[Música] Adolescência: uma fase cheia de mistérios, medos e angústias; um período de indefinições, de busca, de descobertas. Com os hormônios em disparada, o corpo passa por transformações intensas e incontroláveis. Para entender a adolescência do presente, precisamos entender a adolescência do passado.
Quando vocês veem aquelas primeiras fotos de crianças e adolescentes no início do século XX, vão ver uma coisa interessante: pequenas crianças ou adolescentes vestidos de adultos, com as mesmas roupas que os adultos usam, bonés, chapéus e calças curtas, mas com os mesmos modelos de adultos. Não existia moda para criança nem moda para adolescente, porque se considerava que a criança e o adolescente eram pequenos adultos, ingênuos, adultos menores. Quando essas crianças ingênuas atingiam a idade de 12 a 13 anos, as meninas, as mulheres, já se preparavam para o casamento, e raramente elas tinham a chance de escolher seu parceiro.
Eram preparadas para esse casamento, dirigidas à maternidade. Essas mulheres, com 14, 15, 16 anos, se tornavam mães e passavam a se dedicar mais a seus filhos do que a seus maridos. Os meninos, com 12 a 13 anos, no início do século, iam para o campo ou para o ofício dos seus pais e começavam uma vida adulta sem passar pela síndrome da adolescência normal.
Ninguém via o sofrimento que esses sujeitos estavam passando por toda a mudança hormonal, a sexualidade que estava em jogo. Mas, de alguma forma, esses meninos e meninas tinham um ganho fundamental nas suas vidas: eles enlouqueciam muito pouco e adoeciam muito pouco, porque tinham aquilo que chamamos de um investimento libidinal. Libido é o termo que usamos para amor em psicanálise; o investimento de amor que as mães davam a seus filhos.
A maior parte do tempo, elas viviam para seus filhos. O investimento libidinal que elas davam para os seus filhos era muito alto, era muito grande, porque passavam o tempo todo vivendo como mães. Então, apesar de a gente não ter chance de acudir o adolescente na sua adolescência, ele tinha tido uma boa infância; tinha mamado naqueles peitos generosos, escutado cantigas de ninar durante muito tempo, convivido com sua mãe, às vezes com seu pai, que chegava cedo da marcenaria, do trabalho, do campo.
Então, o sofrimento da adolescência era engolido por essa riqueza afetiva que ele tinha tido durante essa infância. [Música] Generosa, a história da psiquiatria nos mostra poucos relatos de doentes ou de suicídios de adolescentes no início do século XX, até os anos de 40 a 45. Bom, Felipe Arer, um historicista, um historiador, nos mostra que, dos anos de 25, 1925, 1930 em diante, as pessoas começaram a ter mais filhos, principalmente aqui no Brasil, e os adolescentes começaram a se casar um pouco mais tarde, se separando um pouco mais dos nossos pais, indo mais para a escola, para os internatos, os meninos indo para o exército.
Nós começamos a notar já o aparecimento de sentimentos de adolescente, necessidade de privacidade. E nos anos 35 a 40, já temos relatos na história do aparecimento dos diários. Lembra-se dos diários, das meninas fazendo diários, começando a colocar uma angústia interna na palavra escrita?
E, pela primeira vez na história, nós tomamos contato de que há uma angústia prevalente nessa época da vida: a necessidade de contar, mesmo que seja para o papel, um profundo sentimento de que falta alguma coisa, de que há alguma coisa pesada nessa fase da vida. E nasce um fenômeno que, infelizmente, nós perdemos hoje, que é o fenômeno da amizade. A amizade, o vínculo afetivo, que é amizade, é a transferência do amor que se tem na família para outro.
As meninas começam a ter amigas, elas transferem o amor da mãe para a amiga, e alguns meninos também começam a formar amizades dentro do colégio interno, dentro do exército, dentro da ACM, dentro dos grupos de esporte, do futebol, do basquete que eles começam. E começam a fazer uma transferência da relação com o pai para a relação com o amigo. Os anos 30, 40 dão a chance do adolescente se separar, não fisicamente, mas afetivamente, da relação familiar.
