A História e a Lenda da Papisa Joana

segundo a gramática da língua portuguesa o feminino da palavra Papa é formado pelo radical pap mais o sufixo feminino Isa que resulta em papiza da mesma forma que o feminino de profeta é profetiza e o de sacerdote é sacerdotiza agora diferente dos cargos de profeta e de sacerdote que em muitos casos históricos foram realmente ocupados por mulheres né profetizas e sacerdotisas o cargo de papa é e sempre foi exclusivamente masculino Então para que essa palavra papisa Bom na verdade existe pelo menos um assunto histórico que justifica a existência dessa palavra inclusive autores já na Idade

Média escrevendo em latim usaram o termo papiss para falar sobre esse assunto E esse assunto Claro é o que a gente vai abordar aqui no vídeo que é a história da papisa Joana segundo alguns relatos existiu uma mulher chamada Agnes que viajou da Inglaterra até a Grécia Mais especificamente até a cidade de Atenas se passando por homem né vestida com roupas tipicamente masculinas e se apresentando como homem e lá Ela estudou com os melhores professores e se destacou tanto no conhecimento da cultura clássica quanto no domínio das escrituras e de lá de Atenas ela seguiu

depois para a cidade de Roma onde ela conquistou também um respeito e uma autoridade tão grande que quando o Papa da época morreu ela foi escolhida por unanimidade para assumir o seu lugar a partir daí ela começou a usar o nome pontifício João e rein ou por 2 anos 7 meses e 4 dias até que por fim o seu segredo foi exposto e o que se diz mais precisamente sobre isso é que enquanto ela passava entre o Coliseu e a Basílica de São Clemente ela entrou em trabalho de parto e ali mesmo ela acabou morrendo

ou em decorrência do próprio parto ou segundo outras versões executada pelas autoridades essa história ficou tão famosa no final da idade média e no início do período moderno que é possível encontrar centenas de referências dessa época a tal papisa Joana que é como essa personagem ficou conhecida e ela aparece em listas de papas em pinturas e gravuras em textos polêmicos ali dos tempos da reforma protestante e há até registros de um busto que teria sido esculpido em sua memória e colocado ali na Catedral de Siena na Itália agora será que essa história é realmente histórica

Será que realmente existiu uma mulher Papa né uma papisa então para responder essa pergunta a primeira coisa que a precisa fazer é analisar as fontes históricas que falam sobre ela né quais são essas Fontes quando foram escritas por quem foram escritas e baseadas em q e a gente pode começar essa investigação pela fonte mais antiga que a gente tem acesso que é um texto intitulado crônica universalis metens escrito por um dominicano chamado Jan de Mai por volta do ano 1250 segundo esse texto houve um papa que não foi contado na lista de bispos de Roma

né ou seja na lista de papas porque ele era na verdade ela né era uma mulher disfarçada o texto diz também que esse Papa né o melhor essa papisa subiu na hierarquia do clero por seu caráter e talentos mas quando o seu segredo foi descoberto as autoridades romanas a amarraram pelos pés a cauda de um cavalo e ela foi arrastada e apedrejada pelo povo e lá no lugar mesmo onde ela morreu ela foi enterrada e escreveram sobre o seu túmulo as seguintes palavras Petre Pater patr pap prito partum Pedro pai dos Pais expôs o parto

da papisa e Pedro aqui Claro é uma referência a São Pedro apóstolo que é considerado na tradição católica como tendo sido o primeiro Papa e além desse texto né do crônica universales a gente tem também outro texto do século Xii que é o crônica Minor que foi escrito por um frad Franciscano anônimo que basicamente repete ali A história desse primeiro texto que eu apresentei E tem também mais um texto do século XI que se baseia no crônica universales que é o tractatus de diverses materis pred cabb esse texto foi escrito por um inquisidor e Pregador

dominicano chamado etien de bbon E como eu disse basicamente também repete ali a história do crônica universales e por último a gente tem outro texto também do século XI que fala sobre a papisa Joana que é o chronicum pontificum at imperatorum que é também um texto escrito por um dominicano que nesse caso aí é o martinos polonus esse último documento né o crônic pontífices é especialmente interessante porque ele é mais detalhado do que a versão mais antiga né do Jan de Mai e ele também Diverge em alguns pontos importantes dos outros documentos para começar esse

