Parece que faz uma eternidade, mas foi em março de 2020. Uma doença que lembrava pneumonia se espalhava pela China. Ela rapidamente se alastra pelo mundo e, em pouco mais de três anos, mata quase 7 milhões de pessoas, segundo as estatísticas oficiais.
Eu sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e a pandemia de covid-19 - com seus impactos na política, na economia e no mundo do trabalho - é tema desse episódio da nossa série especial 21 Notícias que Marcaram o Século 21. A história começa no fim de 2019. Em 31 de dezembro daquele ano, a Organização Mundial de Saúde foi alertada sobre a ocorrência de vários casos de síndromes respiratórias na cidade chinesa de Wuhan.
O epicentro era o mercado de peixes e frutos do mar de Huanan e seus arredores. Uma semana depois, em 7 de janeiro, autoridades chinesas afirmaram terem identificado o agente infeccioso: um tipo novo de coronavírus. Os coronavírus são uma grande família de patógenos que afetam animais como galinhas, porcos, gatos e seres humanos.
Até então, eram seis os coronavírus transmissíveis entre humanos. Dois deles causavam doenças mais sérias, a síndrome respiratória aguda grave, SARS-COV, e a síndrome respiratória do Oriente Médio, MERS-COV. Em 30 de janeiro, a OMS diz que o surto do novo coronavírus constitui uma emergência de saúde pública global.
A essa altura já está em curso uma corrida para tentar entender como o vírus é transmitido, como afeta o corpo humano e o que é possível fazer para evitar que ele se espalhe. 11 de fevereiro, ele é batizado: SARS-COV-2. A doença também ganha nome: covid-19.
E continua se espalhando rapidamente. Três dias depois, a primeira morte na Europa é confirmada, na França. Um turista chinês de 80 anos de idade.
O primeiro óbito fora da Ásia. Algumas escolas são fechadas, jogos de futebol e shows são cancelados. Com pouca informação sobre a gravidade da doença e o potencial de transmissão do vírus, alguns países resistem em adotar protocolos mais rígidos para tentar conter o problema.
A Itália é um deles. Diante da relutância em decretar quarentena nas regiões mais afetadas, o país assistiu a uma explosão de casos no fim de fevereiro. O Brasil estava em pleno Carnaval e, pelo menos para a população em geral, a ideia de que o vírus chegaria rapidamente aqui e o país viveria cenas dramáticas como as que o mundo via na Itália parecia distante.
Mas a realidade era outra. Na quarta-feira de cinzas, dia 26 de fevereiro de 2020, o primeiro caso no Brasil foi confirmado. Um homem de 61 anos que havia voltado de viagem da Itália.
O primeiro caso na América Latina. Quando a OMS declara que há uma pandemia, em 11 de março de 2020, a covid-19 já estava em todos os continentes, exceto a Antártida. A agência chegou a ser criticada por alguns gestores públicos, que afirmavam que ela teria demorado demais para fazer o anúncio, contribuindo para atrasar a adoção dos protocolos mais rígidos necessários para tentar conter o avanço das infecções.
Uma dessas vozes foi a do ministro da Saúde do Brasil na época, Luiz Henrique Mandetta. "Agora, de uma maneira até certo ponto tardia, a Organização Mundial da Saúde concorda com a posição brasileira no sentido de que estávamos diante de uma pandemia. Pandemia é uma situação em que um vírus tem alta capacidade de presença em continentes e transmissão sustentada em vários desses continentes.
O Brasil já vinha alertando para isso. " Diante da transmissão sustentada - e rápida - do vírus, o ministro recomendou o isolamento social. A ideia era evitar que muita gente ficasse doente ao mesmo tempo e sobrecarregasse o sistema de saúde.
Por falar em transmissão sustentada, essa foi uma época em que uma série de conceitos da epidemiologia começaram a fazer parte do nosso vocabulário: taxa de letalidade, número básico de reprodução, curva de transmissão, e por aí vai. Depois do drama na Itália e diante da rápida disseminação do vírus, diversos países começaram a adotar protocolos de isolamento social. Aqui, um dos grandes opositores à estratégia foi o então presidente da República, Jair Bolsonaro.
