Você já sentiu que o mundo ao seu redor está perdendo o juízo e que ninguém mais sabe a diferença entre emoção e descontrole? E se eu te dissesse que a histeria coletiva não é uma aberração do passado, mas o retrato vivo da sua timeline hoje? Respira fundo porque hoje nós vamos olhar nesse espelho e talvez você não goste do reflexo.
A psicologia de massas é, antes de tudo, a psicologia da renúncia ao juízo. Você vive na era do sensível hipertrofiado, onde cada incômodo vira trauma, cada desconforto vira gatilho e cada lágrima pública rende aplausos. Mas não se engane.
Isso não é liberdade emocional, é rendição psíquica. O mundo que você habita não premiou o sentir como potência interior, mas o transformou em espetáculo e em instrumento de manipulação. Freud, ainda em 1921, já nos alertava para essa rendição do sujeito à massa.
No seu ensaio, psicologia das massas e análise do ego, ele descreve um fenômeno perturbador, o desaparecimento do indivíduo diante do coletivo. A massa, o indivíduo abandona a sua singularidade, seus ideais, seus freios morais e adquire um sentimento de força invencível, pois se vê envolvido por um número que o absolve e o empurra. O que Freud percebe e o que você provavelmente se recusa a aceitar é que ao se infiltrar numa multidão, você não se fortalece como sujeito, você se dissolve.
Você entrega suas rédeas à vontade coletiva, que é sempre mais instintiva, mais pulsional e infinitamente mais irracional. O indivíduo isolado é capaz de arrependimento, de dúvida, de freio moral. Já o indivíduo em grupo, segundo Freud, age como se fosse hipnotizado.
Não há pensamento deliberado, só resposta automática. E não pense que isso se restringe a grandes eventos históricos ou revoluções populares. Essa dissolução do eu acontece todos os dias silenciosamente no seu celular.
Quando você adere a uma indignação coletiva sem checar os fatos. Quando você compartilha uma notícia escandalosa apenas porque todos estão comentando. Quando você se emociona com uma tragédia distante só porque ela viralizou.
Freud continua. A massa é extraordinariamente influenciável, crédula, incapaz de crítica, intolerante e só respeita a força e a autoridade. O que isso quer dizer na prática?
Que você, ao se deixar guiar por afetos coletivos, tende a seguir a autoridade aparente, a voz mais barulhenta, o perfil mais seguido, a figura que encarna o que você deseja ouvir. Não importa se está certa ou errada, o conteúdo pouco importa. O que importa é o contágio afetivo, é o calor do pertencimento, o alívio de não estar só.
Mas esse alívio cobra um preço altíssimo, o aniquilamento do pensamento individual. Você já não decide, você reage, já não escolhe, você acompanha. E o mais perverso, acha que está sendo autêntico quando está apenas reproduzindo ecos emocionais alheios.
Freud enfatiza que na massa os sentimentos são simplificados e exacerbados e o indivíduo passa a agir com impulsividade, instabilidade e sugestibilidade. Você já percebeu isso nos surtos de indignação instantânea que duram uma semana e depois desaparecem? Nas campanhas de linchamento virtual que parecem brotar do nada e terminam com pedidos de desculpa abafados.
Freud não está descrevendo apenas massas de rua ou movimentos políticos. Ele está falando do que hoje chamaríamos de cultura de manada, essa capacidade de um grupo transformar sentimentos frágeis em convicções inquestionáveis. Quando a emoção se agiganta a ponto de se tornar critério de verdade, a razão é exilada.
Talvez você ache que está imune, que é autônomo, crítico, atento, mas te faço uma pergunta incômoda. Quantas das suas opiniões você formou em silêncio, longe da aprovação de curtidas e compartilhamentos? Quantas vezes você sustentou um ponto de vista mesmo quando ele te custou isolamento?
Você pode não se considerar parte de uma massa histérica, mas se suas reações são sempre previsíveis, suas causas sempre populares, suas emoções sempre validadas por terceiros, então talvez você já tenha perdido o fio da sua própria consciência. E o mais grave, sem perceber. A massa não deseja a verdade, ela exige ilusões.
