Queridos irmãos, nós, na sexta-feira, a liturgia nos fez meditar sobre o jejum; ontem, segunda-feira, sobre a esmola; hoje, sobre a oração. Portanto, ainda dentro da primeira semana depois de Cinzas, nós retornamos às três práticas quaresmais, as quais Jesus nos ensinou, nos impôs, de algum modo, como lei, como norma. Naquele dia, porém, hoje nós nos focamos mais na oração.
Quando orardes, não useis muitas palavras. Oração não é questão de palavra, não é um discurso diante de Deus. Eu não sou um parlamentar que precisa fazer um discurso, provar alguma coisa.
Não, vosso Pai sabe do que precisais. Vós deveis rezar assim: Pai Nosso. Rezar o Pai Nosso é um milagre; que alguém consiga rezá-lo é um milagre.
E eu posso dizer que só um santo pode rezar realmente o Pai Nosso, no sentido de que recitá-lo é fácil, mas rezá-lo no sentido profundo dessa palavra, desde as profundezas do ser, é um milagre. Porque chamar a Deus de Pai não é coisa nossa. Para conhecer Deus Pai, eu preciso ser Jesus Cristo.
Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar. Ou seja, eu preciso me identificar de tal modo com Cristo, a minha personalidade precisa ser de tal modo absorvida na d'Ele, que nele eu possa dizer: Pai Nosso. Mas eu só posso dizê-lo se o Espírito Santo me revelar que Ele é o Pai.
São Paulo diz na carta aos Romanos que Ele enviou aos nossos corações o Espírito do Seu Filho, que clama: "Abba, Pai". É o Espírito Santo que nos diz: Pai Nosso, porque só Deus pode nos fazer chamar Deus de Pai. Ao ser que transcende a todos os seres, cuja imensidão é infinita, que é inominável, grande em sua completa extensão, Deus é o oceano do ser mais profundo, incomensurável.
E não apenas isso; é infinito. Não é à toa que alguns autores o chamam de substância, que Ele está acima de qualquer coisa. Chamar a esse Deus de Pai, só o Espírito Santo pode nos fazer dizer: Pai Nosso, entendendo o que isso significa.
Pai Nosso não é o meu humano; não sou eu, homem, com a minha natureza humana, simplesmente, que digo isso. É uma ousadia; é uma ousadia para a qual Ele nos convida, a qual Ele nos eleva. E é por isso que, quando eu digo: Pai Nosso, em Cristo, no Filho, sendo eu Filho no Filho, Filho na filiação eterna do Filho, eu posso dizer, como o Filho: "Santificado seja o Teu nome".
Essa é a minha primeira intenção; essa é a minha verdadeira obsessão: Pai, glorifica o Teu nome! Pai, eu Te agradeço porque me [Música] ouviste, mas não Te agradeço por mim, porque sei que sempre me escutas, mas para que creiam aqueles que Tu me deste. Pai, glorifica o Teu nome com a glória que Tu me deste antes da fundação do mundo.
A minha obsessão é que Deus seja glorificado em tudo, por tudo, que tudo, como provém dele, volte para Ele e que toda a glória possa subir para aquele que é a razão de toda a glória. Mas, para que Ele seja glorificado, o Seu nome seja santificado, eu digo: vem o Teu reino. Ou seja, nós queremos que Tu, a todos, como uma grande família de filhos, nós, irmãos, debaixo do amor, do cuidado e da ternura da Tua paternidade, venhas.
O Teu reino, és Tu que tens que governar, não no sentido político, mas no sentido espiritual, mísitico; é o Teu governo, é o Teu cuidado. E o único modo para que isso aconteça é: seja feita a Tua vontade. O meu alimento é fazer a vontade do Pai.
Esta é a vontade daquele que me enviou: que eu não perca nenhum daqueles que Ele me deu. A vontade divina eu não vivo para fazer o que eu quero, e nem quero fazer o que eu acho; eu quero ser como uma pluma levada pelo vento. O vento sopra onde quer, e ouve o seu ruído, mas não sabes de onde vem nem para onde vai.
Assim é todo aquele que nasceu, aquele que foi gerado do Espírito, aquele que pode chamar a Deus de seu Pai. Eu quero ser guiado pelo Pai; a vontade d'Ele é o meu impulso, é o meu alimento, é o que me mantém vivo. Como a Arca de Noé, que não tinha leme, que era uma caixa imensa que ia sendo levada pelo vento, pelas ondas, eu quero ser conduzido pela divina vontade.
Não tenho nem mais o que querer, porque quando a minha vontade está unida a d'Ele, a minha vontade se aquieta. Eu já não quero nada que Ele não queira, e tudo que Ele quer é o meu querer. É como se o meu ser fosse lado de tal modo que eu fluísse apenas no impulso da vontade eterna d'Ele.
