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Video Transcript:
Olá, boa noite a todas as pessoas que nos acompanham nessa transmissão. Que alegria fazer parte de mais uma jornada pedagógica. Eu imagino que assim como eu, vocês também ficaram na expectativa para esse evento que já se tornou parte da agenda dos educadores e das educadoras do nosso país. A vocês todo o nosso respeito e nosso carinho. Que bom que todos vocês estão aqui com a gente, porque essa jornada só acontece com a sua participação. Então, organizem-se para não perder nenhuma mesa. Posso garantir que todas estão muito especiais. Eh, antes de eu chamar as nossas convidadas
de hoje da nossa mesa que tá incrível, eu tenho alguns recadinhos. Primeiro, se você ainda não se inscreveu, não perca tempo. A inscrição é simples, é rápida e dá direito ao certificado de participação e ao nosso sorteio. Isso mesmo, hoje tem sorteio. São três kits de livros e os livros vão aparecer aí para vocês. Olha só, originárias organização de trudado rico, eh, o som do rugido da onça da Migeline Veronsk, eh, Lélia Gonzales, um retrato da Sueli Carneiro e o perigo de uma história única de Shimam. A de X. Eh, tá demais esse esse kit
tá demais, né? Então não perca tempo. Se você quiser concorrer para ganhar esses títulos, basta fazer a inscrição no link, tá aparecendo aí para você e vai aparecer também no chat, tá bom? O anúncio dos contemplados será o final da nossa programação de hoje. Então fique com a gente e boa sorte. Eu gostaria também de agradecer a todo mundo que está trabalhando para essa jornada acontecer nos bastidores, a Juli, o Alex, a Daniela, a Rafaela. Eu agradeço também ao Mais Diferenças, a Paula e a Gabi, as nossas intérpretes de Libras de hoje. Eu vou fazer
nesse momento a minha autodescrição. Eu sou uma mulher negra de pele clara, tenho 44 anos, meus cabelos estão soltos e cacheados. Eu uso uma blusinha preta, um colar que tem um detalhe em branco. E bom, acho que é só isso. Eh, vamos paraa conversa de hoje, então, né? Vamos começar. Então, abram aspas e sigamos pelo começo de tudo, por aquilo que foi determinado como começo de tudo. Embora alguém possa refutar e dizer que essa história começou com um rei que, com o bisco cheio de moedas da aveda burguesia resolveu lançar-se ao mar, aquele mesmo tenebroso,
eu desminto e digo que tudo começou mesmo com in e fecham aspas. Esse trecho faz parte do livro O Som do Rugido da Onça, de uma de nossas ilustres convidadas. Toda a história poderia começar com um rei. Poderia, mas aqui não. A história aqui vai começar por uma menina indígena. A literatura, ela oferece acesso a diferentes perspectivas, permitindo-nos experienciar o mundo, ampliar nosso imaginário e diversificar nossas interpretações da realidade. Uma proposta literária decolonizadora vai além. mobiliza o leitor para reflexão e o exercício de um olhar crítico em relação ao eurocentrismo e à sociedade, considerando a
sua pluralidade. O tema da nossa jornada é: A escola forma leitores a partir dos resultados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil. E a nossa mesa de agora é chamada literatura e diversidade, descolonizando os imaginários. Este é um convite para refletirmos sobre as escolhas e as indicações literárias na escola. Considerando a queda no número de leitores, será que livros mais contemporâneos e diversos garantiriam um interesse maior pela literatura no contexto escolar? O quanto é importante se reconhecer por meio da literatura? Vocês já perceberam que a conversa vai ser boa, né? Bom, eu estou muito ansiosa
para chamar as nossas convidadas, mas apenas por uma questão conceitual é importante a gente fazer um esclarecimento. A gente sabe que os termos descolonizar e decolonizar se referem ao combate à colonização, mas guardam diferenças. Pode ser que em nossa conversa a gente trate tanto do processo histórico localizado, econômico de independência de colônias, que é o colonialismo, quanto do movimento de luta contra as heranças desse processo, como racismo, por exemplo. Nesse caso, nós vamos falar de colonialidade, que se estrutura através do tripé, poder, saber e ser. Esse daqui é só um parêntese conceitual pra gente se
localizar, tudo bem? Bom, então terminando essa parte, essa parte introdutória, é hora de chamar as nossas convidadas e a primeira delas nasceu em Berimbal, Conceição do Jacuíp, Bahia. É poeta, escritora, jornalista, pesquisadora e doutora em literatura pela UnB, Universidade de Brasília. Realizou o pós-doutorado coordenado pela catedrática Conceição Evaris no Instituto de Estudos Avançados na Universidade de São Paulo. Possui textos literários em publicações brasileiras e internacionais. Foi indicada ao prêmio de adbuti com Planta Oração em 2022. Esse livro aqui lindíssimo, seu primeiro livro de contos. Bem-vinda, Cila das Merces. Boa noite. Boa noite a todas, todes
e todos. Uma alegria estar aqui com vocês. Eh, quero agradecer desde já pelo convite, cumprimentar todo mundo que tá aqui assistindo, eh, que tá nas suas casas acompanhando a jornada pedagógica. E agradecer também os parceiros e parceiras Rafaela, Débora, Dani, Alex, Juli, as intérpretes Paulo e Gabi e as parceiras que vão chegar daqui a pouco para essa conversa, a Márcia e a Micheline. Eu vou me autodescrever. Eu sou uma mulher negra. Eu tenho, eu uso dreadlocks na altura dos ombros, mais ou menos passando um pouquinho dos ombros. uso óculos e tô usando uma camisa bege
de gola um pouco alta. E como diria a minha mentora, Conceição Evarista, eu sou uma mulher muito bonita. Concordo. Como não concordar com a Conceição, não é? Obrigada, Calila. Vou deixar você aqui um pouquinho na tela porque aí a nossa a nossa mesa vai ficar mais bonita ainda. Queria chamar a nossa segunda convidada. Ela é doutora em linguística pela Universidade Federal do Pará, mestre em Geografia pela Universidade Federal do Amazonas, escritora, poeta, compositora e contadora de histórias. Trabalha com multio musical de canto e poesia. Eh, ela tem vários livros publicados. Aliás, em breve teremos lançamento
dessa autora aqui pela Pequena Zaar com o livro Maqueira de Tucum. Aguardem, está ficando lindo e já está chegando. Então, seja bem-vinda, Márcia Candeba. Boa noite. Boa noite, Débora. Boa noite, Paula. Boa noite, todos da companhia. Boa noite, Camila. É uma honra. e Micheline, que daqui a pouco vai aparecer. É um prazer muito grande estar com vocês. Eh, meu boa noite hoje vai aqui de Barcelona, onde eu estou eh com a invitação, como eles dizem, né, pela Casa América, justamente para falar de literatura, eh, com o Hugo, que é um indígena, eh, da Colômbia, da
Amazônia colombiana, e tá sendo muito proveitoso. poder estar com vocês para mim é um um presente de verdade nessa jornada pedagógica. Sicature, obrigada, Márcia. Você poderia se autodescrever, por favor? Claro, claro. Eh, sou uma mulher indígena, eh, pele indígena e cabelos negros. Estou usando um vestido laranja, um colar de sementes vermelhas de eh tento. É uma semente típica da da Amazônia. Óculos. Atrás de mim tem um uma parede marrom. Tá joia. Obrigada, Márcia, muito bem-vinda. Bom, e a nossa última convidada é escritora e historiadora, autora de livros de contos, poesia e romances, incluindo Nossa Teresa,
vida e morte de uma santa suicida, vencedor do prêmio São Paulo de Literatura, O som do rugido da onça, que é um livro que a gente vai falar bastante aqui hoje, tá aqui, eh, que conquistou o jabuti de melhor romance literário e vem e o terceiro lugar do prêmio Oceanos e caminhando com os mortos, vencedor do prêmio Oceanos do ano passado, 2024. E com muita alegria, eu anuncio também que em junho sai o novo livro dessa autora pela Companhia das Letras, depois do trovão. Então aguardem também. Olha só que novidade boa, né, pessoal? Seja bem-vinda,
Micheline Verussk. Boa noite. Boa noite. É uma alegria enorme estar aqui nessa jornada pedagógica. Eh, saúdo eh minhas colegas de mesa, saúdo a Paula intérprete, que começa essa noite com a gente, os educadores que nos acompanham e o pessoal da Companhia das Letras sempre tão gentil e atento. Eh, eu sou uma mulher branca e uso óculos, eh, tenho cabelos tingidos de uma cor que é um pouco ferruginosa, vou dizer assim, né? Um pouquinho queimada. Eh, tô com uma blusa xadrez, uma camisa xadrez, eh, vermelha, vermelha com tons de azul e estou agora no escritório. O
