Por que eu sou maravilhosa e vocês são horríveis? Mérito! Por que este diamante está na minha família à seis gerações e não na de vocês?
Mérito! Bom, como já você deve ter visto em algum local desta tela o tema do vídeo de hoje é Meritocracia Menina, eu ando nessa toada de fazer vídeo sobre ficção já fiz um sobre papel de gênero, vai aparecer em algum local já fiz um sobre racismo reverso, né? E hoje esse outro mito fundador da nossa incapacidade de articulação de consciência de classe é a Meritocracia então vem comigo, que o vídeo promete!
Então a gente vai começar falando que a Dona Gabriela Prioli, fez um vídeo no canal dela uma entrevista super interessante com o Michel Sandel ele é professor em Harvard e autor de um livro que ela trabalha no clube do livro dela agora mais recente autor de "A Tirania do Mérito" um livro no qual o Michael vai mostrar como a ideia da meritocracia é uma ideia extremamente perigosa ainda mais em tempos politícos como o nosso Então lá, nessa entrevista no canal da Gabriela uma das primeiras ideias que é colocada no debate dos dois é a ideia de que a meritocracia, ela é uma ideia sedutora e porque ela é uma ideia sedutora Porque a gente deve pensar que todas as ideias que carregam consigo sementes de morte não se apresentam assim: Oi eu sou uma ideia com as sementes da morte, da morte geral, do ódio da destruição Não, elas sempre se apresentam e são passadas através de um malabar ideológico como ideias bonitas, boas, cheirosas, limpinhas Com a meritocracia não é diferente ela aparece para nós em uma era pós queda da aristocracia ela é um ideário extremamente burguês e pequeno-burguês e ela se coloca no horizonte como, bom agora que a aristocracia acabou A aristocracia era um época e uma classe que tinha privilégios de nascença então um duque, um barão, uma condessa, um visconde essas pessoas nasciam numa classe, numa casta que era um direito de nascença a nobreza nascia nobre, eles eram diferentes o populacho, da ralé, do campesinato, dos plebeus porque Deus assim os quis eles estavam de alguma forma conectados sanguinamente com as famílias reais e portanto eles eram primos, tios primo de terceiro grau, sobrinho da neta do primo do cara que casou com a irmã então eles tinham sangue de Deus a gente nunca pode esquecer o Carlos Magno, o primeiro rei da Europa e blábláblá, quem acredita nessas fidaganhada tudo Mas a história é, que os reis eram representantes de Deus na Terra tipo um Faraó Eu falei Faraó não consigo falar sem dançar Então a ideia da meritocracia, quando ela aparece junto do ideário burguês, ela aparece assim olha, não mais essa história de você nasceu bonitinho, diferente mamãe passou talquinho em mim, dentro de um palácio agora, você precisa se esforçar a gente deve pensar que o funcionamento das cortes na Europa o funcionamento dos períodos monárquicos, absolutistas e etc eram repletos de nepotismo Então, seu pai foi secretário de finanças, você ia ser a função da sua família é cuidar da dieta do castelo Então, esses títulos, ocupações e profissões eram mantidos dentro de uma classe A gente que da aula de literatura inglesa na Janinha a gente costuma sempre mostrar como a Janinha é uma crítica dessa série de costumes e dessa etiqueta aristocrática que possibilitam um funcionamento especial de uma sociedade por exemplo, para contar pra vocês antes do período Vitoriano, período da Regência lá na Inglaterra se você, de um classe mais baixa falasse com uma pessoa de uma classe mais alta sem que ela tenha tivesse te convocado a falar, tivesse te convidado a falar você poderia ser açoitado era uma regra de etiqueta que era uma lei você tinha que ser apresentado a alguém "Permita que eu te apresente" eram essas benesses esses favores era assim que funcionava Então a ideia de meritocracia quando aparece no mundo ela aparece bonitona ela fala: Olha agora tudo isso acabou agora é sobre talento, inteligência esforço, agora