A sequência de Fibonacci é uma das séries de números mais famosas da história. Ela é chamada de “código secreto da natureza” ou “sequência divina” porque pode ser verificada no mundo natural em vários casos, como nas pétalas de girassol ou na casca de abacaxis. Talvez você já tenha estudado isso ou visto em algum livro ou filme, como “O Código da Vinci”.
A sequência de Fibonacci tem uma relação próxima com um número, que também é muito famoso: o número de ouro, também conhecido como “proporção áurea” por ser relacionado à natureza e à beleza. Sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e neste vídeo explico a beleza dessa série de números. E falo também sobre a história quase esquecida de Fibonacci, o matemático italiano que deu nome a essa sequência e que teve um papel-chave no restabelecimento do Ocidente como berço da ciência, da tecnologia e do comércio Leonardo de Pisa, mais conhecido como Fibonacci, escreveu sua célebre série de números em 1202, quando publicou o livro “Liber abbaci”, ou “livro de cálculo”, em português.
A sequência aparece em um problema sobre a criação e reprodução de coelhos, que diz o seguinte: Suponha que uma pessoa tenha um casal de coelhos recém-nascidos. Eles demoram 2 meses para atingir a idade de reprodução. Logo depois desse tempo, eles têm dois filhotes, que sempre vão ser um macho e uma fêmea.
Daí por diante, eles vão se reproduzindo todo mês, sempre dando origem a um macho e uma fêmea, sem que nenhum animal morra. Perceba que tudo isso é muito improvável do ponto de vista biológico, mas a proposta vale para nossos fins matemáticos. A pergunta de Fibonacci ao final do problema é: Quantos pares de coelhos vamos ter depois de um ano?
Para chegarmos a esse número, temos que pensar que durante o primeiro mês, nosso casal de coelhos original ainda não atingiu a idade de reprodução. No segundo mês, eles chegam à idade adulta, mas ainda temos apenas um par de animais. No começo do terceiro mês, o casal tem suas primeiras crias, o que já nos deixa dois pares de coelhos.
No começo do quarto mês, o primeiro casal se reproduz outra vez e o segundo conclui seu amadurecimento. Desta forma, ficamos com 3 pares. No quinto mês, o primeiro casal volta a se reproduzir e o segundo tem crias pela primeira vez, mas o terceiro estará chegando à maturidade.
Portanto, temos 5 pares. Esses ciclos reprodutivos continuam a cada mês, de forma que, ao final de um ano, a quantidade de casais de coelhos chegue a 144. São justamente os resultados de cada mês que formam a sequência que, na verdade, é infinita.
A única coisa que precisamos saber é que qualquer que seja o número dentro da sequência, ele vai ser o resultado da soma dos dois anteriores. Por exemplo: o 13 vem da soma de 5 e 8, enquanto o 21 é o resultado de 8 + 13. Então, se a gente quiser saber quantos pares de coelhos teremos em um ano e um mês, só precisamos somar 89 e 144 o que dá 233.
Essa sequência, que é tão famosa hoje em dia, passou totalmente desapercebida na sua época. Apenas no século 19, matemáticos começaram a estudá-la. Não demorou para que eles se maravilhassem pela frequência com que ela aparece na natureza.
Foi então que ela recebeu oficialmente o nome de sequência de Fibonacci. Mas com o reconhecimento científico surgiram problemas ou mal-entendidos que existem até hoje. O primeiro é que essa série na verdade não foi inventada por Fibonacci.
O registro mais antigo em que ela aparece é de entre 450 e 200 antes de Cristo e está num livro sobre métrica, escrito pelo matemático indiano Pingala. O segundo é que, apesar de a sequência aparecer em diversas estruturas naturais e padrões de crescimento, ela não rege a natureza de forma universal nem mesmo nesses dois aspectos. Vejamos as pétalas de flores, que são o exemplo clássico: Como explica o renomado matemático e divulgador americano Keith Devlin, autor de dois livros sobre Fibonacci, a série de números realmente aparece nas pétalas de diversas flores com maior frequência do que se possa imaginar.
O lírio, por exemplo, tem três pétalas, a prímula tem 5, o delfínio, 8, a erva-de-São-Tiago, 13, e a chicória, 21. A margarida pode ter 13, 21 ou 34 pétalas e os girassóis, exemplos mais extremos da sequência de Fibonacci em flores, podem ter 21, 34, 55, 89 ou 144 pétalas na primeira fileira, emparelhadas respectivamente com outras 34, 55, 89, 144 ou 233 na segunda. Dá pra ver que o padrão se repete em diversas espécies de flores e também em outros elementos da natureza, mas não existe uma regra geral.
Existe outro aspecto que se soma a toda essa confusão. E é aqui que entra em cena o outro número famoso que eu citei no começo do vídeo: o número de ouro. Existe uma relação muito próxima entre a sequência de Fibonacci e o número de ouro, uma constante matemática que também é muito antiga, famosa e cercada de mistério.
Pra resumir bastante, o que acontece é que, se a gente dividir um número da sequência de Fibonacci pelo anterior, o resultado vai ser cada vez mais próximo de 1,6180339887… Eu digo “cada vez mais próximo” porque quanto maiores forem os números escolhidos, mais o resultado se parecerá com o número de ouro. Na matemática, ele costuma ser representado pela letra grega fi e é infinito. Na área cultural, é comum dizer que a proporção áurea tem a característica de ser naturalmente agradável ao olho humano.
Por isso dizem que ela pode ser verificada em obras como o Partenon ou “A Última Ceia”, de Leonardo Da Vinci. Neste último caso, por exemplo, diversos estudos mostraram que o número de ouro está presente na sala, na mesa e até na posição dos protagonistas. Mas, como ressalta o próprio Devlin, não existe a certeza de que a proporção áurea contenha a essência da beleza.
Para ele, a melhor explicação para a existência de todas essas teorias é que nós humanos somos bons em reconhecer padrões e ignoramos tudo aquilo que os contrarie. Vale lembrar que quem diz isso é um especialista cujo último livro sobre Fibonacci afirma, no título, que esse “esquecido gênio matemático” “mudou o Mundo”. Mas então, qual foi o verdadeiro legado do matemático italiano?
O grande mérito de Fibonacci foi a sua enorme influência na popularização na Europa do sistema numérico indo-arábico, o mesmo que usamos até hoje. De fato, a maior parte de seu “Livro do cálculo” consiste em explicar o básico sobre o sistema: como escrever os números de 0 a 9 e também como somar, subtrair, multiplicar e dividir usando os algarismos. Mas esses conceitos, que parecem tão óbvios hoje em dia, não eram assim antes do século 13.
Muitos acadêmicos da Europa não só conheciam como também usavam o sistema numérico indo-arábico. Mas os comerciantes e o povo em geral ainda usavam o sistema romano, que exigia, por exemplo, que os cálculos fossem feitos com o dedo ou usando ábacos. Fibonacci foi fundamental para o fim da Idade das Trevas europeia e o início de uma nova era, em que o continente voltou à vanguarda das ciências e do comércio.
Segundo Devlin, a história praticamente se esqueceu de Fibonacci porque, ao divulgar a matemática moderna, ele deu origem a mudanças tão poderosas, que foram absorvidas de tal maneira pela sociedade, que, poucas gerações depois, as pessoas já consideravam o conhecimento que ele produziu como pressuposto. No final, a verdadeira revolução de Fibonacci foi ensinar que dois mais dois são 4. Eu fico por aqui.
Você gosta de vídeos sobre matemática, como esse? Deixa aqui nos comentários. Até a próxima!