é o primeiro texto que identifica exatamente qual Papa foi na verdade uma mulher que teria sido um tal de Papa João VI o inglês que teria reinado ali entre Leão IV e Bento I em me do 9º século os outros documentos que eu citei não dizem Qual é o nome do papa nem da papisa né no caso E na verdade situam a história no início do século X e não do século 9 Além disso O martinos polonus né o autor do cronicon diz que a mulher que se tornaria a papisa Joana tinha ido a Atenas

para acompanhar um amante que é uma coisa que a gente não tem nos outros textos e ele disse também que antes dela se tornar papa ela atuou como professora em Roma ensinando as artes do trivium né a gramática a lógica e a retórica e tudo isso claro também mantendo ali o disfarce masculino Ah e sobre a morte dela né o martinos também especifica o local da cena que teria acontecido entre o Coliseu e a Basílica de São Clemente que é uma coisa que os outros documentos não fazem mas curiosamente ele não especifica a causa da

morte que é algo que os outros documentos anteriores faziam né dizendo que foi uma execução no caso do martinos ele não menciona nada o que pode sugerir inclusive que a morte teria resultado em decorr ência do parto simplesmente e por fim o texto do crônico diz também que os Papas até hoje né até o momento em que o texto foi escrito evitam passar pelo lugar onde a papisa Joana morreu porque eles repudiam a memória desse evento e Ele diz também que as listas de bispos de Roma né as listas de papas omitem o nome dela

por causa da inconformidade do sexo feminino com o cargo de papa e beleza né Então essas são as fontes mais antigas que a gente tem sobre o assunto agora a próxima pergunta que a gente tem que fazer é a seguinte né quão confiáveis Realmente são essas fontes e a resposta a gente vai ver que é não muito antes da gente continuar Deixa eu só agradecer a insider aqui rapidinho né que tá patrocinando esse vídeo vem patrocinando vários vídeos aqui no canal a insider para quem não sabe é Quem produz essas camisetas Tech né que tem

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Fontes todas são de meados do século XI Então são dois séculos que separam o suposto fato e os primeiros registros feitos sobre ele e no caso do crônico né do martinos ol anos é mais tempo ainda porque ele situa o papado de Joana no século 9 então seriam quatro séculos de distância entre o evento e o registro do evento e aqui imediatamente a gente já percebe mais um problema que é que esses relatos são contraditórios né os três primeiros são vagos demais né não trazem nem o nome da papisa e o quarto relato que é

mais completo desloca o evento 200 anos no tempo e outra coisa né esses três primeiros relatos não se contradizem por um motivo muito simples que é que eles dependem diretamente um do outro o crônica Minor e o tractatus de diversis tem como fonte o crônica universalis então nessas Fontes a gente não tem o testemunho de três autores Independentes a gente tem o testemunho de um autor sendo repetido por outros dois e todos eles sem exceção ainda admitem que a história pode não ser verdadeira o Jan meei por exemplo abre a sua narrativa com a palavra

Latina require que significa a ser verificado e o autor da crônica Minor diz que a sua fonte sobre a história da papisa são abre aspas os romanos só isso Nenhum documento escrito é mencionado o etien de bbon também o autor do tractatus de diverses também reconhece que a história que ele conta é incerta mas ele se importa menos com isso porque a obra dele não é propriamente uma crônica igual à outras né é um livro para pregações então ele tá preocupado mais com o sentido moral das histórias e menos com o seu lastro realmente ente

ali histórico objetivo então assim só para dar um outro exemplo de uma história que o etien conta nesse livro segundo ele houve uma vez em que um homem do campo esqueceu uma hóstia consagrada dentro de uma colmeia E aí quando ele voltou para pegar a hóstia né ele se lembrou da hóstia e voltou para pegar ele percebeu que as abelhas tinham construído uma pequena Capela lá dentro da coméia e estavam cantando hinos ali na sua própria língua então é mais ou menos nesse estilo aí que são as histórias do etien né não devem ser levad

muito a ferre e fogo agora o caso do crônic pontífices polonus que é o autor da obra era um bispo e ele tinha servido como Capelão e confessor de vários Papas Então ele era uma figura muito respeitada e ele tinha nessa obra uma pretensão mais Histórica de repassar mesmo os acontecimentos ali da vida dos Papas e dos imperadores né chronicum pontífices relato sobre a papisa Joana além dele est mais de 400 anos distante do evento ele também provavelmente nem sequer escreveu esse relato Pera né Como assim é que os exemplares mais antigos que a gente

tem do cronicon simplesmente não contém essa história eles passam direto ali do Papa Leão I pro Bento io só alguns anos depois é que os manuscritos dessa obra vão começar a trazer a história da papisa Joana Entre esses papados e mesmo assim a primeira vez que essa história aparece é como uma acréscimo Escrito nas margens da folha só depois é que ela entra realmente no corpo do texto e quando isso acontece ela quebra totalmente lhe o fluxo mais natural da obra e o seu estilo também não combina com o formato do crônico por exemplo normal

