Queridos irmãos e irmãs, hoje nós celebramos a festa da Apresentação do Senhor, e o Evangelho nos descreve, ainda que brevemente, o cumprimento dessas duas cerimônias: a Purificação de Maria e a Apresentação do Menino Deus no Templo. A Purificação era um gesto ritual ligado à Lei de Moisés, em que as mulheres, depois do parto, eram consideradas impuras e, por isso, 40 dias depois do nascimento do filho, elas eram purificadas mediante um sacrifício. Então, oferecia-se a Deus um cabrito ou, caso contrário, oferecia-se um par de tórtolas ou dois pombinhos.
Cada pombinho tinha uma finalidade: um era para o Holocausto, ou seja, era integralmente sacrificado para Deus, e o outro era para a expiação do pecado. Então, se tomava um pouco do sangue e passava-se na mulher para purificá-la. A Apresentação do Menino Deus no Templo tem a ver com o fato de que, na libertação de Israel, Deus feriu os primogênitos do Egito e poupou os primogênitos de Israel.
Assim, todo primogênito deveria ser consagrado ao Senhor, e essa consagração consistia em entregar o filho primogênito a Deus e resgatá-lo mediante uma tarifa; eram cinco ciclos de prata. Ora, na homilia da manhã, eu expliquei um pouco tudo isso de maneira mais detalhada. Aqui, já queria partir para um significado mais espiritual, porque, quando o povo de Israel sai do Egito e Deus se manifesta sobre o Monte Sinai, ele revela que o seu propósito era o de constituir uma nação sacerdotal.
O que acontece quando Moisés desce do Monte Sinai, depois de receber os 10 mandamentos? O povo havia prevaricado, adorando um bezerro de ouro, e, por causa desse pecado de idolatria, Deus então determinou que apenas a tribo de Levi, que havia permanecido fiel a Moisés, iria servir como tribo sacerdotal. É como se o propósito de Deus tivesse mudado: agora já não é mais um povo sacerdotal, agora é apenas uma parte desse povo que é sacerdotal, a tribo de Levi.
Na descrição do Evangelho, nós temos muitas semelhanças com a história do último juiz de Israel, que foi o sacerdote Samuel. A Bíblia diz que ele morava na região de Efraim, mas ele era da tribo de Levi, da tribo sacerdotal. Sua mãe, Ana, o entrega no Templo para servir ao lado do sacerdote Eli.
O relato do primeiro livro de Samuel nos dá conta de que Eli havia tolerado o pecado dos seus filhos, que roubavam do sacrifício que deviam apresentar a Deus de coração puro e, além disso, abusavam de mulheres nas imediações do Templo do Senhor em Siló. Então, os filhos de Eli morrem, o próprio Eli morre, e é Samuel quem continua com o culto e se torna o último juiz de Israel, aquele que vai ungir primeiro o Rei Saul, mas, sobretudo, depois, o Rei Davi. Ora, quando Davi tem a ideia de construir um templo para Deus, Salomão, o seu sucessor e filho, é aquele que realiza esse propósito.
As escrituras dizem, tanto no primeiro livro dos Reis quanto no primeiro livro das Crônicas, que, quando Salomão consagrou o templo, a glória do Senhor desceu sobre o templo. A nuvem da glória permaneceu de tal modo dentro do templo que os sacerdotes não conseguiam ficar em pé, tamanha era a magnitude e a densidade da glória do Senhor no seu templo santo. Quando nós lemos a profecia de Ezequiel, nós vemos nos capítulos 10 e 11 que a glória de Deus sai do templo.
Primeiro, vai para a porta oriental e, depois, desaparece. Pouco tempo depois, o templo é destruído, e, quando acontece, depois de 73 anos, o retorno do povo para Jerusalém, Zorobabel consagra o templo, mas a glória do Senhor não vem. Não acontece o mesmo que aconteceu nos dias de Salomão.
