Por que a Alemanha está elevando o perigo de seus parquinhos

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DW Brasil
O contato com o perigo é essencial para o desenvolvimento de uma criança. É o que faz com que ela de...
Video Transcript:
Crianças precisam de perigo. E é o que tem de sobra nos parquinhos na Alemanha. Um jeito de nos fazer lidar com a vida a partir  de uma coisa básica: os próprios limites.
Pedagogia é sobre isso: encontrar o alcance  ou o grau de possibilidades de cada indivíduo. Em comunidades indígenas, por exemplo,  as crianças muito cedo já aprendem a nadar ou lidar com instrumentos  como enxada e até mesmo facão. Por que é tão importante enfrentar  riscos desde tão cedo?
Quando foi que a gente escolheu que  fugir do perigo era a melhor saída? É claro que, aqui, eu estou me referindo  a um tipo de perigo bem específico. E não à ameaça da violência urbana, que nós brasileiros conhecemos  bem e, com razão, temos medo.
Estou falando da mobilidade das crianças,  no desenvolvimento de habilidades delas. E nesse contexto, seria hora de o  Brasil repensar seus parquinhos? Fica comigo que eu vou te explicar neste vídeo.
Esse aqui é um parquinho típico na Alemanha.  Tem em qualquer cidade pequena ou de médio porte. Com escorregador, balanço e um  monte de coisa bem alta para escalar.
Dependendo da localização, costuma ficar movimentado até nos dias  mais frios. E se estiver fazendo calor, esquece! Vai faltar espaço para tanta criança. 
A meninada vem mesmo. Como no Brasil. Está achando tudo meio simples demais?
Como é aí na sua cidade? Conta para  gente nos comentários. Bom, pode até parecer simples,  mas um espaço desses está longe de ser algo feito do nada.
É pensado  nos mínimos detalhes. Inclusive para induzir a imaginação de brincadeiras  diferentes com um mesmo objeto. E com uma regra clara: precisa  ter uma certa dose de aventura.
Como a Alemanha valoriza muito  a informação escrita, existe um documento explicando como os parquinhos  são ou devem ser planejados. Na verdade, é um conjunto de diretrizes para  estrutura dos brinquedos. Está tudo aqui.
O texto diz que eles têm que  ser perigosos. E justifica que a competência de risco adquirida ao ar livre é a  base para o estímulo à segurança. Ou seja, se a criança lida com o perigo,  ela sabe também como reconhecer e evitar.
Sem risco, sem segurança. É o que está escrito. Mas, como você pode imaginar, não  são riscos aleatórios.
Muito menos com exagero. Eles são projetados  com um viés puramente pedagógico. E dosados para serem superados  sem graves consequências.
O que este especialista acredita ser fundamental  para formar na criança uma identidade própria. Ele atua na Escola Superior  de Pedagogia de Karlsruhe, uma instituição alemã voltada  à formação de professores. Tudo isso se refere a um dos principais fatores  para um bom desenvolvimento das crianças, que é correr riscos.
Correr riscos significa permitir  que as crianças se aproximem de seus limites. E quando você se aproxima dos seus limites você  pode descobrir quem você é. Simples assim.
Quando você proíbe coisas que  crianças podem explorar e descobrir, você veta a possibilidade de  elas se desenvolverem. Este estudo aqui mostra que crianças que  conseguem desenvolver habilidades motoras nos parquinhos estão menos suscetíveis  a acidentes na idade adulta. Agora.
. . vai falar isso para um  pai ou uma mãe no Brasil?
Você tem a sensação de que é uma barreira  difícil para os pais brasileiros? O especialista disse que é uma  questão delicada na Alemanha. Precisamos permitir mais riscos,  mas muitos pais não mudaram.
Não mudaram a mentalidade sobre o que  os filhos necessitam. E eles precisam essencialmente de mais riscos. Deixem que eles  saiam.
Deixem que caiam. Deixem que se machuquem, arranhem os joelhos, e sejam felizes.  Porque eles podem se desenvolver melhor.
Todo esse apelo para os pais deixarem  as crianças soltas em parquinhos tem um motivo. É praticamente o único espaço  de liberdade que restou a elas. Os primeiros playgrounds na Alemanha teriam  aparecido em meados do século 19.
Quando a Revolução Industrial já havia criado raízes. E  transformado a vida na Europa numa sequência de invenções e modelos de trabalho para aumentar  a produtividade de bens de consumo. Chegou o século 20, e as pessoas viram os  carros ocuparem as ruas, onde as crianças também brincavam.
A diversão delas deixou de ser,  digamos, cem por cento segura do lado de fora. O que forçou os pais a buscarem uma alternativa do  lado de dentro: a construção de parquinhos. Pois é.
Antes, quando eles surgiram, não eram  públicos não. Eram privados. Cada pai, mãe, fazia para o seu filho.
Só tinha na casa  de quem podia e dispunha de espaço. Após a Segunda Guerra, esses lugares simplesmente ficaram para depois. A urgência  em reconstruir o país se impôs.
O pesquisador com quem conversamos  afirma que só na década de 1970 é que os playgrounds voltaram ao foco  de atenção. E para todo mundo. Tanto que algumas estruturas espalhadas pela  Alemanha ainda são daquele tempo.
Tempo em que a pedagogia daqui foi visionária:  não temos como expor nossos jovens aos riscos de cidades movimentadas, mas sem risco  eles não têm como se desenvolver. Pedagogia é sobre isso: encontrar o alcance  ou o grau de possibilidades de cada indivíduo. Talvez você caia e tenha um pequeno  ferimento no joelho.
