da bolsa de 1929.
A lei determinava a separação entre bancos de investimento e bancos comerciais – ou seja, os bancos comuns que ofereciam empréstimos, serviços de pagamento e transferência, não podiam se envolver em atividades de especulação no mercado de capitais , e vice-versa. Isso foi feito com o intuito de evitar conflitos de interesse, e de preservar a integridade dos bancos comerciais caso o mercado financeiro entrasse em colapso – justamente como ocorreu no crash de 1929, quando mais de 9000 bancos faliram, levando junto as economias de milhões de americanos. Aliás, nós já fizemos um vídeo sobre a crise de 29 e vou deixar no card para vocês.
Durante 66 anos a Lei Glass-Steagall esteve em vigor, mas com a pressão pela desregulamentação nos anos 90, boa parte dela acabou sendo revogada em 1999, com a introdução da Lei . Entre os motivos pra revogação, existia a preocupação de que suas limitações eram prejudiciais à saúde do setor bancário, e que a diversificação das atividades dos bancos poderia mitigar o risco pros consumidores. Na prática, a remoção dessas limitações permitiu a fusão de bancos comerciais e bancos de investimento, dando margem pro surgimento de instituições financeiras gigantescas, como o Citigroup e o Bank of America.
Pra se ter uma ideia, nos anos 90, antes das fusões, os seis maiores bancos dos Estados Unidos tinham ativos correspondentes a 20% do PIB do país. Após a desregulamentação, esse percentual subiu em disparada, e em 2008 já atingia 60%. A formação desses bancos colossais permitiu que o setor bancário se tornasse muito mais lucrativo, mas também aumentou o risco de um efeito cascata no caso de uma crise do mercado financeiro.
Não é difícil achar matérias, tanto da época como atuais que relacionam a Crise Subprime como um dos principais motivos da recessão. Mantenha essa informação em mente, vamos precisar dela daqui a pouco. Voltando aos anos 90, um outro fenômeno também acontecia nessa década frenética: o surgimento da nossa querida internet.
Essa nova ferramenta a princípio era usada por pessoas da área de tecnologia, mas foi se tornando cada vez mais popular com o desenvolvimento de programas e sites mais intuitivos e divertidos, como navegadores web com interfaces mais agradáveis, e sites dos mais variados tipos, de buscadores ao comércio em geral, além do compartilhamento de arquivos. O crescimento da internet foi tão rápido, que de 1993 a 1996, o número de páginas web saltou de 130 pra mais de 100 mil. O Netscape, o navegador web mais popular da época, já tinha mais de 10 milhões de usuários em 1995.
A internet logo virou um lugar empolgante: todo mundo queria usar, e a todo tempo surgiam novos sites, novas companhias, e novas formas de aproveitar a tecnologia. Isso fez com que novos negócios baseados na internet virassem uma espécie de santo graal dos investimentos. O que resultou num cenário extremamente otimista e de crescimento acelerado do mercado financeiro, com constante valorização dos ativos, um fenômeno chamado de Bull Market.
Na verdade, esse período correspondeu ao maior crescimento de capital já visto na história dos Estados Unidos. Por conta disso, a Nasdaq bateu o recorde de capital investido em 1997, e em 1999 cerca de 40% dos investimentos em capital de risco eram aplicados em negócios relacionados à internet. Um artigo da universidade de Nova Iorque, publicado em 2003, mostra que ações de empresas ligadas à internet estavam gerando retornos de até 1000% entre os anos de 1998 e 2000, algo que fez com que os investidores começassem uma corrida pra comprar ações de qualquer empresa que tivesse um domínio “.
com”, na esperança de lucrar com a valorização dos ativos. Algumas empresas também aproveitaram e simplesmente adicionaram “. com” no final do nome, para entrar na onda e lucrar em cima do movimento, o que resultou em um estudo que revelou que isso se transformava em um aumento de 74% nas ações da empresa.