Enquanto Mandetta alertava para um possível colapso do sistema de saúde caso as medidas não fossem tomadas, Bolsonaro dizia que a gravidade da pandemia era superdimensionada. Em 27 de março, os Estados Unidos ultrapassam China e Itália e se tornam o país com maior número de casos de covid-19, mais de 86 mil. No mesmo dia, Bolsonaro chama pela primeira vez a doença de “gripezinha”, expressão que ajudaria a colocar o Brasil no noticiário internacional da pandemia.
O presidente passa a atacar as medidas de quarentena implementadas pelos governos estaduais, enquanto incentiva o uso do “kit covid”, uma combinação de medicamentos - cloroquina, remédio pra verme - sem eficácia comprovada contra a doença e que, como se confirmaria depois, poderiam sobrecarregar o fígado. Nesse começo de pandemia, uma das muitas frentes de pesquisa que buscavam um remédio que funcionasse contra a covid se voltou para a cloroquina, usada até então no Brasil para tratar malária. Não demorou para que os testes mostrassem que não havia evidências de que ela poderia combater a covid - mas o presidente insistiria, compartilhando inclusive notícias falsas sobre o medicamento.
A desinformação, aliás, que neste século 21 ganhou nova escala com o surgimento das redes sociais, ganha fôlego com a pandemia e se torna um problema em diversos países. “We’re not just fighting an epidemic; we’re fighting an infodemic”. Algumas das notícias falsas que circulavam pelo WhatsApp nos primeiros meses diziam, por exemplo, que gargarejar água morna evitava que o vírus penetrasse os pulmões, que água fervida com alho era eficiente como tratamento… com o tempo, as fake news vão mudando, se adaptando às novas fases da pandemia, ao surgimento das vacinas - configurando um problema real para a saúde pública.
De volta ao Brasil, os desentendimentos entre Bolsonaro e Mandetta culminam na demissão do ministro da Saúde em 16 de abril. Entra Nelson Teich, que tem uma passagem relâmpago de 28 dias no cargo. Em maio, Eduardo Pazuello, general do Exército, é nomeado ministro interino e, em setembro, assume como titular da pasta.
Pouco antes, em 8 de agosto de 2020, o Brasil havia atingido a marca sombria de 100 mil mortos pela doença. Foi a época em que as máscaras caseiras se espalharam pelo país. Na falta de equipamentos hospitalares, as máscaras cirúrgicas deveriam ficar para os profissionais de saúde.
Essa era uma das recomendações que mudariam com o tempo, à medida que a ciência ia descobrindo mais sobre o vírus e as circunstâncias da pandemia iam evoluindo. Lembra que no começo muita gente limpava uma a uma as compras do supermercado com álcool? Pois é, isso também foi sendo deixado de lado, quando os cientistas descobriram que o vírus não se mantém viável em superfícies por muito tempo.
Em meados de 2020 já estava claro o impacto econômico da pandemia. Com as medidas de bloqueio necessárias para conter a expansão da doença e evitar um colapso dos sistemas de saúde, o mundo mergulhou na pior recessão desde a Segunda Guerra Mundial, conforme as projeções divulgadas pelo Banco Mundial. Setores como os de bares e restaurantes e o turismo foram duramente afetados, muita gente perdeu o emprego.
Para tentar amortecer esses efeitos, diversos países lançam pacotes emergenciais de auxílio financeiro - mas a capacidade de gastar, claro, varia muito de um lugar pro outro. E, nesse sentido, a pandemia escancarou uma série de desigualdades, uma delas entre ricos e pobres. Só em 2020, conforme as estimativas do Banco Mundial, 88 milhões de pessoas cairiam na pobreza, principalmente no sul da Ásia e na África Sub-Sahariana.
No meio de uma enxurrada de notícias ruins, o primeiro ano da pandemia também trouxe momentos de esperança. “With positive results in recent weeks from vaccine trials, the light at the end of the tunnel is growing steadily brighter. ” Em meio à crise sanitária, a humanidade desenvolveu a vacina mais rápida de sua história: cerca de 10 meses até estar aprovada para uso na população.
. Tem início então uma nova fase da pandemia. E novas expressões técnicas entram no nosso vocabulário do dia a dia: teste de imunogenicidade, RNA mensageiro, percentual de eficácia, imunidade de rebanho… Quem pode tenta garantir o maior número de vacinas possível, enquanto a OMS alerta para o risco de escassez de imunizantes para países pobres.
