A antiga Iugoslávia reuniu nações com diversas culturas, religiões e línguas no sudeste da Europa durante a segunda metade do século 20. Elas conviveram sob certa estabilidade política por décadas. Mas no início dos anos 1990, esse projeto entrou em colapso de forma traumática, em meio a uma série de guerras civis que deixaram mais de 135 mil mortos, milhões de refugiados e dezenas de milhares de desaparecidos.
Sou Camilla Veras Mota, da BBC News Brasil, e neste vídeo eu conto como e por que o antigo país se desintegrou. Bom, ao falar da ex-Iugoslávia nos dias de hoje, geralmente a gente se refere a sete países diferentes: Eslovênia e Croácia, que são os mais prósperos e hoje fazem parte da União Europeia, Sérvia, Bósnia e Herzegovina, Montenegro, Macedônia do Norte e o Kosovo, que ainda não foi reconhecido por toda a comunidade internacional. Combinadas, essas sete nações somam cerca de 22 milhões de pessoas e ocupam uma área menor que a do Rio Grande do Sul.
E embora a desintegração da Iugoslávia tenha acontecido 30 anos atrás, os fantasmas do passado ainda seguem muito presentes. Mas primeiro, vamos ver como esse país se formou. E, para entender isso, é preciso voltar à queda do Império Romano.
Naquela época, muitos eslavos, que eram o maior grupo linguístico da Europa, se estabeleceram na península dos Balcãs, chamada assim por causa da cordilheira ao seu norte. Aliás, a palavra Iugoslávia quer dizer "terra dos eslavos do sul". Com o passar do séculos, os eslavos foram se agrupando em diferentes etnias, ou identidades nacionais, que se dividiam principalmente por causa da religião.
Por exemplo: se uma pessoa era cristã ortodoxa, se identificava como sérvia. Os cristãos católicos eram croatas. E os bósnios eram muçulmanos, mas falavam o mesmo idioma que os sérvios e os croatas.
Todos esses grupos, e outras minorias, conviveram durante séculos sob a influência de dois grandes impérios, o otomano e o austrohúngaro. Mas ambos chegaram ao fim ao perderem a Primeira Guerra Mundial. E foi então que as grandes potências da época impuseram a ideia da união dos povos eslavos do sul.
Foi assim que, no fim de 1918, foi proclamado o chamado Reino dos Sérvios, Croatas e Eslovenos. O problema é que essa unificação forçou a convivência entre etnias que tinham sido inimigas na guerra. Os croatas tinham lutado ao lado do exército austrohúngaro contra os sérvios, que estavam com os aliados.
Em 1929, esse reinado mudou de nome, passando a se chamar Reino da Iugoslávia, também conhecido como Primeira Iugoslávia. Tudo ficou assim até a Segunda Guerra Mundial. Em 1941, o reino foi invadido pelo eixo fascista formado por Alemanha e Itália.
E a guerra de certa forma reacendeu as divisões internas que já existiam na primeira Iugoslávia. Os nacionalistas croatas e eslovenos apoiaram os fascistas e enfrentaram uma guerrilha comunista de sindicalistas iugoslavos, conhecidos como partisans iugoslavos. Eles lutaram sob o comando militar de Josip Broz Tito, que ficaria muito famoso.
Quando o fascismo foi derrotado, em 1945, os partisans foram alçados ao poder. E o projeto iugoslavo acabou retomado sob a liderança política do Marechal Tito. Assim surgiu a República Federativa Socialista da Iugoslávia, apelidada como Segunda Iugoslávia e que existiu até a sua dissolução, em 1992.
A nova federação iugoslava era formada por seis repúblicas: Eslovênia, Croácia, Sérvia, Bósnia e Herzegovina, Macedônia e Montenegro. Tito implantou um sistema socialista próprio, que se descolou do comunismo soviético e era mais aberto ao Ocidente. O país chegou, inclusive, a ser um personagem-chave na política internacional: em meio à Guerra Fria, em 1961, foi um dos fundadores do Movimento dos Países Não Alinhados, que buscava criar uma aliança neutra entre os polos Estados Unidos e União Soviética.
