A terra natal do Kindergarten, de universidades com séculos de existência, de um ensino altamente técnico. O moderno sistema educacional alemão traça suas origens no século 18, quando alguns estados que viriam a formar a Alemanha estavam entre os primeiros do mundo a instituir um sistema escolar obrigatório e gratuito. Hoje, a Alemanha ocupa posições confortáveis em rankings de educação internacionais.
O país também é conhecido por seu sistema de direcionamento vocacional precoce, no qual alunos são encaminhados desde cedo para profissões ou atividades acadêmicas com as quais mostram mais aptidão. Um sistema que costuma ser citado por políticos estrangeiros como um exemplo a ser seguido. Mas esse sistema pode ser um pouco complicado de entender - até mesmo para os alemães.
Eu sou Kamila Rutkosky e vou explicar como funciona o sistema educacional alemão. O sistema de educação na Alemanha é altamente descentralizado, com os 16 estados do país tendo a palavra final no assunto. Por isso, há variações no currículo e em como as escolas são organizadas dependendo da região.
Mas, em linhas gerais, funciona assim: a frequência escolar é obrigatória a partir dos seis anos em todo o país. E não dá para faltar aula por um motivo qualquer. Geralmente as crianças só ficam em casa em casos específicos, como doença, por exemplo.
Nada de ficar em casa para dormir um pouquinho mais. O ensino é gratuito, mas há também escolas privadas. Cerca de 9% dos estudantes frequentam escolas particulares - metade da média brasileira.
As pré-escolas ou creches para crianças com menos de seis anos não fazem oficialmente parte do sistema escolar - a matrícula nelas não é obrigatória e o serviço não é necessariamente gratuito. O homeschooling é proibido na Alemanha, salvo em raríssimas exceções, como no caso de alunos com problemas graves de saúde. A Alemanha investe 4,9% do seu PIB em educação.
Já o Brasil gasta 6%, mas com menor gasto por aluno. A Alemanha é famosa por ter um sistema de educação que, dependendo do aluno, direciona precocemente para o caminho do ensino técnico ou para a universidade. Esse sistema tem uma longa tradição no país, onde o trabalho manual não é depreciado.
Ao entrar na escola, a partir dos seis anos, todos os alunos cumprem quatro anos de ensino fundamental, a Grundschule. Geralmente, quando elas completam dez anos de idade, as coisas complicam um pouco. É que na maioria dos estados alemães, vigora a partir dessa idade um sistema de separação dos alunos de acordo com suas habilidades e desempenho.
Essa separação, dependendo do estado, é decidida pelos pais com base no aconselhamento dos professores ou em alguns casos, responsabilidade exclusiva dos professores. Em linhas gerais, os alunos podem ser direcionados para três tipos de escola. A Hauptschule, para as crianças de menor desempenho acadêmico.
A Realschule, para as de desempenho médio. E o Gymnasium, para as mais preparadas. Os anos de estudo em cada uma delas variam.
Na mais básica, a Hauptschule, são apenas cinco ou seis anos a mais de estudos. Na mais avançada, o Gymnasium, geralmente são oito anos a mais. Na Hauptschule e Realschule, o foco é preparar os alunos para o ensino técnico ou manual.
Após cinco ou seis anos, esses alunos podem seguir para a educação profissional. Esse novo período dura geralmente três anos, e é baseado num sistema dual de educação. Nele, o aluno divide seu tempo com aulas teóricas em escola vocacionais ou técnicas, as chamadas Berufsschulen, e um período de aprendizagem numa empresa.
A qualificação prática tem mais ênfase, e os alunos já começam a ser remunerados. Já o Gymnasium, para alunos que demonstram mais habilidades acadêmicas, tem como foco direcioná-los para a universidade. Nos Gymnasien, há uma ênfase no ensino de línguas estrangeiras.
Ao final de oito anos, os alunos prestam o Abitur, semelhante ao Enem no Brasil, que só pode ser prestado uma vez. Os exames dependem da área que o aluno pretende seguir na universidade. Há ainda alguns outros modelos escolares na Alemanha.
Alguns estados combinam as Hauptschule e Realschule. Outros têm sistemas de Gesamtschulen, escolas compreensivas onde os estudantes de Hauptschule, Realschule e Gymnasium frequentam o mesmo espaço. É um modelo que tem ganhado popularidade na Alemanha.
Por fim, existem as Sonderschulen, para alunos com necessidades especiais. Existe a possibilidade de alunos das escolas de menor desempenho passarem para o Gymnasium, depois de um processo adicional de estudos. Entre os que fizeram Realschule, cerca de 30% seguem estudando para fazer o Gymnasium.
Já os casos de pessoas que fizeram Hauptschule e depois migram para o nível universitário são mais raros. Como resultado, a Alemanha tem proporcionalmente menos jovens adultos com diploma universitário e mais com formação profissional do que na média dos países da OCDE. Entre as pessoas de 25 a 34 anos, 33% fizeram ensino superior na Alemanha, enquanto a média da OCDE é de 45%.
Na mesma faixa etária, 46% na Alemanha concluíram o ensino profissional, enquanto na OCDE são 24%. Esse sistema de direcionamento precoce de carreira gera elogios e críticas. Os apoiadores afirmam que um dos efeitos positivos é que os estudantes da Alemanha apresentam níveis de felicidade mais alto que em outros países europeus.
Há também um menor medo de fracasso nesse sistema menos competitivo e que atende melhor as habilidades acadêmicas dos alunos. Outro dado que costuma ser apontado é que a taxa de desemprego entre os alemães com menos de 25 anos é uma das mais baixas da Europa - girando em torno de seis por cento. Na vizinha França, é três vezes maior.
Alguns jovens também apreciam o modelo que direciona para o ensino profissionalizante pela segurança oferecida. As empresas, sem dúvida apoiam o sistema e muitas colaboram na elaboração dos cursos técnicos oferecidos, o que permite ajustar o currículo de acordo com o funcionamento da economia. Mas há críticas.
Alguns especialistas apontam que aos dez anos ainda há muita incerteza sobre as habilidades de uma criança e que o sistema afasta do caminho da universidade crianças tímidas, com problemas familiares ou de nível socioeconômico mais frágil. Alguns estados alemães já ajustaram a idade de segregação para 12 anos. Pesquisas mostraram que as recomendações dos professores para o direcionamento da escola também são tendenciosas, e que eles são propensos a recomendar o Gymnasium para as crianças de famílias com alto nível social e econômico ou que já tenham histórico acadêmico.
Dessa forma, perpetuam desigualdades e criam dificuldades especialmente para estudantes de origem imigrante, que costumam ter desempenho mais fraco, principalmente por causa da dificuldade de entender a língua.