CRIANÇA FAMINTA BATE À PORTA DA MANSÃO SEM SABER QUE O MILIONÁRIO CHORAVA PELO FILHO...

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Histórias do Coração
CRIANÇA FAMINTA BATE À PORTA DA MANSÃO SEM SABER QUE O MILIONÁRIO CHORAVA PELO FILHO... #HistóriasD...
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criança faminta bate a porta de uma mansão sem saber que o milionário chorava pela perda do filho O que ele não sabia era que aquele menino era Joãozinho Sentia como se o estômago estivesse tentando comer ele por dentro Não era fome de agora Era a fome que vinha há dias aquela que deixa a cabeça leve a vista meio embaçada e o corpo mole O chinelo já tinha arrebentado há semanas O pé esquerdo ia descalço mesmo A camiseta larga e furada balançava com o vento gelado que corria pelas ruas do bairro Chique onde ele nunca tinha
pisado antes Olhava pros lados sem entender porque tudo era tão limpo tão bonito tão diferente do lugar de onde ele vinha Passou por carros caros calçadas lisas e casas tão grandes que pareciam hotéis Uma delas chamou mais a atenção Era enorme Os portões pretos altos cheios de ferro retorcido pareciam proteger um mundo que ele nunca ia alcançar Mas naquele momento ele já nem pensava muito A fome falava mais alto do que o medo mais alto do que a vergonha mais alto do que tudo Andou até a frente da mansão olhou em volta e apertou o
botão da campainha Uma vez só depois duas A terceira vez foi mais longa Esperou Lá dentro Silêncio O som da campainha ecoou pela sala enorme onde tudo estava meio apagado meio cinza Álvaro estava sentado no sofá o olhar perdido na televisão desligada a barba por fazer o rosto cansado e o coração completamente quebrado Fazia s dias que o filho dele Henrique de 8 anos tinha partido Leucemia diagnóstico rápido tratamento pesado esperança curta A dor não dava trégua Nada fazia sentido nem o sol nem o café da manhã que a empregada insistia em deixar na mesa
nem a vida que continuava como se não tivesse sido despedaçada Ele só chorava Às vezes quieto às vezes alto outras vezes apenas ficava ali parado como se estivesse desligado por dentro Quando a campainha tocou Álvaro nem olhou Achou que fosse engano mas ela tocou de novo e outra vez Ele suspirou irritado e gritou pelo segurança Mais nada O rapaz devia estar nos fundos Sem paciência ele mesmo foi atender Caminhou devagar arrastando os pés até a porta Quando abriu o que viu tirou ele do eixo por um segundo Era um menino pequeno magro sujo com o
cabelo todo embolado e o rosto queimado de sol Os olhos dele enormes olhavam direto nos dele sem piscar sem medo só fome Joãozinho segurava o portão com uma das mãos e falou sem rodeios com a voz rouca e seca: "Tio você tem alguma coisa para comer?" Álvaro ficou sem saber o que dizer Olhou em volta como se esperasse que alguém explicasse o que estava acontecendo mas era só ele e o menino ali e aquele olhar Por um segundo ele viu Henrique ali não rosto não nos traços mas no olhar o mesmo pedido de ajuda que
o filho fez tantas vezes no hospital sem nem saber direito como lidar com a dor o estômago de Joãozinho fez barulho alto Álvaro ouviu aquilo pareceu rasgar alguma coisa dentro dele "Tá com fome?" ele perguntou sem pensar Joãozinho assentiu Não pediu dinheiro nem pediu brinquedo nem disse nenhuma história para comover Só olhou de novo e falou: "Qualquer coisa serve até arroz frio" Álvaro abriu o portão mandou entrar O menino entrou devagar olhando tudo com o olhar desconfiado de quem já tomou tapa até quando sorriu O chão da entrada era tão limpo que ele ficou com
medo de pisar Os móveis pareciam de revista e o cheiro cheiro de coisa boa de comida de verdade não de resto de marmita achada no lixo Na cozinha Álvaro pediu paraa Rosa a cozinheira preparar alguma coisa pro menino Rosa levou um susto Nunca tinha visto o patrão agir assim mas não questionou Fez um prato com arroz feijão frango assado e salada Quando colocou na frente de Joãozinho ele olhou para ela como se não acreditasse Começou a comer sem falar nada Rápido com as mãos tremendo Cada colherada era uma batalha entre a fome e o medo
de alguém mandar ele parar Álvaro ficou ali parado assistindo Um misto de dor alívio e raiva crescendo dentro dele Porque aquele menino tava naquela situação cadê os pais dele porque uma criança tinha que bater numa mansão para pedir arroz ele queria perguntar um monte de coisas mas ficou quieto Deixou o menino comer Viu cada movimento cada garfada cada respiração pesada de quem ainda estava tentando acreditar que aquilo era real Depois que o prato foi raspado Joãozinho limpou a boca com a mão e falou: "Obrigado moço Eu não queria incomodar só queria comer." Álvaro se abaixou
olhando direto nos olhos dele sem saber exatamente o que sentia Só sabia que não queria ver aquele menino saindo por aquela porta "Ainda não quer dormir aqui hoje?" Ele perguntou com a voz baixa quase sem acreditar que estava dizendo aquilo Joãozinho não respondeu de cara O olhar dele se encheu de dúvida Como assim dormir ali naquela casa enorme naquele lugar onde ele nem devia ter entrado pode ser insistiu Álvaro Ele balançou a cabeça devagar como quem aceita um presente mas com medo de alguém puxar de volta Então Álvaro chamou Rosa e pediu para ela arrumar
um lugar pro menino dormir Rosa mesmo sem entender nada fez o que foi pedido Levou Joãozinho até um quarto que ficava perto da área de serviço uma cama simples mas limpa um cobertor cheiroso e uma toalha Joãozinho tomou banho devagar olhando paraa água que caía com força fechou os olhos e deixou a água escorrer pelo rosto como se aquilo lavasse não só a sujeira mas também o medo Quando deitou demorou para pegar no sono O corpo estava cansado mas a cabeça girava Quem era aquele homem por que ele deixou ele entrar será que ele ia
acordar e ser expulso será que iam gritar com ele mas o sono venceu e pela primeira vez em muitos dias Joãozinho dormiu de verdade sem barulho de carro sem cachorro latindo sem medo de ser chutado enquanto dormia na calçada Dormiu com a barriga cheia e o coração bagunçado mas dormiu Dia amanheceu e o céu estava sem graça nem azul nem cinza só aquele tom apagado como se ele mesmo tivesse cansado de fingir que tudo estava bem Na mansão o silêncio reinava de novo Não era aquele silêncio de quem tá dormindo era outro mais pesado O