No próximo bloco, a guerra traz a melancolia: sentimentos que antes ficavam soterrados por obrigações sociais e familiares agora ganham espaço. O jovem começou a dar vazão à angústia de ser adolescente, e outras mudanças igualmente profundas começam a se anunciar. Nós estamos saindo da Primeira Grande Guerra, que trouxe para a Europa, um pouco para o Brasil, mas muito para a Europa, um sentimento muito forte de descrença pela morte dos filhos.
A Primeira Grande Guerra trouxe um estado mórbido para a Europa; de repente, passado muito pouco tempo, nós temos a Segunda Grande Guerra. Nós nos envolvemos na Segunda Grande Guerra, e a Segunda Grande Guerra instaura no mundo ocidental um sentimento muito complicado, que é a melancolia, que é uma forma sombria da depressão: um sentimento profundo de descrença e o medo maior de que os filhos nos vão ser tirados, porque vão ser chamados à guerra. Aí nós estamos nos anos 50, onde nasce na adolescência presente aquilo que chamamos de juventude transviada, de filhos que já começam a existir com seus 16, 17 anos, ligados à necessidade de um prazer, um prazer necessário, ligado ao álcool, à motocicleta, que era um símbolo importante disso, e morrendo com muita facilidade, mas com uma história de pais que começaram a não mais investir seus seios, sua presença e seu amor de uma maneira mais intensa nos seus filhos, pelo medo inconsciente da perda que iam ter em função da guerra, em função da morte iminente.
Então, nasce uma geração sem o investimento libidinal dos pais. Nos anos 60 e 70, temos a geração que veio depois dessa, com menos investimento libidinal: nasce a chuquinha, nasce o leite Ninho, a necessidade de dizer "deixa seu filho no berço". Não perca tempo com o seu filho, né?
Que é a consequência da morbidez que a melancolia, de forma passada, deixou. Começa a moda para a criança, a criança para de se vestir como um pequeno tolo adulto e vai se tornando cada vez mais assim, né? Então, os anos 60, 70 e 80, a melancolia de perder o filho vai se confundindo com uma sociedade que vai vivendo mais o momento do já, o momento presente.
Então, nós começamos a aumentar o consumo e a viver dois sentimentos complicados: a descrença, a descrença na política, a descrença na boa ciência, porque a boa ciência nos trouxe a arma, a bomba; a descrença na religião e a crença numa coisa que a gente chama de princípio do prazer, de que nós tínhamos que viver a vida mais num momento e começar a fazer com que nossos filhos tivessem recursos para prazer. Então, nós começamos a desinvestir ainda mais o nosso filho, real, real de rei. Nosso filho deixou de ser o rei do nosso desejo e passou a ser o rei dele mesmo.
Nós começamos a destituir o que a gente chama em psicanálise de neurose, que é uma necessidade nossa. A neurose é a formação em nós, humanos, de um tripé que nos dá a sobrevivência para viver. O tripé é a raiva, o medo e a culpa.
Esse tripé é a maneira pela qual a gente passeia pela vida sem adoecer. O equilíbrio desse tripé é o que nos dá a proteção para o desamparo, a proteção para a gente sobreviver à angústia. Quando esse tripé se desequilibra, quando esse tripé não se faz, nós começamos a viver uma coisa que se chama perversão, que é o avesso da neurose.
Então, nós começamos a criar crianças sem o investimento libidinal possível para que elas se tornem neuróticas, para que tenham o medo, a raiva e a culpa. Como nós começamos a fazer isso? Nós começamos a fazer isso permitindo que esses pequenos tiranos, ah, quando eles entram em medo, a gente tira o medo deles.
O medo é muito importante para nós. Quando uma criança sente medo, a gente tem que dizer a ela que ela pode ter medo. Quando uma criança sente medo hoje, no final dos anos 1900, nós dizíamos a ela que não, não tenha medo.
Não, você não precisa ter medo; a gente acende a luz, a gente diz que bicho-papão não existe, que a mulher loira do banheiro não existe, e a gente vai tirando dela a capacidade de se proteger, porque o medo é nossa proteção. Quando ela está com raiva, a gente elimina a raiva dela, dando algo para que essa raiva passe. "Filhinha, vamos jantar?
" "Não quero jantar. " "Ah, então come um sonho de valsa, mas não grite! Não chore, porque dói o ouvido da mamãe!
