Olá, eu sou Marco Antônio Trevizani Martins, professor da Universidade Federal de Odontologia do Rio Grande do Sul e do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Leciono na disciplina de estomatologia desta universidade. O assunto da aula de hoje é osteonecrose associado ao uso dos bifosfonatos.
Muito bem. Para iniciarmos, a gente precisa conhecer um pouquinho o que são os bofosfonatos. Os bifosfonatos são drogas que foram idealizadas, e por ser um análogo do pirofosfato endógeno, elas têm o principal efeito sobre os osteoclastos, evitando que os osteoclastos reabsorvam o tecido ósseo.
Infelizmente, ele não inibe só os osteoclastos e nem a forma dos osteoclastos. Ele inibe também os osteoplastos e formam o osso. Dessa maneira, o principal efeito dessa droga é inibir o processo de reabsorção do tecido ósseo.
Assim sendo, por serem potentes inibidores da reabsorção óssea, essas drogas são indicadas para pacientes que têm doenças que reabsorvem o tecido ósseo. Dentre elas, a gente pode separar em dois grandes grupos dessas doenças: os pacientes que têm osteoporose e osteopenia, que são doenças que levam à reabsorção do tecido ósseo, mas mais leves, e os pacientes que têm algum tipo de neoplasia, normalmente maligna, dentro do tecido ósseo. Dentre eles, a gente pode destacar os pacientes portadores de mieloma múltiplo, que são as neoplasias verdadeiras do tecido ósseo medular e os pacientes com tumores sólidos que venham a ter um tipo de metástase óssea dentro da doença oncológica.
Existem no mercado uma gama enorme de bifosfonatos. Basicamente, existem bifosfonatos de primeira, segunda, terceira geração que em cada vez que se aumentam uma geração, se multipliquem em torno de 10 vezes a potência de ação dessas drogas. Entretanto, clinicamente a gente divide em dois grupos de drogas: as drogas dos bifosfonatos indicados para pacientes que vão tomar o medicamento por via oral, normalmente os pacientes portadores de osteoporose ou osteopenia.
E as drogas que são utilizadas por via endovenosa, que são as drogas mais potentes e utilizadas nos pacientes oncológicos. Como a droga é muito pouco reabsorvida pelo trato gastrointestinal, os pacientes que tomam por via oral, além de serem bifosfonatos menos potentes, são menos absorvido pelo trato gastrointestinal. Entretanto, os pacientes oncológicos que tomam as drogas endovenosas, elas são fortemente absorvidas por essa via, além de serem muito mais potentes quando comparada às drogas que são utilizados por via oral.
O principal efeito dos bisfosfonatos ocorre diretamente no tecido ósseo. De que maneira? Os bisfosfonatos diminuem a quantidade de osteoclastos, consequentemente a célula que reabsorve o tecido ósseo e altera a forma dos osteoclastos.
De que maneira? O osteoclasto fica com a superfície lisa e ele perde a borda e a escova, que é exatamente o que faz a reabsorção do tecido ósseo. Esse é o principal efeito dos bisfosfonatos diretamente sobre os osteoclastos, as células que reabsorvem o tecido ósseo.
Secundariamente, ele vai ter o efeito sobre a neoformação de vasos, a angiogênese. Então, consequentemente, aquele tecido ósseo recebe um menor aporte sanguíneo consequentemente uma menor quantidade de oxigenação. E por fim, mais recentemente, se descobriu que os bisfosfonatos também alteram um pouquinho tecido epitelial.
Dessa maneira, compromete um pouco mais ainda o processo de cicatrização de mucosas. Então, o efeito que inicialmente acreditava-se que era só sobre o tecido ósseo, hoje sabe-se que não é só sobre o tecido ósseo, ele tem um efeito genérico, muitas vezes comprometendo o processo de cicatrização, de reparo. Não só de tecido ósseo, mas também de tecidos moles nos pacientes.
Então, o que é osteonecrose associada ao uso dos bisfosfonatos? A osteonecrose associada aos bisfosfonatos é uma doença caracterizada por pacientes que usam ou usaram algum tipo de bisfosfonato, que evoluíram com alguma exposição de tecido ósseo, seja nos ossos mandibulares, sejam maxilares, muitas vezes concomitantemente nos dois tecidos ósseos, e que não cicatriza. Aquela exposição perdura por semanas e que consequentemente não cicatriza.
Essa exposição pode ser sintomática, causar dor ao paciente, aumento de volume, um odor característico. Muitas vezes, quando infecciona, a drenagem de secreção purulenta, ou muitas vezes pode ser assintomática. Cada paciente evolui de uma determinada maneira.
Como tratar a osteonecrose associada ao uso dos bisfosfonatos? O tratamento ainda é bastante discutido na literatura por ser uma entidade nova, que surgiu a partir do ano de 2003. Existem várias terapêuticas, nenhuma resolutiva por si só.
Como este paciente tem complicação de reparo, a gente precisa tentar dar situações de reparo. Então, esses pacientes normalmente usam continuamente algum antisséptico para evitar quadros infecciosos. O tecido necrótico exposto não vai regenerar, pelo contrário, a tendência do organismo é separar esse osso necrótico e formar um sequestro ócio.
Então, o ideal é que a gente, para acelerar este processo de reparo, e tentar buscar esse reparo tecidual, é remover esse tecido necrótico exposto, uma vez que ele não vai reparar. Muito importante são as cirurgias que são realizadas nesses casos, pra realmente além de remover o tecido ósseo, conseguir coaptar as bordas da ferida cirúrgica de maneira que o paciente não fique com o osso exposto, consequentemente suscetível à entrada de alguma bactéria num ambiente potencialmente contaminado, que é pouca. Então, são somatórias de coisas que se fazem para tentar buscar o reparo.
