Quando seres humanos vão para o espaço, coisas incríveis podem acontecer. Mas nem toda coisa incrível é necessariamente boa. Às vezes seres humanos vão para o espaço e levam com eles o que há de pior na Terra.
Eles testam armas tão poderosas e com efeitos tão perversos que a melhor decisão é bani-las pra sempre. E o vídeo de hoje conta a história de uma dessas armas. Nós estamos acostumados a ver imagens de bombas nucleares formando nuvens de cogumelo.
Mas o que acontece quando uma bomba nuclear explode no espaço? Pra esse vídeo fazer sentido, eu preciso falar sobre o contexto em que o mundo se encontrava na década de 60. Durante a Segunda Guerra Mundial, alguns físicos perceberam que era questão de tempo até alguém conseguir liberar a energia contínua no núcleo atômico.
E entre eles estavam Leo Sidler e Albert Einstein. Liberar a energia do núcleo atômico seria maravilhoso para a humanidade, porque usinas nucleares poderiam ser construídas e fazer a energia elétrica ficar acessível para todos. O problema era que o mundo estava em guerra, e praticamente ninguém pensava em usinas nucleares quando se falava em energia nuclear.
O primeiro pensamento eram bombas. Se a Alemanha dominasse a fissão nuclear, isso abriria caminho para ela produzir bombas atômicas. Esse medo fez com que Albert Einstein e Leo Zeland enviassem uma carta para o presidente dos Estados Unidos na época, Franklin Roosevelt.
A carta alertava o presidente de que a Alemanha possivelmente conseguiria produzir bombas nucleares, que seria uma boa ideia os Estados Unidos começarem o seu próprio programa nuclear. O projeto Manhattan foi criado como resposta e ele envolveu a criação de uma cidade no meio do deserto e a contratação de mais de 130 mil pessoas, desde trabalhadores até cientistas ganhadores do Nobel. O objetivo do projeto era criar a primeira bomba nuclear da história.
E eles conseguiram. A primeira bomba nuclear da história, chamada Trinity, foi detonada em julho de 1945. Não tinha mais volta.
A humanidade agora estava na era nuclear. É importante entender o que aconteceu logo em seguida, porque as coisas foram evoluindo muito rápido. Em um espaço de poucos anos, a humanidade aprendeu a realizar fissão nuclear, criar bombas e usá-las como armamentos.
Mas a história da humanidade só aconteceu do jeito que aconteceu por causa da Guerra Fria. Ela começou logo após o término da Segunda Guerra Mundial e tem esse nome porque ela nunca escalou para uma guerra total entre os participantes. Ainda assim, é quase impossível de encontrar alguém que viveu nessa época e não ficou marcado pelo jeito que o mundo funcionava.
A razão principal? O medo de uma guerra nuclear. Pela primeira vez na história, humanos tinham uma arma tão poderosa que só a existência dela era o suficiente para impedir conflitos porque, caso um acontecesse, ambos os lados seriam reduzidos a cinzas.
Testes nucleares se tornaram rotina. Eles aconteciam na atmosfera, embaixo da terra e até no fundo dos oceanos. Mas no meio dessa corrida em busca de bombas mais poderosas, uma outra disputa tecnológica ganhava cada vez mais forças.
A corrida espacial. A ida do primeiro ser humano para o espaço levou para fora da Terra a necessidade de mostrar força. A corrida espacial teve um lado bom, que foi desenvolver a indústria espacial até o ponto em que nós conseguimos pousar na Lua, mas ela também serviu de pretexto para que armas começassem a ser colocadas em órbita.
No início essas armas eram principalmente satélites, usados para comunicação e espionagem. Mas como os satélites ficavam em órbitas muito altas e davam uma vantagem de inteligência significativa para os países, não demorou muito tempo para que armas anti-satélites começassem a ser desenvolvidas. E uma delas é a razão pela qual esse vídeo existe.
Bombas nucleares. A ideia era usar bombas nucleares para destruir satélites ou até mesmo mísseis nucleares inimigos em caso de guerra. Só tinha um problema.
Ninguém tinha testado isso antes. Todo teste nuclear até então tinha sido feito na Terra, o uso até embaixo dela, como eu falei agora há pouco. Nesse ponto da história, as bombas de Hiroshima e Nagasaki já tinham sido detonadas e a humanidade entendia melhor os efeitos de bombas atômicas.
O que ninguém entendia é como seria uma explosão fora da Terra. A grande diferença é a ausência de atmosfera. Então, deixa eu começar explicando o que acontece quando uma bomba nuclear explode aqui na Terra.
Os efeitos imediatos são familiares para a maioria de nós. Tudo começa com o clarão, seguido por uma onda de choque extremamente destrutiva, e é claro, a radiação liberada pela fissão nuclear. O clarão começa quando a energia da bomba é liberada.
