A ONU divulgou neste início de agosto um estudo histórico sobre mudanças climáticas O documento foi feito pelo Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC, na sigla em inglês. Contou com a participação de centenas de cientistas que analisaram milhares de evidências coletadas ao redor do planeta. Eu sou a Laís Alegretti, da BBC News Brasil aqui em Londres, e neste vídeo eu vou explicar 5 pontos do relatório, incluindo as conclusões sobre o Brasil.
Entre muitas conclusões importantes, os cientistas mostraram que o impacto da humanidade sobre o clima é, segundo eles, a constatação de um fato. Além disso, o relatório indica que parte dos efeitos da mudança climática pode ser irreversível. Mas nem tudo está perdido.
Há esperanças de que reduções profundas nas emissões de gases de efeito estufa possam, sim, estabilizar esse aumento de temperatura. Vamos começar com os dados mostrados em relação ao aquecimento global até o momento. O documento mostra que a temperatura da superfície global foi 1,09 ºC mais alta na década entre 2011 e 2020 do que no período pré-industrial, entre 1850 e 1900.
Alguns exemplos são as recentes ondas de calor na Grécia e na América do Norte. Ou os alagamentos na Alemanha e na China. Outros números apontados pelo relatório também são importantes.
Por exemplo, a recente taxa de aumento do nível do mar quase triplicou em comparação com o período entre 1901 e 1971. Além disso, os últimos cinco anos foram os mais quentes já registrados desde 1850. O documento também mostra que é ”praticamente certo" que extremos de calor, incluindo ondas de calor, tornaram-se mais frequentes e mais intensos também desde a década de 1950.
Enquanto isso, os eventos frios se tornaram menos frequentes e menos severos. Mas o que causou essas mudanças climáticas? De acordo com o documento, há forte influência humana no aquecimento da atmosfera, dos oceanos e do solo.
O cientista Ed Hawkins, um dos autores do relatório, diz que os pesquisadores não poderiam ser mais claros nesse ponto. Ele afirma que é inequívoco que os humanos estão esquentando o planeta. A Organização Metereológica Mundial diz que é como se a atmosfera estivesse sendo exposta a um doping.
O documento mostra, por exemplo, que a temperatura no planeta aumentou mais rápido nos últimos 50 anos, ou seja, desde 1970, do que em qualquer outro período nos últimos 2 mil anos. E que a influência humana é muito provavelmente o principal impulsionador do derretimento global das geleiras desde a década de 1990. E também da diminuição do gelo marinho do Ártico.
Como já falamos aqui, muitos desses efeitos do aquecimento global causado por nós já podem ser sentidos em todas as regiões do mundo. Mas quais as expectativas para o futuro? Uma má notícia é que o aquecimento que experimentamos até agora provocou mudanças irreversíveis nos nossos sistemas de suporte planetário.
Estamos falando de uma irreversibilidade dentro de uma escala de tempo de séculos a milênios. Os oceanos vão continuar a aquecer e se tornar mais ácidos. E as geleiras montanhosas e polares vão continuar se derretendo por décadas ou séculos.
Os cientistas afirmam que o nível do mar pode aumentar cerca de 2 metros até 2100. E 5 metros até 2150. Esses resultados são improváveis, mas não podem ser descartados.
Se virarem realidade, podem ameaçar com inundações muitos milhões a mais de pessoas nas áreas costeiras até 2100. Além disso, o relatório também aponta para o que o aumento de temperatura pode significar para a humanidade. Vale lembrar aqui do Acordo de Paris, de 2015, que contou com a assinatura de quase todos os países, inclusive o Brasil.
O acordo visava segurar o aumento de temperatura até o fim deste século abaixo de 1,5ºC em comparação ao período pré-industrial. No entanto, em todos os cenários de emissões de carbono considerados pelos cientistas, a meta de 1,5ºC não será cumprida. Até o momento, a temperatura já aumentou 1,09ºC desde esse período, como já vimos aqui.
