É pra abrir sim, eu vou abrir. Quem não quiser que eu abra, eu prendo e arrebento. Que maravilha, general João Batista Figueiredo, um homem de frases feitas.
Aquele mesmo que diz que se ganhasse salário mínimo dava um tiro na cuca. Aquele que também falou "um povo que não sabe nem escovar os dentes vai saber votar". Ahm?
Comé que vai votar um povo que não sabe escovar os dentes? O homem que também falou "todo povo é uma besta que se deixa levar pelo cabresto", e também o autor da frase que eu mais admiro "prefiro cheiro de cavalo que cheiro de povo". Também, né?
Só quem não conhece cheiro de cavalo que não prefere é cheiro de povo, né cara? Viva o cavalo e viva também a cavalgadura do João Batista Figueiredo, que assumiu o poder em 1980 entregue ali pelo General Ernesto Geisel e o Ernesto Geisel disse "vamos abrir. Será uma abertura lenta e gradual.
Vai acabar a ditadura". E aí o general João Batista Figueiredo disse "hei de fazer desse país uma democracia, nem que tenha que prender e arrebentar". Só que ele nem precisou prender e arrebentar porque os caras se arrebentaram a eles mesmos.
É, porque hoje nesse explosivo episódio, você vai ver quando dois militares explodiram a si mesmos. Que iriam explodir o Brasil, mas como são milico incompetente, explodiram a eles mesmos. "Eu prendo e arrebento, eu prendo e arrebento aqueles que explodiram uma bomba no Riocentro".
Cara, eu também não gosto do Riocentro. Vou te dizer, é longe, é uma coisa enorme, o projeto arquitetônico é meio assim, mas agora explodir o Riocentro! ?
E ainda o Riocentro recém inaugurado! ? É porque tu na tua ignorância constrangedora não se lembra que de 1980 a 1981, milicos e grupos de direita paramilitares, todos eles ligados ao SNI, Serviço Nacional de Informações, ligados ao serviços de inteligência do Exército.
. . Se bem que serviço de inteligência do exército é uma contradição entre termos, né?
Explodiram mais de vinte e oito bombas no Brasil. Vinte e oito bombas no Brasil. Sim, sim, sim, terroristas, porque tinha aquele papo "ah, os terroristas".
Então é bom a gente recordar o que esses caras fizeram, né? Ficou determinado pelo general Ernesto Geisel que o Brasil ia enfim voltar de maneira "lenta e gradual e segura" ao regime democrático, e aí essas comunidades de informações, o SNI e acima de tudo serviço de informações do exército, que tinha sido criado em 1967 pelo Costa e Silva, sim, que está morto, morto e enterrado, porque teve o golpe de 64, cê sabe né? O Castelo Branco era em tese um militar legalista e ele disse "não darei o golpe se a sociedade civil não sinalizar plenamente que quer a intervenção militar".
Aí um milhão de pessoas, se é que se pode chamar de pessoas, saíram às ruas na "marcha com Deus pela família e pela liberdade", né? Sinalizando que sim, parcelas da sociedade civil queriam o golpe. Ele deu o golpe e disse que em 65 teríamos eleições.
A questão é que a linha dura da qual o principal representante era o Costa e Silva disse "não não agora que estamos no poder aqui ficaremos". E aí em 1967, se sabe o dia até, dois de maio de 1967 o excelentíssimo general Costa e Silva criou o serviço de informação do exército, porque ele achou que o serviço nacional de informações, o famigerado SNI, era muito brando, então era preciso ter um órgão que infiltrasse agentes no movimento estudantil, que infiltrasse agentes nos grupos de esquerda, né? E que insuflasse, na verdade, uma contra-revolução.
E aí quando, depois de quase vinte anos de ditadura, esse regime já tava caindo de podre, esses caras disseram "não, mas se abrir nós vamos perder a nossa boquinha, vai acabar a nossa mamata". E aí cara, eles decidiram por bomba, por bomba, que nem qualquer terrorista comum. Só que além de terrorista comum, ainda eram incompetentes, né?
Porque a bomba mais explosiva, a bomba que mais chamou atenção, foi a última dessas vinte e oito. Depois eu falo das outras, porque a mais emblemática, a mais reveladora, a mais explosiva, até porque explodiu com eles, foi aquela que explodiu no Riocentro, no dia 30 de abril de 1981. E aí uma entidade chamada Centro Brasileiro Democrático, ligado ao PCB.
. . pô, se era ligado ao PCB, ao Partido Comunista Brasileiro, não podia ser bem bem democrático, né?
Mas tudo bem, estamos ali naquele momento de transição, essa entidade convocou um grande show com esse bando de artista de esquerda, né? Amelinha, Elba Ramalho, Gonzaguinha, Chico Buarque, pra fazerem um show em homenagem ao primeiro de maio. Pra não dar bandeira, primeiro de maio, eles marcaram pro dia trinta de abril.