tipo de silêncio que carrega dor lembrança saudade e vazio Um silêncio que grita mesmo sem som nenhum Álvaro estava no quarto do filho de novo sentado no chão encostado na parede o olhar parado no armário aberto Os brinquedos ainda estavam ali os tênis pequenos lado a lado como se Henrique fosse voltar da escola a qualquer momento Em cima da cômoda o boneco preferido dele o tal do superherói que ele não largava nem para dormir Álvaro pegou o boneco na mão olhou apertou contra o peito e fechou os olhos Um soluço escapou rasgando o peito dele
por dentro Tinha uma dor que não passava Mesmo com o tempo correndo lá fora mesmo com as pessoas dizendo que ia melhorar não melhorava Era como se o corpo do filho ainda estivesse ali em casa ocupando espaço com lembranças As risadas dele ainda estavam no corredor o cheiro dele no travesseiro a voz dele no fundo da mente do pai Álvaro tinha tudo: dinheiro casa linda empregados prestígio mas nada mais fazia sentido O coração dele estava quebrado em pedaços tão pequenos que ele nem sabia se algum dia ia conseguir juntar de novo Lúcia estava no quarto
ao lado deitada de lado olhando pro nada O lençol cobria até o queixo Tinha dias que ela não comia direito O câncer avançava e o corpo não respondia como antes O cabelo tinha começado a cair o espelho virado pro canto do quarto Ela não queria se olhar não queria ver o que estava virando e nem tinha mais forças para discutir com ninguém Tava cansada de médico de remédio de promessa de melhora A única coisa que importava era que o filho dela não estava mais ali Ela ouviu passos no corredor Rosa a cozinheira apareceu com um
copo de suco e uma fatia de pão com manteiga Tentou sorrir mas Lúcia só virou o rosto Não queria nada nem comida nem conversa Rosa insistiu um pouco deixou a bandeja na mesinha e saiu Sabia que não adiantava forçar Estava todo mundo num buraco escuro Era como se a casa inteira tivesse perdido a cor Álvaro voltou paraa sala sentou no sofá largado sem camisa descalço a televisão ligada mas no mudo Era só para não se sentir tão sozinho O controle remoto caiu no chão e ele nem se mexeu Só ficou ali com o olhar perdido
A mente dele estava presa naquela última semana com Henrique Lembrava do hospital do barulho dos aparelhos da enfermeira entrando e saindo do quarto Lembrava do último abraço do último te amo do filho Lembrava de como ele apertou a mão dele até o fim E depois só silêncio um silêncio diferente um que parecia infinito O telefone tocou ele não atendeu Rosa atendeu e voltou com o recado Era o advogado Álvaro mandou dizer que ligava depois O advogado insistia com questões sobre o enterro os papéis do testamento a fundação que eles queriam criar com o nome do
Henrique Álvaro não queria ouvir nada disso O filho tinha morrido O resto não importava Ele se levantou com dificuldade O corpo doía a alma ainda Subiu as escadas devagar e foi até o quarto onde Joãozinho tinha dormido Abriu a porta com cuidado O menino ainda estava ali encolhido na cama dormindo fundo Cobertor até o pescoço os pés sujos ainda de fora Tinha um bichinho de pelúcia velho nos braços Devia ter achado entre os brinquedos guardados Álvaro ficou olhando por uns segundos O menino parecia calmo Não sabia onde tava nem porque tava ali Só tava dormindo
como uma criança devia dormir Ele fechou a porta devagar voltou pro quarto e se trancou Deitou na cama e puxou o travesseiro contra o rosto Chorou baixinho igual uma criança perdida tinha raiva de tudo da doença da vida de Deus de si mesmo Não era justo Nadaquilo era Perder um filho Era como morrer em pé como respirar sem ar No fim da tarde Lúcia saiu do quarto fraca mas decidida Desceu as escadas devagar e foi até a sala sentou ao lado do marido Não disseram nada só ficaram ali um ao lado do outro os dois
destruídos mas juntos Ela foi a primeira a falar Ele já comeu Álvaro entendeu que ela estava falando do menino Só balançou a cabeça dizendo que sim E ela ficou em silêncio de novo Eles ficaram ali por horas sem trocar palavras só dividindo a dor A presença um do outro era o que restava No quarto de hóspedes Joãozinho acordou com o barulho de trovão Olhou em volta meio sem saber onde estava mas aí lembrou o cobertor a cama a comida o cara que deixou ele entrar Por um momento achou que tinha sonhado mas não Era real
Ele estava ali em algum lugar entre o que nunca teve e o que ainda não entendia levantou devagar abriu a porta do quarto e caminhou no escuro até a sala Viu os dois sentados no sofá Não quis atrapalhar Ia voltar pro quarto mas Álvaro viu ele ali parado quieto "Quer sentar aqui com a gente?" Álvaro perguntou Joãozinho hesitou mas foi Sentou no canto do sofá Lúcia olhou para ele com um olhar que misturava dor e carinho E pela primeira vez desde que o filho morreu ela esticou o braço e tocou a cabeça de uma criança
Foi um gesto pequeno mas dentro daquela casa triste foi como acender uma vela no escuro Joãozinho acordou com o cheiro de pão quentinho no ar levantou meio assustado sem saber se ainda estava na rua num sonho ou naquela casa enorme O quarto ainda estava escuro mas dava para ouvir passos lá fora Os pés descalços pisavam com um cuidado no chão frio Ele abriu a porta devagar e deu uma espiada A casa estava em silêncio mas era um silêncio diferente do da rua Era calmo não assustava Desceu as escadas com cuidado sentindo os degraus gelados nos
pés Na cozinha Rosa estava com o avental amarrado e o cabelo preso num coque alto Mexia na frigideira como quem já fazia aquilo há anos Quando viu Joãozinho parado na porta deu um meio sorriso e apontou a cadeira da mesa sem dizer nada Ele sentou sem nem saber se podia Um prato apareceu na frente dele com pão queijo quente e leite com chocolate Aquilo parecia coisa de rei Ele só olhou sem acreditar muito "Pode comer" disse ela sem dar bronca nem fazer cara feia Joãozinho não esperou duas vezes Comeu como se fosse a última refeição
da vida Rosa reparou nas mãos dele tremendo nos olhos ainda inchados do sono e da rua Ela não perguntou de onde ele vinha nem por tava ali Só deixou ele comer Quando ele terminou limpou a boca com a manga da camisa e olhou em volta como quem esperava alguém chegar e expulsar ele Mas quem chegou foi Álvaro camisa branca cabelo bagunçado com o rosto ainda marcado da noite mal dormida Entrou na cozinha e olhou direto pro menino Os dois se encaram por alguns segundos Ninguém falou nada só trocaram aquele olhar que carrega coisa demais para