Só que esse movimento especulativo rapidamente gerou uma supervalorização desenfreada dessas ações, e além disso, muitas das novas empresas apresentavam modelos de negócio insustentáveis, ou simplesmente nem tinham tanto potencial assim. Isso tudo acabou virando uma grande bolha, e quando os investidores perceberam que muitas dessas empresas estavam falhando em retornar lucros satisfatórios, o mercado caiu na real e a coisa ficou feia rápido: em março de 2000, algumas empresas de tecnologia, como a DELL, venderam muitas de suas ações, o que foi suficiente pra causar pânico entre os investidores, e a bolha estourou. Entre 2000 e 2002, o índice da Nasdaq caiu de 5048 pra 1114 pontos, uma queda de quase 80%.
Outros fatores também contribuíram pra queda e pro abalo na confiança do mercado, como sucessivas altas nas taxas de juros pelo governo americano, os ataques de 11 de setembro, e o surgimento do escândalo da Enron, a maior fraude financeira da história, que chocou o mundo financeiro. Todo esse episódio ficou conhecido como “A bolha das pontocom”, e talvez você esteja se perguntando o que exatamente isso tem a ver com a crise de 2008. Além do fato de ser uma demonstração de como a especulação e a supervalorização de ativos podem criar uma bomba relógio, o que veio depois do estouro da bolha das pontocom foi fundamental pra todo o cenário que levou à crise anos mais tarde e a uma recessão como consequência.
Porque uma das principais medidas pra tentar conter a crise gerada pela bolha das pontocom foi mexer na boa e velha taxa de juros da economia. O Fed, o banco central americano, mudou a política monetária e reduziu as taxas de juros da economia até chegar a apenas 1% em 2003. Isso significou que mais dinheiro passou a circular na economia, e conseguir empréstimos e outros tipos de crédito ficou mais fácil.
Rapidamente, a economia americana se recuperou da recessão, e a vida dos americanos parecia ótima novamente. Os americanos tinham dinheiro no bolso e acesso a crédito barato mais uma vez, agora, podiam facilmente tentar viver o “american dream”. Antes de chegar na recessão, também é preciso entender alguns aspectos do modo de vida americano, e como isso se somou ao cenário que acabamos de contar pra criar a tempestade perfeita.
Assim como a maioria de nós, um dos sonhos de muitos americanos é simplesmente conseguir comprar uma casa própria. A diferença é que por lá, a maioria das pessoas faz isso por meio de um tipo de financiamento chamado hipoteca. É tão comum que isso praticamente faz parte da cultura norte-americana.
O conceito é muito simples: o banco financia a compra do seu imóvel, e você paga esse valor parcelado ao longo de vários anos, acrescido de juros. O próprio imóvel comprado serve de garantia, ou seja, caso você deixe de pagar, o banco vai lá, pega o imóvel pra ele, e recupera o dinheiro. Só que pra conseguir a hipoteca, você passa por uma análise de crédito que vai levar em conta se sua pontuação, ou como eles chamam score de crédito, é bom, se sua renda é compatível com os valores, esse tipo de coisa comum em financiamentos.
Quando o Fed baixou as taxas de juros, depois da bolha das pontocom, hipotecar uma casa ficou muito mais atrativo, já que as taxas de juros dos contratos também seriam muito baixas. Isso facilitou o acesso de muita gente ao crédito, e cada vez mais americanos estavam fazendo hipotecas pra garantir a conquista da casa própria. Além disso, aqueles que compravam imóveis como forma de investimento também se aproveitaram da baixa dos juros pra conseguir financiamentos ainda melhores.
Com tanta gente atrás de casas e com crédito na mão, naturalmente o preço dos imóveis começou a crescer de maneira constante, impulsionado também pela especulação, porque todo mundo achava que os preços continuariam subindo. De 2002, para logo após a recessão, 2006, o preço médio de uma casa nos Estados Unidos saiu de 188 mil dólares, pra 248 mil, um aumento de 32% em apenas 4 anos – um excelente sinal pra quem investia no mercado imobiliário. Por falar em investir, a procura massiva por hipotecas também fez vários credores, que é o nome dado a empresas que emprestam o dinheiro nesse processo de financiamento, perceberem uma oportunidade de lucro com esse tipo de contrato e isso é o ponto chave aqui.
