Complexo de vira-lata: Termo popularmente usado para descrever esse senso de inferioridade que muitos Brasileiros colocam sobre si mesmos, sobre o coletivo ou sobre as coisas que são produzidas ou feitas no Brasil. Eu cresci em uma época em que importado era sinônimo de superior, especialmente quando se trata de tecnologia, como carros e eletrônicos. Entre o final dos anos 90 e anos 2000 na região metropolitana de Porto Alegre, a única referência que eu tinha do que nós, brasileiros, faziamos bem feito era sapato.
Todo o resto era ou importado, ou fabricado aqui mas por empresas estrangeiras. Mas isso vem mudando, e o Brasil tem avançado muito nesse cenário, e nada melhor do que modelar o que funciona fora do Brasil pra aplicar aqui. Reconhecido internacionalmente como um dos maiores polos tecnológicos do mundo, o Vale do Silício, localizado no estado da Califórnia, nos Estados Unidos, é o lar de várias empresas que hoje estão presentes nos quatro cantos do mundo.
Muitas delas, inclusive, se tornaram verdadeiros impérios. Agora o Brasil também tem o seu Vale do Silício, ou melhor, o Brasil tem vários “Vales do Silício”. E são deles que grandes tecnologias nacionais estão surgindo, de pequenas e médias startups que juntas levantaram bilhões de dólares de investimento só em 2021, que recebem incentivo e apoio, tanto de empresas quanto do governo Brasileiro.
Onde estão localizados esses que são chamados de Os Vales do Silício do Brasil e o que tem surgido deles é o que eu vou te contar nesse vídeo. Houve uma época, não muito distante, em que a principal riqueza de um país era o ouro. Depois, o petróleo.
Hoje, a tecnologia possui um papel essencial na economia de qualquer país desenvolvido, e os polos tecnológicos são os lugares onde essa mágica acontece. A expressão é utilizada pra se referir aos grandes centros de tecnologia: ambientes pensados pra serem interconectados e que unem recursos humanos e materiais, com o intuito de desenvolver ou melhorar produtos, processos e serviços. Dessa forma, esses lugares criaram as bases necessárias pra impulsionar pesquisas, ideias e empresas em potencial.
Esses locais são muito interessantes do ponto de vista econômico, porque se tornam responsáveis por boa parte do crescimento de um país ou de um estado, já que todo o investimento por trás dessas inovações acabam transbordando nas regiões em que esses polos se situam. Um dos principais pontos fortes de um pólo tecnológico é a integração entre pesquisa, empreendedorismo e atuação do governo. Essa aliança, chamada de “Tríplice Hélice da Inovação”, é amplamente utilizada em países desenvolvidos e se baseia na ideia de que “a inovação é dinâmica e sustentável a partir da articulação entre três atores sociais: a universidade, a iniciativa privada e o poder público.
” Nesse sentido, as três partes possuiriam um papel muito importante quando combinadas: universidades forneceriam pesquisadores e profissionais de alto nível, a iniciativa privada entraria com o capital de risco e o Estado entraria como um facilitador, reduzindo a burocracia necessária pra não atrapalhar o funcionamento da coisa. O Vale do Silício começou mais ou menos assim: Em meados da Segunda Guerra Mundial, o governo californiano investiu em pesquisas da Universidade de Stanford pra desenvolver tecnologias de rádio e comunicações pra uso militar, muito importantes naquele contexto. Além disso, o início da Guerra Fria e a corrida espacial também foram decisivos pro surgimento da região.
Em 1957, a Rússia lançava o primeiro satélite artificial em órbita, o Sputnik 1. Pro governo americano, esse era um sinal de alerta: a ideia de que a Rússia tinha uma tecnologia tão poderosa era um forte indício de que, a qualquer momento, os Estados Unidos poderiam ficar pra trás. O que ninguém sabia era que, também em 1957, a empresa americana Fairchild Semiconductor seria a primeira a criar circuitos integrados feitos com o material silício — que originou o nome do Vale — e graças a essa invenção, toda a indústria da tecnologia seria revolucionada.
Com o passar do tempo, estudantes e ex-alunos de Stanford começaram a criar suas próprias empresas fomentadas pela vontade de inovar e trazer essas tecnologias pro uso comum, e o rápido crescimento de empresas fabricantes dos semicondutores transformou a região. A HP foi uma das pioneiras do que viria a se tornar o Vale do Silício. Numa garagem em Palo Alto, na Califórnia, seus fundadores William Hewlett e David Packard — também ex-alunos de Stanford — começaram desenvolvendo tecnologias de áudio e, tempos depois, diversificaram seus produtos.
Algo similar aconteceu com a Apple. A cultura de inovar e impulsionar novos talentos, que nasceu com essas empresas pioneiras, como a HP, a Apple, e tantas outras — acabou criando o ambiente perfeito pra quem queria unir pesquisa e empreendedorismo. Não à toa, o Vale do Silício se tornou conhecido por abraçar novas ideias e investir em startups, criando todo um ecossistema voltado à inovação.