colocar em palavras Joãozinho tentou levantar achando que ia ser mandado embora mas Álvaro fez sinal com a mão para ele ficar sentado "Você dormiu bem?" ele perguntou com a voz rouca "Dormi sim" respondeu Joãozinho baixinho e completou meio sem jeito "Obrigado pela comida." Álvaro puxou uma cadeira e sentou também pegou uma xícara de café e ficou ali tomando devagar olhando pro menino com curiosidade mas sem invadir Tinha alguma coisa naquele garoto que mexia com ele uma sensação estranha como se conhecesse ele de algum lugar ou como se o destino tivesse empurrado os dois um pro
outro Seu nome é João mas todo mundo me chama de Joãozinho E quantos anos você tem nove Álvaro assentiu depois perguntou tentando parecer calmo E sua família joãozinho deu de ombros Mãe sumiu faz tempo Pai eu nem sei quem é Morei num abrigo um tempo depois fugi e tô na rua faz uns dois anos já acho Álvaro ficou em silêncio Não sabia o que dizer Joãozinho falou tudo com tanta naturalidade que doeu como se aquilo fosse normal como se fosse só mais uma história qualquer Mas não era pelo menos não para Álvaro "Você ficou com
medo de bater aqui ontem?" ele perguntou Fiquei Achei que iam me xingar jogar água chamar a polícia mas eu tava com muita fome Aí fui Álvaro balançou a cabeça devagar Rosa observa os dois de canto disfarçando enquanto limpava a pia Tinha algo diferente acontecendo ali e ela sabia "Quer ficar mais uns dias aqui?" Álvaro perguntou do nada Joãozinho arregalou os olhos olhou em volta como se estivesse procurando uma pegadinha mas não tinha Posso mesmo pode Só precisa prometer que vai se comportar Nada de sumir no meio da noite nem mexer nas coisas sem pedir Aqui
você tem cama comida banho mas tem regra também Joãozinho assentiu rápido Tá bom eu prometo Eu juro Álvaro levantou da mesa e disse: "Então tá Rosa vai te mostrar onde ficam as coisas e depois você pode ajudar ela se quiser Rosa cruzou os braços e olhou pro menino com um olhar sério mas com o canto da boca querendo sorrir Pode começar varrendo a cozinha Quero ver se você é bom de serviço Joãozinho riu pela primeira vez pegou a vassoura e começou a trabalhar não com obrigação mas com vontade Era a primeira vez em muito tempo
que ele sentia que estava servindo para alguma coisa Enquanto ele varria Álvaro subiu às escadas parou na frente do quarto do filho A porta estava entreaberta entrou devagar e ficou ali olhando tudo Respirou fundo Depois pegou uma caixa pequena no armário cheia de brinquedos antigos Levou até o quarto de hóspedes e deixou lá no chão sem dizer nada Joãozinho viu e arregalou os olhos Pode brincar depois que terminar a faxina Álvaro disse saindo do quarto Joãozinho olhou os brinquedos como se fossem tesouros mas voltou paraa vassoura Primeiro a tarefa depois a diversão Ele estava levando
a promessa a sério Mais tarde Álvaro ficou na varanda com uma xícara de café na mão Olhava o jardim mas pensava longe Lembrava do filho claro mas também pensava no que estava fazendo tinha aberto a porta para um desconhecido um menino da rua Podia ser perigoso mas não parecia Tinha algo em Joãozinho que acalmava como se aquele menino precisasse dele tanto quanto ele precisava de alguma coisa que desse sentido para continuar respirando Na hora do almoço os três comeram juntos Rosa serviu arroz feijão bife e batata frita Joãozinho estava no céu comeu sorrindo contou umas
histórias da rua falou de um cachorro que seguiu ele por dias de um cara que dava pão dormido num posto Lúcia desceu depois fraca mas presente Sentou à mesa olhou o menino com atenção mas não falou muito só escutava O clima estava diferente A casa ainda carregava a tristeza claro Mas tinha um brilho novo ali um barulho de talheres batendo no prato um riso bobo um movimento que não existia fazia dias E no meio da dor algo começou a se mexer Devagar mas firme No fim da tarde Joãozinho ajudou a guardar a louça depois ficou
na sala vendo o desenho Álvaro sentou na poltrona pegou um livro mas não leu uma linha Só ficou ali ouvindo o som da televisão vendo o menino no sofá com os olhos brilhando Era estranho era tudo muito rápido mas ele não conseguia mandar aquele garoto embora Alguma coisa dizia que ele tinha que ficar O final da tarde chegou arrastado A luz do sol invadia a mansão por entre as cortinas mas ninguém ali parecia prestar atenção Joãozinho estava no sofá assistindo o desenho com um copo de suco na mão e os pés balançando no ar Era
como se aquele lugar ainda fosse meio mentira para ele Uma parte da cabeça dele dizia para não se acostumar Mas o corpo o corpo queria ficar queria descansar Álvaro passou por trás do sofá e parou para observar o menino Ele ria de uma cena besta na TV onde um personagem tropeçava e caía no chão Aquilo mexeu com o coração de Álvaro Fazia tanto tempo que não ouvia uma risada dentro daquela casa O som parecia estranho fora do lugar mas era bom muito bom Ele olhou pro teto respirou fundo e decidiu que ia fazer uma coisa
que não tinha feito desde o enterro de Henrique Subiu as escadas devagar como se estivesse subindo um monte com pedras nos pés Parou na frente do quarto do filho A porta estava fechada Ele não tocava naquele quarto havia uma semana nem Lúcia nem os empregados Era como se aquele lugar tivesse virado sagrado intocável uma cápsula de dor Mas agora olhando a maçaneta algo dentro dele empurrou Abriu a porta O quarto estava do mesmo jeito que Henrique deixou A cama arrumada com o cobertor azul dobrado a escrivaninha com os cadernos os lápis a coleção de figurinhas
espalhada o armário com as roupas penduradas como se alguém fosse usar a qualquer momento Os brinquedos nos cantos todos organizados do jeito certinho que o menino gostava Um carrinho vermelho em cima da prateleira ainda tinha o adesivo que o pai colou com ele na semana anterior ao hospital Aquilo doeu mais do que Álvaro achava que podia doer Ele deu dois passos para dentro O cheiro do filho ainda estava ali aquele cheiro que só criança tem doce leve uma mistura de talco e suor Ele fechou os olhos por um momento só para tentar segurar aquilo O
