O Brasil terá cidades inabitáveis por causa do calor?

587.54k views2062 WordsCopy TextShare
DW Brasil
A humanidade está rumo a uma espécie de epidemia de calor extremo. Tão extremo que ameaça expor mais...
Video Transcript:
Cidades brasileiras vão ficar  inabitáveis por causa do calor? Você deve ter visto o alerta deste estudo aqui. Ele destacou Belém do Pará como um dos  centros urbanos mais quentes do planeta até 2050.
Outras capitais também foram  listadas, mas numa situação menos grave. O que isso significa? Que algumas transformações da Terra estão  fincando raízes profundas sem fazer barulho.
O calor é um exemplo. Está aumentando aos poucos,  sem freio, e pode se tornar, segundo pesquisadores, “um dos  maiores desafios da humanidade”. A reportagem da DW ouviu especialistas  para entender: como o Brasil, um país aparentemente tão acostumado e preparado  para o sol, se situa nessa história?
Uma frase que cientistas vêm repetindo  ao se referir a mudanças climáticas é: elas não são o futuro. Elas  são o agora, estão em curso, acontecendo. .
. enquanto a gente  conversa aqui nesse vídeo. Mas, aparentemente, o problema só chama atenção  associado a um drama coletivo: uma seca histórica, uma onda de altas temperaturas, uma  chuva de proporções catastróficas.
É aí que está e sempre esteve o erro, de acordo  com os cientistas do estudo mencionado há pouco. Porque na base dessas tragédias climáticas  existe um movimento silencioso de décadas, acelerado nos últimos 30, 40 anos: o aquecimento  médio do planeta. .
. o calor. Um desafio planetário conhecido e, em parte, negligenciado.
Que  pode não dar descanso nos próximos anos. Para compreender melhor, vamos ver o que o estudo está dizendo? E por que o  Brasil deveria estar preocupado?
O estudo é esse que eu mostrei ali no início. Foi feito pela ONG CarbonPlan em parceria com  o jornal americano The Washington Post. A principal conclusão é que caminhamos  para uma espécie de epidemia de um calor implacável.
Com cada vez mais gente  sujeita a ter problemas de saúde por isso. Quer números? Em 2050, metade da  população estimada para o planeta deve ficar exposta a ao menos um mês de  calor extremo no ano.
Seriam em torno de 5 bilhões de pessoas nessa situação. No  começo do século, era menos da metade. No caso do Brasil, olha só Belém do Pará. 
A cidade tinha, no início dos anos 2000, 50 dias anuais de calor extremo. Lá em  2050, vão ser 222! Cerca de seis meses a mais.
Um crescimento vertiginoso entre as  localidades analisadas. O que fez até o jornal americano colocar a metrópole paraense  em destaque. Quando vemos este gráfico, fica claro o porquê Belém mete medo nas outras. 
(mostra o gráfico com a seta bem verticalizada) Só que tem mais nuances importantes de mencionar. Em Pekanbaru, na Indonésia, que seria o centro  urbano mais exposto às altas temperaturas em 2050, os moradores vão lidar com 344 dias escaldantes.  É muito sim.
Mas olhando a linha do tempo da metrópole, já eram 300 dias no começo deste  século. Ou seja, a diferença não é tão expressiva. Manaus é um exemplo parecido.
Daqui  a algumas décadas, vão ser 258 dias infernais. A recordista brasileira.  Porém, agora já são em torno de 200.
Não estou aqui minimizando essa ou  aquela região. Nem poderia. Não se trata disso.
Só estou dizendo que os  gráficos mostram Belém numa situação tão ou mais séria por conta do  aumento súbito e significativo. O professor de Física da USP Paulo Artaxo,  integrante do IPCC, o painel sobre mudanças climáticas, lembra algo básico nessa equação: o  simples fato de o Brasil ser um país tropical. Sendo um país tropical, nós somos  muito mais vulneráveis de que países em áreas de temperatura mais amena. 