Sim, ilusões como a de que toda emoção é válida, toda dor é legítima, todo trauma é inquestionável. Mas Freud nos lembra que a mente humana não evolui só com acolhimento. Ela precisa de confronto, de resistência interna, de elaboração.
Quando uma cultura premia o imediatismo emocional e castiga a dúvida racional, ela não gera liberdade, ela produz servidão afetiva. Você acha que está se libertando ao se expressar sem freios, mas está apenas sendo domesticado por um sistema que lucra com o seu descontrole. Sentir é humano, sim, mas sentir sem pensar, sem elaborar, sem resistir, é infantilismo coletivo.
A pergunta então não é se você sente, mas se você é senhor dos seus sentimentos ou servo da emoção do momento. Porque no final, dizia Freud, a massa não é composta por monstros, mas por pessoas comuns que esqueceram como se pensa sozinhas. A sociedade moderna não apenas se abandona ao delírio coletivo, ela constrói, com zelo afetivo os instrumentos do seu próprio desamparo.
Não bastasse a rendição do pensamento à vontade difusa das massas, agora o próprio afeto é falsificado em escala industrial. E se você pensa que isso é metáfora ou exagero, olhe a sua volta. adultos cuidando de bonecos hiperrealistas, como se fossem filhos, atribuindo-lhes nomes, certidões e até consultas médicas.
Não, isso não é amor, isso é o desespero travestido de ternura. Sigmund Freud já havia apontado para a relação entre a carência afetiva e a idealização inconsciente de figuras substitutivas. No capítulo sete da obra, ele escreve: "A massa substitui para o indivíduo o objeto de amor perdido".
Ela o devolve à situação primitiva em que a segurança era garantida pela presença do líder ou do pai. No caso dos bonecos Reborn, essa figura de amor não é um líder real, nem um pai simbólico. É uma criatura de vinil moldada não para amar, mas para ser absolutamente obediente.
E isso revela algo mais profundo e sombrio, a recusa da relação real com sua imprevisibilidade, sua dor e suas exigências. O indivíduo não deseja mais o outro, deseja o controle absoluto sobre o outro. É aqui que a disfunção se revela com toda sua violência psíquica.
Um boneco jamais protesta, jamais frustra, jamais decepciona. Ele oferece o simulacro perfeito de um vínculo sem o risco do conflito. E assim, como alertava Freud, o sujeito regrede a uma posição infantil, onde todo amor é fusão e toda frustração é ameaça.
O que parece ternura é, na verdade, uma fuga da alteridade. Essa regressão emocional, no entanto, não se limita aos brinquedos. Ela se estende aos vínculos humanos.
Você talvez não compre um boneco, mas quantas vezes tratou seus relacionamentos como objetos a serem consumidos? Quantas amizades você descartou como quem apaga um story? Quantas vezes tentou encaixar o outro no molde do seu desejo?
Como quem edita uma imagem para caber no feed? Freud afirma que na massa o indivíduo renuncia ao seu supergo em favor do ideal do grupo e se entrega àilo que lhe oferece gratificação imediata. No caso das relações artificiais, essa gratificação é o conforto de um vínculo que não exige trabalho.
O amor, nesse cenário, deixa de ser construção e passa a ser decoração emocional. E não pense que isso é apenas um capricho de alguns poucos excêntricos. É um sintoma da nossa época.
Uma geração inteira foi ensinada a confundir afeto com resposta automática. Likes viraram confirmações de valor. Emois substituíram abraços.
Cartas foram trocadas por mensagens que desaparecem. E mais uma vez o alerta freudiano ecoa. As massas são movidas por imagens fortes e simples, não por argumentos complexos.
A imagem do bebê perfeito, mudo, incondicionalmente dócil é a resposta simbólica a um mundo que não ensina ninguém a tolerar o real. Mas e você está mesmo tão distante desse delírio? Observe-se quantas vezes você se irrita quando alguém não corresponde exatamente às suas expectativas emocionais?
