Sócrates e a verdade - INÉDITA PAMONHA #11

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Clóvis de Barros
Neste episódio: aprenda sobre o método socrático e a constante busca pelas verdades do mundo. Se in...
Video Transcript:
[Acorde de violão] [Buzina de carro] Começa agora Inédita Pamonha, por instantes felizes, virginais e irrepetíveis. [Fundo musical] Hoje é quinta-feira, dia do nosso Inédita Pamonha. Seja muito bem-vindo.
Nós continuamos sob o patrocínio dos nossos amigos: Aché Profuse, Eastman Chemical do Brasil e BNP Paribas Asset Management. [Fundo musical] Não são poucos ao longo da história do pensamento aqueles que garantem que a vida será melhor se você passar a vida pensando sobre ela. Alguns terão dito, como Sócrates, que quando a vida não é refletida ela não mereceu ser vivida, assim uma vida vivida no piloto automático, uma vida vivida sem reflexão.
Uma vida sem um pensamento que garantiu as tomadas de decisão é uma vida que merece ser jogada no lixo. É isso que nós podemos entender do que Sócrates nos ensina. Aí você e eu nos olhamos e nos perguntamos, mas olha observando a própria vida e encarando as nossas experiências percebemos que o pensamento nos acompanha o tempo todo, e é quase o tempo todo que pensamos sobre a vida que vivemos.
Assim ao acordar nós constatamos o atraso, vamos imediatamente ao banheiro e constatamos que já não há mais pasta de dente. Percebemos que por causa do atraso vamos ter que pular o café da manhã. Nos vestimos em função da meteorologia presumida, saímos de casa e pensamos no melhor caminho para chegar até o ponto do destino e assim por diante.
Você percebe que o nosso cotidiano é atravessado por pensamentos sobre a vida. Você então pergunta, mas será que é disso que eles estão falando? Os sábios?
Será que Sócrates se referia a esse cotidiano comezinho sobre o qual pensamos todo o tempo? Olha eu penso que não, porque no final das contas se fosse para aconselhar o pensamento sobre esse cotidiano miúdo não precisava ser Sócrates. Todos nós sabemos que é preciso tomar decisões para tocar o dia até o final.
E depois, vamos combinar, um pensamento que garanta uma vida digna, uma vida boa, uma vida nobre, esse pensamento do cotidiano todo mundo faz. E não é todo mundo que tem uma vida digna, boa e nobre, por isso podemos deduzir que Sócrates e todos os seus herdeiros discípulos talvez estivessem falando de outra coisa. [Fundo musical] Mas então do que será, a que será que se referem?
Bem, penso eu que este pensamento, esta reflexão sobre a vida a que ele se refere não tem a ver com o nosso cotidiano, tão pouco tem a ver com as nossas experiências mais triviais. E por quê? Porque o que Sócrates cobra de nós é é justamente a certeza de que esse trivial do mundo percebido, do mundo das sensações é insuficiente para a vida boa, e portanto precisamos ir mais longe.
Precisamos alcançar um outro patamar de reflexão, este sim garantidor de mais lucidez, e portanto, uma vida com essa lucidez mais dignificada. Professor eu realmente não entendi o que é esse patamar. Então vamos partir de um exemplo, esse exemplo nos ajudará.
Imagine que você a vida inteira teve um amigo, morava perto de você, ia com você para escola voltava com você da escola, no final de semana estudavam juntos, quando tinha grupo na sala fazia um grupo sempre, era ele que sempre te chamava para compor o time. E olha que você sempre foi ruim de bola, mas ele sempre te chamava e depois era você que passava a cola para ele e, mais do que isso, os dois tiveram as primeiras intimidades com a mesma moça, não no mesmo momento, em momentos diferentes, o fato é que a mesma moça namorou os dois. Aí você olha e diz: Pô esse é meu parça, esse é meu amigo.