Nos Estados Unidos, os contratos das hipotecas podem mudar de “dono”. Assim, se o credor da hipoteca for o banco A, ele pode vender esse contrato pro banco B, e o banco B passa a receber os pagamentos e juros relativos àquela hipoteca. De repente, comprar contratos de hipotecas se tornou um investimento bastante rentável e percebido como seguro, já que na pior das hipóteses, se o devedor parasse de pagar, você ficava com o imóvel, que provavelmente valeria mais do que o empréstimo inicial, devido à valorização constante dos imóveis.
Isso parecia ainda mais atrativo pelo fato de que investimentos de renda fixa tradicionais, como os títulos do tesouro americano, rendiam pouco na época, já que eram atrelados à taxa de juros. Logo, os bancos de investimento perceberam isso, e é aqui que a coisa fica interessante . Eles começaram a disponibilizar um tipo de investimento chamado de MBS, ou Mortgage-backed securities, conhecido como Título Lastreado em Hipotecas em português.
Basicamente os bancos de investimento compravam uma grande quantidade de contratos de hipoteca dos credores, juntavam em um só pacote e ofereciam como um produto de investimento para investidores como eu e você com retorno baseado nas hipotecas. Os pagamentos recebidos pelos investidores dependem do desempenho das hipotecas no conjunto. Se os proprietários pagarem suas hipotecas em dia, os investidores receberão uma renda regular.
No entanto, se os proprietários entrarem em inadimplência em suas hipotecas, isso poderia afetar o valor e o desempenho dos MBS. Na verdade, esse tipo de título já existia desde a década de 60, mas só passou a ser ofertado em grande quantidade pelos bancos nos anos 2000, justamente quando o mercado imobiliário tava explodindo. Parecia um excelente negócio, já que a garantia do investimento era justamente as propriedades objetos das hipotecas, e tornava viável que muitos investidores lucrassem com o mercado imobiliário aquecido, sem ter que se envolver diretamente.
Até mesmo o governo americano passou a oferecer esses títulos através do Fannie Mae e do Freddie Mac, duas organizações patrocinadas pelo governo que servem pra fornecer liquidez ao mercado das hipotecas, comprando contratos e oferecendo esses títulos de MBS. Mas não foi só isso. Como a quantidade de contratos entre credores e tomadores atingia níveis cada vez mais altos, as seguradoras resolveram entrar no jogo também.
Elas ofereciam os Credit Default Swaps pros credores das hipotecas: um tipo de derivativo, conhecido como CDS, que serve pra proteger o credor da inadimplência, em troca de pagamentos periódicos. Basicamente um seguro contra a inadimplência – caso o devedor não pagasse a hipoteca, a seguradora cobriria o prejuízo. Era 2006 e tudo parecia uma maravilha: as pessoas compravam cada vez mais casas, o preço dos imóveis crescia numa taxa estável, os bancos, os credores e as seguradoras lucravam, e os investidores tinham excelentes retornos com títulos virtualmente seguros.
Mas foi exatamente aí que a coisa começou a ficar meio esquisita. Com o mercado imobiliário explodindo de tão aquecido, e as instituições financeiras e investidores lucrando rios de dinheiro com as hipotecas, a demanda por esse tipo de título era gigantesca – eles queriam comprar o máximo que podiam, e aproveitar esse frenesi de lucros. Só que nesse ponto, a maior parte dos americanos com bons scores já tinham suas casas, ou já estavam comprometidos com alguma hipoteca, ou seja, a oferta de novos contratos de hipoteca pros bancos de investimento montarem seus produtos tava se tornando mais escassa.
A solução dos credores pra isso foi simplesmente ampliar a oferta de crédito. Cada vez mais pessoas com scores de crédito abaixo do ideal foram sendo incluídas nas concessões de hipotecas, aumentando gradualmente o risco desses empréstimos. Mas aqui tem um detalhe curioso, que foi crucial pro desenrolar da história: os credores viram que não precisavam ter tanto cuidado com o risco das hipotecas, porque eles tavam fazendo dinheiro vendendo os contratos de hipoteca pros grandes bancos de investimento, e não com o pagamento da hipoteca em si, e caso o tomador - a pessoa que pegou o empréstimo - não pagasse, isso ia ser problema dos bancos e não deles.