O pão nosso de cada dia nos dá hoje. Eu não quero uma mansão, nem um carro, nem um navio, nem prestígio; só me dá o pão para hoje, o pão que me sustenta na caminhada, já que só o Senhor sabe o que eu preciso. Me dá o pão, esse pão, esse pão que ninguém tem, esse maná caído do céu que chega todo dia, que também é a Tua palavra, porque nem só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus.
Mas me dá o pão para hoje. Eu quero palavra fresca, eu quero providência para agora. Eu não quero fazer reservatórios ou colocar ouro nos bolsos, porque a traça e a ferrugem consomem tudo isso, e os ladrões podem roubá-lo.
Eu quero ser como a erva do campo, como os lírios, que nem o Rei Salomão pode se vestir igual a eles. Como os pardais, que são sustentados por Ele. Perdoa as nossas ofensas.
Quando eu olho para Ti, eu vejo amor, cuidado, santidade. E quando. .
. Eu olho para mim, eu vejo miséria. Eu vejo um coração tão egoísta, tão autocentrado, tão preocupado com as suas próprias mesquinharias.
Olhando para mim, eu não posso dizer outra coisa senão perdão; e não apenas perdão pelo que eu fiz, mas perdão por quem eu sou. Porque uma vez que eu te ofendi e reiterei essas ofensas tantas vezes, e o justo cai sete vezes por dia, a minha existência só pode residir num lugar chamado arrependimento. É onde eu moro, é onde eu vivo, é onde eu estou, de onde nunca vou sair.
E quando tu me levares pro céu, outra coisa eu não serei senão um pecador que se converteu, um pecador arrependido. Eles conservaram as suas vestes brancas porque as alvejaram com o sangue do cordeiro. Eu al vejo todo dia quando eu me arrependo e sei que o que me salva é o sangue.
Mas eu não quero perdão só para mim; eu perdoo a todo mundo, irrestritamente, sem nenhuma reserva. O meu coração só quer uma coisa: pai, perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem. Eu explodo num grito angustiado: eu quero que todos os homens se salvem, cheguem ao conhecimento da verdade.
Eu não quero criar nenhum tipo de separação, [Música], nenhuma sessão Premium Vip onde apenas eu estou. Eu não quero reter perdão; eu quero perdoar, perdoar, perdoar. Essa cachoeira que cai sobre mim tem que cair através de mim.
Eu só tenho misericórdia para pedir para todos porque eu sou miserável. Só te peço que não me deixes cair em tentação e que me livres do mal. A prova vem, a dificuldade vem, e como diz São Tiago, a prova da vossa fé produz paciência.
A prova não é a prova minha; é a prova da minha fé. Então não me deixa cair, não me deixa perder a fé, não me deixa claudicar naquilo de mais importante que eu tenho, que é a minha dependência radical de Ti. Eu só quero estar em Ti.
Me livra do mal, eu não quero ser perverso, eu não quero ser uma imagem do diabo. Eu quero ser uma imagem Tua, eu quero ser filho Teu; e ser Teu filho é viver na verdade de quem eu sou: um nada que é elevado à condição sublime de ser participante da Tua vida. Ao contrário, ser filho do diabo é viver na mentira de que eu sou alguma coisa autonomamente fora de Ti.
Já não sou mais eu que vivo; é Cristo que vive em mim. Dizer o Pai Nosso já não ter mais intenção própria; se perder em Deus é andar completamente esquecido de si mesmo e totalmente focalizado em quem Ele é. Vibrar pra eternidade, ser como a profundeza do mar que se [Música] expressa no fluxo das ondas, indo para Deus com todo o ser.
Caindo sobre Ele: lançai sobre Ele toda a vossa preocupação, porque Ele tem cuidado de vós. Isso é dizer o Pai Nosso. É estar de tal modo impregnado de Cristo, embebido d'Ele, que eu já não tenho mais oração minha para fazer.
Eu rezo a Deus porque eu me perdi Nele. A minha vida está totalmente subsumida na d'Ele, e a única coisa que eu posso fazer é voltar pro meu lugar e, como uma criança pequena, dizer: aba, aba, aba, pai, pai, pai. Essa é a vida de oração, isso é oração.
Pro evangelho, que nós sejamos menos egoístas; ou seja, que o nosso ser possa efetivamente desaguar em Cristo Jesus. Então nós vamos começar a orar. Se não for assim, a oração é tão somente palavras, palavras como os pagãos fazem.
Palavras não são um ser que vibra de amor, não é uma existência que está continuamente latejando de amor por esse Deus eterno que, no Cristo, nos admitiu como filhos. É isso. O que não for isso pro evangelho, não é oração.
É como diz Santa Teresa: um chacoalhar de latas.