Mas você tá chateado com ele porque ele tem pisado na bola com você. Você que resolveu aprontar uma estripulia para o professor de geografia e resolveu sumir com a caneta dele no intervalo, porque percebeu que ele tinha muito carinho por aquela caneta de tinta verde, escrita fina. E você então deu um perdido na caneta.
E aí, você que achava que a classe ia te apoiar naquela pirueta, eis que a classe te denuncia e com a liderança do teu amigo. Aí você fica super chateado e não sabe se interrompe a amizade, o que te deixa triste porque ele é o teu parça maior, ou se continua amigo que também te deixa triste porque amigos não fazem o que ele fez. E você tá nessa dúvida que é uma dúvida prática, é uma dúvida concreta do dia a dia e das experiências da vida e você encontra Sócrates pelo caminho.
Você encontra Sócrates pelo caminho e provavelmente o que será que ele perguntaria para você? Eu penso que ele perguntaria assim: você tem certeza que este cidadão, esse seu parça da cola, da namorada, do time de futebol, ele era mesmo seu amigo? E aí você diz: lógico que tenho certeza, é meu melhor amigo, não há dúvida.
Nesse momento eu suponho que Sócrates então perguntasse: então, se você tem tanta certeza que ele é teu amigo é porque você certamente sabe o que é a amizade. Porque é claro, só sabendo o que é a amizade que você poderá ter certeza sobre a amizade com esse teu amigo e também certeza sobre qualquer outra relação que se pretenda amistosa. Aí você olha e diz: lógico que eu sei o que é amizade, a gente mora perto, a gente estuda junto, a gente tem muitas coisas em comum e a gente está sempre junto etc.
E aí Sócrates começa: o fato de morar perto faz com que haja necessariamente amizade? Você diz não, claro que não. O fato de estar na mesma classe faz com que haja amizade?
Não, não necessariamente não. O fato de passar cola assegura uma relação de amizade? Não, também não, não há necessidade de ser amigo pra passar cola.
O fato de jogar no mesmo time de futebol também garante necessariamente amizade? Não. E também ter tido iniciação com a mesma moça também não.
Então, uai, então você não sabe o que é a amizade. Na hora que você se da conta que os elementos que você apresentou para definir amizade são inconsistentes, você então é obrigado a aceitar que não sabe o que é a amizade. E aí, você também concordará com Sócrates, se você não sabe o que é amizade, não pode ter certeza a respeito da relação com o seu amigo, porque é preciso saber o que é a amizade para identificar a amizade nesta relação particular.
[Fundo musical] O que Sócrates está tentando mostrar para você é justamente isso. Existe uma ideia, um conceito e uma verdade a respeito da amizade, e é esta verdade que contamina, que respinga amizade por todos os casos concretos. Na hora que você não sabe o que é a amizade, eu diria para falar simples, na sua universalidade e não no caso particular, você não pode identificar no caso particular nenhuma amizade.
Você olha em desespero e sabe por quê? Porque talvez você tenha entendido que o problema não termina aí na amizade com o seu amigo, você levanta a mão e cobra de Sócrates: bom, então você sabichão, já que eu não sei o que é amizade me diga o que é para eu poder checar se o meu amigo sempre foi meu amigo mesmo ou não. E aí Sócrates olha para você com um sorrisinho maroto e diz: também não sei o que é, no final das contas eu estou aqui para gente pensar junto, quem sabe a gente descobrir juntos, mas por enquanto estamos apenas denunciando a inconsistência do que você pensava antes.
Nessa incerteza sobre amizade você permanece hesitante sobre a natureza da relação com este seu colega que por enquanto ainda não é amigo, a menos que descubramos juntos o que é a verdade sobre a amizade. Isto é, aquilo que toda relação tem que ter para poder se auto denominar de amizade. O problema não para aí porque quantas vezes esse seu parça te ligou porque saiu na balada, você não é muito disso, e encontrou uma de atributos assim de contorno de curvas assim inesquecíveis, e aí você voltou fissurado, ou ele, né?