No Brasil, o problema era outro. A vacina havia entrado no campo da disputa ideológica entre Bolsonaro e seus aliados, de um lado, e seus opositores, de outro. Em outubro de 2020, o presidente havia mandado cancelar o protocolo de intenções assinado pelo Ministério da Saúde para compra de 46 milhões de doses da vacina que vinha sendo desenvolvida pela SinoVac em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo: a CoronaVac.
No anúncio pelas redes sociais, desautorizou o ministro Eduardo Pazuello, disse que o povo brasileiro não seria cobaia de ninguém e chamou o imunizante de "vacina chinesa de João Doria", em referência ao governador de São Paulo, que, depois de fazer campanha para Bolsonaro em 2018, virou um de seus principais antagonistas durante a pandemia. No dia seguinte, Bolsonaro fez uma live ao lado de Pazuello, que se recuperava de covid-19 e comentou sobre a polêmica: “Senhores, aqui é simples: um manda, outro obedece” Quando o diretor da OMS dá aquela declaração sobre a desigualdade no acesso às vacinas, no dia 4 de dezembro, o Brasil ainda não tinha um plano de vacinação claro, apesar de ser historicamente referência global em imunização, por conta da capilaridade do SUS e do sucesso do Programa Nacional de Imunizações, o PNI. Além de fazer parte dos testes realizados em pelo menos uma das fases de desenvolvimento das vacinas CoronaVac, AstraZeneca, Johnson & Johnson e Pfizer.
Em 8 de dezembro de 2020, a primeira pessoa é vacinada fora dos testes: Margaret Keenan, de 90 anos, no Reino Unido. Estados Unidos e Canadá aplicam suas primeiras vacinas no dia 14 de dezembro. Três dias depois, Bolsonaro seguia repetindo que não tomaria vacina e desencorajando a imunização: “A vacina, uma vez certificada pela Anvisa, vai ser extensiva a todos que queiram tomá-la.
Eu não vou tomar. Alguns falam que eu estou dando péssimo exemplo. O imbecil, o idiota que tá dizendo que eu tô dando péssimo exemplo, eu já tive o vírus.
Eu já tenho anticorpos. Pra quê tomar a vacina de novo? E outra coisa que tem que ficar bem clara aqui dra.
Raíza, lá na Pfizer, tá bem claro lá no contrato: 'Nós não nos responsabilizamos por qualquer efeito colateral'. Se você virar um jacaré, é problema de você, pô” Nas semanas seguintes, dezenas de países deram início às suas campanhas de imunização. (Mapa do Our World in Data pra ilustrar?
Não sei o quão fácil/difícil isso seria… só uma sugestão! ) No Brasil, ela só começa depois da virada do ano. Em 7 de janeiro, o Ministério da Saúde volta atrás e anuncia o contrato para compra de 100 milhões de doses da Coronavac - a mesma do acordo que havia sido cancelado por ordem do presidente três meses antes.
A imunização começa no dia 17 de janeiro, quando a enfermeira Mônica Calazans é vacinada em São Paulo com a Coronavac, aprovada para uso emergencial pela Anvisa. Em 23 de janeiro, começa a vacinação com o imunizante da AstraZeneca, com doses importadas da Índia. Mas a imunização não chega a tempo de evitar o colapso do sistema de saúde no Amazonas.
Em janeiro de 2021, o suprimento de oxigênio disponível no sistema de saúde não deu conta do aumento expressivo no número de casos. Mais uma vez, a pandemia no Brasil era notícia no mundo. CLIP FROM KATY WATSON’S PKG Os cientistas descobririam que parte do aumento de casos no Amazonas se devia ao surgimento de uma variante mais infecciosa do SARS-CoV-2, batizada de Gama.
Esse foi o começo do segundo ano da pandemia. De um lado, esperança trazidas pelas vacinas e, de outro, preocupação com o surgimento de variantes do vírus que escapassem da imunização. A nova cepa rapidamente se espalhou pelo país, gerando uma nova onda da doença, com aumento nos números de casos e mortes.
Entre janeiro e junho, o total de óbitos saltou de 200 mil pra meio milhão. Nesse início de 2021, Índia, África do Sul, Estados Unidos e diversos outros países também encaram uma segunda onda da pandemia. O Brasil começa a conseguir achatar a curva na segunda metade do ano, graças, em parte, à vacinação, que teve início lento e foi prejudicada pelos conflitos entre governo federal e Estados, mas ganhou folêgo.