Esse modelo, conhecido como socialismo de autogestão, era mais descentralizado e foi uma forma de lidar com o pluralismo étnico da sociedade iugoslava. E durante as primeiras décadas, em meio a um apoio massivo a Tito, alcançou sua Era de Ouro: O país tinha uma relativa estabilidade política que levou a grandes avanços na saúde e educação. E muitos de seus habitantes, independentemente de suas etnias, se identificavam como iugoslavos.
E Tito conseguiu isso com seu lema de "irmandade e unidade", mas também com mão de ferro, silenciando as vozes nacionalistas e os opositores. Mas sendo assim, o que levou então o projeto ao fracasso? Para começar, existiam grandes diferenças econômicas entre as repúblicas menos desenvolvidas do sul e as mais desenvolvidas do norte, o que gerou desconfiança entre elas.
Além disso, a Iugoslávia foi acumulando uma dívida externa cada vez mais difícil de suportar. Isso por causa dos grandes empréstimos que teve de pedir depois da Segunda Guerra Mundial. A morte de Tito, em 1980, também não ajudou.
Ainda que o governo comunista tenha continuado por quase uma década, a crise econômica fez os discursos nacionalistas ganharem força, o que gerou cada vez mais tensões. A isso se somaram a crise do próprio comunismo soviético e, depois, a dissolução da União Soviética, que sacudiram com força o Leste Europeu e os Balcãs. E aí situação foi se deteriorando até que, em 1991, duas das repúblicas mais próximas, Croácia e Eslovênia, declararam independência depois de realizarem referendos.
Esse foi o princípio do fim da Iugoslávia. Mas não foi um fim pacífico. A declaração de independência da Croácia, que tinha uma grande população de sérvios-croatas, gerou uma resposta forte da vizinha Sérvia, liderada pelo nacionalista Slobodan Milosevic.
Isso provocou uma guerra civil na Croácia. As Nações Unidas acabaram intervindo para separar sérvios e croatas. Mas a região virou um barril de pólvora.
A Macedônia também se tornou independente em 1991, e, em 1992, outro referendo deu aval à independência da quarta república, a Bósnia e Herzegovina. Isso desencadeou a guerra na Bósnia, que era uma espécie de microcosmo da Iugoslávia, com uma grande mistura étnica. As três principais etnias locais lutaram entre si: croatas, sérvios e bósnios, cada um defendendo as áreas em que eram maioria e tentando expulsar os outros.
Sarajevo, a capital da Bósnia, ficou violentamente sitiada por anos. Um dos episódios mais terríveis aconteceu em 1995: o genocídio de Srebrenica, onde os servio-bósnios mataram cerca de 8 mil bósnios, de maioria muçulmana. Alguns dos responsáveis pelas graves violações de direitos humanos cometidas na antiga Iugoslávia, como Radovan Karadzic e Ratko Mladic, que ficou conhecido como "o carniceiro dos Bálcãs", foram condenados depois em um tribunal internacional criado pela ONU.
A paz na região não chegaria até o fim de 1995, quando sérvios, croatas e bósnios firmaram em Paris os chamados Acordos de Dayton, com mediação do então presidente dos Estados Unidos, Bill Clinton. Mas esses acordos não acabariam com as tensões. Três anos depois, outro conflito eclodiu no Kosovo, uma província autônoma da Sérvia com maioria étnica albanesa e muçulmana.
A Otan, Organização do Tratado do Atlântico Norte, interveio no conflito e bombardeou a Sérvia durante três meses. Em 2008, o Kosovo declarou independência unilateralmente, mas a Sérvia e muitos países da comunidade internacional ainda não o reconhecem como um país. Mas durante esse tempo, o que aconteceu então com a República Federal Socialista da Iugoslávia?
Depois da dissolução, em 1992, ela deu lugar à República Federal da Iugoslávia, que só reunia Sérvia e Montenegro, duas das seis repúblicas que tinham formado décadas antes a Iugoslávia de Tito. Em 2003, essas duas repúblicas abandonaram o nome Iugoslávia e passaram a se chamar apenas Sérvia e Montenegro. E ficaram assim até meados de 2006, quando um referendo de independência em Montenegro sacramentou a separação.
Hoje em dia, a convivência entre as ex-repúblicas iugoslavas é em geral pacífica. Mas o fardo econômico continua pesado especialmente na Bósnia e vários problemas políticos ainda estão por resolver, como o reconhecimento da independência de Kosovo. Eu fico por aqui.
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