Cerca de 35% da energia liberada em uma explosão nuclear é calor. Ele aquece a atmosfera ao redor até temperaturas parecidas com as que encontramos dentro do Sol, milhões de graus Celsius. E aí a própria atmosfera começa a brilhar de tão quente.
E essa energia empurra a atmosfera para longe em todas as direções. Isso acontece tão rápido e de maneira tão intensa que uma parede de ar extremamente comprimido se forma. Essa é a onda de choque, a responsável pela maior parte da destruição inicial de uma explosão nuclear.
E ao mesmo tempo, como se tudo isso já não fosse suficiente, nós ainda temos a liberação de radiação. E nós podemos dividir essa radiação em dois tipos, a inicial e a residual. A radiação inicial acontece logo no primeiro minuto depois de a bomba nuclear ser detonada.
Ela é formada principalmente por raios gama e neutros. O detalhe é que ela diminui de intensidade conforme nós ficamos mais longe da explosão inicial e um dos motivos é a atmosfera, que serve como uma barreira que impede que ela se propague ainda mais longe. E a radiação residual, o segundo tipo e mais duradouro, é formada principalmente pelos resíduos que sobram da explosão e contaminam grandes áreas.
E essa é a radiação que pode durar décadas, como é o caso do lugar onde o teste Trinity aconteceu, que até hoje emite uma quantidade extra de radiação que pode ser medida. E com isso você agora entende o suficiente os efeitos de uma explosão nuclear aqui na Terra, que também é chamada de explosão nuclear atmosférica. Agora você está preparado para entender o que acontece quando uma bomba nuclear explode no espaço.
A principal diferença no espaço ou em grandes altitudes é a ausência da atmosfera. Vamos olhar os três efeitos de uma explosão nuclear atmosférica. O primeiro é o clarão, o segundo é a onda de choque e o terceiro é a radiação.
Eu vou começar com o clarão. Em explosões nucleares atmosféricas, o clarão é formado principalmente pelo ar aquecido ao redor da detonação. Como em grandes altitudes não temos atmosfera, ou se nós tivermos é muito pouca, isso muda bastante as coisas.
Nós continuamos tendo um clarão inicial por causa do calor e energias gerados na fissão nuclear, mas ele dura menos. Já a onda de choque, que por definição é uma onda mecânica que precisa de um meio para se propagar, é extremamente atenuada para grandes altitudes e praticamente inexistente para explosões nucleares fora da atmosfera. E isso nos leva ao último item da lista e provavelmente o mais afetado, a radiação inicial.
Lembram quando eu falei que em explosões nucleares atmosféricas uma boa parte da radiação inicial é absorvida pela atmosfera, meio que servindo como um escudo? Se você tirar a atmosfera da equação, você tira essa barreira. E de fato, a radiação da explosão nuclear no espaço não só dura muito mais tempo, como também continua perigosa mais longe.
Vamos supor que duas bombas iguais fossem explodidas, uma na Terra e outra no espaço. E digamos que aqui na Terra a distância para absorver uma dose letal de radiação fosse de 5 km. No espaço essa distância vai ser muito maior, digamos de cerca de algumas dezenas de km.
Mas a maior diferença provavelmente é o pulso eletromagnético. E ele é praticamente exclusivo para explosões nucleares fora da atmosfera. A explosão da bomba libera grandes quantidades de raios gama.
E isso é verdade, tanto dentro quanto fora da atmosfera. Mas no espaço, ou em grandes altitudes, os raios gama não são tão absorvidos quanto aqui no chão. O resultado é que os raios gama extremamente energéticos gerados na explosão depositam a sua energia nos átomos e moléculas que compõem as camadas superiores da nossa atmosfera.
E isso arranca os elétrons e separa o núcleo atômico gerando íons, que nada mais são do que partículas carregadas. E essas partículas carregadas, por sua vez, aceleram e se movem influenciadas pelo campo magnético da Terra, criando correntes elétricas que geram ondas de rádio. Os efeitos são bastante semelhantes aos de uma tempestade solar, que se vocês se interessarem, tem um vídeo meu que fala sobre aqui.
Os efeitos de um pulso eletromagnético podem ir desde interferir na comunicação até destruir equipamentos eletrônicos no espaço ou em solo. E foi exatamente isso que aconteceu durante um dos testes. Eu gostaria muito de dizer que esse vídeo é apenas teoria e que bombas nucleares nunca foram detonadas fora da atmosfera, mas isso não é verdade.
Os Estados Unidos e a União Soviética detonaram diversas bombas em altas altitudes, inclusive durante a crise dos mísseis de Cuba, que provavelmente foi o episódio mais crítico da Guerra Fria. O mundo teve a fim de uma guerra nuclear completa. O teste mais famoso e potente feito no espaço até hoje foi o Starfish Prime.
Se você estivesse no chão a 1. 450 km de distância, você ainda veria a noite virar dia. Ele aconteceu em 9 de julho de 1962, a uma altitude de 400 km, um pouco mais do que a altitude da órbita da Estação Espacial Internacional.