meu fundo tem duas estantes, uma estante marrom e uma estante branca, um vaso que é uma cabeça de onça com uma eh orquídea e um quadro do Michel Ireneu atrás de mim. Obrigada, Micheline. Bom, gente, olha só que mesa linda, né? Cila, Márcia, Micheline, tá todo mundo aqui com muita expectativa e muito todo mundo muito ansioso para para essas trocas que teremos hoje. Eh, muito obrigada mais uma vez e eu queria começar essa conversa aqui, essa apresentação, essa parte inicial com a Cila. Cila, eh, vou jogar já uma pergunta e aí é com você. Eh,
descolonizar imaginários para formar leitores ou formar leitores para descolonizar imaginários? Qual a importância da diversidade na experiência literária na sua obra e para alcançar leitores na escola? Com você. Eita! Começamos. Então, eh, então, eh, desde que vocês me fizeram esse convite, eu fiquei pensando, refletindo sobre os diferentes tipos de docência, né? E eu posso afirmar que ensinar está conectado à minha casa desde que eu me entendo por gente, né? Desde que minha vida começa. Sim. Eh, eu sempre tenho dito nos lugares que eu venho chegando, né, que eu chego, que minhas primeiras escolas são o
sertão e o Recôncavo da Bahia. Então, são esses espaços assim que me dão régua e compasso, né, que é de onde começam as histórias, né, os aprendizados a partir das experiências eh das pessoas mais velhas, né, dos meus mais velhos. E junto com isso, né, logo em seguida, eh, os estudos formais, né, ditos formais. Então, eu começo dando banca pros meus vizinhos, eh, indo às noites, eh, que dava com minha mãe, né, paraas aulas que ela dava para o o EJA, eh, confecções de cartazes, lendo os livros didáticos, que eram diferentes dos meus. Eu sempre
fui muito curiosa, eh, queria entender como era a dinâmica das crianças, né, como minha mãe ela lidava com as crianças, que minha mãe foi professora, né, de séries iniciais, né, de crianças, adultos e pessoas com deficiência, né? Então, tudo isso na minha cidade natal, né, que é Conceição do Jacuipe, que antes foi vila de Berimbal, uma cidadezinha, né, uma vilazinha que pertencia a Santo Amaro da Purificação, né, a terra da Maria Betânia, todo mundo conhece. E enfim, então depois da graduação, eu vou me tornar eh professora de português e redação, vou lidar, né, com um
outro público que são jovens que querem ingressar na universidade. E eu já tava na graduação e fornecendo aqueles meus conhecimentos e vou adquirindo outras nuances dentro desse espaço educacional, né? Depois vou para o mestrado e lá eu vou desenvolver também uma dinâmica com alunos da graduação, dando aulas, depois dando oficinas, cursos, eh, em diferentes lugares e, eh, depois doutorado, a mesma coisa. chegando no pós-doutorado, também me conectando com alunos de pós-graduação e Brasil afora, com cursos e essa diversidade de trocas que tem sido a minha vida até então, né? Sempre conectado com a literatura e
com essa ideia, né, de troca, de partilhamentos e com desejo mesmo de fortalecer os imaginários. Eh, eu tive a oportunidade de trabalhar com a professora Conceição Ivaristo. Ela foi minha supervisora, coordenadora do pós-doutorado na USP. E com ela eu tive a oportunidade de ampliar, né, minhas perspectivas de educação como prática de liberdade, né? Também na USP trabalhei com a professora Iracima Santos, que também é uma mulher incrível, uma professora incrível, que tem a dinâmica de pensar, né, esse chão da escola, esse espaço de formação, de formação de professores. Então, trazendo esse contexto para falar com
vocês, que mesmo com esse currículo ligado à criação, eu sempre estive muito conectada com esse com a educação, né, com essa com esse labor que é fortalecer, né, essas mentes pro futuro e pra sociedade. E pensando na pergunta, né, que a Débora fez, eh, eu lembrei do saudoso, eh, Antônio Bispo dos Santos, o mestre Bispo, que eu tive a honra de conhecer e conviver, né, tomar uns aperitivos inclusive com ele em Brasília ali pelos anos 2016, eh, que eu morei em Brasília, eu fiz doutorado lá e algumas idas dele para lá, a gente teve algumas
oportunidades de conversa, né, de conversas mais intimistas e eu aprendi de muito eh com ele a partir de uma perspectiva que ele chama de contracolonial, né? E a partir desse ponto de vista que eu vou desse ponto, né, dessa percepção que eu vou discorrer hoje, né, que eu vou pensar hoje junto com outros pensamentos, né? Eu acho que a ideia que ele nos oferece de pensar contra a colonização é uma maneira de afirmar essa necessidade de observarmos eh a partir de um pensamento que vai totalmente de contra a esses delírios e a essa a esse
pensamento colonial, né? para para ele, eh, não temos que descolonizar o que a gente não colonizou, né? Então, quem descoloniza é quem colonizou. Então, ser contra a colonização é eh uma perspectiva de um pensamento que vai a partir de uma experiência de povos que t como no eh algumas eh algumas perspectivas é a circularidade, a pluralidade, né? A pluriversalidade, pensar nesse nessa ideia que se tem de universo como sendo plural, né? Então eu compactuo, né, com essa percepção do mestre Bispo Santos e percebo que na minha obra Planta Oração, que é um livro de contos,
cada conto tem uma um nome de uma árvore, né? E pensar nessa diversidade de personagens, né? São histórias, histórias curtas e não pequenas, né? que ser história curta e ser uma história pequena são coisas diferentes e que podem elucidar o que ele falava sobre essa ideia de começo, meio começo, né? Essas histórias acontecem de forma cíclica, né? De forma circular. Então vai ter a biointeração, que é algo que ele também afirmava no seu eh no seu pensamento, né, que é um outro conceito que eu aprendo com ele. E é o entendimento de que nós e
a natureza, né, que todos os seres eles estão interligados, né, nós não somos separados. Então, quando eu escolho eh colocar o nome dos contos, os títulos dos contos, os nomes das árvores, eu quero também dividir esse essa ideia de protagonismo, na verdade, pensar eh nessa ampliação, né, dessa ideia de protagonismo. E porque a gente pensa assim, por que o limoeiro ele participa tanto da vida, né, dessa primeira a primeira história, né, limoeiro, a história de uma menina que tem algumas alguns desafios dentro da escola, né, né, dentro da sala de aula com a família. E
esse limoeiro é parte fundamental dessa história, dessa casa, desses diálogos. Então, por que esse limoeiro não pode ser o título, né, não pode ser esse protagonista também da história, né? Então, a escolha, né, não é à toa. Então, é a maneira que eu escolho de pensar, né, a a narrativ as narrativas, né, a partir dessa perspectiva de biointeração. Eh, Débora, será que eu respondi tudo? Eu fico aqui pensando também [Música] nessa nessa dinâmica, né, de que as coisas não estão unicamente numa via, né, mas que elas estão interligadas, né? Então, acredito que tanto o espaço
educacional, né, a sala de aula, como fora da sala de aula, eles fortalecem, né, essa formação de imaginário. Eu acredito que é uma via, né, são várias vias que fazem a gente se conectar e formar os nossos imaginários. Eu acho que é isso. Por hora acho que respondeu sim. Acho que para um começo de conversa, tá? Ótimo. Eh, e a gente vai ainda, eh, nós vamos nos aprofundar ainda em tudo isso. Obrigada, Calila. E obrigada também por trazer o bispo para essa roda, né? Um nome tão importante e fundamental paraa nossa formação, né? Pensamento, pensamento
quilombola, né? é um pensamento que vai numa gênese quilombola e a meríndia, né? A ele ele chamava de pendorâmico. Eh, então acho que é um presente ter, né, o pensamento do bispo aqui também com a gente. Sim, vivo. É isso mesmo. Vivo. Obrigada, Calila. Eu queria chamar agora nesse momento eh a autora desses livros aqui, Márcia Cambeba. Que alegria poder contar com você nessa mesa. E eu gostaria que você continuasse, né, eh, a trocar essa ideia conosco, né, qual a importância em descolonizar os imaginários na literatura, na escola. Mas antes eu queria só lembrar uma
coisinha pra nossa audiência. Pessoal, quem quiser enviar perguntas é só digitar aí no chat a sua dúvida, o seu comentário, que que será um prazer contar com a participação de vocês também. Então é isso, Márcia, por favor. Débora, primeiramente eu agradeço imensamente esse convite. Eh, fico muito honrada de estar com vocês, de estar com os professores, porque sou professora também, eh, e de um público muito importante para mim, os professores indígenas que dão aula nas aldeias e no intervalar. Quando os alunos estão de férias, eles estão estudando com a gente, né, a graduação. E fico
