Esses dias eu assisti um vídeo do canal americano CNBC que falava sobre um tema muito intrigante e preocupante, e que infelizmente tem muito a ver com a realidade brasileira também: a fraude alimentar. O vídeo, chamado “Como os americanos são levados a comprar comidas falsas”, dá um panorama geral sobre os esforços da indústria alimentícia pra baratear custos através da adulteração de alimentos. A CBNC mostra uma série de produtos adulterados de maneira criminosa, com a remoção ou substituição de ingredientes originais por substâncias de baixa qualidade, como forma de diluir os custos e aumentar os lucros da indústria.
O problema é que os produtos continuam sendo vendidos como se fossem 100% legítimos, fazendo com que os consumidores, como eu e você, comprem comidas como azeite de oliva, derivados de leite, carnes bovinas e peixes, sem fazer ideia de que eles podem conter ingredientes pouco nutritivos ou até prejudiciais à saúde. Há uma década, em 2013, um escândalo na Europa tomou conta da mídia, quando foi descoberta a presença de carne de cavalo em lasanhas congeladas e hambúrgueres, vendidos no Reino Unido, que na verdade deveriam conter carne bovina. Além do consumo de carne de cavalo ser considerado um verdadeiro tabu no país, devido ao respeito que os britânicos têm com o animal, o fato de que a carne tinha uma procedência duvidosa significava que ela poderia fazer mal à saúde.
Diante da seriedade do tema, e da preocupação com esse tipo de fraude, resolvi investigar a situação aqui no Brasil, e acabei descobrindo casos bizarros, que vão desde o surgimento legal das novas misturas lácteas até misturas ilegais no whey protein. Lá nos Estados Unidos, a agência reguladora responsável por fiscalizar a indústria alimentícia é a Food and Drg Administration, a FDA – e um dos principais problemas que a agência combate é justamente a fraude alimentar. A fraude alimentar também é chamada por eles de EMA, uma sigla que traduzida significa Adulteração com Motivação Econômica, ou seja, adulteração com o intuito de diminuir gastos e aumentar lucros.
Segundo a FDA, ela ocorre quando alguém intencionalmente suprime, remove, ou substitui ingredientes importantes de uma comida – ou também quando são adicionadas uma ou mais substâncias ao alimento pra que ele se passe por um produto mais caro do que realmente é. Um dos exemplos mais comuns é o azeite de oliva extra virgem: alguns fabricantes misturam gordura vegetal barata ao azeite original, fazendo uma mistura de pior qualidade, mas ainda vendendo o produto com a informação de que é 100% azeite de oliva no rótulo – uma mentira deslavada. Em 2016, foi noticiado que 80% do azeite extra virgem italiano no mercado americano era fraudado – ou não era nem italiano, ou não era extra virgem.
No próprio mercado italiano também não é muito diferente, onde foi estimado que mais de 50% dos azeites nas prateleiras eram falsificados. O que não falta são exemplos de comidas que são comumente adulteradas, e o FDA listou alguns suspeitos comuns por lá. É o caso do mel, muitas vezes utilizado como adoçante, e que já foi misturado com adoçantes baratos por algumas companhias, como xarope de milho, xarope de arroz ou açúcar de cana, mas continuaram sendo vendidos como mel puro, e claro, custando o preço do mel puro.
Em março de 2023, a União Europeia resolveu agir contra o mercado de mel falsificado: 18 países fizeram uma campanha de testes, e descobriram que das 320 marcas de mel importadas, quase 50% tinham indícios de que haviam sido adulteradas de forma ilícita. A indústria dos frutos do mar também tem navegado em águas duvidosas – é um dos setores mais afetados pela fraude alimentar. Um dos meios de fraude é simplesmente quando as empresas trocam a carne de certos peixes pela carne de espécies mais baratas, confiando que a imensa maioria dos consumidores não vai perceber a diferença – algo que de fato acontece.
O The Guardian fez uma análise de dezenas de estudos sobre a indústria de frutos do mar. As pesquisas reuniram mais de 9 mil amostras de comidas desse tipo, vindas de mais de 30 países ao redor do mundo – e o resultado foi que quase 40% dos frutos do mar tinham sido fraudados e na verdade não correspondiam ao que era informado no rótulo. Os estudos não revelavam somente um problema grave do ponto de vista alimentar e legal, mas também um sério problema ambiental, já que em muitos casos, a carne de peixe “substituta” vinha de espécies ameaçadas em seus habitats naturais.