coração dele estava apertado doía como se fosse explodir Mas ele continuou Sentou na beirada da cama e olhou tudo em volta Cada detalhe cada canto as paredes com os desenhos que Henrique tinha colado o porta-retrato com uma foto dos dois sorrindo no parque a almofada com o nome dele bordado pela avó Tudo ali gritava saudade Ele passou a mão devagar sobre o lençol depois abriu a gaveta da escrivaninha e pegou um caderno de desenho Henrique desenhava mal mas se achava o máximo Tinha um que era ele com uma capa dizendo que era um superherói que
curava todo mundo Álvaro sorriu por dentro a garganta travada Ele ficou ali por quase meia hora sem dizer uma palavra só lembrando só sentindo O quarto estava vazio mas ao mesmo tempo estava cheio demais cheio de lembrança de ausência de tudo o que não dava para explicar Foi então que ele teve uma ideia uma que doeu só de pensar mas que talvez talvez fosse o certo Se aquele lugar estava parado no tempo talvez fosse hora de deixá-lo respirar de novo Não apagar nunca mas deixar ele viver de outro jeito Ele levantou saiu do quarto e
chamou Rosa Quero que você limpe o quarto do Henrique amanhã Tire o pó abra as janelas Deixe entrar luz mas não mexa nas coisas só limpe Rosa arregalou os olhos tinha medo de entrar ali Todo mundo da casa tinha mas ela assentiu Tá bom seu Álvaro Ele desceu de volta e viu Joãozinho ainda na frente da TV só que agora estava com sono os olhos caindo a cabeça pendendo pro lado Álvaro desligou a televisão e disse: "Vem vou te mostrar um quarto melhor para dormir." Joãozinho levantou meio assustado "Melhor?" perguntou Sim um quarto de verdade
com armário janela travesseiro Bom você vai gostar O menino seguiu ele pelas escadas com cuidado como se a qualquer momento alguém fosse dizer que ele estava proibido Álvaro abriu a porta do antigo quarto de hóspedes que ficava no corredor do lado oposto ao quarto do Henrique Era um quarto bonito com parede clara cortina azul uma cama grande e cheirosa Tinha uma mesinha uma estante vazia e um tapete macio Joãozinho entrou e ficou parado olhando tudo Não sabia nem onde colocar a mão Aqui vai ser seu canto enquanto estiver com a gente disse Álvaro Para sempre
o menino perguntou baixinho Álvaro respirou fundo olhando pro teto Não sei ainda mas por agora é Joãozinho Olhou pra cama depois olhou pro homem e falou: "Posso tomar outro banho?" Pode sim Toalha tá no armário do banheiro Fica à vontade Enquanto o menino ia se lavar Álvaro ficou parado na porta do quarto com a mão na maçaneta Algo dentro dele ainda dizia que estava sendo rápido demais que era perigoso se apegar mas outra parte a que tinha sido pai dizia que não dava para ignorar Joãozinho não era Henrique e nunca seria Mas talvez talvez aquele
menino precisasse deles tanto quanto eles estavam precisando dele Lá embaixo Lúcia ouvia tudo da cama Ela não falou nada só fechou os olhos tentando imaginar o quarto do filho se abrindo de novo Doeu mas pela primeira vez em dias doeu de um jeito diferente No café da manhã Joãozinho apareceu com o cabelo ainda molhado do banho A camiseta estava limpa um pouco grande para ele mas cheirosa Era uma das roupas que Rosa encontrou num armário antigo Ele se sentou à mesa como quem ainda não se acostumou a estar ali Olhava pro prato depois olhava em
volta esperando alguém avisar que estava na hora de ir embora Mas ninguém disse nada Só serviram pão com manteiga e leite quente E ele comeu Lúcia desceu devagar com uma manta nos ombros Tava com o rosto pálido e os olhos fundos mas fez questão de estar ali Sentou na ponta da mesa observando Não falava muito só escutava Era como se estivesse tentando entender quem era aquele menino que do nada entrou na vida deles Tinha alguma coisa nele que despertava sentimentos que ela não conseguia explicar Parte dela se incomodava Outra parte ficava olhando sem parar querendo
saber mais Rosa percebeu o clima serviu o café trocou olhares rápidos com Lúcia depois saiu da cozinha para dar espaço Álvaro entrou pouco depois calado ainda com cara de quem não dorme direito Sentou na frente de Joãozinho e perguntou sem cerimônia: "Dormiu bem?" O menino assentiu com um pedaço de pão na boca "Dormi sim nem acordei de madrugada Lúcia então falou pela primeira vez naquela manhã Você tem quantos anos mesmo nove respondeu ele olhando direto para ela E seus pais a mãe sumiu O pai eu nunca conheci Falou sem drama sem peso como quem já
contou essa história mil vezes Lúcia abaixou o olhar Álvaro pegou a xícara e ficou girando o café devagar O silêncio durou alguns segundos até Joãozinho perguntar: "Eu posso ajudar em alguma coisa hoje?" "Pode" disse Álvaro "Se quiser pode me acompanhar lá no escritório Tenho umas coisas para resolver" Lúcia arqueou a sobrancelha mas não disse nada Só observou "O que esse homem estava querendo com esse menino era por causa do Henrique estava tentando preencher o buraco que ficou ela não sabia mas algo dentro dela ficava alerta Um tipo de desconfiança que misturava tristeza com medo de
perder o pouco que restava da vida deles Joãozinho seguiu Álvaro até a parte de trás da casa onde ficava um escritório grande cheio de livros pastas papéis espalhados Era ali que Álvaro tocava os negócios da empresa de construção da família Ele sentou na cadeira de couro ligou o computador e apontou para uma cadeira menor Pode sentar aí se quiser Joãozinho olhava tudo com curiosidade Nunca tinha visto uma sala daquelas nem sabia o que eram aquelas coisas todas ficou quieto no canto mas observando cada movimento o jeito que Álvaro digitava os telefonemas curtos que ele atendia
os arquivos nas prateleiras os olhos do menino não paravam "Você sabe ler?" Álvaro perguntou depois de um tempo mais ou menos Aprendi um pouco no abrigo mas depois que saí parei "Quer que eu te ensine?" disse Álvaro sem tirar os olhos do computador Joãozinho sorriu com um canto da boca Queria mas vai ter tempo a gente arruma Lá do andar de cima Lúcia olhava pela janela Via os dois sentados na sala lá embaixo e o incômodo crescia Era estranho muito estranho O marido que mal conseguia olhar para ninguém agora passava horas com um menino desconhecido
estava abrindo espaço para alguém de fora tão fácil assim e se fosse perigoso e se esse garoto tivesse algum passado que eles não sabiam mais tarde quando Álvaro subiu para pegar uns documentos no quarto Lúcia aproveitou e puxou Rosa de canto "Você sabe de onde esse menino veio de verdade?" perguntou num tom baixo Rosa balançou a cabeça Só sei o que ele contou Que vivia na rua que a mãe sumiu que não sabe do pai E o Álvaro por que trouxe ele acho que por impulso Ele viu o menino na porta e acho que alguma