muito feliz. O semana passada eu tive uma alegria muito grande, participei da banca de defesa de uma aluna minha que foi aluna de graduação, defesa de mestrado. Então isso para mim é de uma emoção e de uma honra muito grande. Mas vamos lá no que você no que você fez a pergunta, né? Eh, com todos esses livros que eu tenho escrito, não só os os de poesia, como também os infantes juvenis, a nossa intenção como escritores indígenas é justamente desconstruir as ideias erradas que foram ensinadas por longos tempos, eh, repassar de geração em geração e
que ainda continuam. É certo que ninguém consegue nada no estalar de dedos, mas é muito. E eu me sinto muito feliz quando as crianças recitam, por exemplo, o poema índio Eu não sou do Aikiritama, que fala que a palavra índio é uma palavra pesada que carrega justamente toda aquela aquela dor do contato, do processo de colonização, das lutas, né? Eh, e a palavra índio, ela também reforça os estereótipos que eram que eram e ainda pairam sobre nós, como por exemplo, o bom selvagem, o índio preguiçoso, o bárbaro, o gentil. Gentil significa sem Deus, sem alma,
que era como os povos, os nossos ancestrais eram eram vistos pelos colonizadores, pelos viajantes, pelos missionários que adentravam as terras com sua cruz e a espada, de um lado a cruz, de outra a espada, não processo só de evangelização, mas de dominação de território. Então, quando nós escrevemos, nós estamos fazendo com que a memória, o remexer na memória, a nossa língua, e aí eu não tô falando só do português, eu tô falando da língua ancestral, aqueles que falam a sua língua. É importante escrever quando no eaquiritama vocês, eh, quem tem conhecimento do do desse livro,
observa o poema. Eh, o poema me fugiu até o meu poema. Eu esqueço, imagina dos outros, né? Eh, o poemaquiritama que dá nome ao livro. Quando eu digo airitama eu, tama, verano itanaitama manutatana cultura e mimua sini apanha porita no ritual. Eu vou traduzir esse pedacinho. Eu moro na cidade. Esta cidade também é nossa aldeia. Não apagamos a nossa cultura ancestral. Vem, homem branco. Vamos dançar o nosso ritual. Percebam vocês, meus caros professores e professoras, que eu estou devolvendo a agressão sofrida, muitas vezes agressões verbais pesadas em forma de convite. Quando eu te convido para
conhecer a cultura, conhecer os nossos saberes, vivenciar a nossa cultura, a culinária, as danças, os rituais, os cantos, porque tudo para nós é sagrado. A palavra tem espírito. A língua ela não é só palavra. A língua ela é sentida, ela é vivenciada em tudo, o território, na natureza, já ia dizer naturaleza, mas naturaleza, a natureza, eh, o território da água, a vivência dos povos no seu cotidiano, o plantar uma roça, colher a roça, o feminino da terra, a cosmologia ou cosmovisão, que para meu povo não é nada disso, é Icua Mutsaracana, o caminho da sabedoria
ancestral. Então, quando eu trago tudo isso para vocês em literatura, eu estou desconstruindo estereótipos. No caso da descolonização, nós vamos pensar um processo histórico e político, né, envolvido. A descolonização, a palavra descolonizar envolve, traz muito esse processo histórico político. Mas a palavra decolonizar, ela vai ela vai envolver não só o processo cultural, mas também educativo e epistemológico. A nossa a nossa poesia, a nossa literatura, não só poesia, não só a literatura poética, a literatura indígena, ela tem uma epistemologia própria. Então, é preciso que a gente compreenda onde é que tá e saiba trabalhar, né? Então,
quando o professor leva um livro infanto juvenil, o o curuminho rio matinta pajé, e ele desconstrói na criança a figura da Matinta como mito, lenda, folclore, ele está nos ajudando a desconstruir também a imagem de que a Matinta é é um é uma lenda, é um mito, é um folclore. A Matinta, ela é o ente da floresta, ela pertence a à nossa cultura. Eu quando criança ouvi a sovil da matinta. Toda a noite na aldeia meia-noite a matinta marcava a hora de a gente dormir e encerrava a narrativa. Nossas avós paravam de contar as histórias
porque a Matinta estava visitando a aldeia. Ela é respeitada. Quem vai dizer que eu estou mentindo se eu escutei até 9 anos de idade? Como eu vou dizer que a nossa Pagé, dona Teca não conversou com curupira se existe um canto que chama o curupira dentro de um ritual sagrado? Isso é desconstrução de estereótipo. Isso é decolonizar, é descolonizar como queira. Então a nossa poesia ela é sim uma poesia ecológica, uma ecopoia, pelo menos a minha, né? É uma ecopoia, é uma poesia educativa. Sim, também. é uma poesia decolonial ou ou sei lá, decolonial, descolonial,
como queira. É também se tudo contribui para o bom andamento da nossa educação e dos nossos jovens e adultos e crianças, que seja. É isso que eu penso. Obrigada, Márcia. Muito obrigada por essas palavras, por tanta sabedoria compartilhada. Eh, teve um comentário aqui, né, da importância da gente tratar desse tema justamente nesse mês que é o mês de abril, que é um mês dedicado à visibilidade indígena e que muitos currículos escolares também eh se empenham em trabalhar com a cultura indígena. E como esse assunto é importante, né, pros educadores estarem alinhados, né, com com a
cultura indígena de fato, né, como esse trabalho pode ser melhor desenvolvido e entendendo, Débora, não te atrapalhando, já te atrapalhando e entendendo eh o valor da 11.645, 1645, né, que diz que essas culturas, esses saberes, não só os indígenas, dos povos indígenas, precisam estar nas salas de aula, precisam adentrar as salas de aula, os saberes são levados também pela literatura, né? Então, que a 11.645, 1645, através eh da produção literária dos povos originários, indígenas, como queira, possam eh ser trabalhados pelos nossos professores de maneira respeitosa, de maneira eh eh consciente, que o 19 de abril,
por favor, meus caros colegas professores, não seja o dia de pintar a cara das crianças de verde amarelo, de botar um cocar de cartolina, mas seja um dia desconstruam isso, façam outras coisas, criam outras outras ideias. Sim, sem dúvida. As leis 11.645, 10.639 são importantíssimas, né, para para que a gente para essa conversa aqui. A gente tá falando justamente, né, sobre isso. Obrigada, Márcia. Muito obrigada. Você já volta aqui com a gente. Eh, e eu queria trazer a Micheline agora para essa conversa, né? a gente tem falado aqui biointeração, desconstrução, estereótipos, né? São palavras importantes
nessa conversa, né? Como que a gente mobiliza isso na literatura, Micheline? Eh, conhecer esse Brasil que a gente tá querendo se aprofundar aproxima os leitores na escola. Oi, de novo. É uma grande responsabilidade falar depois da Márcia, depois da Calila. Eh, eu queria puxar um pouco eh sobre a questão do imaginário, né, que a Calila falou lá atrás. Eh, eu gosto muito dessa palavra. Eu gosto muito da palavra imaginário, pelo que ela representa, né? O que é um imaginário? O imaginário é uma coleção de imagens. Eh, todos nós temos um imaginário coletivo e um imaginário
que é próprio, que é nosso. Então, pensar eh decolonialmente é também construir, permitir que eh novas imagens se formem eh no tecido coletivo e se forme no indivíduo. Então, quando nós escrevemos eh romances, contos, poesia, música, né, que sai do lugar de uma suposta homogeneidade, né, uma homogeneidade artificial que querem eh colar em nós. a gente permite que a pluralidade se estabeleça. Parece fácil, parece uma operação fácil quando falado assim, mas não é. Eu vou contar um pouquinho da minha experiência, né, da minha experiência de vida. Eu venho do sertão, sertão pernambucano, né? Eh, eu,
esse lugar de onde eu venho, que é a cidade de Arcoverde, é uma cidade marcadamente em território indígena, mas quando eu era criança, eu não tinha essa noção, porque os povos indígenas eram tratados dentro do ambiente escolar como eh invisíveis, embora aquele território fosse um território indígena, fosse, não é um território indígena e estivéssemos, como estamos ainda lá, eh, cercados de povos indígenas por todos os lados. De um lado, a gente tem pesqueira, o povo chucuru, que é um povo combativo, né? um povo muito muito bonito. Eh, do outro a gente tem o povo Capinauá,