E tudo bem. Isso é até bom para as crianças identificarem:  bom, nesse momento ou nessa situação, eu estava muito rápido. Da próxima  vez farei diferente, de outro jeito.
E não significa de maneira alguma que esses  brinquedos não sejam seguros. Na verdade, o próprio cientista da educação  diz que a Alemanha é um país obcecado por segurança. Um exemplo,  aliás, para países mundo afora.
No caso dos parquinhos, inclusive o Brasil. Nós conversamos com a Paula  Mendonça, uma especialista em educação que veio à Alemanha em 2017  aprender sobre os parquinhos alemães. Ela trabalha no Instituto Alana, uma ONG no Brasil que contribui para políticas públicas  de incentivo a cidades sustentáveis.
E isso inclui integrar natureza  e vida urbana de tal forma que as crianças possam crescer em  harmonia com esse entorno. Nada melhor que um parquinho para  brincar à vontade – especialmente para quem vive em metrópoles.  Mas não qualquer parquinho.
Acho que os lugares e os parques e os espaços  voltados para as crianças que têm sido mais interessantes são os que têm se mostrado  mais potentes e mais convidativos para o desenvolvimento da criança. São esses espaços  que conseguem equilibrar o risco benéfico, oferecer desafio para as crianças e  oferecer uma oportunidade de que a criança ela desenvolva suas capacidades, né?  Seja cognitiva, intelectual, física.
A Paula se refere, de certa  forma, ao modelo alemão. Que, aliás, já existe pontualmente no  Brasil. São os chamados parquinhos naturalizados.
Com elementos e formas  da natureza, como o nome sugere. Embora o mais comum ainda seja brinquedos  padronizados para atividades repetitivas, bem baixinhos ou até de plástico.  Para afastar ao máximo o perigo.
O que é uma estratégia questionável,  na visão dos especialistas ouvidos para esta reportagem. Ainda mais num país como o  Brasil, com outras referências tão perto. Em comunidades indígenas, por exemplo, as  crianças muito cedo já aprendem a nadar ou lidar com instrumentos como enxada até mesmo  facão, e subir em árvores e cortar coisas, né?
E aqui no ambiente urbano, por exemplo, as  crianças não têm nem a chance. Então isso faz com que nós, adultos, criemos uma ideia de que a  as crianças não são capazes, que elas não sabem, não estão prontas. Quando que se a  gente olha um pouquinho mais amplamente, para diversas culturas, essas  crianças são muito capazes.
É aquela história. Capazes as crianças são.  O que falta é a paisagem para brincar.
Na Alemanha, mesmo os ambientes artificiais feitos para provocar a percepção da  meninada não são muitos. Esse é justamente o problema que o Ralf  Schwarz pesquisa e tenta resolver. Existe um número entre 80 e  100 mil parquinhos na Alemanha, distribuídos por todo país para  cerca de 83 milhões de pessoas.
O que não é muito. Não sabemos  exatamente o tamanho deles, quantos metros quadrados por criança.  Não sabemos quantas estruturas.
Há muitas coisas que não sabemos. E vamos  tentar descobrir nos próximos 10 anos. A gente fala sobre o exemplo da Alemanha.
Mas  ele está longe de ser uma receita universal. Até porque nem todos os parquinhos daqui  são iguais. Nem teriam que ser.
E como a Paula lembrou há pouco, existem também outros modos de vida  em que o parquinho é a árvore, o rio, a terra batida. Essas coisas que o nosso  olhar de cidadão urbano desacostumou a ver. O que é cientificamente comprovado é  a importância da liberdade para cair e levantar.
. . o contato com o perigo. 
Onde quer que uma criança esteja. E esse princípio serve para refletirmos: será  que a imensa classe média urbana brasileira está mesmo preparando seus filhos para  desenvolver a tal competência de risco? Será que é hora de rever a forma como  os parquinhos no Brasil são feitos?
É urgente pensar em outros tipos de brinquedos, em ampliação desses mercados para  brinquedos que ofereçam realmente mais possibilidades criativas imaginativas e de  desenvolvimento físico das crianças. Um desses exemplos são os parques naturalizados  com quais a gente vem trabalhando. E você?
O acha dessa ideia? É quase como se a proposta de solução fosse um retorno ao passado. Ou criar algo que  ao menos remetesse a esse passado.
Não no sentido do arcaico.  Mas na retomada do contato perdido com a natureza. E vai além disso.
Eu me lembro, por exemplo, de  brincar na rua quando pequeno. A minha infância toda foi num bairro  onde passava carro vez ou outra só. E os pais não ficavam ali monitorando a criançada o tempo todo não.
Era como se houvesse um  acordo de cuidado mútuo entre os amigos. O que sem a gente saber significava que estávamos aprendendo a cuidar de nós e dos outros.  Estabelecendo laços para a vida toda.
Essa consciência sobre si e a importância do outro também é uma habilidade hoje exercitada nos  parquinhos. Já que perdemos as ruas. Isso só precisa ser feito – ou arquitetado - do  jeito mais natural possível para entendermos: não estamos sozinhos e viver não é fácil.
É  uma sucessão de perigos e riscos repentinos. Importante é aprender a enfrentá-los  desde sempre. E melhor: brincando.
O essencial é identificar qual é o  seu grau ou nível de risco pessoal. A aprendizagem, ela tem a ver com isso, de  você estar numa certa condição no momento e você tem um desafio e você amplia sua  capacidade, seja intelectual, física, cognitiva, a partir de um certo estímulo, a  partir de um certo desafio que o meio te coloca.
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