coisa mexeu com ele Lúcia suspirou passou a mão na testa cansada mas não falou mais nada Aquilo estava começando a incomodar de verdade E não era só por ciúme nem por medo de estar sendo substituída Era por não saber não saber quem era esse garoto de onde veio e por ele parecia tão à vontade ali dentro No fim da tarde Joãozinho ajudou Rosa na cozinha cortou tomate lavou alface até tentou temperar o feijão Ficava perguntando de tudo O que era aquilo para que servia tal coisa onde ela aprendeu a cozinhar rosa ria Ele era curioso
perguntador mas respeitoso E isso ela respeitava Enquanto isso Álvaro mexia em uma caixa antiga de papéis no escritório Procurava um documento antigo Mas o que achou foi outra coisa uma carta dobrada no fundo da caixa com um envelope amarelo Abriu por instinto Era uma carta de uma antiga funcionária da empresa uma tal de Marina Ele leu devagar Conforme as palavras iam entrando nos olhos o rosto dele começou a mudar Na carta Marina dizia que estava indo embora que não podia continuar trabalhando lá que não queria atrapalhar a vida dele Dizia que tinha descoberto algo que
ia mudar tudo e pedia desculpa Não falava exatamente o quê mas tinha uma frase que ficou martelando na cabeça de Álvaro Espero que um dia você me perdoe e que entenda que eu só quis proteger Ele ficou parado ali segurando o papel sentindo o peso de uma lembrança que ele nem lembrava direito Marina Marina Ele fechou os olhos tentou puxar da memória o rosto dela trabalhava no financeiro ficou um tempo na empresa depois sumiu sem dar explicação Será que o barulho da porta interrompeu o pensamento Joãozinho apareceu ali com um copo d'água Trouxe para você
disse ele esticando o copo Álvaro pegou ainda meio travado Olhou pro menino por alguns segundos sem dizer nada Alguma coisa ali dentro tava se formando algo que ele ainda não conseguia entender Valeu Joãozinho De nada respondeu o menino e saiu Álvaro olhou de novo pra carta A curiosidade e a dúvida começaram a crescer e Lúcia do outro lado da casa começava a perceber que aquela história não ia ser simples A casa estava silenciosa de novo Depois do jantar cada um foi pro seu canto Rosa recolheu os pratos Lúcia subiu direto pro quarto e Álvaro ficou
mais um tempo sentado na sala com a cabeça cheia pensando em tudo e em nada ao mesmo tempo Joãozinho depois de comer ficou meio perdido Não sabia se devia ir pro quarto sozinho se devia esperar alguém mandar Até que Álvaro olhou para ele e disse: "Pode ir deitar tá se quiser alguma coisa chama" Joãozinho assentiu e subiu as escadas ainda não sabia andar direito pela casa então ia olhando as portas como se cada uma fosse um mistério Quando achou o quarto dele abriu devagar A luz já estava acesa a cama arrumada e em cima do
travesseiro um pijama dobrado Rosa tinha deixado ali Ele pegou a roupa com cuidado como se fosse algo raro demais para ele tocar Entrou no banheiro trancou a porta e demorou no banho A água quente escorria pelo corpo magro lavando não só a sujeira mas uma parte da solidão que ele carregava desde sempre Depois que vestiu o pijama ficou se olhando no espelho por um tempo Não reconhecia o próprio reflexo Parecia outro menino Um menino com rosto limpo cabelo penteado roupa cheirosa Mas o olhar o olhar ainda era o mesmo Aquele olhar de quem já viu
demais sentiu demais cresceu antes da hora voltou pro quarto deitou na cama e puxou o cobertor até o queixo A luz do corredor ainda entrava pela fresta da porta Ele ficou ali deitado com os olhos abertos encarando o teto Não conseguia dormir Tinha medo de que tudo aquilo fosse acabar de repente como outras vezes em que ele achou que ia ficar bem e acabou na rua de novo Fechou os olhos com força tentando segurar o sono Mas na cabeça vinham imagens do passado lembranças soltas bagunçadas como se alguém tivesse jogado um monte de cenas dentro
da cabeça dele sem ordem Lembrou da mãe do rosto dela meio apagado da voz doce chamando ele de meu anjo Lembrou do último dia em que viu ela Eles estavam numa praça Ela disse que ia até a esquina e voltava Ele esperou por horas e ela nunca mais voltou Depois vieram os abrigos as noites em colchão fino os castigos os gritos Criança não podia errar Se derrubasse comida era chinelada Se chorasse era castigo Ele aprendeu a se calar a se defender E quando não aguentou mais fugiu A rua parecia melhor Pelo menos ali ele mandava
em si mesmo Pelo menos ali ninguém mandava ele calar a boca Só que a rua também batia A rua era fria Era fome era medo Era correr de madrugada quando alguém tentava puxar ele para dentro de um carro Era dividir resto de comida com cachorro Era ver gente pior do que ele se perdendo Pensando nessas coisas ele começou a chorar baixinho sem soluço só as lágrimas escorrendo Tentava não fazer barulho Não queria que ninguém ouvisse não queria parecer fraco Mas ali naquele quarto limpo naquela cama fofa tudo parecia mais pesado ainda Era como se o
corpo finalmente tivesse baixado a guarda e tudo aquilo que ele segurou por tanto tempo agora tivesse espaço para sair Do outro lado da casa Álvaro ainda estava acordado Tinha tentado dormir mas a cabeça não deixava Aquela carta da Marina ainda estava mexendo com ele Aquela frase repetia sem parar na mente dele Eu só quis proteger Proteger de quê de quem dele do mundo e por que sumir sem falar nada ele levantou andou pelo corredor escuro e parou na frente do quarto do menino Pensou em bater mas desistiu Encostou o ouvido na porta e não ouviu
nada mas sentia algo ali dentro Algo que doía também nele Voltou pro quarto mas não conseguiu dormir Já era quase 2as da manhã quando o Joãozinho acordou com um barulho de trovão forte seco a janela tremendo com o vento A chuva caía pesada Ele pulou da cama assustado Trovão sempre lembrava de quando ele dormia embaixo da ponte Lembrava do medo de ser arrastado pela água Lembrava dos caras que roubavam cobertor dos outros meninos chorando no meio da lama Ele se encolheu puxou o cobertor até o rosto e tentou esquecer mas não dava Decidiu sair do
quarto Abriu a porta devagar desceu as escadas com cuidado Não queria incomodar só queria ver alguma luz acesa alguma voz algum sinal de que tinha gente acordada Na sala tudo apagado na cozinha também mas a luz do corredor que levava ao escritório estava acesa Ele andou até lá e viu Álvaro sentado na poltrona com uma pasta aberta no colo O homem levantou os olhos quando viu o menino parado na porta "Não consegue dormir?" perguntou ele Joãozinho balançou a cabeça "Tá chovendo forte." Álvaro apontou o sofá com o queixo "Senta aqui comigo." O menino foi Sentou