É muito difícil conseguir a resolução completa, visto a condição que se encontra o tecido ósseo. O tecido ósseo está vivo, mas como eu falei, ele está com pouca célula, está com pouco oxigênio e está com pouco sangue circulante. Então, a somatória de atitudes e de manobras, fazem com que a gente possa ter algum processo de reparo.
Então, o uso de antissépticos, o uso de antibióticos, pequenas ou grandes decorticações de ossos necróticos. A laser terapia pode vir a contribuir também pro fechamento primário dessa mucosa. Então, são uma série de condições que podem levar a gente a ter uma resolução completa.
A palavra-chave não é tratar a osteonecrose. A palavra-chave é a prevenção. Todos os pacientes que vão fazer uso de algum bisfosfonato, deveriam ser encaminhados para um dentista, para que fosse feito uma triagem inicial, uma adequação do local inicial antes do início do tratamento dessa doença, porque dessa maneira a gente conseguiria prevenir futuras complicações e, mais do que isso, fazer um plano de prevenção, de higiene de cuidados bucais, de maneira que o paciente não necessitasse amanhã extrair um dente ou colocar um implante que é normalmente essas cirurgias em tecido ósseo que acabam evoluindo para uma osteonecrose, por não se ter um reparo completo dessa mucosa.
Muita gente pergunta por que não parar ou interromper o uso da droga se o paciente tiver que realizar um procedimento cirúrgico posterior. Os trabalhos mostram que a banalização do uso da droga não contribuem muito porque o bisfosfonato adere à hidroxiapatita e fica retido por anos no tecido ósseo. O efeito sobre o osso praticamente não vai melhorar em nada interrompendo o uso da droga.
Entretanto, alguma melhora gente vai ter no efeito sobre tecido mole, onde o bisfosfonato não fica aderido e não fica retido por anos. De qualquer maneira, isso deve ser conversado com a equipe médica. Os pacientes oncológicos, de certa maneira ganham muita qualidade de vida com o uso da droga e tem seríssimos problemas se pararem de utilizá-la.
Entretanto, os pacientes que usam a droga devido ao quadro de osteopenia e osteoporose, talvez tenham alguma contribuição em parar de usar a droga por um determinado período para que seja realizado algum procedimento cirúrgico que eventualmente manipule osso e o paciente não tenha tanto risco de não ter reparo e, consequentemente, se instalar uma osteonecrose associada ao uso dos bifosfonatos. Grande parte dos quadros de osteonecrose associado ao uso dos bifosfonatos são trauma induzidos, ou seja, algum novo procedimento cirúrgico que manipule osso, uma extração de dente, uma colocação de implante, uma prótese que traumatizou aquela mucosa, lacerou, expôs tecido ósseo e não houve reparo, consequentemente. Então, a grande maioria são trauma induzidos.
Grande parte delas causadas por cirurgiões dentistas desavisados. Entretanto, existe uma pequena porcentagem de osteonecroses espontâneas. Pacientes que, vivendo a vida normal, sem nenhum quadro de doença periodontal, de fratura dental ou de extração de dente, evoluíram para um quadro de exposição de tecido ósseo.
Então, esses pacientes, graças à Deus, são uma grande minoria, a grande maioria é trauma induzido, podem também ter o uma osteonecrose chamada de espontânea. Resumidamente, os pacientes que vão iniciar um tratamento com os bifosfonatos. Esses pacientes devem ser avaliados com o cirurgião dentista, clinicamente e radiograficamente, para identificar qualquer possível foco de complicação depois do uso da droga.
Os pacientes que já usam a droga: duas coisas importantes. Qual é o tipo de droga ele usa, qual é a doença de base e se esse bifosfonato é de uso endovenoso ou por via oral. Por via oral, o risco de uma osteonecrose é muito pequeno.
De uso endovenoso, o risco de uma osteonecrose é bem mais potente. De maneira generalizada, qualquer procedimento cirúrgico que vá manipular o osso, a gente evita nesses pacientes. A gente tenta contornar.
Por exemplo, o paciente teve uma fratura coronariana, que não tenha condições de reabilitar esse dente. Se for possível, fazer edodontia, remover possíveis focos de infecções endodônticas e selar aquela raiz. Façam isso, evitem de manipular tecido ósseo.
Se não tiver condições de se evitar essa manipulação óssea, como por exemplo uma fratura longitudinal, que inicia na coroa e vai até a raiz: a gente tem que submeter esse paciente ao procedimento cirúrgico, a gente vai estar conversando com a equipe médica para identificar qual é o medicamento, há quanto tempo toma, qual é a droga, qual a via de administração dessa droga, para mensurar o risco de uma osteonecrose. E, se tiver que fazer esse procedimento, a gente vai fazer de maneira que o paciente esteja coberto com antibiótico, com uso de um antisséptico, evitando que fique qualquer tecido ósseo exposto, ou seja, temos que recobrir por completo aquela área cruenta com o tecido, de maneira que o paciente tenha a cicatrização por primeira intenção, evitando que fique um tecido osso exposto. Então, a gente vai minimizar a possibilidade de não ter reparo.
Tudo o que contribua, funciona de maneira bastante eficiente. A laserterapia por estimulação com laser de baixa potência em pacientes que tiverem que realizar uma extração de dente, funciona e contribui de maneira bastante significativa. A gente tem que mensurar o risco e dividir com o paciente a responsabilidade do procedimento que a gente vai realizar.
Resumidamente, o que tínhamos para falar sobre a osteonecrose era isso e se alguém tiver alguma dúvida, pode entrar em contato com a gente, ou vir à universidade, ou vir ao próprio Telessaúde pra gente discutir um pouquinho mais sobre o assunto. Obrigado.