A lista de adulterações bizarras vai se estendendo: sucos de caixa “100% da fruta” que na verdade são uma mistura de saborizantes, água e açúcar; temperos exóticos que levam corantes industriais, muitas vezes à base de chumbo; e até mesmo alimentos pra bebês, como a fórmula infantil. Em 2008, uma fabricante na China teve a brilhante ideia de adicionar melamina à sua fórmula infantil. A melamina é um composto sintético, produzido artificialmente, mas que é feito principalmente de nitrogênio e tem uma infinidade de aplicações como na fabricação de plásticos e tintas anti-chamas.
E por que os chineses utilizaram essa substância nos alimentos pra bebês? Bom, porque alguns dos testes pra determinar a quantidade de proteínas em um alimento levam em conta justamente a quantidade de nitrogênio presente. Ou seja, adicionando melamina, a fórmula infantil parecia ser mais nutritiva quando submetida aos métodos de testagem.
Só que a melamina não só não possui valor nutricional, como pode causar graves danos à saúde, em especial aos rins. As consequências dessa irresponsabilidade foram mais de 300 mil crianças doentes, mais de 50 mil hospitalizadas, e ao menos 6 mortes – tudo causado pela insuficiência renal provocada pela melamina, em nome da ganância. Como deu pra ver, a fraude alimentar infelizmente é um fenômeno global, e não faltam casos onde fabricantes fazem o possível pra baratear custos, mesmo que isso signifique colocar o consumidor em risco.
Mas e por aqui? As prateleiras do Brasil também podem estar repletas de mentiras? É considerado crime, segundo o artigo 272 do Código Penal brasileiro: “Corromper, adulterar, falsificar ou alterar substância ou produto alimentício destinado a consumo, tornando-o nocivo à saúde ou reduzindo-lhe o valor nutritivo”.
Mas a pena de prisão de até 8 anos não parece ter intimidado os criminosos, e não foi o suficiente pra que a prática da fraude não se repetisse na indústria alimentícia brasileira também. Inclusive, talvez você se lembre de um dos casos recentes mais famosos de fraude alimentar por aqui: o escândalo da carne com papelão. Quando o caso veio à tona em 2017, várias empresas alimentícias do país foram acusadas de praticar uma série de irregularidades nas suas produções de carne – que iam desde a venda de carne estragada ou vencida, tentativas de “renovar” a aparência de carnes velhas, até claro a inclusão de papelão em alguns tipos de carne.
Várias dessas acusações foram rebatidas e outras comprovadas, algo que gerou muita polêmica no país inteiro na época. Mas o fato é que a operação, chamada de “Operação Carne Fraca”, revelou um esquema de fraudes envolvendo empresários e funcionários públicos pra facilitar fraudes na produção de carnes. No mesmo ano, o Ministério Público do Rio Grande do Sul também entrou em ação contra falcatruas na indústria dos alimentos.
Dessa vez, o alvo eram os produtores de leite. Foi descoberto um esquema envolvendo até 170 pessoas, entre produtores e distribuidores, que praticavam irregularidades na cadeia produtiva de leite. Entre elas, a adulteração do leite com a adição de ureia, ou mesmo de formaldeído, o formol, substância notoriamente cancerígena – além da adição de água em creme de leite velho pra renovar o aspecto.
Segundo levantamento da US Pharmacopeia, a pedido da BBC Brasil, o leite brasileiro tem sido um problema persistente em relação à adulteração – além de formol e ureia, também é usada a água oxigenada. Enquanto isso na Paraíba, 40% das amostras de leite de cabra continham, na verdade, leite de vaca. Outros problemas comuns no exterior, também se repetem da mesma maneira por aqui: carne de peixe sendo substituída em Manaus, mel sendo adulterado com xarope de açúcar, e, claro, o bom e velho azeite de oliva.
