Atos Ilícitos | Prof. Bruno Zampier

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Supremo
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Video Transcript:
[Música] Se falamos dos fatos jurídicos lícitos, é importante a gente lembrar um pouquinho dos fatos jurídicos ilícitos. Mas quero fazer um parênteses nas nossas aulas de responsabilidade civil, que, na minha visão, é o local correto da gente tratar atos ilícitos. A gente explora a temática dos fatos ou dos atos, como dissemos, ilícitos, mas só a título de lembrança, coloca na tela aqui pra gente.
Quando a gente fala em atos ilícitos, esses atos contrários ao ordenamento, três coisas são importantes: primeiro, o artigo 186, ele vai tratar do ilícito chamado de ato ilícito subjetivo. Por que subjetivo? Porque é baseado numa ideia de culpa.
Então, quando o ato comissivo ou omissivo for permeado por negligência, imprudência, imperícia ou dirigido finalisticamente para aquela intenção de causar dano a outra pessoa de forma dolosa, nós vamos falar que, ao provocar o dano, haverá o ato ilícito. Então, o ato ilícito no 186 requer a produção de dano; eu preciso ter um dano para que haja a configuração do ilícito subjetivo do 186. Já no 187, a coisa muda de figura, porque no artigo 187 nós vamos trabalhar o ato ilícito objetivo.
Aqui, não mais baseado numa ideia de culpa; aqui a ideia é a análise de comportamento. Comportamento de quem? De quem é tido como titular de direito.
Quem é titular de um direito pode agir legitimamente, respeitando-se os limites impostos pela lei, ou pode atuar de maneira abusiva. Então, quando eu falo em abuso de direito, eu estou falando de um titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pela função social, pela função econômica, pela boa-fé objetiva e pelos bons costumes. Ou seja, o 187, ao falar que o titular de um direito, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pela função econômica e social, pela boa-fé e pelos bons costumes, essa é a redação, eu acabei de falá-la do 187.
Confere aí no seu Vade Mecum: 187 do Código Civil. O que ele tá colocando pra gente é a possibilidade do abuso do direito no Brasil ser reputado como ato ilícito. Anota essa frase no seu caderno: o 187 consagra que, no Brasil, o abuso do direito independe de culpa e configura ato ilícito.
O 187 consagra, no Brasil, que o abuso do direito independe de culpa e configura um ato ilícito a critério de quem? Do juiz. Por quê?
Porque quem vai dizer se o titular do direito, ao exercê-lo, excedeu ou não os limites impostos pelo ordenamento é o juiz. Nós tivemos um amplo debate disso em 2022 no Brasil a respeito da liberdade de expressão. A liberdade de expressão é um direito fundamental.
Agora, é um direito fundamental que eu posso exercer da forma como eu bem entender? Tanto o STJ quanto o STF, há décadas, falam que não; todo direito tem limite. Não existe direito de caráter absoluto.
Então, o judiciário vai ter esse papel, goste você ou não. Essa tarefa, numa democracia, é do Poder Judiciário de dar a palavra final sobre se um direito foi exercido ou se ele foi exercido abusivamente. E são inúmeros exemplos, tanto no STJ quanto no STF.
Pode ter abuso do direito de demandar? Eu demando quando sei que, evidentemente, não tenho direito algum só para espezinhar, só para encher o saco, só para assediar judicialmente a outra parte. É assédio judicial.
Já ouviram falar? É uma forma de abuso do direito reconhecida assim pelo STJ. Quem entra com uma ação ou incentiva pessoas a entrar com uma ação onde sabidamente não há direito algum só para espezinhar, só para encher o saco, com ânimo chicaneiro, com ânimo emulativo, é claro que essa pessoa pode ser punida.
E a punição vem exatamente da vedação ao abuso do direito de demandar. Quando a gente fala de figuras como venditio e contrafactum proprium, a de implemento substancial e supressio et surrectio, todas essas figuras foram construídas na doutrina e hoje estão presentes na jurisprudência do STJ como formas de quê? Como formas de repressão ao abuso do direito.
Ok, então não é só o abuso na liberdade de expressão. Existe abuso do direito de fiscalização? Existe abuso de autoridade?
Você, delegado, amanhã, como delegado, vejo isso toda hora acontecendo. Tem muito colega aí que quer aparecer, quer mídia; é uma desgraça, é triste, é feio, e é abuso de autoridade. Eu já vi colega pedindo mandado de busca sem ter mínimos elementos para aquela busca.
