Essa é uma área com clima quase de deserto no Brasil e risco de triplicar de tamanho nos próximos anos. Todo ser vivo, toda a Terra, todo a região, ela realmente sofre. Mas eu diria que o grande alerta é para outras regiões que têm também cercado.
Significa o quê? Que eu preciso me adaptar. A identificação da primeira faixa de clima árido em território brasileiro pegou muitos cientistas de surpresa.
Ela foi identificada na Bahia por um estudo feito a pedido do Ministério do Meio Ambiente. A ideia inicial era reunir dados para combater a desertificação, processo de empobrecimento dos solos. E na busca a equipe se deparou com esse fato inédito: uma região de aridez extrema num lugar de calor cada vez mais intenso.
Por trás do fenômeno está a pressão constante das mudanças climáticas globais. Mas afinal, o que esse achado significa? Estariamos diante da fase inicial da formação de um deserto?
Quais impactos sociais e econômicos pra quem depende da terra na região? E para o restante do país? Nós perguntamos aos responsáveis pelo estudo.
Eu já adianto: extrapola as fronteiras do Nordeste. O Brasil está ficando mais quente e seco. É a avaliação de diferentes pesquisadores.
Muitas pessoas têm percebido essa mudança. A gente, inclusive, já falou sobre esse assunto em alguns vídeos. Ano passado, por exemplo, foi o mais quente da história no país, segundo a Organização Meteorológica Mundial.
Dos 12 meses de 2023, 9 foram com médias mensais de temperatura acima das registradas nos últimos 30 anos. Sem contar os episódios de ondas de calor. Teriam sido 9 ao todo.
O El Niño, aquele fenômeno que de tempos em tempos aquece as águas superficiais do pacífico Equatorial, teve culpa nisso. Mas só em parte. Cientistas dizem que outros fatores mais estruturais estão por trás dessa virada climática.
Eu estou falando do aquecimento global, acelerado pelo ser humano. Tanto é assim que 2023, na verdade, foi uma espécie de ápice de uma tendência de elevação de temperatura observada desde a década de 60 no Brasil. Coincidência ou não, o mesmo período da formação da área com condições de clima semelhantes às de um deserto.
E por que eu estou falando disso? Porque essa quentura ajudou a provocar o problema e pode fazer com que ele piore no futuro. Por que essa região chegou agora é caracterizada como um clima árido.
. . porque é uma região onde já chove pouco, só que por um aumento de temperatura, houve um aumento, um aumento do processo evaporativo, um aumento de perda de água pra atmosfera.
A Ana Paula Cunha, cientista do Cemaden, o Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais e coautora do estudo que identificou a área de clima similar ao de um deserto no território brasileiro. O processo de aridização, a intensidade, né, a velocidade com que ele acontece no Brasil, por meio desse estudo nós observamos que é diretamente relacionado ao aumento de temperatura que tem acontecido diferentes regiões do Brasil, sobretudo no oeste da Bahia, grande parte da Bahia, onde nós então encontramos essa área, pequena ainda área árida. E esse aumento de temperatura está relacionado diretamente ao aquecimento global causado pelas emissões dos gases de do efeito estufa.
Então, com maior quantidade de gás sendo liberados pra atmosfera, temos o maior aquecimento, e esse aquecimento causa, sim, essas mudanças no clima, como temos agora observado, né, e trazendo casos concretos de uma mudança de clima no Brasil. O que aconteceu exatamente e por que isso é tão preocupante? Vamos lá.
Parte da região Nordeste brasileira sempre foi marcada por uma paisagem mais seca, quase sem verde, característica de terras em clima semiárido, que era mais severo em termos de falta de chuva de que se tinha notícia no Brasil. Pois é, isso mudou. Não só o semiárido está crescendo em ritmo apressado, como pela primeira vez tivemos registro de uma faixa de território árido, uma extensão que em algum momento pode se transformar em deserto.
Não um Saara da noite pro dia, porque ele é fruto de uma longa evolução climática. Mas deserto no sentido da falta de vida da biodiversidade que vai morrendo aos poucos. A descoberta veio de um estudo encomendado pelo Ministério do Meio Ambientevcom o objetivo de enfrentar a desertificação, que avança sobre alguns estados brasileiros.
