Caríssimas irmãs, hoje a liturgia da palavra se abre com essa frase: "Maldito o homem que confia no homem e faz consistir sua força na carne humana, enquanto o seu coração se afasta do Senhor. " Há um tempo atrás, uma pessoa me fez uma pergunta referente a um debate que havia num grupo de mulheres, em que uma perguntou: "Você confia no seu marido? " E a outra respondeu: "Não, porque a Bíblia diz: 'Maldito o homem que confia no homem.
'" Só que a Bíblia não está falando disso; não está falando da confiança que o marido e a mulher têm que ter mutuamente. O que o texto está falando é dessa fé no homem, de colocar o ser humano como apoio da nossa vida, de colocar o ser humano como se fosse o fundamento da nossa existência. Isso é uma loucura, porque o coração é inconstante.
E vejam que, na parábola contada por Jesus, aqui no Evangelho, o homem rico confiava nas suas riquezas e confiava sempre nos homens. Ele chega a tal ponto de dizer: "Manda Lázaro ir falar com os meus irmãos, porque, se um morto se levantar do sepulcro e falar, eles vão acreditar. " E aí Jesus diz: "Olha, se eles não escutam Moisés e os profetas, mesmo que um morto ressuscite, eles não vão acreditar.
" Foi exatamente o que aconteceu depois da Páscoa. Conforme nós lemos no Evangelho de São Mateus, os guardas foram até o sumo sacerdote e disseram: "Olha, vimos anjos, a pedra rolou sozinha, etc. " E eles foram subornados para dizer que os discípulos roubaram o corpo.
Ou seja, a nossa confiança tem que estar em Deus, inteiramente em Deus. Agora, quando nós dizemos que a nossa segurança tem que estar em Deus, isso significa que os outros irão sumir do nosso horizonte? Não, é pelo contrário, porque o mandamento da caridade nos manda amar a Deus e o próximo.
Então, como as duas coisas se requerem? Como elas combinam mutuamente? É que, quando eu não transformo o homem no meu fundamento, eu aprendo a ter sobre ele um olhar de misericórdia, um olhar de bondade, os mesmos sentimentos que havia no coração de Cristo.
Jesus diz em São Paulo que nós temos que ter os mesmos sentimentos de Cristo Jesus em Filipenses 2:5. E qual era o sentimento de Jesus quando via toda aquela multidão ao seu lado? O Novo Testamento nos diz que ele se enchia de compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor.
Essa experiência é a experiência de orar, de viver, de se ofertar pela salvação dos outros. Hoje em dia, eu vejo muitas pessoas falando sobre as moradas de Santa Teresa, etc. , achando que o progresso da vida espiritual depende muito mais da introspecção, de nós darmos um mergulho para dentro de nós mesmos.
Embora isso em parte seja verdade, não é verdade que o crescimento na vida espiritual vai se dar simplesmente pela minha dedicação à minha vida de oração, porque eu preciso aprender a meditar. Como santos, por exemplo, Abraão, quando os três anjos apareceram a ele no Carvalho de Mambré e foram na direção de Sodoma e revelaram que Sodoma seria destruída, o que ele fez? Intercedeu: "E se tivesse 50 pessoas?
E 45? E 40? E 35?
" Quando o povo de Israel prevaricou, começou a adorar um bezerro de ouro, Moisés foi à presença de Deus em Êxodo 32, e Deus lhe diz: "Deixa-me destruir esse povo, e eu farei uma grande nação a partir de ti. " É uma proposta que chega a ser tentadora, Deus dizendo: "Olha, eu vou abrir um negócio com você. Deixa eu destruir essa gente de cabeça dura.
" Moisés intercede: "Senhor, mas o que vão dizer de Ti? A Tua fama? Que o Senhor trouxe o Teu povo para cá para destruí-lo?
Não, não faça isso. Esse povo tem cabeça dura, esse povo tem um coração pervertido. Tem misericórdia, usa de compaixão.
" Essa é a oração que Jesus faz por nós, no alto da cruz, no Monte das Oliveiras, quando vê os nossos pecados, a nossa incapacidade de nos convertermos. Ele diz: "Eu rogo por eles, para que eles creiam, eu rogo por eles. " Ou seja, o nosso coração tem que ser possuído por vibrações intercessórias; nós temos que ser tomados por um desejo ardente de que todos os homens se salvem, cheios do conhecimento da verdade, de que todos possam compreender a altura, a profundidade, a longitude e a latitude da caridade de Jesus Cristo.
Dentro de nós, precisa haver um sentimento universal de bondade, compaixão, de clamor, de súplica a Deus por todas as almas, indistintamente. O coração do intercessor tem que queimar; ele tem que ser possuído por uma caridade cheia de compaixão, de identificação, de compreensão, de cuidado. O intercessor é como uma mãe que pega um filho doente no colo e o apresenta diante do altar de Deus, que pede em seu favor, confiando nas palavras de Cristo: "Se vós que sois maus sabeis dar boas dádivas aos vossos filhos, quanto mais o vosso Pai do céu dará o Espírito Santo a todos aqueles que lhe o pedirem.
" Ou seja, Deus só sabe dar; Ele não sabe dar outra coisa. Portanto, nós podemos ter impulsos de amor no nosso coração, podemos ter vibrações de amor direcionadas a Deus que nascem desde o mais profundo das nossas almas. Nós podemos estar na oração como quem está suspenso no imutável, no invariável, no permanente, no eterno; ou nós podemos, na oração, ter a experiência de um ser que se desfaz, cujo eu se liquefaz em Deus.
Nós podemos ter, na oração, a capacidade de vibrarmos na direção do céu, de desaguarmos na Santíssima Trindade. Mas nós só oraremos como Jesus quando o Espírito Santo nos colocar na posição de filhos que clamam: "Abba, Pai! ", que têm misericórdia e bondade e compaixão e que se identificam e que sentem as dores do outro.
Traz diante do altar de Deus as dores e as lutas do outro como se fossem próprias. O nome disso é expiação; é lutar as lutas do outro, é colocar-se entre a alma e Deus, entre a alma e o diabo, é mergulhar de tal modo no fogo da cruz que o nosso ser arda com Cristo em benefício das almas, num sacrifício de redenção, completando em nós o que falta às dores de Cristo, aos seus padecimentos pelo seu corpo, que é a Igreja. E quando tudo isso se manifesta com lágrimas, com dores, com dores de parto, com angústias, com uma compaixão que nos faz emitir um grito silencioso, um grito que sai da fina ponta da nossa alma como do mais profundo dos oceanos até chegar às ondas da praia.
Quando isso está em nosso coração, então a oração, a oração, ela se torna um instrumento de verdadeira salvação em Deus, em Cristo. Peçamos a nosso Senhor que sejamos dominados por esses sentimentos de caridade e, ao invés de esperarmos dos homens, que nós possamos vê-los como falhos, fracos, frágeis, efêmeros, intercedendo por eles, sabendo que também nós padecemos das mesmas fragilidades.