Então os credores começaram a abrir linhas de crédito pra todo tipo de gente, incluindo a concessão de hipotecas pra pessoas com histórico de crédito abaixo da média, algo chamado de “subprime mortgage”, empréstimos mais arriscados que os tradicionais. Esse comportamento foi inclusive incentivado pelo próprio governo dos Estados Unidos. Só que os credores não pararam por aí, à medida que eles aumentavam o alcance dos empréstimos subprime, eles foram chegando à parcela da população que não possuía nem mesmo renda ou condições de pagar as parcelas da hipoteca.
Esse tipo de financiamento de altíssimo risco ficou conhecido informalmente como “NINJA”, uma sigla pra “No Income, No Job, No Assets”, que significa “Sem renda, Sem emprego, Sem Ativos”. A essa altura, basicamente qualquer americano conseguia hipotecar uma casa Mas os empréstimos não eram uma mera gentileza dos credores a quem tinha pouca renda. Na verdade, eles ofereciam condições bem atrativas a princípio, mas que nas letras miúdas tinham taxas de juros mais altas e variáveis, o que muitas vezes virava uma bola de neve e tornava impossível o pagamento com o passar do tempo.
Apesar dessa prática ser considerada predatória, o mercado imobiliário seguia em alta, e o preço elevado dos imóveis garantia que os investidores e credores continuariam tendo lucro, afinal, na pior das hipóteses, a casa hipotecada era vendida por mais do que valia no início do contrato. Tanto que as agências de análise de risco classificavam de 80 a 95% dos títulos lastreados em hipotecas com a classificação de risco Triple-A, a melhor classificação, e a de menor risco. Entre 2004 e 2006, mais de 3 trilhões de dólares foram injetados no mercado imobiliário por meio das hipotecas.
Em 2007, a dívida total pendente em hipotecas somava mais de 14 trilhões de dólares, e desses, mais de 1 trilhão e 300 bilhões de dólares eram só de hipotecas subprime. Além disso, os bancos também enfiaram esses títulos lastreados em hipotecas em pacotes de um outro produto, chamado de CDO – Collateralized Debt Obligations – que basicamente eram uma coleção de títulos lastreados em vários tipos de dívidas. Na prática, eles eram investimentos ainda mais arriscados, mas os bancos vendiam como algo seguro.
Mas o que ninguém parecia perceber, é que toda essa estrutura gigantesca – de hipotecas pra pessoas sem renda, bancos de investimento movimentando trilhões em títulos MBS e CDOs, e seguradoras vendendo CDS a torto e a direito – tava toda montada em cima de um único pilar extremamente frágil: a fé de que o preço das casas continuaria subindo. Sim, mais uma bolha tinha se formado no mercado americano graças à especulação, dessa vez, foi a bolha do mercado imobiliário, e essa era muito pior que a última. No final de 2006, o inevitável aconteceu: o preço dos imóveis caiu, e tudo aquilo começou a desmoronar.
Nesse período, o Fed vinha aumentando a taxa de juros numa tentativa de controlar a inflação, chegando a taxas de 5%, só que isso fez com que o acesso ao crédito ficasse mais difícil, e as taxas de juros variáveis dos contratos de hipoteca subprime também acabaram subindo, para além do que os devedores esperavam. Nesse momento, eles não conseguiam mais pagar as parcelas dos empréstimos, e renegociar as dívidas tinha ficado bem mais difícil. Muita gente não conseguia mais cumprir o acordo, e milhões de casas entraram em processo de foreclosure, o nome dado à retomada dos bens pelos bancos e credores devido à inadimplência.
Ao mesmo tempo, ainda tinha muita gente resolvendo vender suas casas enquanto podiam, pra tentar pagar a hipoteca. Entre bancos tentando recuperar o dinheiro, e proprietários desesperados, o número de casas sendo colocadas à venda aumentou exponencialmente, o que fez com que os preços despencassem. Com uma grande parcela dos bancos e credores sofrendo o bom e velho calote, e a garantia dos empréstimos desvalorizando – ou seja, as casas – os títulos relacionados ao mercado imobiliário também começaram a perder valor drasticamente, entre eles os títulos lastreados em hipotecas, os MBS, e os CDOs.