mais à frente tem o povo Funior. Mas na escola a noção de história que era passada para as crianças, que era passada para mim, era de que esses povos não existiam. Então, a gente estudava o quê na escola? A gente estudava o que João Cabral de Melo Neto vai chamar em um poema de As Grandes Famílias espirituais pernambucanas. Tem um ditado em Pernambuco que diz o seguinte, que quem não é cavalcante é cavalgado. né? Então, a gente estudava os Cavalcante, os Albuquerque, eh os goyos, os Brandão, eh os ferrais, né, que são essas famílias que
dizem, né, na história oficial, fundaram a cidade como se a cidade, como se aquele território começasse com a chegada do colonizador. Lembro do meu espanto de criança quando eu descobri que havia povos indígenas ao meu redor. E eu lembro do meu espanto de criança quando eu descobri que não havia só povos indígenas ao meu redor, mas havia povos indígenas eh na formação da minha família. Então, quando a gente escreve, quando a gente permite que novas figuras se estabeleçam dentro desse imaginário, a gente vai tecer e entretecer outras coisas. a gente vai entretecer eh novas possibilidades
de tempo, do tempo circular, do tempo espiralar, do tempo em zigue-zague. a gente vai eh perceber a história dos territórios como história de resistência, como história de eh localização, grande localização no tempo. Há muito pouco tempo atrás, muito pouquíssimos anos, eh um vice-presidente, eu gosto muito de repetir essa história porque eu acredito que isso tá muito presente eh na memória das pessoas. Um vice-presidente, ele disse: "Mas para que remexer no passado? O passado já passou?" Não, o passado não passou. O passado ele se presentifica o tempo inteiro e é responsabilidade nossa como escritores, como educadores,
como pessoas em relação de fazer mostrar esse passado que está o tempo inteiro se presentando, que está o tempo inteiro falando conosco e nos colocar como seres históricos, como vocês que estão do outro lado, né? Eu fui professora da rede pública e da rede privada por mais de uma década. Depois eu saí da sala de aula e fui paraa coordenação pedagógica, que em Pernambuco tem um outro nome, né? São os educadores de apoio, né? E construir uma nova visão, uma outra visão da história do nosso país, é um desafio que não se estabelece apenas no
mês de abril, se estabelece o tempo inteiro. Eh, acredito que cada um, fazendo o seu pouquinho, né, consegue eh dar a dimensão, a grande dimensão da história desse país. Isso é uma coisa que devemos não só as novas gerações, as gerações que estão se formando, mas que devemos a essa história ancestral. que compõe esse continente, que compõe esse país, que compõe esses múltiplos territórios que formam esse país. Acho que é isso. Obrigada, Micheline. Uma fala incrível. Passado se presentifica o tempo inteiro, né? Que forte isso, não? E e e e qual a nossa responsabilidade, né,
como educador nesse sentido, né? Eh, que presente que a gente tá permitindo acontecer, que futuro que a gente espera que aconteça, né? Um futuro tão cheio de passado assim também. E que passado é esse que a gente tá falando? Eh, e outra palavra aqui que apareceu na fala da Micheline, resistência, né, que eu acho que que é uma palavra importante eh pro porque eu para o que eu gostaria de propor agora, que que era falar um pouquinho mais do fazer literário e dialogar um pouco com a obra das autoras, né, gente? porque a gente tá
aqui num evento eh de leitura literária na nossa jornada pedagógica e não tem coisa melhor do que ler, né, nesse sentido e até conhecer um pouco da obra de vocês e como elas dialogam eh partindo dessa questão do descolonizar os imaginários. Então, eu queria pedir pro pessoal colocar aí eh a apresentação, se é possível subir isso. Eu queria que vocês comentassem um pouquinho eh sobre o uso da língua portuguesa nessa perspectiva decolonial, sabe? A Márcia, ela Márcia diz em uma de suas obras que os povos indígenas tinham que falar o português como consequência de violência.
E paraa sobrevivência queria, eu vou pedir paraa Márcia ler. Você pode ler, Márcia? Você consegue ver aí? Senão eu leio. Tá muito pequeno. Você pode ler? Eu posso ler sem problemas. Fica imaginando a crueldade da cena. uma mulher se laçada e ficar cara a cara com seu agressor orgulhoso do feito, depois estuprada e levada a força para viver com um desconhecido e dele parir filhos amamentar, cuidar, proteger, muitas vezes das agressões do próprio pai, que ainda invisibilizava a família. E quando ela tentava fugir ou se negava ao sexo, sofria novamente violência, privação de comida e
água. e surras frequentes. E logo vinha um silêncio cruel, seguido da ordem de falar uma língua compreensível apenas para quem para o que a capturava. Aprendiam português assim como forma de sobrevivência. A Micheline ela acrescenta os em o som do rugido da onça a ideia de apropriação. Pode passar o próximo, por favor. Se a Micheline não conseguir ler, eu leio. Tá pequenininho também, Micheline, eu consigo porque os óculos são quase de raio X. Opa. Ah, então dá essa honra pra gente de te ouvir, lendo da sua obra, por favor. Ademais, usa-se essa voz e essa
língua, porque é com ela que se faz possível ferir melhor. É possível envenená-la, Zarabatana, como fazem os guerreiros do povo miranha com o curário e preparado com o suor e sangue de suas mulheres. É possível incendiá-la por ar quente e amargo. E de todo modo, como já se diz, é possível usá-la como se quiser. É isso. A Calila, por sua vez, ela emprega a língua escrita de maneira livre e imagética, definindo as suas próprias regras, partindo de sua expressividade. Então, a gente separou aí uma imagem poética, né, da Calila, uma poesia visual, por assim dizer.
Eh, que eu queria que vocês ficassem uns segundinhos lendo e interpretando cada um aí que está nos assistindo e construindo os sentidos. A Micheline, ela também cria palavras e estruturas. Então, a gente vê o uso da língua de uma maneira eh muito eh interessante na obra de vocês três. E um dos traços do colonialismo é justamente a imposição da língua do colonizador no sentido de dominação da identidade do outro povo. Há maneiras diferentes de desafiar essa narrativa, mas vocês escolhem empregar a língua portuguesa e também subvertê-la. Então eu gostaria que vocês comentassem sobre essas escolhas
e como elas são importantes paraa construção de sentido da produção de vocês. Você pode começar, Cila? Vamos lá. Eh, eu gosto muito, né, de pensar, né, na língua portuguesa e pensar eh na diversidade que a gente tem a partir dessa língua, né? E tem algo que eu gosto sempre de refletir quando a gente fala da da língua, das palavras, eh, que a Lélia Gonzales, né, a grande pensadora, a grande filósofa, uma grande eh pesquisadora, né, que nós tivemos e que temos a honra de acompanhar o seu legado. Ela faz algumas articulações que eu acho muito
caras pra gente, né, pra gente refletir eh sobre a língua portuguesa, né, no Brasil e nesse continente da América do Sul e da América Central, que é a percepção das influências, né, do banto, eh, do yorubá, das línguas indígenas, né, e o quanto isso faz com que a gente se expresse diferente. de do próprio português, dos colonizadores. É importante e e que isso de alguma forma faz com que as nossas cadências, faz com que a forma como a gente fala, com a tonalidade que a gente expressa, isso explicite também eh a presença, né, desses diferentes
desses diferentes povos. e que quando a gente afirma muitas vezes América Latina, né, a gente tem mania de eh trazer, né, essa referência, a gente acaba pagando eh isso pela percepção, né, que a Lélia nos oferece, eh acaba pagando essa essa experiência, né, e essa eh elaboração desse conhecimento desses povos, né? Então, há sempre uma um olhar para de um lugar muito da sabedoria, do corpo, mas a elaboração a partir do conhecimento eh escrito senso propriamente, né, do do dizer, da forma de falar, da forma de pensar também a palavra. Isso acaba sendo eh deixado
um pouco de lado. Obviamente, né, que a a linguística tá aí, né, para trazer todas as influências. Imagina, eu sou de um lugar que é conhecido como berimbau e banhado por um por dois rios, né? Um dos rios chamam Pojuca e o outro rio chama Jacquip, né? Então, tipo, não tem saída, né? Não tem saída, né? Então, a nossa presença, né? A presença dessa comunidade, das comunidades, né? dessa pluralidade de existência tá presente. E no meu trabalho estético, né, nesse trabalho da linguagem, da forma, isso tá evidente. Eh, eu gosto que você trouxe exatamente esse