ficou com as mãos no colo O barulho da chuva batendo na vidraça era o único som da sala "Você tem medo de chuva?" Álvaro perguntou um pouco mas é mais do barulho mesmo e dos trovões Álvaro fechou a pasta e colocou de lado Olhou pro menino viu os olhos vermelhos os ombros tensos Ficaram em silêncio por alguns minutos Sabe meu filho também não gostava de trovão ele disse Sempre que chovia forte ele corria pro meu quarto Às vezes dormia lá mesmo só para se sentir mais seguro Joãozinho olhou para ele O senhor ainda pensa muito
nele o tempo todo Joãozinho abaixou a cabeça Eu também penso na minha mãe mesmo sem saber onde ela tá Álvaro estendeu o braço e colocou a mão no ombro do menino Um gesto simples mas ali naquela hora foi enorme Você pode ficar aqui essa noite se quiser Tem um cobertor ali no sofá Joãozinho olhou levantou pegou o cobertor e se enrolou Deitou devagar ajeitou o travesseiro e fechou os olhos O barulho da chuva ainda estava ali mas parecia menor agora Álvaro apagou a luz e ficou sentado por um tempo só ouvindo a respiração do menino
A casa pela primeira vez em muitos dias parecia respirar de novo também O som da campainha foi direto insistente Não era como a batida de quem tá com pressa era de quem tem costume de entrar em lugar e sem pedir licença Rosa enxugou as mãos no avental e foi abrir Quando viu quem era o sorriso dela sumiu na hora Seu Artur cadê o Álvaro ele entrou sem esperar resposta como sempre fazia O palitó caro a gravata apertada no pescoço aquele olhar que parecia pesar qualquer um só com um segundo de silêncio Rosa ficou muda e
apontou pro fundo da casa Arthur foi entrando como se ainda morasse ali O tipo de pessoa que nunca perde o ar de dono mesmo quando não tem mais motivo nenhum para isso Era o irmão mais velho de Álvaro Só dois anos de diferença mas pareciam de mundos diferentes onde Álvaro era mais calmo mais discreto Artur era direto frio sempre pensando em controle números poder Na sala Álvaro mexia em alguns papéis tentando colocar ordem nas coisas da empresa que ele tinha deixado de lado desde a morte do filho Quando ouviu o som do sapato caro batendo
no chão da sala já sabia quem era "Achei que você não ia aparecer tão cedo" disse sem levantar os olhos "E deixar você perder a cabeça de vez?" "Nem pensar" Arthur respondeu jogando a maleta em cima da mesa Álvaro fechou a pasta com calma como quem segura o estômago para não explodir Os dois se olharam por um instante Olhar de irmãos que se conhecem desde sempre mas nunca se entenderam de verdade Rosa me contou Tem um menino aqui Álvaro cruzou os braços Joãozinho Ele apareceu aqui faminto sozinho Trouxe ele para dentro Trouxe assim uma criança
da rua Álvaro você ficou louco ele estava morrendo de fome Arthur E você achou que virar assistente social ia resolver a sua dor isso não é um abrigo é sua casa Ou pelo menos era Álvaro não respondeu só olhou pela janela como quem tenta puxar o ar para não voar no pescoço do outro Você sabe o que a imprensa faria se soubesse disso arthur continuou Você é um homem público Álvaro Dirige uma das maiores construtoras do estado Imagina o escândalo Milionário acolhe menor abandonado Você já pensou nisso você tá me ouvindo falar de escândalo Arthur
meu filho morreu A mulher que eu amo tá lutando contra um câncer E você tá preocupado com o manchete arthur deu um passo paraa frente falando baixo mas com a raiva presa no canto da boca Tô preocupado com o que sobrou porque pelo jeito nem isso você tá conseguindo cuidar Nesse momento Joãozinho apareceu no corredor segurando um carrinho nas mãos ouviu vozes altas e foi ver Parou na porta da sala sem dizer nada só ficou ali vendo os dois homens se encarando Artur virou o rosto e viu o menino Olhou de cima a baixo como
quem analisa um problema e não uma pessoa É ele Joãozinho Apertou o carrinho contra o peito sentindo que alguma coisa estava errada naquele olhar Sim respondeu Álvaro com firmeza O que ele tá fazendo com os brinquedos do Henrique o silêncio foi gelado Álvaro não respondeu de imediato Sentiu o coração apertar Eu deixei Artur riu com desdém Claro que deixou porque agora tudo pode Deixa eu adivinhar Ele dorme aqui come aqui tá quase virando parte da família Joãozinho começou a dar dois passos para trás Aquilo tudo estava pesado demais O jeito que aquele homem olhava para
ele falava com ele ali na frente como se ele fosse um objeto fora do lugar "Vem cá menino." Artur chamou direto Joãozinho parou sem saber se ia ou se corria olhou para Álvaro buscando algum sinal Tá tudo bem Joãozinho álvaro disse calmo O menino foi devagar parou de frente pro Artur que se abaixou um pouco como quem fala com um bicho arisco Você é esperto né já viu que aqui tem comida cama brinquedo vida boa e pensou: "Vou ficar." Acertei Joãozinho não respondeu Ficou só olhando os olhos brilhando de vergonha e raiva Você acha que
é fácil assim artur continuou Entrar na vida dos outros como se tudo fosse seu Você sabe o que aconteceu com o filho dele sabe o que essa casa passou álvaro levantou de um pulo Chega Arthur Não é com ele que você tem que falar É comigo É com você Sim Mas é sobre ele Artur apontou com o dedo E sobre o que você tá deixando acontecer lúcia apareceu na escada fraca com a mão segurando o corrimão Ouviu tudo Viu o rosto do menino o jeito dele olhando pro chão tentando se encolher dentro do próprio corpo
"Que tá acontecendo aqui?" ela perguntou Artur virou ainda no mesmo tom seco tentando trazer seu marido de volta pro mundo real Mas parece que ele já foi longe demais Joãozinho não aguentou largou o carrinho no chão e correu pro quarto Trancou a porta e se jogou na cama Tava tremendo O peito apertado o rosto vermelho Não era só vergonha era aquele medo que ele conhecia bem O medo de ser jogado fora de novo Álvaro foi atrás dele bateu na porta mas Joãozinho não respondeu Sentado do outro lado o menino chorava em silêncio Lá embaixo Arthur
