'Isso é fake news, não dá pra confiar'. Já ouviu alguma coisa assim? Esse termo em inglês, 'fake news', que em português significa literalmente 'notícia falsa' virou meio que um saco de gatos pra falar de um monte de coisa: boato, rumor, manipulação, distorção, opinião disfarçada de notícia.
Virou também arma política: se a pessoa não concorda com a notícia, mesmo que verdadeira, já declara: 'é fake news'. Conteúdo falso existe desde as civilizações antigas. Governos, por exemplo, lançavam informações falsas para desestabilizar inimigos, mudar rumos de guerras E qual é a diferença agora?
Com a internet e as redes sociais, mensagens falsas são espalhadas com uma rapidez incrível. Eleição americana de 2016: Donald Trump derrota Hillary Clinton. Foi ali que o debate sobre conteúdo falso veio à tona E não foi à toa.
Sabe qual foi o link mais compartilhado na campanha eleitoral? Papa choca o mundo e apoia a candidatura de Trump. Link visto aí por quase 1 milhão de pessoas no Facebook.
Era falso. O papa nunca apoiou nenhum dos dois candidatos. Investigações descobriram que por trás dessa e de outras manchetes falsas estavam.
. . adolescentes da Macedônia, que fica bem longe dos Estados Unidos Eles ganharam dinheiro inventando notícias sobre as eleições americanas Colecionavam cliques e atraíam o dinheiro de publicidade.
E aí você pode pensar: 'Ah, bastava o Vaticano negar que o papa apoiava Trump'. O problema é que normalmente o desmentido não provoca a mesma corrida por compartilhamentos que a mentira. Quem estuda esse assunto explica que as notícias falsas tendem a mexer com as nossas emoções.
Nos fazem sentir raiva, medo, grande surpresa. E isso aumenta a nossa vontade de compartilhar aquele conteúdo para extravasar aquela emoção. A universidade americana MIT analisou a retransmissão de notícias pelo Twitter e identificou que os links com conteúdo falso tinham 70% mais chances de serem compartilhados pelos usuários do que os links com notícias reais.
E aí tem um outro fenômeno: um ciclo vicioso. Quanto mais vezes a gente vê aquela informação circular, mais ela se cristaliza na nossa memória e fica mais difícil se convencer de que ela é falsa Mas até agora a gente só deu o exemplo do papa. Você pode pensar: 'ah, não me interesso por política, não tô nem aí pra opinião do papa'.
O problema é que o impacto dessas mensagens falsas pode ser bastante real e trágico Veja esse exemplo: Guarujá, 2014 Esse post foi compartilhado com aquele típico tom alarmista, que gera medo, emoção. 'Boatos rolam na região da praia do Pernambuco, Maré Mansa, Vila Rã e Areião que uma mulher está raptando crianças para realizar magia negra. Durante toda essa semana, recebemos diversas mensagens de seguidores sobre o fato.
Se é boato ou não, devemos ficar em alerta'. 'Divulgue para todo mundo, vamos compartilhar, isso a imprensa não mostra' Usam muito isso Primeiro vamos aos fatos: o retrato falado era na verdade de um crime ocorrido em 2012 no Rio de Janeiro. Ou seja, uma foto tirada de seu contexto original foi usada dois anos depois para promover uma mentira.
Se o site que transformou o boato em post no facebook tivesse telefonado para a polícia, descobriria que não havia sido registrado nenhum rapto de crianças na região. Mas a boataria na internet acabou fazendo com que moradores do Guarujá confundissem uma mulher inocente com a do retrato falado. E ela foi espancada até a morte.
E esse não é um problema exclusivo do Brasil. Nathalia Passarinho, é com você Agora, olha só esse vídeo: fazia parte de uma campanha para conscientizar os pais dos riscos de deixar filhos sozinhos. Mostrava um ator sequestrando uma criança e depois retornando ao local com dizeres em uma placa: 'basta um momento para uma criança ser sequestrada nas ruas de Karachi' Mas a parte do vídeo em que o ator voltava com a criança foi retirada e um novo vídeo foi compartilhado como se mostrasse o flagrante de um sequestro Usava o mesmo tipo de linguagem alarmista do caso do Brasil.
