A Índia passa por um momento crucial: é uma economia de crescimento rápido com uma das maiores e mais jovens populações do mundo. Em 2022, ela entrou pela primeira vez no grupo das cinco maiores economias. E várias projeções indicam que, em 2030, estará atrás apenas da China e dos Estados Unidos.
Ao mesmo tempo, a Índia está ganhando também um papel geopolítico maior. Isso em meio a incertezas causadas pela rivalidade cada vez mais acirrada entre Estados Unidos e China e também no contexto da guerra na Ucrânia. Afinal, a Índia vai virar uma superpotência global?
Primeiro, vamos colocar em contexto o crescimento econômico indiano. Os governantes da Índia não costumam ser modestos quando falam sobre isso. Em 2022, a economia global cresceu apenas 3%.
Estados Unidos (2,1%), China (3%) e União Europeia (3,5%) ficaram perto dessa margem. Mas a Índia superou todos, com uma alta de 7% no PIB. Isso foi, de longe, o melhor resultado entre as dez maiores economias do mundo.
A Índia tem uma grande vantagem sobre outros países: uma enorme população jovem. Outras grandes economias enfrentam o desafio do envelhecimento populacional. Mas a Índia tem um dividendo demográfico único: mais da metade dos indianos tem menos de 30 anos.
Recentemente, a Índia ainda superou a China como o país mais populoso do mundo. Mas se tornar a terceira maior economia do mundo é uma coisa. Rivalizar com Estados Unidos e China é mais complicado.
Muitos analistas não veem sentido em comparar a Índia com a China. A economia chinesa é seis vezes maior do que a indiana. O PIB per capita é de 12 mil dólares.
O indiano é de 2 mil. E a Índia está bem atrás num setor importante: as exportações. A China fornece cerca de 15% do comércio global, e a Índia, apenas 2%.
O milagre econômico da China pode em grande parte ser explicado pelas exportações de produtos industriais. Ela é a maior exportadora do mundo. A Índia vem bem depois, na 18ª posição.
Ou seja: a China é uma máquina industrial bem-sucedida. A Índia é diferente: ela teve sucesso em outras áreas. A agricultura continua sendo a principal empregadora na Índia.
Mais de dois em cada cinco trabalhadores estão nesse setor. A indústria emprega apenas 12% da força de trabalho. Onde a Índia realmente se sai bem é no setor de tecnologia da informação.
É ele que impulsiona o crescimento das exportações. E o país também ganhou a reputação de ter um ambiente dinâmico para startups. Além disso, se tornou um destino importante para algumas gigantes do setor de tecnologia.
A Apple, por exemplo, transferiu parte da produção do iPhone para o país. Em agosto, a Índia se tornou até o primeiro país da história a pousar no polo sul da Lua. Mas feitos como esse podem desviar a atenção de problemas estruturais graves.
Economistas argumentam que o PIB de um país de proporções continentais, como a Índia, tende a ser grande. E a Índia ainda continua sendo, na realidade, um país pobre. O desemprego é baixo, ronda os 7%.
Mas para quem frequentou o ensino superior, a taxa é o dobro disso. E como mais de 40% do emprego indiano está na agricultura, a verdade é que muita gente é extremamente mal remunerada. Outro ponto: o papel das mulheres.
Só 20% das mulheres indianas estão oficialmente na força de trabalho, em comparação com cerca de 70% dos homens. Um reflexo de fatores históricos numa sociedade bastante machista. Tem também a questão ambiental.
As cidades indianas estão entre as mais poluídas do mundo. E a dimensão dos danos ambientais é vista como uma ameaça séria ao progresso econômico e social do país. Outra questão essencial: o declínio da democracia indiana e as questões étnicas envolvendo hindus, religião de 80% da população, e a minoria muçulmana.
Muitos dizem que essa situação é também uma grande ameaça à república indiana. E que ela estaria piorando com o partido hindu nacionalista de Narendra Modi. Paralelamente à questão econômica, fato é que o peso geopolítico da Índia cresce.
O país está ganhando proeminência no cenário mundial, em meio à nova ordem global. Nas últimas décadas, a China vinha cortejando com sucesso países em desenvolvimento frustrados com o Ocidente. Era como se a rápida ascensão chinesa servisse como uma fonte de inspiração – e uma moeda na construção de novas relações comerciais.
Mas foi um parceiro por vezes indigesto para democracias ocidentais por seu regime autocrático e que viola liberdades básicas. Na comparação com a China, a Índia é vista como um modelo de parceiro menos dominador e menos ligado a dinheiro ou defesa. Um parceiro que aposta mais na promessa de diversificar as instituições que moldam a política global.
A Índia tem se concentrado em suas próprias formas de influência. Se a China tem a Nova Rota da Seda, a Índia está construindo sua própria aliança com os EUA e outros dez aliados asiáticos. Ao mesmo tempo, vem ampliado conexões com o Oriente Médio e outras regiões por meio da grande e bem-sucedida diáspora indiana.
Especialistas consultados pela DW apontam que a Índia tem um longo caminho a percorrer para ser considerada uma grande potência. Mas o crescimento rápido de sua economia, e a busca do Ocidente por aliados alternativos à China, colocam o país numa posição privilegiada. Não de tomar a posição de Pequim, um rival incontestável.
Tampouco de se tornar a grande liderança do Sul Global. Mas em condições de virar um interlocutor e parceiro importante de alguns países enquanto as peças do novo xadrez global se movem. Uma ordem onde o poder mundial é repartido em várias regiões do mundo.