"Ah, mas vai que a gente acha alguma coisa lá. " Filho, não é assim que a banda toca. "Vai que a gente acha alguma coisa lá.
" Você tem que ter um mínimo de elemento de prova para pedir isso. E aí foi lá no juiz, botou uma pressão e conseguiu o mandado de busca. Eu, olhando aquilo, falei: "Meu Deus do céu!
" Isso é abuso, abuso de autoridade, abuso de poder. Então, a ideia de abuso é uma ideia muito importante pro Direito Administrativo, penal, civil. Quando você vai além, quando você vai fora, a gente vai falar de excesso de abuso.
No Direito Civil, a gente chama isso de abuso do direito. Então a figura do 187 é uma figura que auxilia, de novo, não apenas o direito civil, mas o direito como um todo. Ah, precisa comprovar a intenção de prejudicar outrem?
Precisa provar a intenção de agir para além ou fora ou em excesso? Não basta o comportamento. Então, a análise do 187 é uma análise comportamental.
Lembrem-se disso. E é o juiz que vai ter que analisar, porque é cláusula geral, ok? E, por fim, dentro da ideia dos atos ou dos fatos ilícitos, nós temos também a importante figura do 188, que vai tratar das excludentes de ilicitude.
Você, aluno, normalmente ama Direito Penal, verdade ou não? Verdade! Bruno, não tem como negar, né?
Pois é. Sabe aquelas excludentes de ilicitude? Legítima defesa, exercício regular de direito.
. . estado.
. . De necessidade, consentimento do ofendido, distrito, cumprimento do dever legal.
. . Lembra dessas cinco lá do 23 e 24 ali do Código Penal?
Pois é, elas também estão presentes no Código Civil. Lembre-se disso: o Código Civil também trata de excludentes de ilicitude. Lógico, ele está falando das ilicitudes do direito civil.
E mais, o 188 não trata dessas cinco do Direito Penal. Claro, consentimento do ofendido é uma causa supralegal de excludente de ilicitude. A gente já estuda isso lá no Direito Penal há décadas, mas aqui no Direito Civil ela também poderia ser tida como uma excludente de ilicitude, tá bom, com os mesmos requisitos do Direito Penal.
E ela é falada no Código Civil, não? Também não por isso? Supra-legal!
Então, quais o Código Civil trabalha? Gravem: o Código Civil trabalha a legítima defesa, o exercício regular de um direito e o estado de necessidade. Tome note no seu caderno!
Tela! O Código Civil, no artigo 188, trabalha três excludentes de licitude: a legítima defesa, o exercício regular de um direito e o estado de necessidade. Legítima defesa, exercício regular de um direito e o estado de necessidade.
E ele não traz muitas definições do que seriam essas figuras. E elas. .
. Olha, olha, olha, olha! Coloca na tela, coloca na tela, coloca na tela esses três aqui para prova de delegado.
Galera, coraçãozinho sempre cai excludente de licitude do Direito Civil em prova de delegado. E aqui eu vou fazer um adendo, um parênteses, porque é muito importante a gente estudar isso, já que cai bastante. Eu tenho que dar foco nisso.
Por quê? Porque existem algumas diferenças para o Direito Penal e, se você for com o raciocínio de Direito Penal para prova de Direito Civil, você pode estar em apuros, ok? Então, vamos lá: primeiro, legítima defesa.
Os requisitos que você aprende sobre a legítima defesa no Direito Penal você pode transplantar para cá: Ctrl+C, Ctrl+V, tudo igual. Então, quando é que é legítimo agir em sua própria defesa? Quando tiver uma agressão injusta.
Quando é que eu vou analisar essa agressão injusta diante do caso concreto? Uma agressão injusta atual ou iminente, sendo que você vai reagir para interromper aquela agressão usando o quê? Dos meios à sua disposição, usando esses meios de maneira proporcional, não usando esses meios de maneira abusiva.
Ou seja, gravem: eu vou pensar nos requisitos da legítima defesa como você pensa no Direito Penal. Ah, Bruno, mas aquelas discussões do penal, legitima defesa putativa e tal, tem que vir com granos sales, com muito cuidado, para trabalhar isso no Direito Civil. Por quê?
