Eu tenho um problema, meu ascendente é em Áries. E eu tenho outro problema, é que eu sou a menina que nasceu sem cor. Pra alguns, eu sou preta.
. . Pra outros, eu sou preta.
Pra muitos e muitos eu sou parda, ainda que eu sempre tenha ouvido dizerem por aí que parda é cor de papel. E a minha consciência racial quando me chamem de parda fique tão bamba quanto a autodeclaração de artista pop como a Anitta quando pratica apropriação cultural. Eu sou a menina que nasceu sem cor, porque eu nasci num País sem memória, com amnésia, que apaga da história todos os seus símbolos de resistência negra, que embranquece a sua população e trajetória a cada brecha.
Que faz da Redenção de Cam a sua obra-prima. Monalisa da miscigenação e ó, ódio ao milagre da miscigenação, calcado no estupro das minhas ancestrais, na posse de corpos que nasceram para serem livres, na violação de ventres que nunca deveriam ter deixado de serem nossos. E, eu tenho outro problema, pô, não sei dar cambalhota.
E não importa que pra alguns eu seja a menina que nasceu sem cor, que falte melanina para a minha pele ser retinta e que meus traços não sejam tão marcados. O colorismo é uma política de embranquecimento do Estado que, por muito tempo, fez com que eu odiasse os traços genéticos do meu pai herdados. Me odiasse, me mutilasse, meu cabelo alisasse.
Meninas pretas não brincam com bonecas pretas, mas faço questão de botar no meu texto que pretos e pretas estão se armando, se amando, porque me chamam por aí de parda, morena, moreninha, mestiça, mulata, café com leite, marrom bom bom. Por muito tempo, eu fui a menina que nasceu sem cor, mas um dia gritaram-me: "Negra! ".
E eu respondi.