Viralizou e criou pânico. Ao menos 29 pessoas morreram em 2018 vítimas de linchamentos em vilarejos da Índia, onde circularam boatos de WhatsApp sobre supostos sequestradores de crianças A área de saúde também é alvo frequente das mensagens falsas. É mensagem falando de remédios milagrosos ou até que vacina não funciona.
Tudo sem confirmação científica E pra fake news tem remédio? O jornalista pode e deve entrar aí pra combater a informação falsa. Pra isso, é fundamental ouvir especialistas.
Olha aí o que diz a cientista Maria Augusta Arruda-Bullock, da Universidade de Nottingham, na Inglaterra, sobre o boato sobre vacinas O desenvolvimento de vacinas foi um grande advento da medicina moderna, que evita a morte de milhões, bilhões de pessoas Infelizmente, nas últimas décadas, muitas pessoas estão lançando fake news, atacando a vacinação, principalmente a vacinação infantil, o que é um grande erro Traz a reemergência de doenças como sarampo, coqueluche, rubéola Então, a melhor maneira de se atacar essas fake news é dividir com a comunidade como é importante a vacinação e como essa campanha que chamam de 'anti-vaccine' é nociva e é um problema de saúde pública Vamos fazer uma pausa agora para um exercício em sala. Pausa aqui, dá uma olhada no material que a gente preparou para você analisar. Tem um link na descrição do vídeo Uma pesquisa feita no Facebook, por um grupo de universidades nos Estados Unidos indica que usuários mais velhos, com mais de 65 anos, tendem a compartilhar mensagens falsas com muito mais frequência do que o grupo mais jovem, de 18 a 29 anos.
A pesquisa mostrou que quanto mais jovem menor chance de o usuário compartilhar tais fake news O problema é que muitas vezes não se trata apenas de determinar se algo é verdadeiro ou falso. O que se vê muito é opinião disfarçada de fato, de verdade. É por isso que eu vou falar agora sobre algo bem beeem básico A diferença entre fato e opinião.
Por exemplo, a temperatura hoje no Rio ultrapassou os 40 graus. Nossa jornalista na cidade, Júlia Carneiro viu nos termômetros e confirmou com o Instituto Nacional de Meteorologia, que mede a temperatura de forma científica: fato. Aí imagine que eu converso com a Júlia e ela me diz: 'Eu adoro o verão'.
Opinião dela. Tem gente que pensa de forma oposta, por diversos motivos. O verão pode ser bom, por exemplo, pro vendedor de bíquini e ruim pro vendedor de casaco São opiniões.
Mas vamos falar de um tema que costuma causar mais polêmica: futebol E de como diferentes fatos podem sustentar diferentes opiniões Meu colega Thomas Pappon diz, por exemplo, que o Palmeiras é o melhor time do Brasil É o clube com maior número de conquistas nacionais: são 13 títulos de Campeonato Brasileiro e Copa do Brasil. Fica à frente do Corinthians nesse quesito Já meu colega Adriano Brito. .
. Pera aí. .
. o melhor time é o São Paulo, afinal são três títulos mundiais Mas aí vem a Juliana Iotti e. .
. Não, gente, para, para tudo. .
. O melhor time do Brasil é o Flamengo, é a maior torcida, voz do povo é a voz de deus. É o seguinte, como dizia o meu pai, entendeu, eu não entendo por que que algumas pessoas, algumas pessoas, não são Flamengo.
Não consigo entender, não dá pra entender. Note aí que cada um trouxe um fato verdadeiro para sustentar uma opinião pessoal. Então, antes de uma troca de ideias, é importante saber que fatos estamos usando pra sustentar conclusões: títulos nacionais, títulos internacionais, tamanho da torcida.
Para ajudar, a gente pode considerar que os dados são fatos e que a opinião são as ideias construídas pelas pessoas a partir dos fatos. Mas também de acordo com a visão de mundo que cada um tem. Às vezes, crenças religiosas.