Porque o foco do Direito Penal é a punição do autor do crime e a proteção desse autor. Por quê? Porque ele vai sofrer a medida mais grave, que é a medida de restrição de liberdade.
Então, a ideia de garantismo penal, que está na nossa Constituição, evidentemente é uma ideia de proteção dos direitos de quem sofre as consequências penais. Então, o foco do Direito Penal é naturalmente a pessoa do autor do crime. O Direito Civil é diferente.
O Direito Civil está focado na vítima. Essa é a maravilha do Direito Civil! O Direito Civil, repito, está focado na pessoa da vítima.
Ele olha pra vítima e fala: “Olha, essa pessoa aqui merece proteção, ela sofreu danos, eu quero que todos os danos que ela tenha sofrido sejam objeto de adequada e devida reparação. ” Por isso que a ação é na medida não da culpabilidade do autor, mas sim na medida da extensão dos danos. É assim que a responsabilidade civil funciona.
Eu não vou ficar olhando se é culpa, se é dolo; isso eu deixo pro Penal. Ele está preocupado com o autor. Aqui, estou preocupado com a vítima.
Então, eu vou olhar não pra conduta do autor, eu vou olhar especialmente para os danos experimentados pela vítima. Daí a ideia de uma reparação integral: todo e qualquer dano sofrido pela vítima merece ser reparado. Princípio da reparação integral dos danos.
O princípio maior da responsabilidade civil, focado em quem? Na vítima. Então, se houve uma legítima defesa porque o sujeito analisou mal as circunstâncias, ele pode até não responder no Penal numa legítima defesa putativa, mas no Direito Civil ele vai responder.
Vai, vai, porque eu não tô pensando no autor, eu tô pensando em quem? Na vítima. Então, eu encontrei aqueles tio Meve e Caio, encontrei seu algo na madrugada, aí ele botou a mão na cintura para tirar uma carta de pedir desculpa e achou que era uma arma e matou.
Vai responder pra família por uma indenização. Ah, mas penalmente ele pode ser absolvido. Beleza, a gente discute lá se é na culpabilidade, se é na ilicitude que vai ser absolvido.
Todas aquelas discussões do Penal, mas aqui no Cível, aqui no Cível, filhote, vai pagar a indenização, sim, porque eu tô focado em quem? Na vítima. Lembrem-se disso.
Segundo, quando eu falo em exercício regular de um direito como excludente de ilicitude, na verdade, eu tô fazendo uma análise a contrário senso do próprio 187, que como acabamos de ver, é o artigo que fala de abuso do direito. Ora, só tem duas alternativas: ou eu exerço o meu direito regularmente ou eu o exerço irregularmente. Não tem meio termo.
Ou eu abusei do meu direito ou o exerci de maneira adequada, de maneira regular. Faz sentido ou não? Claro, claro que faz!
Então, eu sou credor: eu posso fazer uma cobrança vexatória do meu devedor? Colocar uma faixa na porta da casa dele para que o bairro todo veja: “Me paga a dívida, seu Antônio devedor, cont. Tomás tá me devendo R$ 100.
000 com juros e correção? ” Eu não posso usar de meios vexatórios para cobrar um crédito, ainda que eu seja credor, porque isso seria abuso do direito de cobrança. Agora, se eu propuser uma ação, se eu notificar o seu Antônio.
. . Meu devedor, de que ele está em mora, isso é exercício regular.
Claro que isso está dentro das minhas possibilidades; enquanto credor, eu posso cobrar a dívida da qual sou titular, melhor dizendo, do crédito do qual sou titular. Então, a cada caso que se coloca frente ao poder judiciário, a gente pode ter a análise se o exercício é regular ou se seu exercício é abusivo. Lembra da liberdade de expressão que citei?
Muitos dos julgados do STF e do STJ, depois de uma pesquisada, vão discutir isso. O jornal Alista publicou a seguinte matéria: "Não, pera aí, mas ele tem direito de opinar a respeito, ele não foi além, ele deu a visão dele sobre o fato". Isso é jornalismo opinativo, crítico.
Então, o jornalista aqui não vai responder se a pessoa retratada não gostou; só lamenta. O fato é verídico. Ele fez o contraditório jornalístico, ele atuou conforme as balizas, então é exercício regular.
Não há ilicitude. Se não há ilicitude, não há dever de reparar. Ah, não!