Esse momento ficou conhecido como “a crise dos subprime”, dezenas de firmas credoras de hipotecas subprime declarararm falência ou foram vendidas. Foram mais de 25 só nos primeiros meses de 2007. A essa altura o pânico já tava tomando conta – e com razão, porque o pior ainda nem tinha chegado.
Lembra quando a gente falou da criação das super instituições financeiras logo após a revogação da lei Glass-Steagall? Pois é, a maioria desses bancos gigantescos tava profundamente envolvida no mercado imobiliário, e vinham fazendo fortuna com produtos como os MBS e os CDOs – só que eles também vinham trabalhando com uma alavancagem estratosférica. Alavancagem é a prática de pegar dinheiro emprestado para aumentar o potencial de retorno dos investimentos ou atividades da instituição.
Isso significa que eles tinham empréstimos e outros compromissos financeiros que eram muito, muito maiores do que o dinheiro que realmente tinham em seus cofres. Somado à desvalorização massiva dos títulos e à falta de liquidez nos ativos imobiliários, esses bancos sofreram um tremendo golpe, e a falência era só uma questão de tempo caso nada mudasse. Em março de 2008, o quinto maior banco de investimentos dos Estados Unidos, o Bear Stearns, simplesmente colapsou.
Da noite pro dia, o Bear Stearns viu seus cofres se esvaziarem, e através de um acordo garantido pelo banco central americano, foi vendido ao banco JP Morgan Chase por 236 milhões de dólares – pouco antes, o mesmo banco valia mais de 25 bilhões. A quase falência do Bear Stearns desencadeou uma crise de confiança nos bancos de Wall Street, e as próprias instituições passaram a se recusar a realizar empréstimos entre si. Ao mesmo tempo, milhões de investidores e outras instituições tentavam salvar seu dinheiro do desastre iminente.
O problema é que com a alta alavancagem, os bancos simplesmente não tinham caixa o suficiente pra todo mundo. Em 7 de setembro de 2008, o governo americano teve que resgatar as instituições Fannie Mae e Freddie Mac da falência, as duas maiores financiadoras imobiliárias do país, com receio de que a quebra delas congelaria o setor imobiliário por anos. Enquanto a economia americana entrava em queda livre, a situação dos bancos se deteriorava cada vez mais.
O que culminou na maior falência bancária da história americana: o banco Lehman Brothers, quarto maior banco de investimentos do país, também sucumbiu. Dessa vez, o governo americano não se envolveu, e no dia 15 de setembro de 2008, o banco com mais de 630 bilhões de dólares em ativos de mais de 100 mil clientes declarou falência, marcando de uma vez por todas o início da crise financeira mundial, e fazendo o índice Dow Jones cair 500 pontos em um dia. Nas palavras do investidor mais famoso de Wall Street, Warren Buffett, “o medo se espalhou em setembro de 2008 de uma forma que parecia um tsunami”.
A edição de 4 de outubro de 2008 da revista The Economist mostrou o mundo à beira do abismo, só que na verdade, a queda já tinha começado. De 2006 a 2009, quase 9 milhões de casas receberam notificações de foreclosure, ou seja, estavam na iminência de serem tomadas pelos bancos, o que quer dizer literalmente milhões de famílias perdendo seus lares. Toda a economia americana sentiu os efeitos da crise.
Além do mercado imobiliário e das centenas de milhares de pessoas perdendo suas casas e suas economias, as bolsas de valores despencaram, e milhões de americanos perderam seus empregos. Nas semanas após a falência do Lehman Brothers, o índice Dow Jones da bolsa de Nova Iorque caiu quase 1600 pontos, atingindo níveis que não se via desde 2004. Só em setembro e outubro de 2008, 400 mil pessoas foram demitidas, um número assustadoramente maior que as 4 mil vagas perdidas só um mês antes, em agosto.
Um ano antes disso, os Estados Unidos estavam gerando mais de 100 mil empregos novos por mês. No final de outubro, o Bureau of Economic Analysis do governo americano anunciou uma retração de 0. 3% na economia americana.