Então, regiões como Teresina, Cuiabá, onde no verão normalmente temos 40, 41 graus  Celsius. . .
quando essas temperaturas atingirem 44, 45 graus, o que é previsto para as próximas  décadas, certamente nós vamos ter que a uma população que vai sofrer muito com os eventos  climáticos extremos e com o aquecimento global. A temperatura do ambiente e como ela afeta o  corpo humano é outro aspecto central do estudo. O texto fala em 32 graus celsius como a  fronteira para uma zona de perigo, num local bem úmido.
O que equivaleria, segundo as estimativas,  a 48 graus num espaço mais seco. Coisa de deserto. É tudo uma projeção, calculada com base em  variáveis climáticas, para dizer que nessas condições o nosso organismo fica ameaçado, sob  estresse térmico.
Nem adultos saudáveis aguentam direito. 15 minutos de atividades ao ar livre  já bastariam para colocar pressão sobre órgãos vitais e afetar algo fundamental, como afirma  o professor da Unifesp Ronaldo Christofoletti. Acho que o primeiro ponto de um calor extremo é o  bem-estar, o se sentir bem, à vontade ao longo do dia que passa pela saúde mental e física, ele já é um primeiro impacto, mas algumas coisas mais  sérias elas podem ocorrer durante o calor extremo.
Esta animação ilustra o  que o professor quer dizer. A temperatura considerada de bem-estar  para muitas pessoas é cerca de 20 graus. É quando a troca de calor entre o  corpo e o ambiente flui com certa tranquilidade.
Sem esforço extra da nossa parte. Quando esquenta demais do lado de fora,  a dinâmica muda. Um outro sistema de resfriamento do corpo é ativado: o suor. 
À medida que ele evapora, a pele resfria. É uma maneira natural de controlar a temperatura interna. Até porque se ela  aumenta muito, é o caos.
O corpo tenta transportar calor para  a superfície o mais rápido possível. O coração começa a bater mais rápido. Ao mesmo  tempo, perdemos líquido.
O volume sanguíneo diminui e o cérebro não recebe tudo o que  precisa. Vem a dor de cabeça e a tontura. O que agrava um quadro desses é se o ar ao redor  estiver – além de quente – bastante úmido.
Ele não vai absorver mais umidade. Então, mesmo a  transpiração intensa pode proporcionar pouco resfriamento para nós. Como se o ar-condicionado  do corpo ficasse sobrecarregado por um momento.
O calor mata? Sim. Com  desidratação, derrame, infarto.
Na Europa, matou cerca de 60 mil  pessoas ano passado. No Brasil, as mortes também ocorrem, embora os dados, na avaliação de especialistas, precisassem passar  por uma sistematização e controle mais rígidos. Eu imagino o que pode estar  passando pela sua cabeça.
Primeiro, que 20 graus como  ideal de conforto térmico – sem ar-condicionado – não é a realidade na  maior parte do Brasil. Nem no inverno. E 32 graus – sem contar as variáveis de umidade,  vento, incidência de radiação solar – também não parecem muito.
É um dia normal em várias cidades  brasileiras. Incomoda, as pessoas reclamam, mas a vida segue, não é? Inclusive fique à  vontade para compartilhar como é aí onde você mora aqui nos comentários.
Como você sente  os efeitos do aquecimento global por aí? Bom, os especialistas reconhecem que, de fato, em algumas regiões do planeta as populações estão  mais adaptadas à quentura. E é assim no Brasil, como falou o Paulo Artaxo.
Bem diferente  da Europa, mais preparada para o frio. Só que a problemática levantada no The Washington  Post vai além: está no crescimento da frequência do calor extremo, como em Belém do Pará. A mudança  se daria com rapidez num espaço de poucas décadas, tempo talvez insuficiente para as pessoas se  habituarem.
Menos ainda as mais vulneráveis. Alguns vão sofrer mais do que os  outros, seja pela sua condição social, seja pela sua condição etária ou por  algum problema existente de saúde. Voltamos àquela palavra que não envelhece  no vocabulário do brasileiro: desigualdade.
Quem são os que vão sofrer mais? O professor já deu algumas dicas. Em termos  etários: recém-nascidos, crianças e idosos.