nesse livro é que uma linha de texto seja dedicada para cada ano de papado Então se um papa reinou por 3S anos ele vai ter três linhas de texto dedicadas a ele mas no caso da papisa Joana que segundo o próprio texto teria é reinado por 2 anos são sete linhas de texto Então por tudo isso né o Consenso dos historiadores hoje é que o relato do crônico sobre a história da papisa Joana é uma interpolação um acréscimo ao texto feito depois da morte do martinos polonus né o autor original aí do livro ou seja

mais uma coisa que não ajuda muito na credibilidade desse relato agora se é assim então né Se essa história do Papa que era mulher é uma invenção medieval e esse é digas de passagem o Consenso acadêmico hoje e é a posição majoritária também desde o século X Inclusive a pergunta que a gente pode fazer aí é quem foi que inventou essa história toda como que essa lenda começou com que objetivo e por que ela pegou tanta gente né ao ponto de terem feito um busto na Catedral de Siena para essa papisa que nunca existiu então

essa parte É bem interessante e bem difícil de responder também mas existem alg algumas hipóteses propostas por historiadores que podem ajudar a entender o desenvolvimento dessa lenda vamos começar aqui então com três hipóteses principais sobre a origem dessa ideia de que existiu em algum momento um papa mulher a primeira dessas hipóteses tem a ver com um Papa João mesmo né da de onde vem o papisa Joana que teria sido o Papa João VI mas esse Papa não é o suposto João VI ou inglês que reinou entre Leão IV e Bento io mas sim um João

VI que reinou entre Adriano i e Marinho io isso no final do 9º século uma coisa marcante que esse Papa fez né o João viav foi reconhecer formalmente a reinstalação de fóssil ieo como Patriarca de Constantinopla sendo que esse fóssil primeiro tinha sido excomungado pelo Papa que veio logo antes né O Adriano i e essa excomunhão tinha acontecido num contexto de muito atrito entre as igrejas do ocidente e do oriente e esse clima inclusive né de cisma continuava ali na época do João VI e por causa disso alguns viram essa atitude mais conciliatória do João

VI como uma demonstração de fraqueza né um recuo covarde ou uma atitude de mulherzinha nos termos da época então algo que pode teré acontecido é que essa memória de João VI como um papa mulherzinha metaforicamente pode ter se deformado com o tempo e adquirido um sentido mais literal né de que João era de fato uma mulher se passando por por homem outra hipótese também que já foi levantada tem a ver com duas mulheres que foram muito influentes num período que às vezes é chamado de século obscurum na história do papado Essas Mulheres foram Teodora a

esposa de teofil io que era o governante efetivo de Roma e a sua filha marosa segundo alguns cronistas da época a marosa né a filha da Teodora teria sido amante de um papa que foi o Sérgio I mãe de outro papa o João x e teria tido também Grande infuência sobre dois outros Papas pelo menos que foram Leão vi e Estevão vi então por causa disso né a gente lê em algumas crônicas desse período que as autoridades papais na prática teriam sido duas mulheres a Teodora e principalmente a marozia e daí talvez né dessa ideia

de mulheres controlando o papado pode ter se desenvolvido também posteriormente A Lenda de que Mulheres foram oficialmente Papas né ou papis nesse período e por último a terceira hipótese que a gente tem é outra que envolve as rivalidades entre as igrejas do ocidente e do oriente no início do século X o Papa Leão 9 e o patriarca Miguel I de Constantinopla trocaram uma série de acusações sobre a igreja né representada ali por um e por outro e uma das acusações feitas pelo leão 9 foi a de que os católicos orientais estavam desrespeitando a definição do

Concílio de niceia de não aceitar eunucos na igreja e por causa disso talvez até algumas mulheres talvez até algumas mulheres tivessem se infiltrado aí no meio desses eunucos e ocupado as posições mais elevadas da hierarquia eclesiástica o leão nono não diz diretamente que isso aconteceu mas ele sugere né deixe isso no ar atribuindo esse essa questão a uma opinião popular e de fato a gente tem dois documentos pelo menos do 9º século que contam histórias populares que vão nesse sentido aí de uma mulher assumir como Patriarca de Constantinopla numa delas o patriarca de Constantinopla toma

uma sobrinha como amante e veste essa sobrinha com roupas masculinas para poder ficar com ela em casa sem ninguém desconfiar E aí ele apresenta essa sobrinha na verdade como sobrinho Só que mais tarde quando esse Patriarca morre a sobrinha mantendo o disfarce né claro assume o posto de Patriarca no seu lugar e aí um ano e meio depois segundo a história um demônio aparece para um Nobre em sonho e revela para ele o que tinha acontecido né o que ele tinha feito que era usar o antigo Patriarca para colocar uma mulher no mais alto posto