Quantas vezes você cancela, exclui, silencia alguém porque não suportou ser contrariado? O boneco que você critica está em escala presente nas suas atitudes. Quando você prefere o silêncio do falso, a complexidade do autêntico.
A obra de Freud nos força a encarar um espelho interno, não o literal, mas o conceitual, onde a idealização dos vínculos revela o medo de se relacionar com o outro real. Ele escreve: "O amor de massa é uma forma de narcisismo invertido. Ama-se o outro apenas enquanto ele confirma a imagem que temos de nós mesmos.
E talvez seja esse o motivo pelo qual tanta gente hoje troca relações imperfeitas por ficções confortáveis, porque o outro real exige diálogo, escuta, paciência. O boneco ou o avatar emocional exige apenas adoração. O afeto se transforma em vitrine, a dor em performance, a saudade em postagem com trilha sonora, mas o preço disso é altíssimo.
A incapacidade de amar verdadeiramente, porque amar de fato é se frustrar, é permitir que o outro te escape, é aceitar que o amor, assim como a liberdade, é sempre arriscado. Você pode rir dos bebês de borracha, pode até se sentir superior, mas antes de apontar o dedo, pergunte-se: em que parte da sua vida você substituiu o real pelo confortável? Em que momento você trocou a dor do vínculo verdadeiro pela anestesia do controle emocional?
Freud jamais propôs que fôssemos frios ou insensíveis. O que ele denunciou foi o uso inconsciente do afeto como substituto do pensamento. Quando o sentimento é usado como muleta, ele deixa de ser ponte com o outro e se torna a armadilha do ego.
E o resultado disso? Uma humanidade emocionalmente emparedada, abraçando bonecos e acreditando que isso é amor. No abismo que se forma entre o desejo por segurança emocional e a recusa do real, surge uma consequência ainda mais devastadora.
O desaparecimento do sujeito. Não apenas sua autonomia é corroída, mas sua própria consistência interna se esfarela. Já não se trata de um indivíduo com vontade própria, mas de uma partícula arrastada por uma corrente impessoal, onde o que antes era identidade se transforma em eco.
O eu não se sustenta, ele se curva. E Freud foi um dos primeiros a expor essa rendição psíquica com precisão quase profética. Ele escreve em uma de suas passagens mais incisivas: "Na massa, o indivíduo se despersonaliza.
Seus sentimentos e atos são contagiosos e sua razão é facilmente ofuscada. Torna-se, por assim dizer, hipnotizado pelo líder com quem se identifica e substitui seu ideal do ego por aquele que o grupo oferece. " A potência dessa afirmação é desconcertante.
Freud não fala aqui apenas de eventos políticos ou religiosos. Ele está tratando de algo estrutural, o enfraquecimento do eu diante de qualquer formação coletiva que prometa pertencimento. O sujeito abre mão do seu crio moral, da sua faculdade crítica, da sua voz interior, em nome de uma aceitação imediata.
E ao fazer isso, dissolve a própria soberania psíquica. É por isso que ele observa que a massa não conhece a dúvida nem a incerteza, age por impulsos, é crédula e intolerante, não por maldade, mas porque perdeu a bússola interna. Seu referencial deixa de ser a realidade e passa a ser a repetição alheia.
O que vale não é o que é verdadeiro, mas o que é aceito. O erro deixa de ser incômodo quando é compartilhado por todos. E aqui nos aproximamos de um fenômeno ainda mais perigoso, a substituição da consciência pela convenção.
O indivíduo começa a agir não porque escolhe, mas porque os outros já decidiram por ele. Ele se adapta, ele repete, ele obedece. E o mais trágico, acha que está sendo livre.
Freud observa esse processo com clareza quase cirúrgica. Na massa desaparecem os sentimentos de responsabilidade individual. O senso de culpa é anestesiado, pois o superego cede lugar ao líder idealizado que assume o papel de consciência coletiva.