No fim de 2021, 77% da população tinha recebido pelo menos uma dose. No mundo, 9,18 bilhões de vacinas foram aplicadas naquele ano. Os países começam a reabrir suas fronteiras, as pessoas voltam a se encontrar, ainda de máscara, ainda praticando o isolamento social, e resgatar alguma coisa da vida antes da pandemia.
Mas nem tudo era recuperável, especialmente as vidas perdidas para a doença. As estatísticas oficiais apontam 7 milhões de óbitos, mas o saldo, segundo a OMS, é provavelmente bem mais alto, já que alguns países tiveram subnotificação de casos e mortes. Devagar, em 2022, a vida vai voltando ao normal.
Não exatamente ao normal, mas ao “novo normal” - tá aí mais uma expressão que veio com a pandemia. Isso porque a crise sanitária não afetou só a Saúde. Ela teve impacto na educação, na política, na economia, na cultura, na sociedade.
Um exemplo ilustrativo é o mundo do trabalho. A vida no escritório foi colocada em xeque pelas quarentenas. O home office, até então uma prática meio errática, se populariza instantaneamente.
E, ainda que depois da reabertura muita gente tenha voltado aos escritórios, algumas das mudanças tecnológicas se tornariam permanentes. No auge da crise sanitária, muitas pessoas tiveram que adaptar a casa pro trabalho - e, às vezes, também para as aulas dos filhos, que migraram para as salas de aula virtuais. Com tanta gente em casa e por tanto tempo, as pessoas começaram a olhar pro lugar em que viviam de forma diferente.
Teve quem aproveitasse o trabalho remoto pra sair da cidade grande e ir para o interior, teve quem buscasse mais espaço - essa demanda maior por imóveis, aliás, provocou aumento nos preços em várias regiões do mundo. Para além da economia, a pandemia foi mais um elemento de polarização em um mundo que, neste século 21, tem visto suas divisões se aprofundarem. Muita coisa foi politizada: as máscaras, as vacinas, o isolamento e até o próprio vírus, que trouxe à tona xenofobia e racismo contra a população chinesa.
Por falar em China, o país implementou uma das quarentenas mais rigorosas do planeta - e uma das mais longas: mesmo quando o mundo começou a reabrir, depois do início da imunização, o governo dobrou a aposta em sua política de “covid zero”, com impactos negativos na economia. CLIP (acho que é fácil encontrar matéria sobre a desaceleração do PIB em 2022) Dezenas de milhões de pessoas foram submetidas a algum tipo de restrição - e os chineses chegaram a ir às ruas protestar contra as medidas. CLIP Os reflexos da pandemia na política, aliás, foram profundos.
Logo nos primeiros meses ficou clara a diferença de perfil entre os líderes globais: os dispostos a trabalhar em conjunto com a comunidade científica para controlar a disseminação do vírus e aqueles resistentes às recomendações dos cientistas. O tempo mostraria que os países governados por líderes populistas, que muitas vezes negaram as recomendações que eram consenso entre os cientistas e contribuíram para espalhar desinformação, registraram volume superior de mortes em excesso (ou seja, aquelas além das esperadas em um cenário sem pandemia). Um dos estudos que mostram esse cenário é esse, feito com dados de 2020 e publicado no Jornal de Instituições Políticas e Economia Política.
Pra alguns desses líderes, a postura teve um custo político. Ainda que não se possa estabelecer uma relação direta de causa e consequência, a pandemia contribuiu, por exemplo, para minar as chances de reeleição de Donald Trump no fim de 2020. Diferentes pesquisas mostram que a crise sanitária foi um dos grandes assuntos que mobilizaram os eleitores americanos.
Nos Estados Unidos, a corrida eleitoral aconteceu em meio a uma segunda onda virulenta da pandemia. Trump chegou a pegar a doença e, em um gesto simbólico, tirou a máscara em sua primeira aparição pública após voltar do hospital. No Reino Unido, a gestão Boris Johnson mergulhou em uma crise entre o fim de 2021 e o início de 2022 em meio a alegações de que ele e sua equipe haviam participado de festas na sede do governo durante os períodos de lockdown no país.
O caso escalou e o primeiro-ministro chegou a ser submetido a uma moção de voto de confiança - que poderia tirá-lo do cargo - por seu partido por causa dos episódios. Ele sobreviveu à votação por uma margem relativamente modesta: 60% votaram pela sua permanência e 40%, pra que ele saísse. Mas caiu na sequência, na esteira de um outro escândalo envolvendo um político de seu partido, que renunciou após acusações de assédio sexual.