da igreja oriental então é possível né que mais tarde esses boatos sobre uma mulher ter liderado à igreja oriental tenham sido revertidos para atacar a igreja ocidental daí a história da papisa Joana bom essas Então são três hipóteses que a gente tem pelo menos sobre a questão de como surgiu a história do Papa mulher agora agora falando da motivação para espalhar esse boato Ainda Há outras razões que a gente precisa considerar uma primeira razão para espalhar essa história como já ficou claro né é esse contexto de polêmica entre católicos romanos e católicos orientais mas havia

também algumas razões internas na própria igreja romana para difundir essa história da papisa a primeira delas é a de que justamente no século XI que é quando a gente encontra pela primeira vez a história da papisa Joana as ordens dos franciscanos e dos Dominic anos estavam envolvidas numa série de atritos ali com o papa e isso pode ter motivado os autores dos documentos que a gente viu né que são todos do século XI e todos escritos por franciscanos ou dominicanos a circular uma história que debilitava as ideias de perfeição e de incorruptibilidade do papado então

alguns autores nessas ordens podem ter circulado essa história justamente para atacar o seu adversário naquele momento que era o papa e outra razão também possível para ess histórias terem circulado ali principalmente a partir do século XI é que esse século também assim como o início do século X Foi um momento de muita discussão sobre a participação das mulheres dentro ali dos quadros da igreja de um lado por exemplo a gente tinha os cistercienses e os prém monstr tenses que começaram a reduzir a participação das mulheres dentro das suas ordens e por outro lado a gente

tinha irmandades femininas auto-organizadas né como as beguinas por exemplo que começaram a ganhar bastante expressão e importância no no cenário católico e isso motivou vários debates né até uma certa ansiedade sobre o papel das mulheres no clero que pode ter contribuído para aumentar o apelo de uma história como a da papisa Joana né que afinal de contas era uma mulher que supostamente tinha chegado ao mais alto posto da igreja e no séculos seguintes claro essa história teria ainda mais apelo né porque no contexto das reformas protestantes os autores que questionavam a instituição do papado fizeram

referências constantes à história da papisa o Yan hus por exemplo né que é um dos precursores do protestantismo escreveu que abre aspas a pessoa mais iletrada ou uma mulher ou um herge e anticristo pode ser papa e como um exemplo disso ele citou especificamente a papisa Joana que ele também chamava de Agnes diga-se de passagem né que é um nome que começa a aparecer associado à papisa Joana a partir ali do século X outras fontes também mais tardias vão dizer que o nome de batismo dela era gilberta na verdade e que ela era Germânica e

não inglesa né E que ela era o Papa João VI e não João VII enfim né Há várias diferenças aí e outro elemento que surge também posteriormente né na virada do século XI pro século X é a ideia de que depois do episódio da papisa Joana a igreja teve que criar um novo rito para verificar se o papa era mesmo homem antes de confirmar sua eleição e isso seria feito né segundo dizem os boatos ali da época com o Papa sentado numa sedes stercoraria né uma espécie de vaso sanitário onde um Cardeal verificaria por baixo

né pela abertura do assento ali sanitário se o papa tinha ou não tinha as partes ali esperadas então assim né Por causa de alguns desenvolvimentos como esse né a partir da história da papisa Joana né com esses usos contra a figura do Papa muitos católicos no espírito ali da contrarreforma começaram a questionar mais fortemente a credibilidade dessa história né de que papisa Joana tinha de fato existido e foi nesse contexto por exemplo que surgiram alguns protestos contra a presença de um busto da papisa na Catedral de Siena que era um entre 170 bustos de papas

segundo se conta e algumas Fontes dizem Até que esse busto acabou sendo modificado que ele não foi descartado mas sim que ele foi modificado e reaproveitado para representar um outro Papa que é o Papa Zacarias bom e vale dizer também que pouco tempo depois os próprios protestantes começaram a abandonar essa história também né um Historiador calvinista do século X inclusive que é o David blondel foi um dos principais responsáveis por desacreditar a história da papisa Joana e a partir do século XVII praticamente ninguém mais levava essa história a sério né nem os católicos Romanos nem

os ortodoxos orientais nem os protestantes de qualquer forma né essa é uma história que por mais que ela não seja Histórica no sentido de ter realmente acontecido ela é profundamente Histórica no quanto que ela revela sobre o período no qual ela surgiu E no quanto ela revela também sobre os diferentes períodos Nos quais ela foi se desenvol vendo né se expandindo se modificando e assumindo novos significados até os dias de hoje inclusive e é isso né Como sempre as referências consultadas para fazer esse vídeo estão na descrição aí embaixo muito obrigado por assistir e até

o próximo vídeo falou