Como destruição do ambiente ameaça agricultura e expõe Brasil a clima extremo

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BBC News Brasil
O cenário climático para o Brasil nas próximas décadas não é nada animador. Viveremos secas cada v...
Video Transcript:
Esse tempo seco e quente que fez muita gente sofrer em boa parte do Brasil nestes últimos dias vai se tornar cada vez mais frequente por aqui nas próximas décadas, por causa da ação humana sobre o clima e o meio ambiente. Teremos de nos adaptar a secas cada vez mais prolongadas e extremos climáticos, que vão impactar o cotidiano de nós, brasileiros, e até a nossa produção de alimentos - colocando em risco o nosso status de gigante agrícola mundial. Eu sou Paula Adamo Idoeta, da BBC News Brasil em São Paulo, e neste vídeo eu falo sobre as consequências desse prognóstico sombrio.
Eu fiz uma enrevista com o cientista Carlos Nobre. Ele é um dos principais especialistas em clima do país. Foi pesquisador do Inpe, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, e hoje coordena o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para Mudanças Climáticas e preside o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas.
O motivo para a conversa foi a divulgação de dados alarmantes pela organização MapBiomas, mostrando que a superfície de área com água no Brasil está 15% menor em relação ao início dos anos 90. Na prática, é como se a gente tivesse perdido o equivalente a uma vez e meia a superfície de água de toda a região Nordeste. Como já sabemos, esse não é o único dado preocupante sobre o meio ambiente brasileiro.
Na Amazônia, o desmatamento acumulado dos últimos doze meses até julho atingiu sua pior marca em dez anos, segundo um levantamento recente do Instituto Imazon. Focos de incêndio também estão em alta no Cerrado, na Caatinga e na Mata Atlântica em relação ao mesmo período que no ano passado, segundo um estudo do Inpe. Eu cito esses dados porque eles estão interligados: quanto mais avança o desmatamento, justamente em um momento em que a temperatura média mundial está aumentando, menores vão ser as temporadas de chuva no Brasil.
O motivo: áreas desmatadas perdem a capacidade de reciclar água. A vegetação e as suas raízes que fazem o papel de absorver a água, transpirá-la e jogá-la de volta à atmosfera. Portanto, quanto mais incêndios e florestas derrubadas, mais seco e quente o clima.
O Carlos Nobre diz que os estudos já mostram com clareza que áreas desmatadas no sul da Amazônia, por exemplo, têm secas mais prolongadas, menos chuva e temperaturas cerca de 3 graus Celsius mais altas. Não dá para saber se serão mudanças permanentes, mas são mudanças que devem nos afetar nas próximas décadas. Isso mesmo que seja cumprida a difícil e ambiciosa meta do Acordo de Paris, de manter o aumento das temperaturas globais em no máximo 1,5 grau Celsius.
E na prática, qual vai ser o impacto dessas mudanças já em curso no Brasil? Eu vou resumir isso em três pontos: O risco de uma mudança drástica nos biomas brasileiros O risco de a nossa produção agrícola não suportar bem a escassez de água E os riscos trazidos pelos eventos climáticos extremos. Começando, então, pelos biomas brasileiros.
Segundo o Carlos Nobre, é nas regiões Norte, Centro-Oeste e Nordeste que serão sentidos com mais força o prolongamento das secas e a redução das temporadas de chuva. O grande perigo, diz o cientista, é grande parte da região deixar de ser semi-árida e se transformar em semi-deserto. O meu colega João Fellet falou disso num vídeo recente recente, mostrando como as mudanças climáticas estão acelerando a criação de um deserto do tamanho da Inglaterra na Caatinga brasileira.
São regiões em que a terra deixa de abrigar qualquer forma de vida. Eu vou deixar o vídeo do João aqui na descrição, depois dá uma olhada. Na Amazônia, estudos do qual Carlos Nobre participou apontam que, se o desmatamento continuar, vamos chegar a um ponto de não retorno, em que as características de uma floresta tropical exuberante serão perdidas e a região vai se transformar em uma savana, de mata bastante empobrecida.