É então que temos, já alguns poucos séculos antes da Encarnação do Senhor, essa profecia de Malaquias. Ele diz: "Eis que envio o meu anjo, e ele há de preparar o caminho para mim. João Batista logo chegará ao seu templo, o dominador que tentais encontrar, e o anjo da Aliança que desejais".
Ou seja, é o próprio Deus que vem para ocupar o seu lugar no seu templo santo. E o que vem diz: "Eis dos exércitos, e quem poderá fazer-lhe frente no dia de sua chegada? " É como se alguém batesse na porta do templo e, ao invés de serem os peregrinos, fosse o próprio Deus.
O próprio Deus vem para invadir o seu templo santo, para tomar o seu lugar de honra, e o profeta diz: "Quem poderá resistir ao Senhor? Quem poderá ficar de pé quando ele aparecer? " O Salmo 23, que nós lemos em resposta, diz exatamente isso: "Ó portas, levantai vossos frontões, elevai-vos bem mais alto, antigas portas, a fim de que o Rei da Glória possa entrar".
Dizem-nos: "Quem é este Rei da Glória? " O Rei da Glória é o Senhor Onipotente. O Rei da Glória é o Senhor Deus do universo.
Ele vem para entrar no seu templo santo, mas diz o profeta Malaquias: "Ele é como o fogo da forja e como a barrela, o sabão dos lavadeiros. Estará a postos como para fazer derreter e purificar a prata. Assim ele purificará os filhos de Levi e os refinará como ouro e como prata, e eles poderão assim fazer oferendas justas ao Senhor".
Será, então, aceitável ao Senhor a oblação de Judá e Jerusalém, como nos primeiros tempos e nos anos antigos. O profeta está dizendo que Deus vem como um fogo para refinar, para purificar, exatamente como acontece com a prata e o ouro quando são submetidos ao cadinho. O que acontece?
A prata e o ouro são metais nobres, mas, infelizmente, aderem a eles metais pesados. E como é que se faz para separar a escória, a impureza, dos materiais que são metais pesados do ouro e da prata? É quando o fogo do cadinho, o fogo da forja, é elevado a altas temperaturas.
O ouro e. . .
A prata se derrete, as escórias aparecem. Então, com uma pinça, o forjador é capaz de tirar as escórias. O Profeta Malaquias diz que o Senhor vem ao Seu templo para purificar os filhos de Levi, que o Senhor venha ao Seu templo para submetê-los a um fogo refinador, a fim de que eles possam oferecer oblações justas.
Ora, Jesus entra no Seu templo, entra, mas ninguém percebe. É a ironia do Evangelho de São Lucas: o Dominador, o Senhor, o Deus Todo-Poderoso e Vé dos Exércitos chega no Seu templo santo. Quem percebe?
Apenas um velho, Simeão, e uma velha, Ana. Ninguém se dá conta. É interessante!
Eu comentava na missa da manhã que o Evangelho não descreve que Maria e José pagaram um resgate, dando a impressão de que Jesus foi entregue no templo para ficar lá. Isso não aconteceu assim, mas nós não podemos nos esquecer que na sequência desse relato está o relato da perda e do encontro de Jesus no templo. E quando Ele encontra, ou melhor, é encontrado por Maria e José, e ela lhe pergunta: "Filho, por que fizeste isto conosco?
", Ele responde: "Não sabeis que eu deveria cuidar das coisas do Meu Pai", como que dizendo: "O Meu lugar é aqui. Vocês não me entregaram aqui. O Meu lugar é no templo do Senhor.
Eu tenho que cuidar das coisas do Meu Pai. " Que coisas do Pai são essas? É o Seu sacrifício, é o Seu sacrifício expiatório.