exemplo, né, dos meus desenhos. Eu digo que isso são meus desenhos, a forma como eu desenho com as palavras, né? Eh, dá pra gente observar essas palavras como uma imagem, né? E e eu desenho esse tipo de paisagem. Eh, entendendo exatamente que tudo se mistura, né? Então, quando a chuva cai, né, eu acredito que tem a cor, que tem a coragem e a água, né? Eu acredito que tem a fusão do tronco e dos caules, as coisas não estão separadas, né? Então, um troncaule, né? Porque tá tudo junto, tá tudo brincado, né? E tem a
ceiva que tá dentro. E se você observa essa árvore que tem um tronco largo e grande, as raízes estão misturadas e aí tem um afeto de quem coloca o adubo, tem um afeto do passarinho que pousa, tem um afeto de quem encosta naquela árvore, né? E tem aquelas sementes que se misturam com a terra, com a raiz, né? E tudo que não cabe nessa página que eu fiz esse desenho, né? mas que aparece naquele espaço que eu imaginei. Então, essas introduções, né, que eu penso nessa visualidade, eh, e que aparecem em boa parte do meu
projeto, né, é algo que tá muito para além do aglutinamento das palavras. Eh, a Conceição Evaristo, né, professora, catedrática e tudo mais, ela desenvolveu o conceito de escrevivência. E aí geral muitas vezes pensa o aglutinamento das duas palavras, escrever a vivência. Só que quando a gente vai olhar escrevivência, a gênese, né, desse conceito, ele tá muito além da aglutinação. Tem aglutinação das palavras, mas a conceição sabiamente nos oferece, né, essa esse pensamento bastante sofisticado, né, que vai eh até a página dois, falar igual parecido com ela, até a página dois, muito em diálogo com a
escrita de si, né, do Foucault. Mas quando vai pra página três, paraa página quatro, se distancia, porque a gênese que a Conceição utiliza é a mulher preta, é a é a mãe preta, são essas mulheres que habitaram as casas grandes, é Anastasia, né, utilizando a máscara e e a e a retirada dessa máscara, né, com algumas imagens fundantes que só quem nasceu no Brasil, que só quem eh lidou, né, com essa essa história brasileira é que possui, né? Então, a escrevivência tá atrelada, não uma escrita de si, mas uma escrita de nós, mesmo quando escrita
em primeira pessoa. Então, eu acho que tem muito isso no meu trabalho também, né? Esse pensamento eh de confluência, né, de confluir as palavras, eh que é exatamente essa compreensão de que as coisas podem se juntar e podem podem se misturar, né? que tudo pode se ajuntar e que tudo pode se misturar. Eu acho que sim. Tá bom. É, vagina. Tá ótima escrita de nós. Que forte isso, né? Mesmo que em língua portuguesa, né? Mesmo que em língua portuguesa. Sim. O Ricardo Souza no chat, ele falou, ele comentou assim, ó: "Primeiro temos que descolonizar nossas
mentes e o que sai dela através da língua linguagem que no nosso caso foi violentamente imposta". Márcia, você poderia comentar falando ainda do uso da linguagem na sua obra? Ah, sim. Eh, que sai da linguagem. Bom, no caso da da dos povos originários, dos povos indígenas, eh para para nós a língua, né, as as palavras, eh, e na língua portuguesa, elas são elas são importantes, né, eh, não proc eh, fortalecer você, tem muita gente que fala: "Ah, não, não escrever na língua ancestral, você fortalece eh eh a colonização e tal". Eu eu penso diferente. Eu
penso que eu escrevo bilíngue, né? Então, alguns textos meus vem eh tupi. Nós falamos o tronco tupi da família Tupi Guarani e e traduzo para o português. Por quê? Porque eu escrevo para eh para os os dois mundos. Eu sempre digo que são dois mundos, né? O universo indígena e o não indígena, onde os dois precisam se unir através de uma ponte. E essa ponte é o respeito. O respeito à cultura do outro, o respeito à autoridade do outro, o respeito à identidade, ao pertencimento, aos saberes, à territorialidade, ao próprio território. E aí nós falamos
de o corpo água território. Por quê? Porque nós somos o povo das águas. Se nós nascemos de uma gota d'água que veio com uma grande chuva, bateu no rio e emergiu o homem e a mulher e assim deu origem ao povo mago Cambeba, nós então somos filhos do rio e o rio também se comunica e o rio tem a sua linguagem própria de se comunicar porque o rio ele é sujeito de direito, portanto ele tem espírito. Ele é um tataravô que todo dia nos conta narrativas, todo dia nos conta nos conta histórias e ao ao
pular na água. Por isso que nós nas estando nas aldeias todo dia tem um banho de rio. Mesmo que tenha água encanada nas casas, a água o rio ele está ali à nossa espera. Eu quando dou aula, meu minha primeira aula dentro das aldeias, porque a universidade manda a gente pra aldeia, né? da aldeia que sai para ir pra cidade, é o contrário, nós que vamos lá. E como eles me chamam professor aparente. Eh, então eu digo, como professora aparente, nossa primeira aula vai ser próximo do rio. E sempre as aldeias elas têm um barranco,
chama barranco, platô na geografia. Eu sou geógrafa, tá gente? Então, é platô, mas na geografia eh eh na linguagem popular, barranco. E e eu e nós ficamos, então começa 5 horas a minha aula da manhã, ainda tá um pouco escuro e a gente canta. Eles cantam na língua ancestral, eu canto na minha língua. Pode ser que a gente não se entenda, porque mesmo sendo o mesmo tronco, há pequenas modificações na escrita, na pronúncia que nos difere. como povo falante do tronco tup. E isso que é bonito. O Brasil tem um complexo linguístico muito grande. Os
povos indígenas ainda com todo o processo eh eh de violência colonial, com o governo da língua, que o que é o governo da língua? É a imposição de uma língua sobre a outra. É a minha tese, daqui a pouco vai estar disponível. Eh, você já não tá, né? Porque já foi pra universidade, já não tem um tempinho. E lá eu falo sobre o governo da língua e o povo mago Cambeba. Então, é a língua do do colonizador, a língua do outro que se impõe sobre a nossa. Então, para se impor sobre a nossa, ele tem
que ou extinguir ou deixar ela num processo de fratura. Então hoje o Omágua tanto do Brasil quanto do Peru, porque eu pesquiso na PANAmazônia, meu povo, nós estamos no Brasil, no Peru, no Equador, na Colômbia e na Venezuela. Eu até agora só consegui Brasil e Peru. Pósdoc vai ser Colômbia e Equador para poder eu fechar. Então, eh mesmo no na Amazônia peruana e na Amazônia brasileira, nós falamos uma língua fraturada pelo contato. Lá eles falam eh espanhol e o castelhano. No Brasil, português e a língua ancestral, mas lá também a gente fala língua ancestral. O
que que nos une? a língua ancestral fraturada, violentada, mas resistente. Mas por que escrever em português? Porque é a forma que nós encontramos dentro desse processo de desconstrução de estereótipos, de desconstrução de mentes tortas pelo contato, né? eh para dizer para vocês o que nós nós estamos pensando. Por isso nasce a literatura indígena escrita escrita com o nosso pensamento, escrita com a nossa vivência, escrita com os com os nossos ancestrais, escrita com a oralidade dos nossos mais velhos. Portanto, nós falamos de uma oralitura, né, que é a oralidade na literatura eh eh indígena. Eh, e
a isso é muito importante. Por isso que muitas vezes nós não, eu não me vejo poeta e tampouco me vejo escrevendo poesia. Eu me vejo escrevendo eh eh desenhando a palavra. Eu desenho a palavra. A palavra que nasce da oralidade, a palavra que nasce da percepção do sentir pensar o mundo, a palavra que nasce da nossa vivência dentro do conceito do que é o bem viver, que isso é muito importante que a gente também compreenda para poder então entender a importância de falar sim o português, mas jamais deixar de falar a língua ancestral. E se
esse parente não sabe mais falar a língua ancestral, porque dele foi tirado o direito, é hora de aprender ou de se reescrever na sua língua ancestral. Por isso eu escrevo eh em tupi e em português. Por isso eu canto em tupi e em português. Para mostrar que sim, há possibilidade de se criar essa ponte, de construir essa ponte. E essa ponte precisa ser o respeito. Eu sei andar no teu mundo. Que você então saiba andar no meu. É isso. Obrigada, Márcia. Micheline aplaudiu aqui todos nós, né? Obrigada. É isso. A ideia é essa, construir pontes.