Primeiro, o jornalista inventou uma notícia falsa, não tem comprovação nenhuma. Ele fez uma ilação. Além disso, descascou e detonou a pessoa retratada sem mais nem menos; não, esse cara vai responder por dano.
Pera aí, isso não é jornalismo, isso é ofensa. Então, isso aqui não tem liberdade de expressão; aqui houve abuso e vai responder, porque há ilicitude. Então, se de um lado você tem um exercício regular, do outro, esse exercício pode ser tido como abusivo.
Tá bom? E, para acabar, o terceiro previsto, então, esses dois estão no inciso I do 188. Já no inciso II do 188, nós vamos ter o estado de necessidade.
O que você aprendeu classicamente sobre estado de necessidade? Age, atua em estado de necessidade, aquele sujeito que escolhe sacrificar um bem de menor valor para salvar ou guardar um outro bem de maior valor. Lembra?
Eu causou um dano, mas causei aquele dano com a intenção de evitar um mal maior. Repito: eu causo, sim, um dano, mas eu causo aquele dano com a intenção de evitar um dano maior, um dano mais grave. Exemplo clássico que meu professor contou na faculdade e que nunca mais esqueci: há 20 anos, eu tô dirigindo meu carro e, de repente, uma criança de 5 anos atravessa correndo no meio da rua.
Eu desvio o carro para não atropelar a criança, mas colido em um veículo regularmente estacionado naquela mesma rua. A criança foi salva? Foi, mas agora há um dano no veículo que estava estacionado.
É clássico! Clássico! Sacrifiquei um patrimônio para salvar uma vida.
Atuei em estado de necessidade. Foi uma decisão minha? Foi.
Pratiquei ato ilícito? Não! Agi em estado de necessidade.
Ah, no penal, se classifica justificante exculpante; deixa isso pro penal, porque pro civil isso não vai ser relevante. Tá bom? Mas o Código Civil tá focado em quem?
Na vítima! Quem é a vítima nesse caso? O dono do carro parado, que não tinha nada a ver com a história.
Então, a pergunta que fica é: o dono do carro parado que eu resolvi bater nele para salvar a vida da criança, ele vai poder cobrar de mim uma indenização? Vai! Anote aí: 929.
900 e 29. Quem sofre o dano, mesmo tendo o agressor agido em estado de necessidade, vai poder cobrar desse agressor uma indenização. Então, nesse meu exemplo, o dono do carro parado pode se voltar contra mim?
Pode! 929. Ah, Bruno, mas isso não é justo!
Por quê? E o pai da criança, que não cuidou bem dela? Tanto é que ela atravessou na frente do seu carro; esse cara não vai responder por nada?
Sacanagem, injusto! Pois é, mas o direito se veio maravilhoso, né? E olha o que fala o 930: o 930 vai me dar o direito de regresso.
Hum! Hum! Então, Bruno, você vai poder se voltar contra os pais daquela criança que não custodiaram, não cuidaram dela adequadamente, permitiram que ela atravessasse a rua.
Perfeito! Então, olha como o direito civil é sábio: eu pago uma indenização pro dono do carro que estava parado na rua, que não tinha nada a ver com a parada, né? Tinha nada a ver com nada ali, coitado.
Eu pago uma indenização para esse camarada, mas depois eu posso entrar com uma ação regressiva contra quem não custodiou adequadamente, contra quem não cuidou daquela criança, contra os pais, tutores, seja lá quem for daquela criança. Ok? Então, lembrem-se dos atos ilícitos: 186, 187 e 188.
Esse também é um capítulo que, se eu fosse vocês, estudava na doutrina, quando é para estudar, só lei seca e caderno, eu falo. O bom de videoaula é essa orientação, né, gente? Então, aqui, se eu fosse vocês, estudaria atos ilícitos em livros de doutrina.
Já citei vários doutrinadores aqui, escolha o de sua predileção e vá ler atos ilícitos na doutrina, porque isso vai te ajudar bastante. Tá joia? É um tema super relevante para prova de delegado, tem pertinência temática.
A maioria das ilicitudes penais são ao mesmo tempo ilicitudes civis. Por isso que, quando tem uma condenação no direito penal, normalmente essa condenação vira título executivo judicial no civil, na chamada ação civil ex delito, que você estuda lá na ação penal, no processo penal, porque ela tá prevista tanto no CPC quanto no CPP. Tá joia?
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