Ele se entrega a nós como vítima e como sacerdote, entrega a Sua vida, mas ao nos dar o Seu sacrifício, Ele nos constitui como nação sacerdotal. O propósito de Deus é restaurado. Nós lemos no livro do Apocalipse que Ele nos constituiu como reis e sacerdotes para apresentar ao Senhor um culto santo, desde que purificados pelo fogo.
O que acontece, queridos irmãos, é que o fogo, fogo refinador, o fogo purificador, passa pela vida de nós todos. São Pedro diz na sua epístola, na primeira delas: "Bendito seja Deus, o Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo! Na Sua grande misericórdia, Ele nos fez nascer pela ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos para uma viva esperança, para uma herança incorruptível, incontaminável e imarcescível, reservada para vós nos céus.
E para vós que sois guardados pelo poder de Deus, por causa da vossa fé, para a salvação que está pronta para se manifestar nos últimos tempos. " É isso que constitui a vossa alegria, apesar das aflições passageiras a vos serem causadas ainda por diversas provações, para que a prova a que é submetida a vossa fé, mais preciosa que o ouro perecível, o qual entretanto não deixamos de provar ao fogo, redunde para o louvor, para a honra e para a vossa glória quando Jesus se manifestar. Ou seja, São Pedro está falando que nós todos precisamos passar por provações, por esse fogo purificador, por esse fogo refinador que vai expor as escórias do nosso caráter.
Isso acontece, por exemplo, numa família que está em crise. De repente, as máscaras caem; o que há de pior em cada um vem à tona, e se torna muito mais fácil identificar os vícios, os pecados que estão misturados com o ouro de Deus, para que eles sejam eliminados de nós. Isso acontece quando nós passamos por um revés profissional, por um período de escassez financeira, por uma crise afetiva, por uma crise espiritual em que o nosso espírito é submetido a todo tipo de aridez, de secura, e nós não temos vontade de orar.
A nossa carne grita, queima, entra em colapso. A nossa mente fica obscurecida, perdida, com sentimentos convulsivos. O fogo passa por dentro de nós para separar as escórias do ouro precioso, para que Ele nos purifique, para que Ele nos lave como com sabão de lavadeiros.
O Senhor precisa fazer uma faxina em nós. Pela força do Seu sacrifício, Ele precisa extrair de nós – e isso sempre doi – aquilo que mais nos envergonha, aquilo que mais nos humilha, aquilo que mais nos joga no chão. As escórias do nosso caráter precisam ser expostas para que o nosso caráter receba do Senhor o ouro puro que só Ele pode nos dar.
No livro do Apocalipse, essa imagem aparece mais uma vez quando o apóstolo fala à igreja de Laodiceia. Ao anjo da igreja de Laodiceia escreve assim: "Eis o que diz o Amém, a testemunha fiel e verdadeira, o princípio da criação de Deus: conheço as tuas obras. Não és nem frio nem quente.
Oxalá fosses frio ou quente; mas como és morno, nem frio nem quente, vou vomitar-te-ei. Compra de Mim ouro provado ao fogo para que fiques rico; roupas alvas para te vestires, a fim de que não apareça vergonha de tua nudez; e um colírio para ungir teus olhos, de modo que possas ver claro. Eu repreendo e castigo aqueles que amo; reanima, pois, o teu zelo e arrepende-te.
Eis que estou à porta e bato. Se alguém ouvir a Minha voz e me abrir a porta, entrarei em sua casa e cearemos eu com ele e ele comigo. Ao vencedor concederei assentar-se comigo no Meu trono, assim como eu venci e me assentei com Meu Pai no Seu trono.
Quem tiver ouvidos, ouça o que o Espírito diz às igrejas. " Por que o Senhor manda a igreja de Laodiceia, a morna igreja de Laodiceia, que estava tão preocupada com seus ganhos materiais, com a conquista daquilo que esta vida passageira pode dar? Por que o Senhor lhe exorta a comprar o ouro puro refinado que só Ele pode dar?