" E a culpa, né? E aí, quando uma criança entra em culpa, a mãe entra em culpa junto. Aí ela tira a culpa da criança e, assim, nós [Música] destituímos e criamos uma sociedade perversa.
O que é uma sociedade perversa? É a sociedade que começa a ter prazer com dano ao outro. Essa sociedade que está aí fora, riscando parede, assaltando, e nós damos início a uma violência complicada: o não investimento dos pais nos filhos.
Esse amor perdido, esse amor não dado, a retirada desse investimento pelo medo da perda gerou uma coisa que foi a perda da identidade. Os adolescentes, as crianças, os adolescentes começaram a não ter com o que se identificar. E, como nós já vimos, esse movimento de ir para fora e fazer amizades, esses grupos começaram a criar uma identidade.
Então, nós começamos a ter os "hippies", mais para frente, nos anos 90, os "emos", os "skinheads", para ter uma identidade, só que é uma identidade que não se consagra, uma identidade que não se faz. Aí, o esforço para ter outra identidade: a tatuagem, a tatuagem. Mas uma tatuagem só já vazou a identidade.
Então, faz outra, depois outra, depois outra. E hoje nós temos gente que tatua o corpo inteiro, como se quisesse ter outro corpo, outra pele. Próximo bloco: o desejo fundamental, a busca por uma identidade, é uma das grandes questões da adolescência.
Por isso nos deixa tão preocupados. De onde vem tanto medo, tanta angústia, tanta ansiedade? No século passado, em um dos seus seminários mais importantes, Jacques Lacan, um psicanalista francês, ouviu durante uma das suas noites, em um dos seus seminários, algo assim: "O que nós, os humanos, procuramos na nossa vida?
Nós produzimos coisas, nós vamos para o trabalho, nós vamos para a faculdade, nós vamos atrás de um doutorado, nós vamos atrás de dinheiro, nós vamos atrás de tudo. Mas sempre nós ficamos com esse desamparo, com essa angústia fundamental. " Qual é a coisa, ah, que coisa é essa atrás da qual todos nós vamos?
Qual é o desejo fundamental nosso? E Lacan responde assim: "O desejo fundamental do ser humano é o desejo de ser desejado. " A gente se veste, a gente se embeleza, a gente vai atrás de valores sociais, valores pessoais, para buscar esse desejo fundamental que foi perdido em algum lugar.
Nossos adolescentes buscam isso. Quando eles não encontram esse desejo fundamental no piercing, na tatuagem, às vezes eles vão para o álcool. O álcool é um depressor do sistema nervoso central.
Quando se bebe álcool em alguma quantidade, essa angústia fundamental de uma falta de identidade passa. O que é essa angústia? Essa angústia, a tradução de angústia (Angst, Fall em alemão) é desamparo.
Quando é que uma criança, um adolescente, fica desamparado? Quando ele não sabe se ele é desejado. Uma vez, um menino me disse assim: "Tio, eu tô gostando muito de uma menina da minha escola.
" E eu achei aquilo muito bom. E aí ele me disse: "É a mesma que todos os meninos gostam, então provavelmente eu não vou ser o escolhido. " E essa angústia é terrível.
É terrível. Percebe? É um bem que faz mal.
E como é que eu luto por ela? Então, todos lutam por ela. Todos lutam por ela.
Eu imagino a angústia das outras meninas, como é que deve ser, né? E dessa que não vai poder escolher nenhuma, porque a hora que ela escolher uma, ela deixa de ser um objeto de desejo, do desejo dos outros. Percebe que loucura que é isso, né?
Quando que a gente sente que a gente é desejado pelo outro? Que a gente é um desejo do outro? Quando existe uma história que marca isso?
Quando existe uma continuidade, uma linearidade que marca isso? Quando existem sinais que marcam isso? E quando existe a chance da gente poder se dirigir a essa pessoa ou a esses seres e poder dividir a nossa angústia.
Então tá lá minha mãe em casa e eu vou sentar com ela e vou falar da pessoa que eu gosto. Vou falar que estou me sentindo gordo e ela não vai me criticar. Ela vai me ouvir, ela vai me acolher.