pegou a maleta e foi embora sem se despedir Lúcia ficou parada na escada observando tudo Tava cansada mas também estava cheia de perguntas que só aumentavam E Álvaro pela primeira vez sentiu que se quisesse manter Joãozinho ali ia ter que lutar com mais do que só os próprios sentimentos O sol bateu direto na janela do quarto Joãozinho acordou com os olhos meio grudados virado de lado encolhido cobertor até o pescoço Por uns segundos ele esqueceu onde estava Olhou pro teto pro abajur pras paredes e achou tudo estranho até lembrar que não estava mais na rua
Aquilo ainda era esquisito para ele Estranho acordar e não ver o céu não ouvir buzina não sentir o chão gelado das calçadas Se levantou devagar passou a mão no rosto coçou a cabeça e calçou os chinelos que Rosa tinha arrumado Estava tudo muito quieto Ele abriu a porta devagar e saiu no corredor A casa parecia vazia mas o cheiro de café fresco denunciava que alguém já estava de pé Desceu as escadas em silêncio com passos lentos como se cada degrau ainda fosse território desconhecido Na cozinha Rosa mexia a panela como sempre O barulho do óleo
fritando alguma coisa e o cheiro de pão na chapa deixavam o ar mais leve Quando viu o menino na porta ela só levantou uma sobrancelha e apontou com a cabeça pra mesa "Vai sentar tá quase pronto." Joãozinho sorriu de canto agradecido Sentou e esperou Tinha aprendido que ali mesmo sem dizer muito as pessoas cuidavam dele E isso era novo era bom Enquanto comia Álvaro apareceu Estava com uma camisa simples e o rosto mais descansado do que nos dias anteriores Ele olhou pro menino que mastigava devagar e perguntou: "Dormiu bem?" Joãozinho respondeu de boca cheia com
um gesto de cabeça Depois engoliu rápido e disse: "Dormi sim melhor do que em qualquer lugar que eu já dormi na vida." Álvaro sentou à mesa também Rosa colocou o café dele sem que ele pedisse Tudo ali seguia um ritmo próprio um ritmo que aos poucos estava incluindo Joãozinho sem nem perceber Depois do café Álvaro levantou e disse: "Hoje a gente vai sair um pouco para onde?" "Comprar algumas roupas para você Tá precisando né?" Joãozinho arregalou os olhos Nunca ninguém tinha levado ele para comprar roupa Sempre pegava doações roupas usadas rasgadas às vezes até roupa
de menina só para ter o que vestir Sério sério antes de saírem Lúcia apareceu na sala com um vestido leve e um lenço na cabeça A aparência ainda era frágil mas o olhar estava mais firme Ela olhou pro menino que se ajeitou na hora e perguntou: "Vai sair com ele?" Álvaro respondeu que sim que iam comprar roupas Lúcia assentiu mas não disse mais nada só observou o jeito como o menino olhava pro marido dela como se confiasse nele de verdade Aquilo mexia com ela Ainda era difícil aceitar mas o incômodo que sentia antes estava começando
a se misturar com outra coisa uma coisa que ela não sabia nomear Foram até o shopping em silêncio Joãozinho não sabia nem por onde olhar Tudo ali era enorme brilhante cheio de gente Olhava para as vitrines como se estivesse em outro planeta "Pode escolher o que quiser" disse Álvaro apontando pra loja de roupas infantis "O que eu quiser dentro do bom senso né?" Álvaro riu Joãozinho escolheu duas camisetas um short e um par de tênis Quando calçou o tênis ficou olhando o pé como se tivesse ganhado um presente do tamanho do mundo Agradeceu três vezes
apertando o tênis com força Depois passaram numa livraria Álvaro pegou um livrinho de histórias infantis e entregou para ele Vamos tentar praticar a leitura Joãozinho ficou sério Você vai mesmo me ensinar claro que vou A gente combina uma horinha por dia Um pouco de leitura um pouco de escrita Que tal o menino assentiu com força Os olhos brilhavam Era como se alguém tivesse enxergado ele de verdade pela primeira vez Na volta para casa Joãozinho quase dormiu no carro Sentia um cansaço bom daqueles que não vinham da fome mas de viver algo novo Quando chegaram ele
correu pro quarto e espalhou as roupas em cima da cama Rosa apareceu na porta curiosa e ele mostrou tudo com orgulho como se tivesse voltado de uma missão importante À tarde ele ajudou a varrer a varanda regar as plantas e até arrumar parte do escritório com Álvaro Guardava os papéis alinhava as canetas perguntava o nome das coisas Cada canto da casa era um mundo novo para ele explorar No fim do dia Lúcia desceu pro jardim sentou num banco e ficou observando Joãozinho estava tentando brincar com o cachorro do vizinho que apareceu pelo portão Corria ria
jogava um graveto Álvaro apareceu com uma manta e colocou sobre os ombros dela Sentou ao lado e os dois ficaram ali em silêncio assistindo o menino correr Ele tem energia hein álvaro disse Lúcia demorou para responder Tem E é curioso também fica observando tudo tentando entender tudo Você ainda tá incomodada com ele aqui ela respirou fundo Não mas ainda tô tentando entender o que ele tá fazendo com a gente Álvaro olhou pro menino e disse: "Talvez nada talvez tudo Não sei Só sei que quando ele chegou eu parei de sentir só dor Comecei a sentir
outras coisas também." Lúcia encostou a cabeça no ombro do marido Ficaram ali por um tempo só escutando o vento os passos do menino o som leve da vida tentando voltar Antes de anoitecer Joãozinho tomou banho vestiu uma das camisetas novas e apareceu na cozinha querendo ajudar com o jantar Rosa deu uma tarefa simples colocar a mesa e ele fez com o maior cuidado do mundo Guardanapo do lado certo copo alinhado prato limpo Jantaram os três juntos Pela primeira vez Lúcia puxou o assunto com ele Você gosta de futebol joãozinho abriu um sorriso Gosto muito mas
nunca joguei num campo de verdade só na rua com bola de meia E qual time corinthians Álvaro fez uma careta Poxa justo esse Joãozinho riu É o que eu via mais na televisão quando dava para ver A conversa seguiu leve natural Quando terminou ele ajudou a tirar os pratos e lavou as mãos sem ninguém pedir Subiu pro quarto sozinho e leu as primeiras palavras do livrinho com esforço mas com vontade Álvaro foi espiar depois Encontrou o menino sentado na cama livro no colo boca mexendo em silêncio como se tentasse guardar cada sílaba Não disse nada
só apagou a luz do corredor fechou a porta devagar e ficou ali do lado de fora por alguns segundos A casa tava começando a ter rotina de novo mas era uma rotina diferente uma que ninguém ali tinha planejado Álvaro acordou cedo naquele dia mais cedo do que o normal passou a mão no rosto ficou sentado na beirada da cama por uns minutos e depois foi direto pro escritório Tinha algo martelando na cabeça desde a noite anterior carta da Marina aquela letra pequena firme e a frase que não saía da cabeça dele Eu só quis proteger