Além deles, quem tiver alguma doença, comorbidade,  comprometimento em órgãos, como coração e rins. Mas num Brasil tão complexo e desigual,  esses fatores parecem ser só a ponta do iceberg. A preocupação maior é com um conceito  conhecido e pouco aplicado: a justiça climática.
As populações que vivem em zonas usualmente  periféricas e mais carentes das grandes cidades serão aquelas mais impactadas, porque são as zonas  de maior vulnerabilidade ambiental. São as zonas que usualmente concentram áreas de poluição,  são as zonas onde, quando vier o calor extremo, nós não podemos esquecer que o calor extremo, ele  também trará, muito possivelmente, o aumento das chuvas extremas. Então são as áreas que terão  maior impacto de inundação de deslizamento.
Isto vai afetar principalmente  a população de baixa renda, que não tem condições, por exemplo,  de refrigerar adequadamente as suas casas. Imagine uma temperatura de 42  43 graus numa favela, por exemplo. O estudo da CarbonPlan também menciona esse  desafio.
Diz que 80% dos futuros afetados por dias extremamente quentes vão estar em  países onde a pobreza é mais presente – por ironia, os menos responsáveis pelas  emissões que nos lançaram nesse abismo. No mapa, o foco maior está em dois  territórios onde, segundo as análises, a situação será mais delicada: Sul da  Ásia e África Subsariana. Regiões sem infraestrutura massificada para  dar conta do tamanho do desafio.
Ar-condicionado? Para poucos. O aparelho,  apesar de uma solução não 100% ecológica, é citado como uma ferramenta de alívio  imediato num mundo em aquecimento.
O entrave é o acesso a ele. Na Índia, por exemplo,  270 milhões de pessoas devem sofrer de calor extremo dentro de casa já em 2030. Mas apenas  5% dos lares contavam com climatização em 2018.
A renda é um fator decisivo na  aquisição ou não de uma máquina dessas. Uma pesquisa deste professor da Universidade  da Califórnia mostrou que uma família tende a comprar um ar-condicionado se tem renda anual  superior a 10 mil dólares. Em alguns dos lugares mais pobres do mundo – e que aparecem no mapa  do estudo – ela pode ser inferior a 2 mil.
No Brasil, pesquisadores sugerem que  a maior parte das residências vai ter ar-condicionado até 2035. Será que  isso vai controlar a habitabilidade, ou algumas cidades brasileiras,  como Belém, vão ficar inabitáveis? A nossa pergunta lá do começo,  ela tem uma palavra que pode ser relativizada.
Por mais absurdo que  pareça. E a palavra é inabitável. Não se trata de desprezar o sentido dela – uma  negação em essência.
Mas admitir que, para uns, é possível que as circunstâncias extremas  sejam contornáveis – para outros, não. No caso do Brasil, é o velho  dilema de um país continental, com males sobre as quais o calor extremo vai  se sobrepor. Provavelmente vão ter os que conseguirão resolver as coisas com telhados  verdes ou outras tecnologias – e os que não.
Agora, claro, devem surgir os cenários  em que pode não restar muita escolha. Então, por exemplo, já temos regiões no Nordeste  brasileiro que uma região que já é semiárida, onde chovia muito pouco, com quedas de  precipitação nesse pouco da ordem de 30 35%, com o aumento da temperatura da ordem de 2,3 a  2,5 graus. Então uma região que era semiárida está passando a se tornar uma região  árida.
Isso significa que em algumas regiões do nosso Brasil nós vamos ter que  mudar essa população destas localidades, já que a sobrevivência delas no Nordeste  brasileiro em particular, vai ser muito, muito difícil conseguir subsistência num  clima não tão favorável à subsistência humana. A afirmação do cientista cita um fenômeno que  pode se tornar mais comum daqui para frente: migração climática. E eu não  estou falando de um país para outro não.
É migração interna mesmo,  como afirmou o Banco Mundial em 2021. Segundo a ONU, o Brasil teve a  maior quantidade de deslocados internos nas Américas em 2022. A maior  parte por causa de desastres naturais.