Essa referência de que o desejo dele suporta minha angústia é muito importante. Nós não temos isso. Por isso, os consultórios estão cheios de adolescentes e crianças tentando dividir com seus terapeutas, com suas fonos, com suas pedagogas, essa angústia.
Essa angústia. E o que a gente sabe hoje é que, às vezes, alguns sintomas, ir mal na escola, se machucar. .
. Nós temos muitas meninas que hoje se cortam com estiletes ou adoecem facilmente. Alguns sintomas são especialidades dos adolescentes para ver se despertam nos cuidadores esse desejo que falta.
Se angustiando os pais para ver se desperto. Mas, infelizmente, se não existe um desejo a priori, esse desejo não consegue ser despertado. Mas o que a gente percebe é que muitos filhos não foram desejados.
Querer ter um filho não é igual a querer um filho. Não sei se vocês compreendem o que estou falando. Esse desejo não está pronto na cabeça de uma sociedade consumista.
Às vezes, o filho entra como objeto de consumo. Então, vamos ter um filho. Percebe?
Agora vamos ter dois. Percebe? Agora vamos pôr lá pra babá cuidar, pra escola cuidar.
E, às vezes, alguns pais imaginam que a escola teria que suprir essa coisa que não foi suprida em casa ou que a sociedade teria que suprir isso. Mas isso não funciona. Nossa referência de vida foi e será sempre dirigida a essa necessidade fundamental de sermos desejados.
Como essa angústia não atrapalha a vida de ninguém? Quando nós nascemos, precisamos formar uma entidade psíquica em nós que chamamos de ego. Para que esse ego seja formado, é necessário que a gente tenha um cuidador, pelo menos durante o primeiro ano de vida inteiro.
E esse cuidador tem que ser o mesmo, de preferência a mãe. E essa mãe tem que tomar o cuidado para que nosso dia tenha uma rotina, nosso quarto seja o mesmo quarto, nosso berço seja o mesmo berço durante um ano, para criar uma coisa que se chama pontos de fixação. Os pontos de fixação são onde o cérebro e o psiquismo se encontram, e a criança começa a ter um sentimento chamado sentimento de pertinência.
Isso é fundamental para nós, do segundo ano de vida até o quinto ano de vida, e o cérebro dela vai evoluir e vai ganhar um aditivo muito complicado, que é o funcionamento da amígdala cerebral. A amígdala cerebral é o nosso condutor do medo e da raiva, que são os dois pontos fundamentais da neurose. Como funciona uma criança normal?
Uma criança normal é aquela onde, quando ela é tirada do prazer, se ela for normal, ela grita, xinga, se joga no chão, faz birra. E como o cuidador dessa criança tem que reagir? Tem que suportar isso.
Suportar isso sem reagir de volta, sem xingá-la, sem bater nela, sem crucificá-la, sem puni-la, e esperar esse reloginho da amígdala cerebral ter começo, meio e fim, para que a criança saiba que ela pode suportar essa frustração. Quando uma criança sente que suporta a frustração, ela começa a ficar forte. E esse ego construído no primeiro ano de vida faz com que ela fique mais forte.
Quando uma criança faz birra e a mãe bate, ou a mãe chora, ou a mãe vai embora, essa criança começa a se sentir má, uma criança má. E aí, Melanie Klein, que foi uma estudiosa da maldade das crianças, dizia que essa criança má, dos dois aos cinco anos de vida, não vai conseguir retirar mais essa identidade de uma criança má e vai crescer com essa angústia de que, sendo má, quem vai desejá-la? E aí nós vamos ter problema na adolescência.
Aos seis anos de idade, nós vamos então montar a nossa neurose. Como aparece a neurose dos seis aos onze anos de idade? Através das neuroses: tiques, piscar o olho, enfiar o dedo no nariz, começar a ter mania, não querer que misture arroz com feijão.
E o terceiro item da neurose: o medo. Às vezes, as pessoas estão sentadas na sala e a criança está com sede e quer ir até o lugar onde tem água. E ela fica assim: "Mãe, tô com sede".
E tem nove anos. "Vamos comigo tomar água, por que, filho? " "Porque eu tô com medo.
" "Medo do quê? " "Tô com medo do fantasma. " Percebe, e eu vou com você tomar água.