é você que faz sua vida tudo depende das suas escolhas a sua troca de classe social acabou, o anciã regime acabou agora é o regime novo que de novo era só uma pintura e um verniz Sempre que eu preciso falar de meritocracia em um tuíte eu uso um vídeo, provavelmente vocês já tenham visto se não viram, vai estar aqui na descrição do vídeo também é uma corrida, o treinador fala pra galera: Ó vocês vão correr por essa nota de cem dólares, quem chegar primeiro ganha cem dólares, mérito né? Na verdade não, porque essas pessoas não comeram igual não tiveram o mesmo treinamento mas enfim, finjamos mérito aí ele fala: No entanto eu preciso que você dê um passo a frente, se você cresceu numa casa com pai e mãe um passo a frente, se a escola era próxima da sua casa um passo a frente, se você tinha um local de estudos um passo a frente, se você tinha energia elétrica seus pais não abusavam de substâncias químicas, etc Depois de falar tudo isso, o treinador mostra aos competidores que essa é a vida meritocrática que de mérito tem muito pouco, porque alí na corridinha todo mundo que ficou pra frente são pessoas brancas e homens Então ele fala: Agora vocês vão correr por cem dólares Quem será que vai conseguir? Então não importa, a mulher preta que ficou no final da fila não importa quão rápido ela corra, a chance que ela tem de pegar a nota de cem dólares, é infinita ou quase nenhuma Um outro problema, da gente acreditar em meritocracia é que a ideia meritocrata cria na sociedade uma cultura de perdedores e vencedores a ideia de que é uma corrida que todo mundo pode chegar só depende de você, se esforce e blábláblá ela vai estimulando em nós uma percepção de que algumas pessoas são merecedoras e outras não e essa ideia mascara, ou melhor, ela normaliza, ela naturaliza as desigualdades, os funcionamentos absurdos da sociedade as violências, as discriminações porque no final do dia algumas pessoas se esforçaram pra ter um jatinho, pra praticar equitação na Hípica e quem é pobre, preto, fudido trabalha de caixa de supermercado frentista de posto, vende carregador de celular no metrô de certo não se enforçou o bastante Outra coisa bárbara é que a gente se atem as palavras sempre falo pra vocês do Seu Raimundinho do Raymond Willians, do palavras-chave o livro dele chamado "O Vocabulário de Cultura e Sociedade" que o Raymond vai nos ajudar a entender que as palavras carregam trajetórias social históricas e políticas consigo antes da meritocracia, a gente acreditava na graça por sermos sociedades cristãs a gente acreditava que algumas pessoas caíam nas graças divinas e outras não então você tem pessoas graciosas e desgraçadas outra palavra é "Fortune", no inglês tem essa expressão "Fortune Teller", uma pessoa que lê o seu futuro que te diz o que vai acontecer "Fortune" não tem nada a ver com fortuna, historicamente tem a ver com sorte, com a roda da fortuna com o que vai acontecer e essa palavra desafortunado é alguém que o destino não estava traçado pra vitóri "ai que evento fortuito" é uma coisa boa, auspiciosa Então como as nossas palavras que são formas cristalizadas de entendermos o funcionamento da sociedade como elas carregam consigo retratos, fotogramas de como opera o sistema de valores e significados de um grupo em um tempo Outra ideia importante de explicar, a gente já falou disso aqui é que essa ideia de mérito, máscara as operações sociais quando a gente acredita que mérito tem a ver com esforço e dedica como a gente explica que a Dona Josefa que é quitandeira que trabalha na área rural, na zona rural que leva verdura e legumes pra alimentar, ganha tão pouco como a gente explica que o Seu José que é motorista de caminhão que passa a noite acordado dirigindo como a gente explica que a Jussara que é mãe de quatro crianças na periferia, trabalha de babá não vê os filhos, vê os filhos de quinze em quinze de trinta em trinta, dorme na casa da patroa, cria os filhos.