Micheline, eu queria te chamar também para comentar sobre isso e também já entregar uma pergunta da audiência para você. O Daniel Matos, ele pergunta: "Como podemos reescrever a história para dar voz a toda essa pluralidade? O microfone tá desligado, Micheline." Ah, desculpa. Pronto, agora sim. Eh, eu acho impressionante que num país como o nosso, né? Hum. um território eh atravessado, né, marcado pela ferida colonial, né, e em que eh esse atravessamento é um atravessamento de corpos, né, é um atravessamento de de vidas que a gente pense a vocês estão me ouvindo ainda? Eh, vocês, a
gente pense a língua portuguesa como um uma coisa monolítica e a gente diga às vezes numa conversa, às vezes na sala de aula, né? Eh, o português tem contribuições, eh, o português falado no Brasil, né, tem contribuições da língua indígena, aí passou uma lista de palavras indígenas, né, eh, de origem indígena. E tem contribuições da eh dos povos que vieram da África e passa-se uma lista da dessas palavras. E não se perceba que eh esse português eh como a Márcia falou muito bem, é uma língua fraturada, é uma língua eh que foi recosturada, né, remendada,
né? Eu gosto muito eh quando os portugueses de Portugal falam que nós não falamos português, que nós falamos brasileiro. Eu eu gosto muito porque eu acho que de fato a gente fala uma outra língua, porque a gente fala outras, muitas línguas e que a gente segue uma base que é essa base do português. Mas é outra coisa que a gente fala, eh, a gente sabe, aprende inglês, a gente aprende espanhol, italiano, japonês, coreano, e a gente tem muito pouca noção de toda a riqueza eh vocabular, lescal, estrutural, que essas línguas que foram invisibilizadas dotam o
português. E a gente tem muito pouca curiosidade de aprender eh essas essas manifestações, né, desses rios subterrâneos, dessas várias línguas na língua que a gente fala. Então, eh, alguém falou, né, que precisamos descolonizar, decolonizar a linguagem. Sim, precisamos precisamos eh apurar o ouvido para essas línguas que estão subterraneamente eh em curso na língua portuguesa. Se você entra ai, mas como é que a gente faz isso, gente? Se você entra no Google e você coloca dicionário de tupi, se você coloca no Google Scholar, eh, você vai saber do nhengatu da da Amazônia, você vai saber da
do nhengatu paulista, que é a língua geral, você vai saber tanta coisa. Então eu advogo que o educador, seja o educador formal que tá ali na escola, seja o avô, o tio que educa jovens, né, que educa seus sobrinhos, que eh sejam curioso, seja um pesquisador, não tenha medo das muitas línguas que formam a língua portuguesa. Não tenha medo de errar, inclusive não tenha medo de recuperar, né? Eh, nesse meu novo livro que vai sair agora em junho, né, depois do trovão, eh, é um livro que vai tratar sobre a Guerra dos Bárbaros. É, mais
uma vez um romance histórico e a Guerra dos Bárbaros é um romance que, desculpem, a Guerra dos Bárbaros é a maior, o maior conflito armado em território brasileiro e pouquíssima gente conhece. O que do que vem a ser a Guerra dos Bárbaros? é o conflito genocida que a coroa portuguesa financia, financia os bandeirantes para subirem pelo interior do Brasil, pelo sertão, até o Rio Grande do Norte, dizimando povos indígenas, os tapuios, porque os tupis eram os de língua bela, os tapuios eram os de língua travada, a língua feia, língua torta. Os tapuios, eh, os tupis
eram considerados os indígenas, né, os povos indígenas mais amigos, mais amistosos. Os tapuias eram considerados os inimigos ferrhos. Na verdade, todos, a gente sabe, todos eram vistos como inimigos, tratados como inimigos, mas interessava politicamente essa divisão entre tupis e tapuios. Eh, eu eu venho refletindo muito, né, sobre a língua e sobre a linguagem e sobre essa diferenciação, né, entre os de língua travada e os de língua fluida, né, pra gente pensar que a que interessa tipo de cisão, né, por interessão historicamente e ainda ainda interessa, né? Interessa porque eh é mais fácil destruir o que
tá dividido. E nesse processo de destruição também é mais fácil destruir, invisibilizar aquilo que não se ama. a gente vê, né, ó, na vida, né, essa invisibilidade dos povos indígenas, né, essa invisibilidade do das raízes ancestrais de cada um, né? E no caso dos indígenas, ela é muito mais eh forte, porque os povos eh afrodescendentes, eles muito cedo eles se organizaram em torno de proteger a sua a sua cultura, proteger o seu legado. No caso dos indígenas, a divisão foi terrível, né? Eh, e tanto que a gente tem pessoas com fenótipo marcadamente indígena que dizem:
"Não tem indígena, não tem sangue indígena na minha família". Então, quando você divide, quando você aparta, quando você invisibiliza, você não ama. Então eu advogo que é preciso eh recolocar os recolocar os afetos das crianças, dos jovens para entender, conhecer e amar. A gente não vai, por exemplo, eh, amar a natureza se a natureza é só o o descanso de tela do meu computador. a gente não vai eh valorizar o legado a ancestralidade indígena ou a ancestralidade afrodescendente se eh as pessoas não estão em contato permanente com as histórias, com eh as crenças, com as
com a cosmovisão. Então, é um é um trabalho gigantesco. É, sim, claro que é, mas é um um trabalho que é necessário ser feito. A gente precisa eh assumi-lo individual e coletivamente. Aí eh o Daniel, acho que foi o Daniel, fez eh Daniel Matos fez a pergunta: "Como podemos reescrever a história para dar voz a toda essa pluralidade? A gente precisa derrubar quem tá no pedestal. Há alguns anos atrás, eu fui a New Orleans e eu tava andando à beira do Mississippi e eu vi vários pedestrais vazios. Eu fiquei muito impressionada com aquilo. Eu eu
pensei, será que foi por conta do Catrina, né, aquele aquele evento catastrófico que que as estátuas não estão aqui? O que foi que aconteceu com essas estátuas? Só pedestais vazios. Mais tarde cheguei na casa de um amigo professor na universidade lá e disse: "Me chamou muita atenção os pedestrais vazios ao longo do rio". Aí ele me disse: "O que aconteceu foi que eh eram estátuas de escravagas considerados heróis, considerados eh grandes nomes da história americana. E nessa época a prefeita de New Orleans era uma mulher negra e eu não sei como é que tá agora,
mas na época havia também uma municipalidade que trabalhava junto com essa prefeita e aprovaram uma lei em que essas estátuas foram retiradas. Elas foram retiradas fisicamente, né? A gente precisa retirar essas estátuas fisicamente e afetivamente. A gente não pode mais falar sobre Pedro Álvares Cabral apenas, mas a gente precisa falar eh sobre Tibiriçá, sobre eh Maria da Grã, sobre várias e várias personalidades indígenas e negras que forjaram esse país. E a gente precisa dentro de cada comunidade, de cada cidade, quem é que fez e faz a nossa história. Na minha cidade Arcoverde, a família Calisto,
a família Gomes, afrodescendentes e descendentes de indígenas que fazem o samba de coco da cidade. Essas pessoas são a história viva da cidade. A gente precisa tirar eh o José de Albuquerque do pedestal e falar do mestre Irineu. A gente precisa recolocar a importância de cada uma dessas figuras. A importância da figura do seu avô, do seu bisavô. É trabalhoso. É. Vai encontrar oposição, vai. Mas a gente tá aqui 8 de abril, terça-feira, 8:14, falando sobre essas coisas. A gente tá falando disso aqui porque a gente é um povo sem medo. Sem dúvida. É verdade,
Micheline. E quando você fala: "É difícil", é um desafio e e tem muita gente ainda que considera esse isso muito complexo até, sabe? E e chegou até uma um comentário sobre isso no chat. Eu queria até ouvir a Calila sobre isso, né? Como trazer esses temas tão complexos. A gente joga dificuldade, né, pros educadores, tem tem esse esforço e também a gente vê aí uma questão de o que seria essa complexidade de fato, né? Porque eh onde que tá o nosso olhar, porque essas questões, como você bem colocou, estão ao nosso redor. Por que seriam
elas complexas, né? Eh, e como trabalhar esse tipo de literatura com essa geração que acha que acha que as redes sociais são uma meta de vida, né? E nenhuma crítica a que o que a gente tá falando é muito é muito focado na pesquisa de do de retratos para leitura do Brasil, que indica justamente essa queda eh na leitura escolar, inclusive, né? e o crescimento, obviamente, o interesse pelas redes sociais, né? Então, Cila, você poderia comentar um pouco, né, eh, como que a gente faz então, né, depois dessa do que você trouxe a Márcia Micheline,
eh, uma de algo de ordem mais prática aqui pra gente. Bom, temos muitos desafios, né, pela frente, eh, pensando nessa nova geração, mas também pensando nesse espaço rico, que ainda é o espaço escolar, a sala de aula. Eh, durante a fala da Márcia, né, e a fala da Micheline, eu fiquei pensando em alguns tópicos e pensando, né, né, na questão que a Márcia levantou de da língua fraturada, né, que tem que dialoga super com o que a a Lélia fala, né, do preto a orar leitura que a professora Lida Maria Martins também apresenta na sua