Mas por que tem fantasma? Não, porque tem medo. Essa neurose é a que nos protege da loucura.
Dos seis aos onze anos, nossos filhos precisam desse medo, e nós temos que acolhê-los nesse medo. Na adolescência, a neurose vem através do desamparo, através da angústia: o tamanho, o tamanho dos seios, a moda, o grupo, o futuro. O que você.
. . Vai ser filha?
Que profissão você vai escolher? Não sei. É uma angústia muito grande essa.
Eu queria ser professora, mas se eu falar isso, me matam. Percebe? Então eu tenho que escolher uma coisa que não tire o desejo dos outros sobre mim.
O que se faz com essa angústia? Essa angústia tem que ser trazida para dentro de casa e transformada em fala. Como que a angústia do adolescente aparece?
Através da neurose, da raiva, do medo e da culpa. Precisa ter alguém em casa para perceber isso. Nossa, meu filho tá nervoso.
A gente fala "bom dia" para ele e ele fala um palavrão. Então tá normal? E o que é necessário fazer?
Ficar perto dele. "Senta aqui, vamos conversar. " Mas eu não quero conversar com você!
Importante, eu vou ficar aqui perto de você até a hora que você quiser conversar comigo. Eu não vou assistir à novela, não vou conversar com o seu pai, se tiver um pai perto. Eu vou ficar aqui perto de você.
E aí vai acontecer o fenômeno fundamental da angústia: primeiro a raiva. "O que você está querendo de mim? Você é chata!
" Depois o medo. Então, o medo de que a mãe não saiba lidar com aquilo. E aí a angústia: "Mãe, eu tô gostando da fulana, mas ela já tem dois namorados.
" "Mãe, eu não sei química, eu não consigo aprender química. " Precisa ter alguém que suporte a neurose para que a angústia venha. No próximo bloco: a adolescência de hoje e de amanhã.
O mundo está mudando cada vez mais rápido. Cada nova geração parece trazer um novo significado para a adolescência. O que é então ser adolescente hoje?
A adolescência deixou de ser um período orgânico, onde os hormônios chegam, e passou a ser um período conceitual. Hoje a gente vê meninos de 8 anos, 9 anos, travestidos de adolescentes. Alguns com piercing, alargadores na orelha.
Não lidam com a afetividade, eles não têm amigos. As meninas não fazem diários porque não dá tempo, porque elas têm que deixar recados no MSN, no Facebook. E elas não têm a transferência da família para os amigos, porque como não há vínculo em casa, eles não fazem a transferência aqui para fora.
Então, o que eles vivem? Eu vou contar o que eu escuto deles: eles têm um monte de gente com quem convivem que são parceiros de prazer, mas se eles precisarem de um amigo, onde eles precisem de uma relação afetiva, eles não têm. Eles não têm um amigo, eles têm parceiros de prazer.
E nós, não temos um fim para a adolescência. Nós não temos um fim. Hoje, alguns pais de adolescentes se vestem como adolescentes, vivem como adolescentes, agem como adolescentes, têm grupos como adolescentes e vivem com os filhos de igual para igual, sem nenhuma condição de perceber um filho angustiado.
O desamparo das crianças, tanto da classe Z, que eu conheço muito bem, como da classe A, o desamparo, a solidão delas, vai obrigando-as a buscarem padrões de identidade e a sociedade industrial vai oferecendo isso, vai oferecendo padrões de identidade. Então, você hoje tem filmes que são feitos com crianças de menor idade, travestidas de adolescentes. Então, você vai descendo a idade, vai descendo também o consumo, é a busca pela angústia de uma identificação com algo que lhe dê uma sensação de pertencimento a algo.
Percebe? Mas como isso não funciona, porque pra gente poder sentir que a gente pertence a algo é necessário que haja o desejo do outro, a gente se sentir desejado. A roupa dura muito pouco tempo e daqui a pouco ela chega e fala: "quero comprar outra roupa, preciso comprar.
" Então, hoje os nossos guarda-roupas têm milhares de roupas, algumas até com etiqueta. Não sei se vocês já viram isso. Percebe?