E aí mais de vinte mil, vinte mil pessoas foram a esse show e os caras dessa comunidade de informações, dessa comunidade terrorista ligado ao Exército Brasileiro, começaram a planejar um atentado. O plano era o seguinte: eles iam dizer que grupos de esquerda mais radicais do que aqueles que estavam ali, que eram brandos, tinham se revoltado com aquelas pessoas e explodido uma bomba no Rio Centro, matando várias pessoas, e isso era obra da VPR, vanguarda popular revolucionária. Eles começaram esse planejamento, mas são aqueles caras patéticos, né?
Porque naquela tarde, no dia trinta, seis automóveis pararam num pequeno restaurante de beira de estrada na estrada Grajaú-Jacarepaguá num lugarzinho no meio da selva, chamada Cabana da Serra. Aí o garçom começou a servir aqueles caras assim de óculos escuros, assim né? E ainda olhava e saía, falando sério, saía assim da cintura deles um monte de revólver, os caras armados e assim com vários mapas, falando sério, parece piada, vários mapas e falando em código, X, aí o cara pô, chamou a polícia, né cara?
Daí chegou uma veraneio dos policiais, olhou assim os cara, tinha quinze homens armados, seis carros parados, daí o cara, pá, daí só anotou as placas, anotou as placas e foi embora. Uma das placas que ele anotou era de um Puma. Sabe aquele carro brasileiro, Puma?
Um monte de playboy tinha Puma. Até conheço uns amigos que tinham um Puma. Todo mundo abriu mão do seu Puma depois do que vai acontecer daqui a pouco, porque esses carros se dispersaram e esse Puma desceu lá em direção ao Rio Centro, estacionou no estacionamento dos artistas e entrou sem que ninguém o parasse e ficou ali parado.
Nesse mesmo momento os outros carros se espalharam e pintaram todas as placas de trânsito ao redor do Riocentro com a sigla VPR, vanguarda popular revolucionária, né? Os mesmos caras, assim, de óculos escuro assim com revólver, pssht "VPR, VPR". Tem fotos deles pintando isso.
. . No inquérito, né?
Você não vai ver essas fotos porque elas fazem parte só do inquérito. E o carro parou ali com duas pessoas dentro. Depois elas viriam a ser identificadas sargentão Guilherme Rosário e o capitão Jair Messias.
. . Não, o capitão Wilson Machado.
Não, Wilson Machado. O capitão Wilson Machado fazia parte da segurança pessoal do João Batista Figueiredo, cada vez que ele vinha ao Rio, mas o Figueiredo não tinha nada, realmente porra nenhuma a ver com isso. Já o sargento Guilherme Rosário era conhecido como "agente Wagner" e era especialista em explosivos.
Hahaha! Especialista em se autoexplodir, como veremos, porque ele vai pelos ares, que maravilha. Ele explodiu e o capitão Machado explodiu nas bolas do capitão Manchado.
Que maravilha. Mas isso ainda não aconteceu. Isso ainda não aconteceu.
O que tá acontecendo é o seguinte: um mês antes desse evento, o chefe da segurança do Rio Centro, que era o coronel Dickson Grael, pai dos velejadores Torben e Lars Grael, foi demitido sem nenhuma explicação, afastado. E aí botaram no lugar dele o tal tenente César Wachuelc. O cara se chama Wachulec!
Ele se chama. . .
E aí nesse dia todos os seguranças que não eram diretamente ligados a eles foram afastados e o melhor de tudo, o melhor de tudo é que dos vinte e oito portões que dão acesso ao Rio Centro, depois que vinte mil pessoas entraram ali, eles fecharam vinte e três desses portões. Só cinco ficaram abertos. E aí eles tinham bomba dentro desse Puma e eles tinham uma outra bomba na subestação de energia elétrica.
O plano era explodir a bomba no meio das pessoas e depois explodir uma outra bomba na subestação de eletricidade pra deixar tudo escuro e as pessoas tentarem sair por vinte e três portões fechados a cadeado. Cambada de assassino escroto. Cambada de milico escroto.
E aí eles estavam ali, saíram assim, lentamente, com o carro e BUUUUM! A bomba explodiu no colo do sargento, estraçalhou o sargento e o capitão Manchado saiu com as tripas, do lado de fora segurando as tripas, e explodiu nas bolas! Pior é que tava vivo até pouco tempo, eu não vou pesquisar se ele continua vivo ou não, porque ele já é um vivomorto, né, esviscerado.
De qualquer forma, isso aconteceu exatamente no momento que a Elba Ramalho tava cantando "banquete dos signos". Eu não sei se o cara não gostava da Elba Ramalho, se ele escolheu naquele momento, aquela música, né? A música é do Zé Ramalho, Zé Ramalho que assiste esse canal aqui, Zé Ramalho, o Bob Dylan do Nordeste, uma música maravilhosa.