E os autores acreditam que uma alta de 1,5ºC ocorreá até 2040. E se as emissões não forem reduzidas nos próximos anos, isso acontecerá ainda mais cedo - o que pode aumentar a quantidade de fortes chuvas em escala global, e de secas em algumas regiões do mundo. Também é provável o aumento de incêndios florestais em muitas regiões.
A gente tem visto que Turquia e Grécia, por exemplo, têm sido bastante afetados nas últimas semanas. E o Brasil? O relatório diz que o país não sai dessa ileso.
Muito pelo contrário. O texto prevê um aumento de temperaturas na América do Sul em taxas maiores que a média global Além disso, o estudo indica mais chuvas no Sul e Sudeste do Brasil, mais seca no Nordeste e aumento da seca agrícola e ecológica. No Brasil e em outros países da América do Sul e da América Central "as temperaturas médias médias provavelmente aumentaram e continuarão a aumentar em taxas maiores do que a média global.
” Isso pode causar um aumento das chuvas na região Sul e parte do Sudeste do Brasil, incluindo Rio de Janeiro e São Paulo. Por outro lado, há a diminuição de chuvas no Nordeste e o crescimento na duração da seca. No Norte, a tendência é que haja um aumento de dias secos e da frequência das secas.
Outro ponto importante é que o nível relativo do mar aumentou em taxas mais altas no Atlântico Sul e no Atlântico Norte. Por isso, segundo o relatório, é extremamente provável que o aumento relativo do nível do mar continue nos oceanos ao redor da América Central e do Sul, contribuindo para o aumento das inundações costeiras em áreas baixas e para o recuo do litoral ao longo da maioria das costas arenosas" O texto mostra também que as "ondas de calor marinhas também devem aumentar em toda a região ao longo do século 21". Essas ondas são regiões do oceano com temperatura da água anormalmente altas por um longo período de tempo.
Mas então o que pode ser feito? Apesar de esse relatório ser o mais assertivo em relação ao aquecimento global e suas consequências graves para o futuro, os cientistas também se mostraram esperançosos. Isso porque nós temos a capacidade de interromper ou até mesmo reverter o aumento das temperaturas.
Para isso, seria preciso cortar pela metade as emissões globais de gases do efeito estufa até 2030. Além de zerar as emissões líquidas em meados deste século. Zerar emissões líquidas envolve reduzir as emissões de gases de efeito estufa tanto quanto possível usando tecnologia limpa.
Em seguida, enterrar quaisquer liberações restantes usando a captura e armazenamento de carbono, ou absorvendo-as com o plantio de árvores. Apesar de as projeções futuras não serem animadoras e muitos impactos serem irreversíveis, os autores alertaram para o que consideram fatalismo. Em outras palavras, nós não estamos condenados.
Ainda há o que fazer para que a situação melhore, segundo eles. Reduzir o aquecimento global pode minimizar vários dos chamados pontos de inflexão. Esses pontos são o momento em que o sistema climático da Terra sofre uma mudança abrupta em resposta a seu aquecimento contínuo.
De acordo com o secretário-geral da ONU, António Guterres, esse relatório é um alerta vermelho para a humanidade. Veja o que disse o porta-voz: Vale lembrar que o lançamento do relatório ocorre três meses antes da COP-26, uma importante cúpula do clima que ocorrerá em Glasgow, na Escócia. Guterres diz contar com os líderes de governo e todas as partes interessadas para garantir que essa cúpula seja um sucesso.
Isso significa que provavelmente ele será o alicerce das negociações. O IPCC tem histórico nesse ponto: sua avaliação anterior em 2013 e 2014 preparou o caminho para o acordo climático de Paris. Mas segundo conta o repórter de meio ambiente da BBC Matt McGrath, este novo estudo é muito mais forte, mais claro sobre o que vai acontecer se os governantes não agirem.
Se a COP-26 terminar de maneira insatisfatória, tribunais podem se envolver mais. Ativistas ambientais foram à Justiça em países como Irlanda e Holanda nos últimos anos para forçar governos e empresas a agirem com base na ciência sobre as mudanças climáticas. É isso, eu fico por aqui.
Em breve a gente volta com mais vídeos sobre o clima. Até a próxima.