Também é comum no mercado brasileiro que alguns fabricantes adulterem azeite extravirgem misturando outros tipos de óleo vegetal, muito mais baratos, como óleo de soja ou canola, pra tentar enganar o consumidor. Também acontece a mistura de azeite de pior qualidade, como azeite virgem ou azeite lampante sendo diluído no azeite extravirgem – algo considerado pelos especialistas como uma sofisticação das técnicas de falsificação. Frequentemente são realizadas ações contra esse tipo de crime, principalmente por parte da Anvisa, a “nossa FDA”.
Em 2021, por exemplo, uma única operação no Paraná apreendeu mais de 4200 garrafas de azeite fraudado – que foram destinados à produção de biocombustível. Isso quer dizer que muitas vezes, o consumidor opta por um azeite extravirgem por ser uma opção considerada saudável, mas pode acabar levando pra casa uma mistura de óleos baratos sem nenhum benefício. Falando nisso, nem mesmo quem tenta manter um estilo de vida fitness escapa desse mercado fraudulento.
Em 2013, Félix Bonfim, um empresário paranaense resolveu testar os suplementos que vendia em sua loja, pagando pra que um laboratório privado analisasse 27 tipos de whey protein. Quase todos os produtos apresentaram valor protéico diferente do que o rótulo informava. A Anvisa permite que essa diferença seja de até 20%, mas segundo Félix, algumas marcas só ofereciam 3 gramas de proteína, uma diferença de 87% em relação aos 24 gramas informados na embalagem.
Esse caso ganhou destaque no mundo fitness, já que o whey protein é um dos suplementos mais comumente usados por atletas e frequentadores das academias. Após a polêmica, a Anvisa intensificou suas ações, e em 2014 proibiu a venda de mais de 20 tipos do suplemento, por considerar que havia fraude alimentar. Em 2018, a notícia se repetiu, com mais irregularidades sendo encontradas em 10 marcas de whey diferentes.
Inclusive, a Proteste, que vem monitorando e testando as proteínas do mercado, disponibilizou uma ferramenta pra comparar o verdadeiro valor nutricional de diversos suplementos. Esses são só alguns tipos de artimanhas usadas pela indústria alimentícia aqui no Brasil também, mas tem um detalhe: todos esses casos têm algo em comum, que é o fato de que a adulteração cometida é simplesmente ilegal, é crime. Mas, e quando a fraude ocorre à vista de todo mundo, sem necessariamente quebrar nenhuma lei?
Uma simples visita ao mercado é suficiente pra achar inúmeros produtos no mínimo suspeitos, e sair revoltado. A indústria dos alimentos tem tentado adotar o máximo de estratégias possíveis pra baratear o custo das suas produções, sem afugentar os clientes. Provavelmente, um dos fatores tem sido a escalada na inflação dos últimos anos, que fez com que o preço dos alimentos disparasse e ficasse mais difícil pro consumidor continuar comprando os mesmos produtos.
Mas isso não quer dizer que muitas empresas também não tenham utilizado de má fé pra tentar ludibriar o cidadão comum, mesmo jogando com o livro de regras embaixo do braço. Isso é muito bem exemplificado no vídeo sobre a Farsa da Indústria dos Laticínios, do canal Estudo de Caso. Nele, o Gabriel mostra uma série de estratégias da indústria láctea pra enganar o consumidor.
Em qualquer supermercado atualmente, é possível encontrar o reflexo dessas táticas nas prateleiras. A seção de leite agora tem um produto novo, a bebida láctea, feita à base do soro do leite e bem menos nutritiva que o leite comum. Já nas gôndolas de leite condensado, o tradicional produto usado em tantas receitas queridas dos brasileiros, como brigadeiro e pudim, agora é acompanhado de um primo “pobre”: a mistura láctea.
Pobre em nutrientes, pobre em sabor e pobre em bom senso. Isso porque é bem fácil confundir essa embalagem de leite condensado, com essa embalagem da mistura láctea – mesmo sendo totalmente diferentes em composição e processo de fabricação. As embalagens são praticamente iguais, e ficam lado a lado nas prateleiras – por que?
Pra enganar quem não presta atenção nas letras miúdas. Falando do ponto de vista estritamente técnico e legal, esses produtos não podem ser considerados uma fraude, já que suas embalagens informam sua composição e identificam que é um produto diferente. Mas na prática, fica muito claro que a semelhança intencional das embalagens é uma evidente tentativa de enganar o consumidor.