pesquisa. Eh, isso que a Micheline brilhantemente falou, né, sobre essa necessidade de quebrar, né, de tirar esses pedestais, né, do dos espaços, da gente poder, eh, trazer essa pluriversalidade para dentro da sala de aula. Então eu começaria afirmando isso, né, dessa necessidade da gente eh possibilitar que a juventude ela possa conhecer, né, possa, a ter dentro da sala de aula uma biblioteca não somente de livros, mas de referências, né, eh com legitimidade de um povo diverso, né, tá na hora da a gente eh em alguma medida sempre esteve, né, na hora, mas eu acho que
cada vez mais a gente insistir nessa toada. E bíblia diversidade, né, é a palavra que muitos educadores já conhecem, inclusive. Exatamente. Então, assim, isso tudo que a gente faz em alguma medida é um ato político, né? as escolhas que a gente oferece eh pra nossa turma, a maneira como a gente conduz, né, as referências bibliográficas, os livros de os livros que a gente escolhe, né, essa curadoria que a gente eh realiza, né, nas jornadas, nas jornadas, né, na elaboração do do plano de aula. Eh, às vezes a escola não tem, mas a gente consegue, né,
a partir de um, enfim, de outros meios, levar, né, paraa escola ou trazer, né, como a Márcia falou também, desse movimento outro, né, da universidade ir paraa aldeia, né, não ser só um movimento único, né, eu acho que isso também é algo interessante. Eu acredito que eh as epistemologias indígenas e afro-brasileiras, né, negro-brasileiras tem muito a oferecer em termos de tecnologia, não como um modo de eh resolver todos os problemas, né, mas como esse espaço também de, enfim, rico, né, de de outras perspectivas. Eh, eu acho que é isso, assim, eh, essa manutenção de um
status qu, né, de um único de um único de uma única perspectiva, de um cân eh, que se diz responsável por tudo e por todos e que, na verdade, eh, não navega, né, não navega em outras em outras águas, não observa por outros ângulos, eh, eh perspectivas que são caras, né, pra comunidade eh pras comunidades plurais. Eh, imagina, eu sou do interior da Bahia, né, nascida e criada numa cidade eh, que na época tinha 20 e poucos mil habitantes, né? Então, imagina, eu fui criada com a perspectiva do isso, isso na Bahia a gente pensa
num escritor, né, litorânio, né, que traz toda uma conjuntura de de personagens, mas que não é a única Bahia, né? Temos Bah, 417 cidades que, né, trazem consigo uma diversidade de vidas, né? Eh, eu quero, aí um dado momento eu quis saber quem eram essas mulheres, essas herdeiras da resistência, né? Essas mulheres que de alguma maneira eh dialogam com as narrativas, as narrativas de do que é o Brasil, né, que acontece ali no sul da Bahia, desse início de do que a gente entende como Brasil, dessas narrativas. E eu passo a a enfim, a conhecer
mais de 60 autoras eh dentro do meu território que fazem, escrevem suas poesias, seus cordéis, contam histórias, né? são contadoras de história. Então eu acredito que é isso, assim, trazer eh levar, né, pra sala de aula o que tá dentro da comunidade, né, dessa comunidade próxima, investigar quem são os autores da minha comunidade, quem são os autores que podem trazer também essa diversidade de Brasil, né, que o Brasil, enfim, tem temos regiões, eh, falamos dessas regiões, mas na hora de pensar nessas referências bibliográficas, muitas vezes a gente fica sempre eh num mesmo eixo, né? Tem
pesquisas que falam disso, né? Que, enfim, desenvolvidas pela UnB, né? Pela professora Regina Dalcastém, que fez a coordenação. Sim. E que vai falar do perfil do do autor brasileiro. Tem tem uma série de eh de pesquisas que vão trazer esses dados e a gente precisa fazer a prática, né, que é, enfim, pensar nessas outras referências. Sem dúvida. E conforme a gente vai pesquisando, a gente vai se surpreendendo, porque isso acaba tando mais próximo do que a gente imagina, né? Então, a gente tá falando aqui de algo que não é para ser complexo, não. É algo
muito próximo. A gente tá falando de de nos aproximarmos desses leitores a partir da história e das referências de cada um deles, né? Eh, Maria Juliane Loureiro, ela mandou aqui um um recadinho. Débora, na temática de hoje, está faltando a literatura da etnia cigana. Obrigada. Nós vamos anotar essa observação. Bem lembrada, viu, Maria Juliane? Muito obrigada pela sua participação. Eh, eu queria ter, chegou mais uma pergunta aqui paraa Márcia. Márcia, eh, vamos falar um pouquinho dos nossos clássicos, né? Essa pergunta me deu até eh quando você viu, percebi já o seu sorrisinho. Eh, Márcia, o
que você acha da literatura de José de Alencar, Iracema e Ubi Birajara? Há uma boa visão dos dos povos indígenas nessas literaturas que são muito trabalhadas, né, nas escolas, nos currículos escolares. Poderia comentar? Primeiramente, elas criam uma imagem estereotipada, né? Perceba Iracema como ela como como ele traz Iracema, né? Eh, a deusa dos lábios de mel. Então, tinha aquela coisa toda, né? E logicamente que a gente compreende eh que quando essas obras foram escritas, eh me corrijam aí os os professores de português, acredito que era século XIX por ali, né, que que foi escrito. E
essa e essas essas obras eh no contexto de agora da contemporaneidade, elas não nos representam, né? Então, eh, não tem como querer que Iracema eh eh seja seja algo que, que que vá, por exemplo, fortalecer as lutas das mulheres indígenas nos territórios. Não tem condição, meu povo. Eh, não tem condição de trabalhar isso, não tem condição de eh a gente tem que desconstruir. É justamente isso que que a nossa literatura indígena quer fazer, né? Eh, logicamente, ah, Márcia, mas foi escrito lá atrás, com outro pensamento, com outro olhar, se criava uma identidade nacional, né? Era
um período que se criava, se se buscava uma identidade nacional. E, e, e aí esses autores foram trazendo eh essas essas imagens de como eles viam os indígenas, né? Eh, e aí a realidade das mulheres indígenas são completamente outras que não não condiz com o Iracema, como Iracema é descrita nesse romance ou nesse livro. Eh, e aí tem a tem a questão tem a questão eh eh eh simbólica, né? Eh, tem a questão cultural, tem a questão identitária, que ninguém se vê num livro desse. Como é que eu quero, né? É por isso que eu
até achei engraçada a pergunta e é importante, professor, não tô debochando da pergunta, não. É importante que você faça, mas eu dei o sorriso porque é uma pergunta muito comum eh para nós escritores indígenas até aqui onde eu estou em Barcelona, né? Eh, por parte de professores da língua portuguesa que dão aula de língua portuguesa aqui e que, entre outros livros, para falar de cultura indígena, se utilizam de José de Alencar. tem, né? Eh, os indígenas, eles são eles são povos que viveram de fato, que lutaram, heróis, eh guerreiros, por exemplo, a a o feminismo
não se aplica dentro das aldeias. Eu participei com a falecida, faleceu, né, da da Academia das Letras, me fugiu o nome dela agora, eh, Eloía, né? Uhum. Eloía, eh, Teixeira, que antes ela se assinava, né, do parque de Holanda. Eh, então nos levaram à casa da Eloía, ela é feminista, nós já já tinha sido nos falado isso, né? E e a Eloía se impactou com as nossas respostas quando nós falamos. E não foi combinado, não foi uma resposta combinada. Ela levou uma guarani, uma terena e eu uma cambeba. E quando ela perguntou, né, como que
o feminismo é visto dentro das aldeias de comum de de comum, como é a as nossas respostas foram iguais, sem que a gente tivesse pensado se combinado ou eu nem sabia quem era que ia estar comigo lá. Eu conheci a Marisa, a Marise, mas não conhecia a outra parenta, Terena, que falou lindamente, né? Então, há uma diferença, porque o nosso tempo é circular, enquanto que o tempo da cidade é é linear. Uhum. Nós obedecemos a circularidade do tempo, nós obedecemos a a ordem da natureza, nós obedecemos eh a a aldeia, ela ela é ela é
um um território que é comum a todos. Por isso a casa comum, por isso que se refere à casa comum, a casa comum como sendo a terra. Terra é a casa comum de todos nós, né? os povos indígenas estão lá justamente para buscar eh essa unidade. E a nossa literatura, ela vem muito eh em contraponto eh para para desconstruir, por exemplo, o José de Alencar e não só ele, mas muitos outros que escreveram em épocas passadas, mas que ainda eh essas essas obras são utilizadas nas universidades, nas escolas públicas, nas particulares e o estereótipo eh
é é mantido através desses pensamentos. Sim. Só um contraponto, Marta, porque assim, eh, a, a literatura brasileira ela é diversa, então é importante que a gente conheça as obras de José de Alencar, obviamente. Claro. Brasileira, óbvio. O que a gente tá falando aqui é que se tem José de Alencar, tenha também a Márcia Cambeba, né? Tenha também a Calila. Leiam também o som do rugido da onça, né? Apresentem essas narrativas eh diversas na sala de aula e isso enriquece, né? Isso só vai enriquecer. A diversidade ela só enriquece, né, Márcia? Acho que só fala é
muito nesse sentido, né? propõe essa construção de pontes. Existe o lugar dessa literatura, mas nós temos autores indígenas que estão narrando as suas histórias maravilhosamente, né, e e entendendo essa diversidade e outros autores também, não indígenas que exploram essa diversidade de uma maneira também belíssima, né? Então, a literatura é diversa, a gente precisa ampliar o nosso olhar e descentrar aí. tem espaço para todo mundo, né? É justamente. Eu não quero aqui dizer que o José de Alencarno possa ser usado. Claro, claro. Sim. Né, mera escritora indígena que tá aí no, né, na luz todo dia.