O importante é saber diferenciar, identificar o que influencia uma opinião. E não ganha discussão quem escreve só com letra maiúscula. No jornalismo, a gente traz fatos, análises e várias opiniões.
É importante que você saiba identificar esses elementos em texto e consiga fazer uma leitura crítica. As opiniões refletem uma diversidade de vozes? Não gostou, não entendeu?
Reclama. . .
Você não vai conseguir reclamar com quem inventou uma mentira no WhatsApp, mas você sabe onde encontrar a gente Vamos destacar exemplos comuns de conteúdo falso e mostrar como você pode fazer um trabalho bem simples de detetive São três técnicas que qualquer um pode aprender: busca por palavras-chave, busca por imagem e verificação de informações simples, como a data de publicação, a autoria do conteúdo da reportagem e origem. Pode ser áudio, meme, vídeo. Recebeu um áudio chocante no WhatsApp?
Pesquise palavras-chave do conteúdo do áudio em um site de buscas pra ver o que já foi dito a respeito Pode ser que o áudio já tenha sido desmascarado ou que você encontre dados que provem se ele é verdadeiro ou falso. Ouça esse que circulou em 2015: 'Eu não sei se vocês estão sabendo da história do bichinho do feijão, que está correndo. .
. O que está sendo solicitado: coloque o feijão de molho 30 minutos com o vinagre, depois desses 30 minutos você joga água fora, lava o feijão. .
. Ok? Vamos espalhar o máximo dessa notícia, porque quando recebi a primeira vez a gente não sabia se era verdade ou não.
Eu não gosto de arriscar, então comecei a tomar essas medidas em casa. E hoje eu tive essa notícia de que é verdade sim. Basta jogar as palavras-chave no Google: feijão, vinagre.
. . Olha o que vem: o esclarecimento da Fiocruz: 'boato sobre a superbactéria no feijão é falso' O primeiro alerta em relação ao áudio é a ausência de fontes e também da identificação do autor da voz por trás do áudio.
É um problema comum. Afinal, quem espalha mentira se beneficia do anonimato. E muitas vezes, quando o autor se identifica, você vai verificar e ele não existe.
E essa foto impactante? É meio suspeita? 'Ceará tomado pelo PCC, pelo caos e destruição'.
Janeiro, 2019 Dá para descobrir se a imagem já foi usada antes. Salve a imagem e jogue na busca reversa de imagens do Google ou em sites como TinEye O mesmo recurso pode ser usado para fotos e notícias Reutilizar fotos da internet é uma tática muito comum. Então, essa busca reversa costuma ter resultados bem surpreendentes Colômbia em agosto de 2010.
Uma forte explosão atingiu o norte de Bogotá Às vezes, no entanto, a foto é modificada, como ocorreu com essa usada em um perfil falso criado para falar bem de políticos. Aí fica difícil de rastrear E uma notícia ou um meme que está viralizando? Tem como saber se é verdadeiro?
Veja se ela tem data e se a data está correta, porque pode ser uma reportagem velha sendo ressuscitada com a intenção de adulterar a percepção das pessoas, causar pânico desnecessário ou manipular opiniões. Esse post, por exemplo, circulou em 2016 Mas era baseado em uma reportagem de 2012, quatro anos antes. Ou seja, mesmo a notícia que na época era verdadeira ganha um contorno completamente falso quando ressurge anos depois.
E nunca deixe de se perguntar: quem escreveu isso? Se um texto não tem autor, criatura, quem se responsabiliza pelo que está escrito? Você nem sempre vai encontrar sozinho as respostas para todas as suas perguntas.
Combater informações falsas é um esforço conjunto, então conte com a gente pra isso. E temos uma última missão pra vocês: o jogo dos quatro erros. Dê uma olhada no material Você vai achar o link na descrição do vídeo.
Boa sorte. Espero que vocês tenham curtido e agora entendam um pouco mais sobre o trabalho do jornalista Quem sabe entre vocês a gente não tem aí futuros colegas de profissão Muito obrigada e até a próxima.