A bomba tinha por volta de 1,4 megatons, quase 100 vezes mais do que a de Hiroshima. Mas ninguém esperava o seu efeito. A detonação gerou um dos pulsos eletromagnéticos mais intensos já registrados, comparáveis com os gerados por tempestades solares.
Postes de luz pararam de funcionar no Havaí a 1. 450 quilômetros de distância. Alarmes de carro dispararam na Nova Zelândia a 1.
300 quilômetros da explosão. Mas o pior dos efeitos ainda estava por vir. A detonação da Starfish Prime jogou cem bilhões de bilhões de bilhões de elétrons na atmosfera.
Uma parte deles seguiu as linhas de campo magnético do nosso planeta e formou auroras. Mas outra parte, formada principalmente por elétrons extremamente energéticos, ficou presa e formou cinturões de radiação ao redor da Terra, que foram os responsáveis pela destruição de alguns satélites. O primeiro deles foi o Telstar, lançado um dia depois do teste da Starfish Prime.
Quando ele parou de funcionar alguns meses depois, a dose de radiação calculada foi 100 vezes maior do que a esperada. Ao todo, 7 satélites pararam de funcionar como consequência direta do Starfish Prime, e os elétrons gerados pela detonação ainda podiam ser detectados em órbita 5 anos depois. E os impactos em humanos poderiam ser ainda piores.
As doses estimadas de radiação em órbita nos meses seguintes ao teste eram calculadas em várias vezes o limite anual de exposição à radiação. E agora eu pergunto, como você acha que a União Soviética respondeu a essa demonstração de força? Os testes nucleares no espaço mostraram um horror que até então era apenas ficção científica.
A guerra não tinha mais fronteiras. As consequências dela podiam afetar até o espaço e a nossa habilidade de sair do planeta. Mesmo se você fosse um país neutro, o céu sobre você não estava livre de se tornar incandescente.
Como resposta aos testes americanos, a União Soviética implementou o Projeto K, cinco testes nucleares conduzidos em altitude. E o pior deles aconteceu no dia 22 de outubro de 1962, bem durante a crise dos mísseis de Cuba. A bomba utilizada tinha 300 quilotons, bem menor do que a Saffir Spring, e a altura era praticamente a mesma.
O diferencial foi o local. O teste foi conduzido em cima do continente, em uma região populosa. Detectores de corrente tinham sido estrategicamente preparados ao longo de uma linha telefônica de 570 quilômetros.
E por causa da explosão, todos eles mediram correntes altíssimas, queimando os disjuntores que protegiam a rede. Uma linha de cabos elétricos subterrâneos com mil quilômetros de comprimento também foi afetada. E a corrente induzida pelo pulso eletromagnético fez com que a usina elétrica da cidade de Caraganda pegasse fogo, sendo destruída.
O teste do dia 22 de outubro de 1962 é até hoje o mais destrutivo exemplo que nós temos de um pulso eletromagnético gerado por uma explosão nuclear no espaço. Como que você reagiria se vivesse nessa época sendo apenas um passageiro em uma disputa de força entre as duas ações mais poderosas da época? Eu não posso responder por você, mas eu posso tornar o final desse vídeo um pouco mais otimista.
Conforme os testes nucleares foram ficando cada vez mais poderosos e perigosos, e a humanidade foi se dando conta de que nós não entramos em uma guerra nuclear total diversas vezes por pura sorte, a pressão popular venceu. Testes nucleares atmosféricos, submarinos e no espaço foram proibidos em um tratado histórico assinado em 1963. Ele ainda permitia testes subterrâneos, mas foi um desfecho para uma era marcada pela insanidade e busca por armamentos cada vez mais poderosos.
Atualmente um outro tratado, o tratado do espaço sideral, assinado por 114 países, proíbe que armas nucleares ou de destruição em massa sejam colocadas em órbita ou em corpos celestes ou em qualquer lugar do espaço. Ele é muito claro em representar praticamente a terra inteira e dizer em alto e bom som que o espaço não é o lugar para o desejo de destruição de alguns representantes da nossa civilização. A humanidade só aprendeu quando testemunhou em primeira mão os efeitos negativos e duradouros que explosões nucleares podem ter.
Que toda e qualquer tentativa de reviver os anos insanos da década de 60 seja rapidamente combatida. Mas e você? O que você faria se olhasse para o céu de noite e visse uma explosão nuclear acontecendo?
Digita aqui nos comentários. E também me digam qual tema vocês querem ver no próximo vídeo. E essas camisetas que eu uso nos vídeos e são em promoção na minha loja.
Ganhe duas pulseiras Loos em pedidos acima de R$200 e o frete é grátis para o Brasil inteiro em pedidos acima de R$300. É só clicar no link aqui na descrição, mas não demore porque o tempo é limitado. Muito obrigado e até a próxima.