Outro exemplo parecido com o da Califórnia é o chamado “Vale do Silício Chinês”, que fica na cidade de Shenzhen. Com uma população urbana de mais de 12 milhões de pessoas, a cidade hoje é conhecida como “o coração da indústria de tecnologia global”. Shenzhen abriga empresas como a Tencent, que é uma das maiores em serviços de Internet do mundo, além de ser a dona da Riot Games — criadora de League of Legends— e ainda tem várias participações em gigantes como a Tesla, o Spotify e a Uber.
Com o 3º maior PIB da China, Shenzhen é a cidade chinesa que mais investe em tecnologia, e é considerada a maior fabricante de eletrônicos de toda a Ásia. Essas cidades, que se tornaram referência em tecnologia, inspiraram alguns exemplos aqui no Brasil também. Nosso país começou a investir nesses parques tecnológicos na década de 80.
Mas por que a gente ainda parece tão distante de se tornar referência em tecnologia? Os polos tecnológicos do Brasil são relativamente novos e ainda não atingiram um grau de desenvolvimento suficiente pra serem comparados ao Vale do Silício, mas o país vem avançando. Temos 6 grandes polos — aqueles que agregam mais de 2 parques no mesmo ambiente, e diversos parques: nos últimos 10 anos, saímos de 20 parques em operação pra um total de 55, um salto de mais de 150%, segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações.
Desses 55 parques tecnológicos, a maior parte deles é voltada pro setor de Tecnologia da Informação. Eles abrigam mais de 1900 empresas e têm um faturamento de mais de 3,5 bilhões de reais. Um dos primeiros grandes pólos brasileiros foi o Porto Digital, fundado no ano de 2000 em Recife.
Depois de um período de crise financeira que o Estado de Pernambuco enfrentou na década de 90, a necessidade de alavancar mudanças econômicas e sociais pra gerar riqueza, emprego e renda, fez com que o governo estadual investisse mais de 30 milhões de reais em infraestrutura pro novo parque. Esse investimento deu certo e em 2007 o parque foi reconhecido pela Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores, a ANPROTEC, como o melhor ambiente de inovação e tecnologia do país. Em 2021, o Porto Digital atingiu a marca de 355 empresas instaladas, empregando cerca de 15 mil profissionais e tendo um faturamento bilionário de mais de 3 bilhões de reais.
Mas ainda que os números sejam extremamente positivos, existe um entrave: a falta de mão de obra qualificada. A formação de profissionais pra ocupar esses postos ainda é insuficiente no Brasil, o que acaba atrasando o nosso avanço. O próprio polo do Recife oferece formação por meio de um projeto chamado “Embarque Digital”, que foca na formação de profissionais da área de tecnologia.
Além do Porto, outro polo tecnológico brasileiro que vem ganhando destaque por seu rápido crescimento é o de São José dos Campos, no Estado de São Paulo. Ele foi inaugurado em 2009 e abriga três das maiores fabricantes de aviões do mundo: a Boeing, a Airbus e a Embraer. A região possui centros acadêmicos de excelência como o Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o ITA, além de ser de fácil acesso por estar entre São Paulo e Rio de Janeiro.
É um dos principais do país e abriga mais de 300 empresas, de diversos setores como energia, têxtil e automotivo. No Estado de Minas Gerais, o San Pedro Valley, localizado em Belo Horizonte, também é referência. A comunidade localizada no bairro São Pedro surgiu em 2011, tendo como ponto de partida encontros informais entre criadores de startups, como a Hotmart.
Com mais de 1. 200 startups, Minas só fica atrás de São Paulo, Em números, Minas só perde pra São Paulo, com mais de 1. 200 startups, representando 9,5% do total Brasileiro.
Outro polo sediado em Minas Gerais é o Vale da Eletrônica, em Santa Rita do Sapucaí. O município com pouco mais de 40 mil habitantes abriga atualmente mais de 200 empresas no ramo tecnológico, que exportam produtos e soluções pra mais de 40 países. A cidade de Santa Rita do Sapucaí participou ativamente dos testes pra implantar a tecnologia 5G no Brasil, e continua trabalhando em pesquisas pra garantir a alta velocidade da conectividade em áreas de longa distância das torres.
Na região Sul, o polo Sapiens Parque, localizado em Santa Catarina, tem a proposta de ser uma cidade inteligente dentro de Florianópolis. O local já recebeu mais de 30 milhões de reais em investimentos do governo e receberá muito mais da iniciativa privada: mais de 300 milhões de reais foram confirmados da JBS, uma das maiores indústrias de alimentos do mundo, que confirmou a instalação JBS Innovation Center no parque. A proposta da empresa é construir um centro de pesquisa em biotecnologia, pra desenvolver ainda mais sua produção de proteínas, já sendo considerado o maior investimento de uma empresa brasileira no ramo, além de uma resposta às necessidades de inovação no mercado de alimentos.