Ou seja, o mal não é mais reconhecido como tal quando praticado em grupo. O erro é reciclado como virtude se todos o aplaudem. O indivíduo não apenas cede, ele se ilude.
Ele acredita que está no controle quando, na verdade apenas gravita ao redor do desejo coletivo. Seu orgulho é alimentado por uma voz que não é sua, sua moral moldada por uma régua externa. Tal diagnóstico lança uma luz perturbadora sobre os movimentos contemporâneos de opinião, comportamento e até mesmo afeto.
A necessidade desesperada de pertencer, de não destoar, de se fundir ao grupo tem como consequência direta a castração do pensamento autêntico. É por isso que tantos hoje não conseguem sustentar um posicionamento que vá contra a maré, não porque não tenham argumentos, mas porque não suportam a solidão. Freud foi impiedoso ao descrever esse temor do isolamento como uma das forças mais primitivas do psiquismo humano.
Ele escreve: "O temor de ser excluído da massa é com frequência mais poderoso que qualquer impulso moral. A identificação com o grupo oferece alívio imediato à angústia do abandono. Assim, mesmo quando o grupo caminha rumo ao precipício, o indivíduo prefere marchar junto do que questionar o trajeto.
Ele se engana com a ilusão da segurança, troca a verdade pelo aplauso e, nesse pacto silencioso, mata a própria integridade. Mas o que se perde quando se perde a si mesmo? A capacidade de criar, de dissentir, de amar com profundidade.
Tudo isso depende da manutenção de um eu coeso. Um eu que não se dobre a pressão, que saiba sustentar um pensamento mesmo que ele doa, que permaneça fiel a si mesmo, mesmo quando a massa o chama de louco. Quando Freud fala da identificação com o líder, ele não está falando apenas de figuras políticas ou religiosas.
O líder pode ser um algoritmo, uma tendência, um discurso hegemônico, pode ser uma estética, uma hashtag, uma ideologia simplificada que oferece alívio em vez de complexidade. E o sujeito, ao aderir, sem refletir, se transforma em sombra. Vive, mas não pulsa.
Fala, mas não diz. Ama, mas não sente. Por isso, a pergunta que resta é simples, mas aterradora.
Até que ponto você ainda é você? Ou será que sem perceber já entregou suas decisões, seus valores, seus afetos nas mãos de um rebanho que te aplaude enquanto te engole. Há uma força ainda mais ardilosa que subjaz ao apagamento da individualidade, a identificação, não como um gesto voluntário de empatia ou escolha consciente, mas como uma aderência quase inevitável, enraizada nas camadas mais primitivas da constituição psíquica.
Segundo Freud, a identificação é a forma mais originária de ligação emocional a um objeto anterior, até mesmo ao amor. É como se o sujeito, antes de saber quem é, já estivesse emaranhado no que o outro representa. Freud escreve: "A identificação é conhecida da psicanálise como a forma mais primitiva de ligação afetiva com outra pessoa.
culpa o lugar do objeto perdido, sendo em parte uma substituição pelo desejo de colocação no lugar do objeto. Esse movimento é sutil, mas devastador. O sujeito não apenas se aproxima do outro, ele se transforma nele.
Apropria-se de três jeitos, crenças, reações, sem perceber que está sendo moldado por aquilo que desejava conquistar. O desejo não é mais vivido, é imitado. Não se trata mais de amar, mas de ocupar o lugar do que se ama, muitas vezes por medo de perder esse vínculo.
Essa operação aparece nitidamente na lógica das massas. O líder não é apenas seguido, ele é interiorizado. Seus gestos, suas certezas, seus valores passam a habitar o íntimo de cada membro do grupo como se fossem próprios.
A multidão não pensa como ele, ela pensa que é ele. A identificação se transforma em fusão e o sujeito abandona sua singularidade para se tornar extensão de um ideal alheio. Freud descreve esse fenômeno com exatidão perturbadora.
O indivíduo renuncia a seu ideal do ego e o substitui pelo ideal comum da massa. Quanto mais forte for essa identificação com o grupo, mais desaparecerá sua individualidade. Esse desaparecimento é silencioso, não ocorre por força externa, mas por adesão interna.