Voltou fissurado e te ligou de madrugada para contar que tava apaixonado pela enésima vez, porque tinha encontrado uma pessoa maravilhosa, lindíssima, espetacular etc. Você então naturalmente ouve, acredita no que ele tá falando e ele continua, 10 sobre 10, 20 sobre 10, nunca vi nada mais maravilhoso, e você diz: beleza então, amanhã a gente conversa eu vou dormir. Se você ao invés de ter ligado para o seu parça tivesse ligado para Sócrates, provavelmente ele teria perguntado: escuta, era bonita mesmo?
Nossa você não tem noção velho, você não tem noção. Sócrates então olharia, ouviria né? Porque é no telefone, e ele então diria: bom, se você tem tanta certeza eu só posso supor que você sabe com absoluta fluência, nitidez, clareza o o que é a beleza.
Porque só sabendo o que é o belo que você pode ter tanta certeza sobre o belo e a beleza na pessoa que você encontrou, se você não sabe o que é o belo, evidentemente que tá chutando pode estar muito equivocado. E aí você vira e fala: é lógico que eu sei o que é a beleza, você não viu, eu tirei umas fotos, eu vou te mandar, vê aí no Whats é incrível etc. E aí pergunta: mas escuta, quais são esses atributos?
Olha só o comprimento, olha a espessura, olha a textura, olha a cor, olha não sei o que, olha não sei o que lá. E Sócrates começa: então para haver beleza precisa ter essa estatura? Não necessariamente.
Precisa ter essa com de cabelo? Não necessariamente. Precisa ter essa cor de olhos?
Não necessariamente. Precisa ter essa textura de pele? Não necessariamente.
Precisa de. . .
Não necessariamente. E tal como no caso da amizade, Sócrates termina o questionário concluindo que você não sabe o que a beleza. Não sabendo que é a beleza, também não sabe identificar o belo no mundo.
[Fundo musical] Puxa vida, não é possível que você não tenha se dado conta. A tal da vida refletida que torna digna a vida dos humanos, o tal do pensamento bom para vida boa não é constatar que acabou a pasta de dente, é ir atrás das verdades que projetam suas sombras no interior da caverna das nossas percepções sensíveis. É ir atrás do que é o belo, é ir atrás do que é amizade, e alguém um dia perguntou ainda para Sócrates: será que é possível ensinar a coragem a alguém?
Ou ensinar a alguém a ser corajoso? E claro, Sócrates perguntou: meu, se você quer ensinar alguém a coragem, ser corajoso, eu só posso supor que você saiba muito bem o que é a coragem, e aí de novo mesmo problema. Portanto Sócrates nos convida a sair da caverna, isto é, a sair do particular, a sair do cata milho dos encontros particulares com o mundo e ir atrás de verdades que permitirão sim entender o mundo muito melhor.
Só entenderemos o funcionamento do mundo, que para os gregos é sempre um bicho grande, e ordenado, e harmonioso, se pudermos, através das verdades das coisas, pudermos estruturá-las, organizá-las, relacioná-las e aí sim com sabedoria compreender não só como o mundo funciona, mas também qual é o nosso papel, qual é o nosso lugar, qual é a nossa função "ergon" neste mesmo mundo. Por isso, pensar bem sobre a vida e ir atrás das verdades do mundo parece mesmo ser, segundo Sócrates, condição para uma vida bem vivida. [Fundo musical] Este foi o seu Inédita Pamonha desta irrepetível quinta-feira.
Muitíssimo obrigado pela sua audiência, mais ainda obrigado aos nossos patrocinadores: Aché Profuse, Eastman Chemical do Brasil e BNP Paribas Asset Management. que com sua iniciativa, disposição, apreço e generosidade conseguem viabilizar essa mensagem para tanta gente. Agora só quinta que vem e se você gostou, somente neste caso, estaremos juntos novamente.
Valeu! Você ouviu o Inédita Pamonha, por Clóvis de Barros Filho, trazido até você pela revista INSPIRE-C. Acesse: www.
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Este podcast foi editado por Rádiofobia - Podcast e Multimídia.
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