E essa transformação, se ocorrer, é irreversível, diz o cientista. Isso porque só sobreviverão as espécies capazes de se adaptar ao clima mais seco. A vegetação tropical e sua fauna serão perdidas no caminho.
Em julho deste ano, um estudo publicado na revista Nature, que teve participação do Inpe, apontou que, por causa do desmatamento e das queimadas, a Amazônia já está emitindo mais gás carbônico do que consegue absorver. Ou seja, a floresta no estado atual de degradação virou uma emissora de CO2, em vez de uma aliada global na retenção de gases do efeito estufa. É por isso que, na opinião de Nobre, o maior desafio atual do Brasil é zerar rapidamente o desmatamento da Amazônia, para impedir que a floresta tropical seja permanentemente perdida.
O segundo impacto é no agronegócio, que representa mais ou menos um quarto de todo o Produto Interno Brasileiro. Segundo o Carlos Nobre, toda a estrutura de produção agrícola e pecuária do país também já está sendo e será cada vez mais impactada pela maior escassez de água e por um clima em desarranjo. Mesmo que se desenvolvam, por exemplo, variedades mais resistentes de grãos, “o clima está ganhando a guerra e a agricultura vai ter que se preparar para isso”, me disse o cientista.
O Nordeste, que citamos acima, é um exemplo disso. Esse avanço da desertificação pode fazer com que áreas importantes de produção agrícola fiquem completamente inviabilizadas, deixando apenas regiões à margem do rio São Francisco aptas para plantação. Dá para imaginar o impacto disso na vida de milhões de pessoas que dependem dessa produção para viver.
O Carlos Nobre também alertou que, se o mundo não tiver sucesso em manter o aumento da temperatura global em até 1,5 grau celsius, o ritmo atual de aquecimento pode fazer o Brasil deixar de ser uma potência agrícola mundial. Ele cita como exemplo a queda na produtividade da soja, em decorrência do ar mais quente que tem sido soprado da Amazônia, na região conhecida como Matopiba, que são áreas de Cerrado entre os Estados de Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. Chegamos ao nosso terceiro ponto: o dos eventos climáticos extremos Se no centro e no norte do Brasil as chuvas devem ficar mais escassas, a tendência é de que o mesmo não se repita em parte do Sudeste e Sul do país.
Essas regiões podem, na verdade, ver sua quantidade de chuvas aumentar nas próximas décadas, diz o pesquisador. De um lado, isso pode fazer com que essas regiões - que por sua localização já têm um clima um pouco menos quente que o restante do país - ganhem mais protagonismo na produção agrícola nacional. De outro, porém, elas também vão sofrer com os devastadores efeitos dos chamados eventos climáticos extremos, como chuvas torrenciais, secas prolongadas e ondas de calor.
Esses eventos climáticos têm se tornado mais frequentes em todo o mundo são também consequência direta do aquecimento global, como apontou o relatório mais recente do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU, o IPCC, divulgado no início de agosto. Algumas cenas recentes desses eventos extremos foram vistas na Europa, como as destruidoras enchentes na Alemanha, e na América do Norte, que viveu fortes ondas de calor. No Brasil, segundo o Carlos Nobre, mesmo que - hipoteticamente - não houvesse um aquecimento global em curso no mundo, os sucessivos recordes de desmatamento na Amazônia e no Pantanal já estariam tendo impactos muito ruins sobre o clima brasileiro.
Na prática, os dois fenômenos - desmatamento e aumento das temperaturas - têm ocorrido juntos, potencializando um ao outro. Se vai ficar difícil viver num Brasil - e num mundo - de clima cada vez mais instável, vou finalizar este vídeo com a recomendação principal do IPCC. Estamos em um momento de alerta vermelho para a humanidade e uma catástrofe só poderá ser evitada com reduções profundas nas emissões de gases estufa.
Tanto impedindo o desmatamento quanto parando de consumir combustíveis fósseis. Por hoje é só. Siga acompanhando nosso conteúdo no YouTube, nas redes sociais e no nosso site, o bbcbrasil.
com. Até a próxima!
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