A Bahia, inclusive. Pesquisadores do instituto nacional de pesquisas espaciais, o Inpe, e do Cemaden, verificaram o seguinte: a região considerada semiárida no Brasil aumentou 226000 km² de 1960 a 2020, o período de observação do estudo, e de 1990 para cá apareceu um espaço árido de quase 6000 km². Tamanho mais ou menos do Distrito Federal.
No mapa dá para ver exatamente onde. A zona de aridez se estende por um trecho que abrange ao menos 5 municípios da Bahia e um pedaço de Petrolina, em Pernambuco. Para chegar a essa conclusão, os cientistas envolvidos nesse trabalho analisaram a quantidade de chuva e de água evaporada para atmosfera e calcularam, dessa forma, os níveis de secura de uma determinada área.
Ou seja, o índice de aridez, a falta crônica de umidade. Levando em conta parâmetros das Nações Unidas. Os resultados colocaram os autores e todos os brasileiros diante de uma dura realidade.
A ariização é um processo irreversível, porque é uma mudança de clima, né? E a mudança de clima em razão das mudanças climáticas. Como sabemos, né, que o aquecimento global continua, e vai continuar, ainda que as mudanças climáticas sejam mitigadas, ainda que reduzam o gás do efeito estufa, ainda assim esse aquecimento vai continuar.
Portanto, o processo de aridização é um processo irreversível. Uma transformação tão drástica, vocês devem imaginar, não se estabelece sem consequências. A nossa reportagem conversou com uma agricultura do semiárido brasileiro pra entender o que está acontecendo por lá.
A Ana Lúcia da Silva mora em Juazeiro, na Bahia, onde as pessoas estão, até certo ponto, acostumadas à seca. Só não tão intensa como ultimamente. A gente vem percebendo, né, que algumas culturas que a gente plantava, os nossos pais plantavam, os nossos avós, hoje a gente não consegue mais plantar elas.
Então, tipo a macaxeira, que a gente chama aqui a mandioca, né, que faz a farinha. Ela tem muito tempo que a gente deixou de produzir aqui nessa região por conta das chuvas poucas. Tem anos que chove bem menos, né?
Outros chovem mais, mas assim toda naquele período só. Choveu, encheu tudo e pronto. Então esse espaço muito é grande, né, de uma chuva pra outra, tem dificultado é a produção dessas culturas que precisam de mais água.
Esse é um ponto crítico, não apenas para agricultura familiar: a redução na disponibilidade de água. Um relatório da ONG MapBiomas alerta que o Brasil, símbolo de abundância, está secando. O território ainda concentra 12% do volume de água doce no mundo, mas perdeu um milhão e meio de hectares de superfície hídrica em 3 décadas.
A Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico também divulgou um estudo com uma conclusão preocupante: se não houver cortes nas emissões globais de gases de efeito estufa, o Norte, Nordeste e parte do Centro Oeste brasileiros vão perder até 40% da água em menos de 20 anos. Ou seja, ficaria ainda mais complicado sobreviver em localidades como Juazeiro, onde está a Lucia. Todo ser vivo, toda a Terra toda a região, ela realmente sofre, né?
Clama por esse tempo, com essa temperatura alta. A gente sai para trabalhar porque é obrigado. Vai na roça porque tem que olhar alguma coisa.
Mas que é aguentando o calor, o solzão na cabeça, não é não. E aí cada dia que passa tem dificuldade, dificuldade porque. .
. ó, a gente tem. .
. realiza feira agroecológica aí, as mulheres que, principalmente, somos nós mulheres, né, que estamos lá no quintal produzindo esses alimentos. A gente sofre com essa quentura, com essa temperatura alta, porque o alface não produz da forma que é para produzir.
O coentro, ele queima todinho também, né, mais do calor. Então assim, vem interferindo demais. Muito, muito na vida das pessoas, né, principalmente nas nossas vidas que estamos aqui.
Além da agricultura, a escassez de água também pode afetar preços no setor energético. Por isso, o Javier Tomasella, seja pesquisador do Inpe, que ajudou na elaboração do estudo, considera essencial melhorar a gestão de recursos hídricos. O que precisa ser realmente melhorado é a questão da governança da água, né, e isso implica ações públicas.