Eram péssimas notícias, o país entrava oficialmente na Grande Recessão. A AIG, sigla pra American International Group, a maior seguradora dos Estados Unidos na época, tinha feito muito dinheiro vendendo seus produtos pro mercado financeiro, especialmente os CDS, aqueles seguros pra títulos que protegiam contra a inadimplência. A Forbes chegou a dizer que a AIG era o nome mais importante do setor financeiro na época, com mais de 1 trilhão de dólares em ativos e 103 mil funcionários.
Mas com a inadimplência das hipotecas nas alturas, e todo o resto da economia desmoronando, muita gente se voltou à AIG pra reivindicar o valor garantido pelos CDS. De repente, a AIG precisava arrumar 75 bilhões de dólares pra pagar seus segurados, dinheiro que eles simplesmente não tinham em suas contas, deixando a instituição à beira da falência também. Depois de ver o impacto que a falência do Lehman Brothers causou na economia americana, o governo percebeu que não podia ficar só assistindo enquanto tudo colapsava.
Eles anunciaram um pacote de empréstimos bilionários pra grandes nomes do mercado, na esperança de evitar a falência dessas empresas, e assim impedir o prejuízo ainda mais gigantesco que isso geraria na economia. Esse pacote foi chamado pelo governo de TARP – Troubled Assets Relief Program – que significa algo como Programa de Resgate de Ativos Problemáticos, e tinha o principal objetivo de re-estabilizar a economia abalada pela crise. Esse pacote também ficou conhecido como “Resgate dos Bancos”.
Uma das empresas resgatadas foi a AIG, que recebeu um empréstimo de 85 bilhões e passou a ser controlada parcialmente pelo governo. Mas com o agravamento da situação, mais e mais companhias apareciam pedindo socorro ao governo. Gigantes do setor financeiro como o Citigroup e o Bank of America foram alguns deles, mas à medida que a crise destruía também outros setores, empresas como a General Motors e a Chrysler também precisaram do resgate do governo.
Como descrito pelo economista e professor da FGV, Paulo Gala, foi quando “Wall Street chegou na Main Street”. A crise de 2008 durou oficialmente até junho de 2009. Nesse período, quase 9 milhões de americanos ficaram desempregados da noite pro dia, e as famílias perderam cerca de 19 trilhões de dólares em patrimônio.
O governo americano gastou mais de 2 trilhões e meio de dólares em medidas pra conter a crise, entre empréstimos e garantias às empresas afetadas. Mesmo assim, o número de pedidos de falência de empresas por lá subiu 75% de 2007 a junho de 2009, chegando a um total de 1 milhão e 300 mil companhias em processo de falência na justiça. Mas como a gente comentou, os impactos da crise não ficaram restritos aos Estados Unidos.
Na verdade ela foi mundial, justamente porque um colapso na principal economia do planeta tem impactos nos quatro cantos do mundo, e foi exatamente o que aconteceu. Países de todo o mundo tentaram se proteger da recessão lançando pacotes de estímulo nas suas economias. Mesmo assim, muitos não escaparam da severidade do desastre, como Islândia, Grécia, Espanha, Itália, Irlanda e Portugal na Europa.
Muitos deles precisaram da intervenção da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional pra tentar estabilizar a situação. O comércio global sofreu queda de 15% entre 2008 e 2009, e o nível de desemprego global aumentou em 3%, o que significava 30 milhões de novos desempregados entre 2007 e 2010. Talvez você se lembre dos noticiários da época, mas a Grécia foi um dos países mais afetados pela recessão.
O governo grego tava altamente endividado mesmo antes da crise. Quando a onda da recessão atingiu o país e seus bancos, a situação ficou ainda mais difícil. Em outubro de 2009, a Grécia anunciou um estado de emergência financeira, era um país falido.
A União Europeia e o FMI entraram com um resgate de 240 milhões de euros, mas pediu em troca a adoção de políticas de austeridade fiscal pelo governo grego. A população grega não ficou nada satisfeita com isso, e uma série de protestos e conflitos com a polícia aconteceram. Uma crise econômica e de instabilidade ainda duraria muitos anos no país mediterrâneo.
O auxílio à Grécia foi o maior resgate financeiro a um país na história, mas até hoje, o país ainda tem débitos com a União Europeia, e tem pagamentos previstos até depois de 2060. Nosso país também foi afetado pela recessão. Em 2008, cerca de 25 bilhões de reais em investimentos estrangeiros foram retirados da Bovespa, um recorde de fuga de capital.