. . como a gente explica que essas pessoas na meritocracia não se esforçaram, não se dedicaram o suficiente e ai eu espero que o assunto vá sendo introduzido pra vocês para que a gente entenda como a meritocracia, a ideia dela é uma operação discursiva, é uma bravata ideologica pra justificar o funcionamento e as injustiças e as opressões de uma sociedade absurda Lá no vídeo da Gabriela que eu falei o Michael da um exemplo super engraçadinho, pensemos o Neymar pensemos a Naomi Campbell que são pessoas que vieram de background empobrecidos que são pretas, que são pobres que eram periféricas e que "deram certo", que se esforçaram Não, elas só deram certo nesse tempo e nesse espaço não tem nada a ver com mérito não tem nada a ver com talento tem muito mais a ver com hora certa e lugar tem muito mais a ver com fortuna, com bem aventurado com cair nas graças de um tempo no 1700 ninguém ligava pra futebol então o Neymar com seu talento de atleta e de sonegador de imposto dele não teria acontecido no 1700 a Naomi Campbell, a mulher mais bonita dos anos 90 em outra era em que magreza não é elogiada, não seria bonita Então tem muito pouco aqui de talento, de esforço e tem muito mais aqui de fortuna Então chegamos propriamente dito a palavra meritocracia primeira vez que ela vai ser usada de forma sistemática é por aquele sociól britânico que eu mencionei, o Michael Young, em um livro dele chamado "The Rise of the Meritocracy" " A Assensão da Meritocracia" de 1958 é um livro em duas partes e oito capítulos antes de ser publicado ele foi rejeitado inúmeras vezes as vezes porque a galera que queria editar falava "Não, a gente tava pensando numa coisa meio Admirável Mundo Novo" do Aldous Huxley, só que 2.
0 outras editoras falaram que não publicavam tese de mestrado e doutorado Então o livro que caia em uma ficção científica mas não tão boa ou é uma teoria social mas muito complexa tomou inúmeros nãos, até ser publicado em 58 Então, primeira coisa ele aparece como uma sátira política deve ser lido como uma sátira né e não foi a palavra meritocracia no inglês foi incorporada no vocabulário como uma coisa bacana e o livro é uma distopia e ai lá no capitulo quatro o Seu Maiquinho explica que a meritocracia, essa junção de habilidade com esforço e logo no capítulo 5 a gente começa entender como opera essa sociedade os capítulos prévios vão contanto pra gente o que foi a revolução meritocrática nessa sociedade distopica no capítulo 5 a gente aprende que um terço da população não tem as habilidades, os esforços e são pobres, marginalizados, moram em periferia são de famílias empobrecidas e os seus empregos foram com os avanços da tecnologia tomados por máquinas e essas pessoas se tornaram servas então a gente tem uma sociedade onde um terço da população ocupa uma posição servil é aqui que a sátira política começa e até se aproxima do Geoge Orwell, por exemplo é uma obra bem humorada, satírica, mas a gente deve fazer a leitura dela tentando entender quais são os apontamentos pra época ela dialoga com o sistema educacional que havia por exemplo no Reino Unido na época que separava as crianças, então as crianças da classe trabalhadora vai pra escola mais podrinha porque você não vai precisar saber filosofia, literatura crianças da classe média, vai pra essa escola aqui que ai você aprende uns negocinho mais e crianças da elite vai pra ITA, vai pra Cambridge, vai pro colégio preparatório porque você tem que aprender a debater você tem que aprender finanças tem que aprender economia e esse sistema vigorou na Inglaterra até ontem no relógio da história apesar de ser uma distopia o livro aponta caminhos bacanas no final, quando a população começa se revoltar com esse sistema e lutar por um sistema de melhores acessos de mais igualdade, etc. . .