O sujeito não é forçado a se perder. Ele anseia por isso. Busca alívio na homogeneidade, conforto na repetição.
A diferença deixa de ser uma possibilidade e passa a ser um fardo. Questionar o padrão não é mais um exercício de inteligência, mas um risco de exílio emocional. A identificação assim opera como um golpe silencioso contra o desejo autêntico.
O que poderia ser expressão torna-se imitação. O eu começa a se projetar em personagens exteriores, esquecendo que ele mesmo já era por natureza uma construção complexa e inacabada. Quando Freud diz que o ego é o verdadeiro herdeiro do complexo de Édipo, ele está apontando para a genealogia trágica da identidade.
Nascemos do conflito, crescemos da renúncia, nos tornamos o que suportamos desejar sem jamais possuir. Nesse jogo psíquico, o sujeito aprende que a melhor forma de manter o vínculo é tornar-se semelhante. Quanto mais igual for ao outro, menos risco de ser rejeitado.
E é assim que nascem os comportamentos miméticos, as lealdades incondicionais, os delírios coletivos. A massa torna-se um grande espelho opaco. Todos refletem todos, mas ninguém se reconhece.
Freud descreve: "O amor coletivo não conhece rivalidade. A identificação com os membros do grupo é reforçada por essa ausência de competição. A unidade da massa se sustenta sobre a renúncia ao desejo individual.
Ou seja, a paz que o grupo oferece não é gratuita, ela cobra o preço da singularidade. A coesão não é fruto da harmonia, mas da renúncia generalizada. Cada membro sacrifica parte de si para manter a ilusão do todo.
E quanto maior a renúncia, maior a sensação de pertença. O sujeito se aliena não por fraqueza, mas por estratégia emocional. Mas há algo profundamente trágico nessa engrenagem.
A falsa resolução do desejo. O indivíduo acredita que ao identificar-se encontrou seu lugar no mundo. Mas o que ele encontra é apenas um disfarce, uma caricatura do próprio anseio.
Seu amor não se realiza, se dilui, sua vontade não se concretiza, se uniformiza e assim ele sobrevive, mas sem potência. Freud não oferece conforto aqui. Sua análise é desprovida de idealizações.
A massa para ele é um artifício que mascara o abismo do sujeito moderno. O medo de desejar por si, o temor de sustentar, um querer que não esteja já validado por um modelo externo. A tragédia, portanto, não é a obediência, mas a substituição do querer pelo parecer.
Por fim, resta a pergunta: O que em você ainda não é cópia? O que sobra de legítimo quando se retira a influência do grupo, do discurso dominante, da figura idealizada que você aprendeu a admirar? Ainda há nesse labirinto de reflexos alguma centelha de desejo que seja só sua?
Não é apenas o desejo que se distorce na dinâmica das massas, é também o juízo que captula. O pensamento próprio se esvai como neblina diante do calor, da unanimidade. A lucidez, antes uma bússola se converte em incômodo.
O senso crítico, outrora nutrido pela dúvida e pela investigação, torna-se suspeito, um obstáculo ao conforto emocional de pertencer. O sujeito que pensa é um dissidente. E num mundo onde a coesão é mais valiosa que a verdade, ser dissidente é ser ameaçador.
Freud nos adverte. Num grupo, cada sentimento e cada ato é contagioso até o ponto de que o indivíduo facilmente sacrifica o seu interesse pessoal pelo interesse coletivo. Esse contágio não é apenas emocional, é cognitivo.
A clareza é vencida pela repetição, a razão pela insistência, o juízo pelo afeto partilhado. E a mentira, se amplamente acolhida, goza do mesmo prestígio de uma evidência. Ninguém precisa ser enganado.
Basta que muitos acreditem juntos. É nesse caldo que o delírio ganha prestígio. Ele não se impõe pela força, mas pela adesão.
Não precisa ser plausível, apenas comum. O líder, fonte irradiadora desse delírio, é percebido como infalível. Freud escreve: "O líder da massa aparece como o substituto do ideal do ego de cada indivíduo.