Outro pólo na região Sul é o Parque Científico e Tecnológico da PUC do Rio Grande do Sul, o TecnoPuc. Com 18 anos de existência, ele abriga quase 200 empresas e mais de 300 startups. O Parque vai abrigar duas empresas multinacionais de projetos de semicondutores, sendo elas a inglesa Ensílica e a norte-americana Impinj.
Entre os motivos pra instalação das sedes no TecnoPuc, a mão de obra qualificada é o principal — e não é coincidência, a PUC é uma das melhores universidades do país. Mas mesmo com o “boom” dos polos tecnológicos do ano de 2000 pra cá, o Brasil ainda caminha lentamente rumo à inovação. Segundo lista divulgada pela Forbes, entre 2 mil empresas de destaque no mundo, apenas 1% vem do Brasil.
Mas por que, mesmo com tudo isso, o Brasil ainda não é considerado uma potência tecnológica? Bem, a resposta pode estar nos investimentos — ou na falta deles. Em 2021, o Brasil ficou na posição número 57 dos 132 países avaliados no Índice Global de Inovação, realizado pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual.
Essa posição representa um avanço quando comparamos a 2020, em que estava na posição 62, e 2019 66. Mas ainda é muito ruim. Pra Rafael Navarro, presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras, a ANPEI: “O Brasil pode melhorar seu posicionamento se potencializar o apoio às empresas que promovem inovação, se otimizar políticas públicas, assim como melhor uso dos recursos financeiros e humanos.
” Segundo o professor Paulo Feldmann da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, existem 2 principais razões pro Brasil ser um dos países que menos investe em inovação: a quantidade de empresas de grande porte aqui ainda é pequena e os incentivos fiscais pro desenvolvimento de pesquisa também são baixos. Também existe uma desconexão entre universidades, empresas, e o papel do Estado nisso tudo. Segundo ele, falta no Brasil a cultura de dedução de impostos para as empresas que investem em pesquisas.
Uma economia que foca em exportar matéria-prima, como minério de ferro, soja e cana-de-açúcar, ao invés de produtos de valor agregado, como tecnologia, acaba fazendo menos investimentos em pesquisa e desenvolvimento. O Brasil parece estar fazendo o caminho inverso de grandes nações como os Estados Unidos, que também começou exportando matéria-prima, mas que rapidamente se industrializou e progrediu, ou da China, que criou complexidade tecnológica com ampla ajuda e interferência do governo. Pra se ter uma indústria consolidada e forte, é preciso investir em inovação, não tem outra saída.
A tecnologia gera maior competitividade no mercado nacional e internacional, o que resulta em serviços melhores e mais acessíveis pro consumidor, além de maior exportação de tecnologia, o que impacta positivamente no PIB, empregos e salários. Mesmo com tantos pólos tecnológicos em potencial, o Brasil ainda está engatinhando pra alcançar um patamar de inovação parecido com os Vales do Silício. É fato que alguns avanços ocorreram, mas a nossa economia só despenca: saímos da lista das 10 maiores economias do mundo em 2021.
Mas nem tudo é ruim: apesar das adversidades, nosso país possui mais de 14 mil startups em funcionamento, mais de 1400 foram abertas só em 2021, ignorando qualquer sinal de crise e efeitos da pandemia na economia. Em 2021, foi sancionado o Novo Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador, que busca atrair mais investidores e incentivar empreendimentos que foquem em inovação. O reconhecimento da importância dessas empresas é o primeiro passo pra alavancar o ambiente de negócios no país.
O Brasil tem uma demanda altíssima por tecnologia: uma pesquisa feita em 2016 pela Qualcomm revelou que nós estamos em 3º lugar na lista de lugares que mais consomem tecnologia no mundo. Mas ironicamente, produzimos muito pouco. Pessoas e empresas buscam inovação todos os dias, em produtos ou serviços que tornem a vida mais fácil.
Estimular o crescimento tecnológico pode beneficiar não somente quem consome esses bens e serviços, mas a economia em geral. Quando falamos de pesquisa e desenvolvimento, estamos nos referindo também a áreas como saúde, educação e agronegócio, que se beneficiam de avanço tecnológico pra entregar o que há de melhor no momento. Mas sem inovação, é impossível elevar o país ao patamar de uma economia desenvolvida.
Assim, o Brasil corre o sério risco de continuar sendo o país do “poderia, se” — se tivesse menos burocracia, se tivesse mais investimento, se houvesse mais educação. E quem sabe um dia deixaremos de lado o tal do “complexo de vira-lata” E aí, você acha que o Brasil algum dia pode se tornar uma potência tecnológica? Me responde nos comentários aqui embaixo que eu to curioso pra saber a sua opinião.
Se você quiser descobrir como você pode criar um negócio contando histórias aqui na internet, confere uma aula grátis no primeiro link da descrição aqui em baixo. Agora pra descobrir como o Cadê revolucionou a internet no Brasil nos anos 90 e simplesmente desapareceu, confere esse vídeo aqui na tela que eu te vejo lá em alguns segundos. Por esse vídeo é isso, um grande abraço e até mais.