Pouco depois da falência do Lehman Brothers, em um dos dias de queda do Dow Jones, a bolsa brasileira sofreu um golpe duro e teve que pausar as negociações depois de uma queda de 10% no Ibovespa. O Brasil também foi impactado pela queda nas exportações Mas o Brasil vinha com uma economia estável, e o governo vinha adotando algumas políticas de incentivo, e os impactos acabaram de certa forma sendo mitigados por aqui. O PIB brasileiro teve uma retração no 1º trimestre de 2009, mas logo depois voltou a subir, algo que fez o mundo olhar com bons olhos pro Brasil, como mostra essa capa de 2009 da revista The Economist, com o Cristo Redentor “alçando vôo” e o título “O Brasil Decola”.
A crise financeira mundial de 2008 é amplamente considerada como a maior crise econômica desde a grande depressão dos anos 30. Esse ainda é um assunto bastante discutido pelos economistas, e ainda há bastante divergência em alguns pontos. Alguns culpam a crise pela facilidade de acesso ao crédito de pessoas de baixa renda, outros, culpam o sistema complexo de títulos e derivativos construído em cima de uma base nada sólida.
O fato é que o medo de uma nova Grande Depressão forçou a ação rápida de todo mundo quando a coisa começou a dar ruim, e muitas das ações tomadas, como o resgate de grandes instituições financeiras, foram cruciais pra sobrevivência do sistema econômico mundial – por mais que muitos contribuintes não tenham gostado nem um pouco disso. Só que apesar de muito grave, a crise de 2008 não foi necessariamente uma surpresa. Anos antes já haviam pessoas falando que a inflação do mercado imobiliário era claramente uma bolha, ou que a rede de produtos de investimento criada pelos bancos de investimento, em cima de títulos de risco, tava fadada ao fracasso.
Algumas dessas pessoas não só viram o tamanho da burrada que tava pra acontecer, como resolveram apostar em cima disso. Michael Burry, retratado no filme A Grande Aposta de 2015, foi um deles. O criador da Scion Capital, uma firma de investimentos, fez uma aposta considerada por muitos como uma loucura: ele apostou contra o mercado imobiliário em 2007.
Usando sua empresa de investimento, ele utilizou fundos fazendo a estratégia de “short selling”, uma tática utilizada por investidores experientes pra lucrar quando o preço das ações cai. Ele previu que os títulos CDO imobiliários iriam perder valor quando a bolha imobiliária começasse a estourar, e fez de 100 a 700 milhões de dólares pra cada um de seus investidores com isso. De maneira irônica, Michael Burry fez fortuna em cima da ganância dos próprios credores e bancos de investimentos.
Depois da crise, uma série de medidas foram tomadas pra evitar que outro desastre do tipo aconteça tão cedo novamente. Nos Estados Unidos, berço da crise, uma reforma foi aprovada em 2010 conhecida como Lei Dodd-Frank, que buscou melhorar as práticas do sistema financeiro americano, com mais transparência e segurança. Nos primeiros meses de 2023, quando esse vídeo foi feito, uma nova instabilidade no mercado imobiliário tem preocupado muita gente.
O preço médio das casas simplesmente disparou nos últimos anos, principalmente após o início da pandemia: saiu de 322 mil na metade de 2020, pra 480 mil no fim de 2022, um aumento de quase 50% em menos de 3 anos. Só que no primeiro trimestre de 2023, o preço médio sofreu uma queda de 9%, chegando a 436 mil. O que isso significa ainda é incerto, mas com certeza tem muita gente apreensiva no mercado, torcendo pros flashbacks de 2007 não se tornarem realidade mais uma vez.
Me diz ai, você acha que a crise de 2008 ainda afeta o mundo, ou ainda, você vê uma nova crise se aproximando? Comenta aqui abaixo e dá uma olhada no que o pessoal tá falando. Agora, se você quer descobrir como fazer de 2 a 5 mil reais por mês como um Alquimista Digital, confere uma aula grátis no primeiro link da descrição, ou apontando a camera do seu celular para o QR code que ta aqui na tela antes que essa aula saia do ar.
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