Políticas públicas, mas também o engajamento do setor privado. Porque se o principal setor usuário é a agricultura irrigada, obviamente a gente tem que criar mecanismos e a própria iniciativa privada tem que trabalhar no sentido de fazer um uso mais eficiente da irrigação, melhorar os métodos de irrigação para que eles se tornem mais eficientes, e gastem menos água. O Ministério do Meio Ambiente se mostrou atento ao assunto.
Em nota, informou que este ano vai lançar um plano de combate à desertificação e que pretende envolver setor público e privado na proteção da Caatinga, o bioma predominante no semiárido. Assim como no uso e na revitalização de bacias hidrográficas. O Ministério declarou ainda que vai tentar reforçar o diálogo entre os governos da Bahia e Pernambuco para ações de enfrentamento à aridez.
Mas é aquela coisa: e a raiz do problema? A enfrentamento, de alguma forma, das mudanças climáticas, ele de alguma forma, está muito atrasado por todos esses questões bem conhecidas. Portanto, não devemos esperar que a situação piore tanto que as mudanças se tornem muito mais dolorosas.
Quanto antes a gente tomar uma atitude, do meu ponto de vista, é melhor. A emergência do planeta é uma questão fundamental, segundo os cientistas. Ela é que teria criado o ambiente de clima árido que a gente vem debatendo ao longo do vídeo.
A questão é que o fato de que a Terra não vai parar de esquentar, nas projeções da comunidade científica, piora as perspectivas para o futuro do Brasil. Ana Paula Cunha já mencionou isso anteriormente. Porque nós estamos aqui discutindo processos de degradação que se retroalimentam.
Poluímos a atmosfera, faz mais calor, a vegetação não sobrevive, o solo fica mais exposto, aquela área degradada interage com o clima e vai se tornando ainda mais quente e seca. Seca até ficar árida ou hiper árida, que seria o equivalente a um deserto mesmo. Além disso, pode se expandir, como sinalizado no estudo do Cemaden e do Inpe.
Então, espera-se, projeta-se que, em razão disso, essa pequena área árida no Brasil de 5000 quilômetros quadrados, logo nas próximas poucas décadas também triplique de tamanho. Em razão do aquecimento global e a consequente mudanças climáticas. É claro que a região semiária é onde isso tem acontecido de forma mais intensa, mas na região centro-oeste, incluindo o Pantanal, é uma região onde o índice de aridez ele tem reduzido.
O que significa isso? Que o clima está se tornando mais seco, né? Então, assim, a gente foca o resultado no semiárido, nessa região árida.
Mas eu diria que o grande alerta é para outras regiões que têm também secado. Os sinais são de que a aridez não vai se restringir ao Nordeste. Na nota técnica do estudo, os pesquisadores escreveram que apenas a região Sul ficaria de fora de uma zona de perigo.
Mas também não é exatamente que o Brasil já tem ou vai ter seu primeiro deserto em alguns anos, nos moldes que conhecemos de outros lugares do planeta. O que os cientistas notaram, em resumo, foi uma mudança climática em solo brasileiro, e essa mudança pode acelerar um fenômeno que já atinge 85% do semiárido do país: a desertificação. Em locais desertificados, a terra chega num ponto de degradação em que não nasce mais nada.
A partir daí, você pode imaginar o que acontece. A saída emergencial, na opinião dos especialistas ouvidos pela nossa reportagem, é apenas uma. Pensar em formas de adaptação.
O fato de ser inevitável significa o quê. . .
que eu preciso me adaptar a essas novas condições, porque aquelas condições que eu já tinha mudaram. Então pode ser que com o passar dos anos, né, e com esse novo clima árido, essas áreas aumentando, sim, acelera o processo de degradação e a gente tenha cada vez mais áreas com solos expostos. Se não tiver um trabalho de reflorestamento, é uma área perdida, um solo pobre, né, que não tem capacidade de produção.
O que a gente tem buscado, né, a praticar, a fazer realmente, é estar buscando novas culturas que sejam resistentes a esse clima aqui. E aí temos práticas, né, de recatingamento, estar replantando novas espécies, principalmente da Caatinga, que a gente tem observado que se perdeu muito.