Queridos, é porque custa muito caro ser purificado pelo fogo de Deus. Custa lágrimas, custa dores, custa sacrifícios, custa estar com a alma, muitas vezes, posta sob pressão, com sentimentos de tal modo abalados que nós perdemos até a segurança do próprio chão que pisamos. Só que acontece que, quando nós não fugimos, quando nós deixamos o Senhor entrar no.
. . Seu templo entrar em nós para nos purificar quando nós permitimos que o fogo de Deus atravesse a nossa alma, com a mesma precisão com que Simeão diz a Maria: "Uma espada atravessará tua alma".
Quando nós permitimos que essa palavra de Deus, que é viva e eficaz, cortante e penetrante como espada de dois gumes, separe o ouro da escória, é então, queridos irmãos, que nós temos o nosso caráter tratado verdaderamente pelo Espírito Santo. Quantos de nós, apesar de tempos de caminhada, continuamos ainda com as mesmas escórias: nosso espírito crítico, nossa ignorância, a nossa incapacidade de compreender os outros, um modo rígido de julgar, uma língua rápida para difamar, um coração tardo para perdoar, uma vontade disposta a sempre dar o troco, as preferências por aqueles que mais nos agradam, o egoísmo que nos faz pensar em nós mesmos em primeiro lugar! Todos nós precisamos ser atravessados pelo fogo purificador que só o Senhor pode nos dar.
Mas quando nós não fugimos, quando, no momento de tribulação, a aflição produzida nos leva a uma posição de humildade, nós nos colocamos diante do Senhor e oramos, tomamos a sua palavra em nossas mãos e deixamos que a palavra vá às nossas disposições, retome os nossos passos, reequilibrando os nossos sentimentos. O fogo do Espírito Santo vai fazendo com que surja o caráter de Cristo em nós, e é isso que nós mais precisamos. Isso nós só podemos ter quando nós nos agarramos ao Senhor através da oração.
Sabe por que as pessoas não conseguem orar? Porque, quando Deus começa a tratar o seu caráter, e isso dói, elas fogem. Quando Deus diz para você: "Olha, você tem que abandonar aquele pecado.
Você tem que abandonar aquela relação", quando o Senhor, o Anjo da Aliança, lembra: "Olha, eu tenho uma aliança de vida e morte contigo, você precisa se submeter à minha vontade", então a carne cede e o homem foge. Ele não quer saber mais. Prefere que Cristo passe inadvertidamente, que ele não perceba, porque perceber quem é ele mexe profundamente com todas as nossas posições de conforto.
Não fuja do fogo da forja de Deus! Talvez você já tenha passado por isso, quando aquela doença chegou em você, quando aquela escassez bateu à sua porta, quando a perseguição se tornou mais rígida. São esses os momentos mais privilegiados em que o fogo de Deus começa a tirar de nós aquilo que não tem a ver com a obra dEle em nossa vida.
Não fuja, deixa o Senhor te tratar! Talvez isso signifique que Ele tire algumas pessoas, ou que Ele cause alguns distanciamentos, ou que Ele trabalhe de tal modo nos teus sentimentos que você, aos poucos, comece a mudar. Não importa, quando o fogo refinador do Senhor chega, ele dói, mas é ele que santifica.
Não fuja, porque você e eu temos que ser apresentados ao Senhor para que nós possamos apresentar ao Senhor, graças ao sacrifício de Cristo, uma oblação pura, isto é, uma adoração em santidade. Que Deus nos leve a essas experiências profundas com o fogo do seu amor! E então, queridos irmãos, anos se irão passando e nós teremos experiências profundas com o Senhor, porque o nosso Deus, como diz o autor da carta aos hebreus, é um fogo consumidor.
Que Ele passe por nós e que nós possamos, dia após dia, ser tratados pelo Espírito Santo, retirados de uma posição de frieza para uma posição de fervor, em que o Espírito de Deus prevalece sobre todas as nossas inclinações. Amém. Creio em Deus.