No futuro, seria o calor? O calor é esse risco rastejante,  aquela água que não para de subir. A solução para amenizar o nosso sufocamento, repetimos um episódio atrás do  outro: frear as emissões de CO2, controlar o efeito estufa, o aquecimento da  Terra.
Ter mais verde para nos dar sombra. Mas isso você que nos acompanha já sabe. Então, como é que a gente vai lidar  com esse calorão em 2050 – e até lá?
Como nós vamos lidar com isso? O Como essa  mudança vai ocorrer? Essa é um debate que tem que ocorrer.
Eu acho que não existe uma  resposta pronta. Ela não está pronta ainda. Ela vai passar por uma mudança de comportamento da  sociedade, por uma adequação dos nossos sistemas.
O que a gente tem que fazer é estruturar políticas  que combatam os impactos e os eventos climáticos extremos.
Related Videos
Crise climática: até onde vamos aguentar?
13:58
Crise climática: até onde vamos aguentar?
DW Brasil
102,998 views
Por que europeu fuma tanto
12:47
Por que europeu fuma tanto
DW Brasil
4,793 views
EUA x CHINA: o iminente conflito DECISIVO para o MUNDO | Market Makers #103
31:23
EUA x CHINA: o iminente conflito DECISIVO ...
Market Makers
577,078 views
Como destruição do ambiente ameaça agricultura e expõe Brasil a clima extremo
8:06
Como destruição do ambiente ameaça agricul...
BBC News Brasil
156,202 views
A maior floresta tropical do planeta começou a morrer: e agora?
12:07
A maior floresta tropical do planeta começ...
DW Brasil
238,725 views
Como a Austrália virou uma vilã do clima
14:20
Como a Austrália virou uma vilã do clima
DW Brasil
88,403 views
É assim que o mundo ficará se todo gelo Derreter..
11:45
É assim que o mundo ficará se todo gelo De...
Capital Financeiro
1,003,623 views
O drama das famílias que vivem embaixo de torres de energia eólica na cidade de Lula
11:59
O drama das famílias que vivem embaixo de ...
BBC News Brasil
2,490,288 views
A era das redes sociais está acabando?
13:20
A era das redes sociais está acabando?
DW Brasil
433,912 views
As soluções simples para não 'morrer de calor' na Índia
14:49
As soluções simples para não 'morrer de ca...
BBC News Brasil
2,530,912 views
Documentário: BBC revela venda ilegal de terras na Amazônia pelo Facebook
41:24
Documentário: BBC revela venda ilegal de t...
BBC News Brasil
590,276 views
Como países estão reflorestando desertos
12:42
Como países estão reflorestando desertos
DW Brasil
1,511,796 views
Matéria de Capa | O Avanço dos Mares | 16/06/2024
25:37
Matéria de Capa | O Avanço dos Mares | 16/...
Matéria de Capa
125,856 views
Por que ascensão social no Brasil é uma das mais difíceis do mundo?
12:27
Por que ascensão social no Brasil é uma da...
DW Brasil
216,116 views
Alerta: ciclo climático mundial está mudando, diz PhD em meteorologia | HORA H DO AGRO
14:36
Alerta: ciclo climático mundial está mudan...
Jovem Pan News
183,499 views
Tsunami: the moment when everything changed - Full documentary in English
1:22:28
Tsunami: the moment when everything change...
Investigations et Enquêtes
31,945,787 views
Como sal e areia podem substituir as baterias de lítio
11:13
Como sal e areia podem substituir as bater...
DW Brasil
230,344 views
Suíça. Um país quase perfeito. Grande Episódio
50:51
Suíça. Um país quase perfeito. Grande Epis...
As viagens de Antônio
11,378,910 views
O imenso deserto que está nascendo no Brasil
12:31
O imenso deserto que está nascendo no Brasil
DW Brasil
408,374 views
Estudo afirma que mundo não resistirá às mudanças climáticas e vida na Terra será impossível
3:51
Estudo afirma que mundo não resistirá às m...
Jornal da Record
1,347,631 views
Copyright © 2024. Made with ♥ in London by YTScribe.com