Eh, eh, como como eu sempre digo, eu não escrevo para ser canone de ninguém e tampouco para ser bestseller. Eu escrevo porque é uma necessidade nossa de produzir literatura para que as nossas gerações futuras que estão nascendo aí, os novos cambebas que estão na barriga de suas mães, eh possam ter eh memória e ser a continuidade dessa história. Eu escrevo para isso, né? Se a minha literatura vai ser usada, vai na sala de aula, na cidade, aí é é outra coisa. E a gente fica muito feliz porque a gente escreve para Uniponte, não para separar.
Isso mesmo. Olha, a gente precisa terminar, mas eu queria muito ouvir a opinião da Micheline sobre esse assunto. Eh, Micheline, que só comentando aí, se você pudesse rapidamente comentar também sobre essas obras clássicas e e a maneira como eh a nossa diversidade pode ser apresentada, eu ia agradecer mesmo rapidinho, mas eu queria muito te ouvir. Claro. Eh, eu acho que precisamos ler José de Alencar e outros autores, eh, mas a gente precisa lê-los criticamente, né? Na verdade, eh, ler ao revés, né? ler eh contra a corrente. tão eh desconstruindo esses estereótipos, percebendo esses lugares de
de preconceito, de construção de [Música] eh de imagens, né, atravessadas por ideais que não são eh que não são nem disculpáveis pelo tempo, sabe? Eu eu acredito muito. Ah, mas ele escreveu isso. Eu acredito nisso em parte, sabe? Porque eh enquanto José de Alencar tava escrevendo eh aquele monte de bobagem sobre eh Iracema e, enfim, outros personagens indígenas, a gente tinha eh no Peru eh o Guam Pomaria, que era um um pensador indígena, fazendo uma outra coisa. Então, a o tempo, o espírito do tempo não desculpa os preconceitos. E a gente hoje falar sobre Iracema,
falar sobre Guarani, falar sobre esses personagens, né, falar sobre Bom né, falar sobre esses personagens, a gente tem que estar municiado de eh de outros autores, de outros pensadores e municiado principalmente de outros afetos. Todo monumento é feito para se que se construa outro em cima, né? É por isso que eu gosto tanto da frase que abre o o Caminhando com os mortos, né? Que esse segundo romance da teologia, que é se Deus é grande, o mato é maior, né? que é, a gente tem a força da natureza, a força do tempo, a força de
todas essas coisas contra os preconceitos, contra eh esses lugares de invisibilização e de diminuição do outro. Então, vamos ler e companhia ao revés. É isso, sim. Com outras lentes, né? E acho que isso se estende também pro trabalho que é desenvolvido com a literatura afrobrasileira e das narrativas que eram escritas eh falando, né, por esses autores. Então, é muito importante que a gente tenha esse olhar crítico. E para construir esse olhar crítico, é necessário que a gente leia, né, os livros e os nossos autores, eh, todos eles, né, e de maneira diversa com a Márcia
colocou a Micheline. Tenho certeza que a Carila também concorda, né? É importante que a gente que a gente tenha esse olhar crítico, né? E isso a gente vai construir pela literatura. Gente, eu não queria terminar essa mesa, tô sendo sincera. Eu queria ficar mais meia hora aqui, mas o povo não vai deixar, porque eu ainda tinha separado trechos das obras de vocês que assim são tão significativos que eu não vou conseguir apresentar aqui. Por isso eu reforço o convite para todo mundo que tá nos ouvindo. Conheçam essas autoras, gente. Calila Márfia Cambeba, que em breve
já tá com o livro aqui na pequena arma aquira de Tucum que tá chegando, a Micheline e eu aproveito para agradecê-las. Eh, muito obrigada pela disponibilidade, eh, pelo carinho, né, eh, por essa, por esse momento aqui que vocês compartilharam com a gente tanto, né? Eu só tenho agradecer. Eu vou passar a palavra para que vocês possam se despedir e aí na sequência eu já anuncio os ganhadores do nosso sorteio. É, eu posso me eu posso me despedir primeiro, Deb? Claro, claro. É que eu vou viajar e ainda tô arrumando poxa. Boa viagem. Eh, eh, eu
quero até avisar, amanhã, eh, não, depois de amanhã, quinta-feira, eu vou est na feira do livro de Tira Dentes, na Fliti. Então, se tem alguém aí de lá ou de perto, aparece por lá. E no sábado eu tô na livro em Fortaleza, então também quem tiver por lá tá convidado. Muito obrigada. Foi eh foi um momento muito muito bacana, muito importante. Calila, tenho a impressão que a gente se conheceu na UnB, né? Adoro seu livro. Sou leitora da Calila e da Márcia. E muito obrigada por partilhar essa mesa. Obrigada, Débora e todos vocês. Boa noite
e tchau, gente. Obrigada Micheline. Obrigada mesmo, Calila. Ah, eu quero agradecer, né, a vocês. tava aqui pensando que o quão é importante, né, esse essas reuniões, essa esses encontros, essas jornadas e enviar um abraço, né, carinhoso para todos os professores e professoras eh que estão em casa, que estão acompanhando essa jornada, que acompanham nossos trabalhos, né, e dizer a vocês que estamos aqui, né, eu vou dizer assim no plural, né, que nós estamos aqui para fortalecer e também pro qualquer dúvida que vocês tenham. estamos nas redes. Eh, dizer que eu também tô escrevendo, que logo
menos vai aparecer aí vai chegar novidades. Essa semana começa uma um clube de leitura de planta oração na Argentina, eh, em Buenos Aires. Algo que me deixa muito feliz pensar, né, nessa literatura brasileira, afro-brasileira, negro-brasileira, para além, né, do do nosso território, o quão isso é interessante também, a gente poder fazer essas trocas de experiência. E terminar com uma frase que, na verdade, é epígrafe eh do Planto oração, que diz que graveto é uma frase da mãe Estela Joochos, né, que também foi escritora. e fortaleceu muito essa essa perspectiva de biointeração, que é graveto, é
que derruba a panela. Então é isso, deixo um abraço e estou por aqui. Obrigada, Calila. Márcia, quero agradecer imensamente o convite eh que vocês fizeram. Agradecer a Camila, agradecer a Micheline, eh a Paula e toda a equipe que tá por trás dessa live. eh aos professores que estão aqui, professoras, eh dizer que a gente tá eh sempre dispostos eh nós escritores indígenas a a falar um pouquinho, a dialogar eh sobre eh a forma de de pensar a literatura indígena em sala de aula. também estamos atuando com formação para professores com relação à literatura indígena em
sala de aula e agradecer a todos que têm eh de de uma certa forma levado o nosso material para os seus alunos. Muito obrigada. Obrigada, Márcia. Gente que agradece muito a sua participação aí de Barcelona. A gente sabe que o fuso é diferente. 2 da manhã aqui. Ai, Márcia, obrigada. Nem tenho como te agradecer. Obrigada. Márcia, muito obrigada. Gente, chegou a hora que vocês estavam esperando. Então, os ganhadores do sorteio são Cíntia Silveira M. Rodovalho de Catalão, Goiás. Michele F. Silveira da Silveira de Panambi, Rio Grande do Sul, e Luana Barbosa dos Santos de São
Gonçalo, Rio de Janeiro, vão receber originárias, que é de organizado pela Tuduado Rico e o Maurício Negro, o Som do Rugido da Onça de Micheline Verunski, Lélia Gonzáes, um retrato de Sil Carneiro e o perigo de uma história única de Chima Amanda Nigie. Parabéns. Nossa equipe entrará em contato para acertar os detalhes do envio. Pessoal, essa mesa acaba aqui, mas nossa jornada ainda continua. Convido vocês para as mesas de amanhã, que estão incríveis também, às 4:30, o papel da literatura na alfabetização e nos multiletramentos e às 7 horas, formando quem forma leitores, debates e práticas.
Mais detalhes nas redes sociais da Companhia na Educação. Muito obrigada pela sua companhia. Até aqui a gente se vê nos livros e na jornada pedagógica. Até a próxima. Tchau.
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