Dezenas de ministros e funcionários renunciaram ou foram demitidos, num movimento que culminou com a saída de Boris Johnson em julho de 2022. No Brasil, é difícil medir o impacto que a pandemia teve na derrota eleitoral de Bolsonaro em 2022. A aprovação ao seu governo despenca em 2020, se recupera no ano seguinte e volta a se deteriorar em 2022.
De qualquer forma, a crise sanitária e seus efeitos estiveram entre os temas debatidos durante a corrida eleitoral - a falta de oxigênio em Manaus, por exemplo, e os momentos em que o ex-presidente chegou a imitar de forma jocosa pacientes com falta de ar. Em maio de 2023, a OMS declara o fim da emergência global de covid-19, 1. 191 dias depois de anunciá-la, lá em 30 de janeiro de 2020.
“Yesterday, the Emergency Committee met for the 15th time and recommended to me that I declare an end to the public health emergency of international concern. I have accepted that advice” Para fazer a recomendação, o comitê de emergência levou em consideração que a última grande onda global da doença, causada pela variante ômicron do coronavírus, havia acontecido havia mais de um ano, entre dezembro de 2021 e janeiro de 2022. Desde então, graças à imunidade conquistada com a vacinação e a própria disseminação da doença, o número de novos casos, internações e mortes diminuíram.
Dias antes, a OMS havia publicado um relatório em que discutia a necessidade de passar de uma resposta de emergência para um cuidado de longo prazo com a covid, que continuará a ser um problema de saúde pública. Em resumo, o “novo normal” significa também conviver com o vírus. Vírus, aliás, cuja origem a ciência ainda investiga - uma questão central em toda essa história.
Três anos depois do início da pandemia, há duas principais hipóteses: A primeira é a de que o coronavírus tenha saltado de animais para os seres humanos - no jargão em inglês, um natural spillover, ou transbordamento natural. Uma das possibilidades nesse sentido é que o coronavírus tenha passado de morcegos para um animal intermediário e, dessa espécie intermediária, para seres humanos. A questão é que, até o momento, os cientistas não encontraram um coronavírus em morcegos ou outros animais que sejam totalmente compatíveis com o Sars-Cov-2 e confirmem de forma irrefutável essa teoria.
Uma segunda hipótese é a de que o vírus tenha escapado, de forma acidental ou não, de um laboratório na China. Essa teoria voltou a ser discutida mais recentemente quando, em fevereiro de 2023, o diretor do FBI Christopher Wray afirmou que a agência avaliava que a origem da pandemia provavelmente estaria ligada a um "incidente em um laboratório". Na ocasião, a Casa Branca se manifestou dizendo que não há consenso entre os órgãos do governo sobre esse tema e que outras agências avaliavam como mais provável a hipótese da passagem do vírus de animais para humanos.
O governo chinês refuta essa teoria. Em resposta aos comentários do diretor do FBI, um porta-voz do Ministério de Relações Exteriores do país acusou as agências de inteligência americanas de politizar a discussão sobre as origens do vírus. Esse ainda é um tema cheio de controvérsia e em aberto.
Em 2021, a OMS chegou a enviar uma missão à China para investigar, em conjunto com o país, a origem dos Sars-Cov-2 e concluiu que a teoria do vazamento no laboratório seria "extremamente improvável". Um grupo de cientistas criticou o relatório por não levar a hipótese do vazamento em laboratório a sério e, na sequência, o diretor da OMS afirmou que "todas as hipóteses se mantêm abertas e necessitam ser investigadas mais a fundo". Essa discussão é importante porque é fundamental entender onde o vírus se originou, e como, no esforço para tentar evitar uma nova pandemia.
Caso a hipótese da disseminação natural do vírus se prove correta, isso poderia afetar a pecuária, por exemplo, ou a forma como os humanos manejam animais silvestres. No caso da teoria do vazamento em laboratório, isso abriria uma grande discussão sobre o nível de segurança da pesquisa científica com agentes patogênicos. Além de impactar a forma como o mundo se relaciona com a China, que já foi acusada de suprimir informações sobre a covid-19 no início da pandemia.
Eu fico por aqui. Para assistir a outros vídeos da nossa série 21 notícias que marcaram o século 21, visite nosso canal no YouTube, que tem uma playlist lá com todos os episódios. Até a próxima!