Porque na verdade o prazer da roupa é comprá-la, que é o engodo. Parece que agora que eu comprei a roupa, eu ganhei uma identidade. Quando eu chego em casa e visto a roupa, parece que ela só ficou boa na loja.
Já tiveram essa sensação? Porque a nossa identidade não tá nisso, tá em querer ser desejado por alguém. Eu tenho medo do futuro, porque se as pessoas não entenderem a importância disso, de a gente perder tempo com o nosso amor por outro, nós vamos ter um caos.
O número de suicídios já é grande entre os adolescentes, muito alto, né? Porque eles se frustram e se matam. "Ou a minha namorada não quer mais namorar comigo, eu vou lá e mato ela.
" Percebe? Já viram como é? Então assim, a violência é o sinal da perversão, a ausência da neurose.
Na neurose, a gente chora porque a namorada não quer mais me namorar e vai pro colo da avó, da mãe, do pai. Como não tem esse colo, eu mato quem tá me provocando dor. Compreende?
Então eu tenho medo do que vem por aí. Se a gente não acordar logo, eu não sei quem vai acordar esse povo todo, mas nós temos que acordar as pessoas que vêm por aí. Essas gerações que estão vindo.
O que uma mãe pode fazer para não ter a síndrome do ninho vazio quando nossos filhos saem de casa e vão morar longe, mudam de país ou vão para a faculdade em outra cidade? O que acontece é a perda de uma dinâmica familiar que às vezes nem era tão boa assim. Às vezes elas se suportam por causa da presença de um filho.
Quando esse filho sai, passou no vestibular, o casal tem que regredir a sua vida de casal e de repente eles descobrem que faz 18 anos que eles vivem como pais e eles têm que voltar a viver como um casal. E eles têm que reaprender isso. E às vezes eles não querem mais.
Então, a síndrome do ninho vazio às vezes é um. . .
Sintoma ruim para um casal que vai ter que agora conviver com um filho a menos, cuidando de um filho que eles não prestavam muita atenção ou cuidar de um casal que estava descuidado até agora, porque é o papel que viviam, a dinâmica que viviam. Apenas a dinâmica de pai e mãe e a questão do filho longe. O medo da perda do filho que, se que venha a consciência, não se esqueçam que, como a nossa qualidade afetiva, às vezes, não é muito boa, uma criança, um adolescente problemático no nosso meio, justifica nossas angústias.
Quando esse adolescente sai, nós ficamos sem justificativa. A gente chama isso de bode expiatório. Às vezes, nós que trabalhamos com adolescentes conseguimos ajudar esses adolescentes e, às vezes, eles param de usar droga; às vezes, eles saem da perversão e entram na neurose, e se tornam boas pessoas, param de agredir os pais, voltam a estudar e os pais se separam.
Percebe? Então, eu posso contar para vocês mais do que meus dedos das mãos e dos pés casos onde a vitória, a minha vitória terapêutica, a minha vitória como profissional, se tornou complicada, porque a sobrevivência daquela família era justamente a patologia daquele adolescente. Então, os pais, todo dia angustiados, procurando juntos no guarda-roupa onde estava a Maria Juana, a maconha, onde estava no guarda-roupa o cachimbo de crack; onde estava.
E, de repente, esse adolescente se liga a mim, transfere para mim coisas que ele precisava transferir, melhora, muda, tira o alargador da orelha, começa a ter um discurso diferente na vida, volta para a escola, é recolhido na escola de onde ele saiu mal, começa a ficar em casa, começa a estudar, e os pais se separam, porque acabou a função deles de horrorizados. E isto também tem que ser levado em conta quando a gente fala da síndrome do ninho vazio. Às vezes, a saída de um filho de casa termina a única função que um casal tinha na vida.
Então, nós precisamos pensar em tudo isso. Tudo isso, além, claro, uma pessoa boa sente falta de um filho que ama, e essa é a última resposta que a gente pode dar. Tem gente normal também no mundo.
No Café Filosófico de hoje, o psicólogo Ivan Capelato percorreu a história de olho na adolescência e nas questões que a afligem, esse período tão turbulento das nossas vidas. Esta e outras palestras você encontra na íntegra no site da CPFL Cultura. Tchau e até o próximo [Música] café [Música] k [Música] C.