Ele goza de autoridade irrestrita porque encarna os valores mais íntimos que cada membro do grupo projetou fora de si. Em outras palavras, o líder é um ídolo esculpido a partir das carências mais íntimas. Ele não convence pela lógica, encanta pelas promessas que ecoam fantasias infantis, segurança, destino, identidade.
Seus erros são ignorados, suas contradições racionalizadas, suas arbitrariedades justificadas como necessárias. O grupo se cega voluntariamente, não por ignorância, mas por devoção. Essa devoção é regida por uma lógica narcísica.
Freud insiste. A massa exige ilusões e não suporta que se lhe tirem as suas ilusões. Essa é talvez a frase mais decisiva da obra.
Nela está contido o núcleo do fenômeno. Não se trata de busca pela verdade, mas pela continuidade de um estado psíquico prazeroso. A massa não é um espaço de pensamento, é um abrigo contra o desconforto da consciência.
O indivíduo, ao entrar nesse campo, renuncia à vigilância interior. Passa a viver sob o julgo de uma moral coletiva que se autoreferencia. O certo é o que todos fazem, o justo é o que todos aplaudem.
O crítico é o que incomoda e nessa atmosfera, até o mais sensato pode ser percebido como insano, pois a razão para ser válida precisa da chancela do grupo. Freud nota que o declínio da consciência individual é uma das principais características da vida em grupo. Esse declínio não é uma falha, mas um funcionamento.
Ele garante a coesão, elimina tensões internas, suprime conflitos morais, mas seu custo é a infantilização do sujeito. Ele se torna novamente dependente da autoridade paterna, que agora ressurge sob a forma do líder carismático. O grupo então se organiza como uma família regressiva.
Há o pai idealizado e os irmãos que competem entre si apenas pela aprovação dele. O laço entre os membros da massa é indireto. Freud esclarece: "Cada um se encontra ligado ao líder pelo mesmo laço afetivo.
Por essa via, os membros se identificam entre si. Ou seja, o elo comum não nasce da convivência, mas da submissão ao mesmo ideal. Essa estrutura torna o grupo coeso e, ao mesmo tempo, frágil.
Basta que o líder vacile para que tudo colapse. No entanto, enquanto dura, essa estrutura oferece uma sensação de proteção quase sagrada. O pensamento crítico se torna uma heresia.
A dúvida é vista como ameaça. O sujeito que questiona corre o risco de ser expulso do refúgio simbólico que a massa oferece. A sanidade, nesse contexto, exige coragem.
Pensar por si é um gesto de desobediência, mas há algo ainda mais perturbador. Muitas vezes, o indivíduo percebe a inconsistência do delírio coletivo, mas escolhe calar. Opta por manter o silêncio em troca da permanência.
vende sua autonomia em parcelas de omissão. Isso porque, no fundo, sabe que estar certo sozinho é mais insuportável do que estar errado, acompanhado. Essa dinâmica que Freud destrincha com lucidez impiedosa revela o abismo entre razão e pertença, entre clareza e cumplicidade.
O sujeito que ousa pensar arrisca tudo. Posição, afeto, identidade. Mas talvez, justamente por isso mereça o nome de sujeito.
Pois enquanto a massa vive na zona de conforto da ilusão, ele habita o território arriscado da consciência. Se esse vídeo te sacudiu, se você sentiu a pancada e teve que engolir seco, então é porque você está no lugar certo. Se inscreve no canal, ativa as notificações e considera assinar o clube de membros.
Lá a gente mergulha ainda mais fundo na alma humana, sem medo de olhar o abismo. Agora me responde nos comentários em que momento você percebeu que estava sendo levado pela maré da histeria coletiva? Ou será que ainda não percebeu?
Quero saber. Vamos conversar, porque aqui a gente pensa mesmo quando dói. E se isso te incomodou, ótimo.
É sinal de que ainda tem alguém aí dentro. Agora mostra que está vivo. Provoca, pensa comigo.