que que fica pra gente dessa história meritocrata é de que existe aqui uma implementação como disse antes, ideológica para naturalizar um funcionamento estrutural e social Se antes a gente tinha casta, a aristocracia que nasceu perfeita bonita, então ela tem o direito de ficar descançando no Palácio e fazer festa a gente quando passa pro sistema de classes como a gente entende agora as classes ABC alfa númerico você abre mais um banheiro na tua casa, você mudou de classe você comprou uma moto você mudou de classe e aqui estaria a ideia que só depende de você o seu consumo, sua produção, seu esforço pode te deslocar pode fazer você ascender tá tudo bem a sociedade não é ruim ruim é a sua preguiça Só que ai eu trouxe dados porque eu não saio de casa sem referência bibliográfica pra desmontar essa falácia não é possível que toda população preta é preguiçosa e burra não é possível que a população de mulheres é acomodada não é possível que a população de imigrantes não é esforçada não é possível que em toda história do planeta só a população branca europeia, heterossexual, cisgênero masculina seja quem tem mérito essa é a ideia, ela é absurda agora estatisticamente ela também é absurda eu separei alguns estudos norte-americanos tá tudo aqui linkado que vai mostrar como os Estados Unidos a terra da liberdade, da meritocracia, trabalha que dá dá pra morrer, dá pra ficar sem auxílio médico lembra da enfermeira que uma vez caiu no metrô e falou "não liga pra ambulância, porque se não vou ter que contrair uma dívida e não vou ter como pagar eu prefiro curar minha perna fraturada em casa do que ir pro hospital e contrair uma dívida que eu vou precisar de um empréstimo no banco ficar pagando em parcela" Esse é o sistema maravilhoso e meritocratico que tem lá sem serviço público de saúde por exemplo e aqui o importante nesses estudos que eu vou elencar é a gente entender como eles mostram que não tem mérito nenhum Se você somar código postal o CEP da pessoa com grau de escolaridade e riqueza dos pais Nova legenda e as previsões tão sempre certas de 2015 a gente tem esse estudo sobre a mobilidade econômica dos Estados Unidos dá pra ascender socialmente se eu me esforçar, estudar se eu fizer uma faculdade, eu ascendo Aliás, um assunto que eu até pensei em fazer um vídeo mas é tão curtinho, não precisa de um vídeo o Oscar esse ano tava refleto dessas narrativas neoliberais, aquele filme que a Glenn Close foi indicada pro Oscar de melhor atriz codjuvante "Era uma vez um sonho" tá disponível na Netflix é uma história barata digna de livro de auto-ajuda de vai lá faz várias dívidas no cartão, faz empréstimo no banco tenha 22 cartões de crédito se foda bastante aprenda a etiqueta da classe dominante finja amizade com pessoas que você odeia que no final "tudo vai dar certo" e tudo vai dar certo na história é ter dois filhos e uma casa Então voltando, esse estudo de 2015 ele vai mostrar as diferenças salariais que existem entre crianças que cresceram em casas de determinadas classes sociais uma classe média, uma classe muito baixa e uma classe muito rica, e as diferenças que existem são de mais de duzentos por cento, por exemplo entre a classe mais rica e a classe mais pobre Aliado a esse estudo tem um de 2018 que foi publicado em 2020, por uma série de pesquisadores de Harvard comunistas de certo Que vai fazer um mapa um atlas de oportunidades nos Estados Unidos, que é exatamente isso o seu CEP e algumas informações sobre você conseguem determinar de onde você veio onde você mora e quanto você ganha E o estudo foi publicado porque ele praticamente não tem erro nas previsões que ele faz então agora você soma os dados do estudo de 2016 que te diz que a renda e a escolaridade dos seus pais determina quanto você vai ganhar com outro que dependendo de onde você nasceu dá pra prevêr como vai ser sua vida expectativa de vida quantos anos você vai viver você me fala: Olha que meritocratico!