Não à toa, é possível encontrar uma infinidade de artigos e matérias na internet basicamente com a mesma mensagem: “mistura láctea NÃO é leite condensado! ” Esses novos produtos são feitos com o objetivo de parecerem apenas um substituto mais barato das versões originais, mas geralmente são completamente diferentes, e muitas vezes só possuem uma fração do produto original na sua composição. Como essa manteiga, que na verdade não é manteiga, e sim um “alimento à base de manteiga e creme vegetal”.
Além disso, algumas empresas ajustam seus rótulos minuciosamente pra anunciar coisas que muitas vezes não são exatamente verdade. É o caso do achocolatado Nescau, que ganhou uma versão Light. A versão Light promete conter 30% menos calorias, só que a coisa não é bem assim.
Como explica a chef Carolina Garofani, ao comparar as tabelas nutricionais das duas versões, é possível ver que a porção sugerida na versão light é quase a metade da original, e na versão light é considerado a mistura feita com leite desnatado, enquanto na versão normal com leite semi desnatado. Ou seja, você vai obter os 30% a menos de calorias somente se você diminuir a porção pela metade e usar outro leite. Na comparação grama por grama das duas versões, a diferença real não passa dos 10% de calorias.
A embalagem do produto meio que explica isso, mas tá tudo embaralhado numa sopa de letrinhas minúsculas que eles sabem que ninguém vai ler. Novamente, isso não é ilegal, as informações tão todas lá, mas algumas empresas jogam no limite da lei pra se safar com jogadas como essa. Isso aconteceu comigo recentemente, quando fui comprar um azeite de oliva no mercado e acabei levando esse aqui, o mais barato.
Confesso que eu não li direito a embalagem, que por sinal era de plástico porém no exato mesmo formato dos outros azeites, além de ser vendido entre eles, o que me pareceu uma justificativa para o preço mais em conta. Ao ver o produto em uma prateleira cheia de produtos semelhantes, nós acabamos perdendo os detalhes, ao chegar em casa e ver o produto sozinho, vi que na prática só 5% dele é de oliva, e provavelmente sua virgindade foi perdida. Então, como lidar com tantos tipos de fraude, legais e ilegais?
Não tem outro jeito, o consumidor tem que ter o triplo de atenção ao fazer compras, especialmente quando se tratam de alimentos comumente fraudados, como pescados, azeite, alimentos lácteos, carnes e café. Um aliado do consumidor pode ser o aplicativo Desrotulando, que ajuda a fornecer informações precisas sobre os vários produtos do mercado, através de um simples scan do código de barras. Pra um melhor combate a esse crime, também é necessário informar às autoridades caso se depare com um item suspeito, recorrendo a órgãos como a Anvisa, o Procon, ou o Inmetro.
Se você não sabia que esse tipo de crime e artimanha ocorre bem diante dos seus olhos, é provável que as pessoas à sua volta, que vão ao mercado todos os dias, também não saibam. Por isso, se esse vídeo abriu seus olhos, é importante que você compartilhe com quem você mais se importa: sua família e amigos próximos. O fato é que sempre haverá criminosos dispostos a lucrar a qualquer custo, mesmo que esse custo seja a saúde de outras pessoas.
Mas agora que você sabe um pouco mais sobre como ocorre a fraude alimentar, pode ficar um pouco mais fácil analisar aquilo que vai pro seu carrinho de compras, e pro seu corpo. Me diz aí, o que você achou desse vídeo? Comenta aqui embaixo e dá uma olhada no que o pessoal tá falando.
Se você quiser descobrir o que eu chamo de Algoritmo Humano e como você pode usar ele pra levar um canal no youtube de 0 a 100 mil inscritos, confere uma aula grátis no primeiro link da descrição, ou apontando a câmera do seu celular pro QR code que tá na tela antes que essa aula saia do ar. Agora pra descobrir quais são as artimanhas da indústria farmacêutica pra lucrar o máximo possível, mesmo que isso possa custar a sua saúde, confere esse vídeo que tá aqui na tela. Aperta nele que eu te vejo lá em alguns segundos.
Por esse vídeo é isso, um grande abraço e até mais.