Dá pra subir o som da música? Será que dá pra subir o som? Uma música maravilhosa que fala sobre o cangaço, que fala sobre a belezura da mulher, e no momento em que a que a Elba Ramalho, Rouxinol da Paraíba, cantava o banquete, BUM, aí levaram correndo esse capitão, avisaram lá, "o capitão vai chegar", os caras da comunidade de informações, né?
Ligaram correndo e disseram "vai chegar o capitão, aí vai chegar o capitão", no hospital Miguel Couto, né? E o outro lá mortaço. Bom cara, daí foram instaurado um inquérito, mesmo no regime militar, teve um IPM, e as provas eram enormes, né?
Tinha digitais até na testa, digitais até na testa, se descobriu que eram esses dois caras, se descobriu que eles estavam ligados a comunidade de informações, e aí o IPM, o inquérito policial militar, acabou não dando em nada em tese, mas deu em alguma coisa, deu em alguma coisa, porque o general Golbery do Couto e Silva se demitiu né? O "bruxo" se demitiu do SNI porque o SNI não sabia que isso tava acontecendo, o Figueiredo também não sabia que isso tava acontecendo, isso era o golpe dentro do golpe e isso tinha começado um ano e meio antes, em janeiro de 1980 quando eles começaram a explodir bombas em bancas de jornal que vendiam os jornais da chamada imprensa alternativa, como o Movimento, o Opinião, o Pasquim, o A hora do povo e o Coojornal de Porto Alegre, o jornal da cooperativa dos jornalistas de Porto Alegre, onde eu trabalhava. Aí o jornal acabou fechando graças a Deus e eu fui trabalhar na Tv Globo, fui trabalhar na TV Globo, claro.
Claro, ganhando muito mais. Eu queria agradecer aqui aos militares por terem fechado aquele jornal de esquerda e terem me levado pra imprensa de direita. E eles eram tão, mas tão, mas tão de direita que sabe onde é que eles também tentaram botar uma bomba?
Tu sabe? Tu sabe? Tu sabe?
Na casa do Roberto Marinho. Sério, na casa do Roberto Marinho. Desativaram uma bomba na casa do Roberto Marinho porque eles achavam o Roberto Marinho comunista.
Estou te falando sério, não é brincadeira. E eles também botaram uma bomba aonde? Na Associação Brasileira de Imprensa, que explodiu.
Botaram uma bomba sabe aonde? Na OAB, na Ordem dos Advogados do Brasil, matando uma funcionária ali, esses criminosos! Em 1999 o caso foi reaberto pela Procuradoria Geral da República porque já vivíamos em pleno comunismo, né?
No governo do FHC, e tendo sido o caso reaberto o coronel Wilson Manchado e Esviscerado foi condenado por homicídio culposo e aquele patético daquele general Nilton Cruz, o Nini, que ainda tá vivo, tem 98 anos esta múmia. Esta múmia, tá vivo, um que dava de relho, de chicote em carros que buzinavam em protesto em Brasília, e ainda não morreu o velho, tem 98 anos, mas daqui a pouco ele vai, ele foi condenado por falso testemunho e desobediência. Só que daí o Superior Tribunal Militar considerou que o caso sim, estava ligado, poderia ser enquadrado na lei de anistia e nenhum desses caras foi punido.
Como não foram punidos os responsáveis pelo atentado na OAB e na ABI. E daí em 2004 a Comissão da Verdade, tem aqueles que dizem "ah, comissão da verdade é pura coisa de esquerdista, comunista". Até pode ser, né?
Mas tentou esclarecer a verdade. A Comissão da Verdade tentou em 2004 reabrir o caso e não conseguiu, porque o caso é ainda mais grave, porque embora a bomba tenha explodido literalmente no colo deles, a bomba explodiu no colo dos milicos, eles tentaram desde o início culpar a esquerda, disseram "não não não, esses aí são agentes de esquerda infiltrados no Exército Brasileiro", né? Mas não colou, todo mundo sabe que foi eles, e aí mesmo assim com todas essas turbulências, porque eles disseram que a abertura ia ser "lenta, segura e gradual", né?
Lenta ela foi, né? Mas segura não foi, em nenhum momento, mesmo assim chegamos ao Tancredo Neves, que daí morre misteriosamente, se bem que é teoria da conspiração, morreu realmente apenas por incompetência médica, né? Que no Brasil é bem comum.
E aí a morte do Tancredo abre as portas para o paraíso que é o governo Sarney e o governo Sarney é sucedido pelo governo Collor de Mello, ou seja, esse país é mesmo uma bomba e eu vou embora. Tchau.