Ele não fazia ideia do que ela queria dizer com aquilo mas sabia que não ia conseguir sossegar enquanto não descobrisse Sentou na frente do computador abriu o e-mail da empresa e puxou os registros antigos Marina tinha trabalhado ali Isso ele lembrava Era do financeiro tímida eficiente quase invisível Ficou pouco mais de um ano e depois saiu do nada Não pediu demissão sumiu E só agora lendo aquela carta Álvaro começava a desconfiar que aquele sumisso não tinha sido simples assim digitou o nome dela no sistema e achou um arquivo velho com CPF RG endereço antigo Copiou
tudo num papel Ficou olhando aquilo por um tempo com um aperto no peito Não sabia o que ia encontrar mas já dava para sentir que vinha alguma coisa grande Enquanto isso Joãozinho estava no quarto tentando ler uma historinha Ficava repetindo as palavras em voz baixa errando aqui e ali mas insistindo O quarto agora tinha uns brinquedos uma mochila um par de tênis no canto Aos poucos tava deixando de ser só um quarto e começando a aparecer um lugar onde alguém morava de verdade Rosa chamou para o café Joãozinho desceu rápido Tava com fome e com
aquela vontade boa de fazer parte sentou à mesa e perguntou se podia ajudar com alguma coisa depois da comida Rosa deu um pano e mandou ele limpar a mesa Ele fazia tudo com o maior cuidado do mundo Era como se cada tarefa simples fosse uma forma de agradecer por estar ali Lúcia apareceu mais tarde sentou no sofá com uma manta nas pernas e um livro no colo mas não lia de verdade Observava Joãozinho limpando Rosa mexendo na panela a casa funcionando Tudo muito diferente de algumas semanas atrás quando só o silêncio morava ali Ainda era
difícil ver aquilo tudo acontecendo tão rápido mas ela estava tentando entender e aceitar Foi então que ela viu algo no chão da sala um colar simples de couro com uma pedrinha pendurada e uma letra presa num círculo de metal A letra A Lúcia pegou o colar virou na mão algumas vezes e sentiu o coração acelerar Aquilo ali não era estranho Ela já tinha visto aquele colar antes muitos anos atrás num momento que ela tentou apagar da cabeça guardou o colar na mão e subiu direto pro quarto Abriu uma gaveta antiga onde guardava coisas velhas e
puxou uma caixinha de madeira Lá dentro fotos antigas bilhetes lembranças Vasculhou até encontrar uma foto dela e Álvaro num jantar da empresa de muito tempo atrás E lá no fundo no canto da imagem uma moça jovem cabelos escuros presos num coque usando o mesmo colar Marina Lúcia sentou na cama segurando a foto e o colar A mente dela começou a ligar os pontos A moça sumida A carta o menino a letra A o jeito como Álvaro olhava para Joãozinho o silêncio dele sobre o passado Tudo começou a pesar Ela não quis acreditar mas a dúvida
já estava ali plantada como uma semente impossível de arrancar Na parte da tarde Álvaro chamou Joãozinho para uma conversa no escritório "Vem cá senta aqui comigo." O menino foi meio sem saber por quê sentou devagar com as pernas balançando na cadeira Me conta uma coisa Você lembra da sua mãe como ela era joãozinho pensou um pouco Lembro mais ou menos Ela era magra cabelo escuro trabalhava muito Às vezes voltava tarde mas sempre me dava um beijo antes de dormir Ela te dizia o nome dela sim Marina Álvaro parou sentiu um nó no peito tentou esconder
mas a mão começou a tremer um pouco E o sobrenome dela acho que era Marina Duarte mas não tenho certeza Ela nunca falava muito disso Álvaro levantou da cadeira foi até a janela e ficou olhando pro jardim Não tinha mais dúvida Era ela a mesma Marina da carta a mesma Marina da empresa a que sumiu sem avisar E agora o menino estava ali na casa dele com a letra A pendurada no pescoço Joãozinho ficou quieto Sentia que alguma coisa séria estava acontecendo mas não sabia o quê Por que você tá me perguntando essas coisas ele
arriscou Álvaro virou de costas Porque eu acho que talvez você não tenha aparecido aqui por acaso Joãozinho franziu a testa Aquilo parecia filme mas era a vida dele Naquela noite Álvaro não conseguiu dormir Deitou levantou andou pelo quarto saiu foi até o escritório de novo abriu a carta mais uma vez ficou lendo e relendo Marina tinha ido embora grávida era isso e nunca disse nada por quê decidiu que ia investigar e até o antigo endereço da ficha dela ver se alguém ainda morava lá perguntar puxar qualquer pista Precisava saber Lúcia do outro lado da casa
também estava acordada deitada de lado com a mão segurando o colar do menino O mesmo colar que anos atrás ela tinha visto no pescoço da mulher que ela fingiu não ver A sombra do passado estava voltando e ninguém ali ia sair ileso dessa história Álvaro já estava cansado daquilo A cabeça pesada o coração batendo rápido e aquele aperto no peito que não deixava ele respirar direito Desde que achou aquela carta da Marina o mundo virou de cabeça para baixo Ele tentava manter a calma mas por dentro estava tudo bagunçado Não conseguia parar de olhar pro
Joãozinho e pensar que talvez aquele menino fosse mesmo filho dele E se fosse como é que ninguém contou isso antes ele ligou pro Artur mandou um recado direto Preciso falar com você pessoalmente agora Artur chegou na mansão com a mesma postura de sempre como se ainda mandassem tudo Entrou sem pedir ignorando Rosa ignorando até o cachorro que latiu na entrada Álvaro já esperava por ele no escritório "Senta aí" disse seco Artur não gostou do tom mas obedeceu Sentou devagar jogou as chaves na mesa e cruzou os braços Fala o que foi agora Álvaro jogou a
carta na frente dele Lê isso Artur pegou o papel leu devagar Quando chegou na parte final levantou os olhos meio confuso Marina isso aí é de quando 10 anos atrás Arthur devolveu a carta com calma E o que você quer com isso agora quero saber porque ela sumiu E se você teve alguma coisa a ver com isso Artur deu um sorriso torto Tá brincando comigo não tô brincando Você sempre soube demais Sempre quis controlar tudo e sempre deixou claro que aquela história com a Marina te incomodava Incomodava mesmo Você era casado Álvaro Eu cometi um
erro e paguei caro por isso Mas isso não te dava o direito de esconder nada de mim Tá dizendo que eu escondi tô dizendo que ela sumiu do nada sem motivo E agora aparece essa carta E um menino Um menino que pode ser meu filho batendo na minha porta Artur levantou da cadeira Você tá delirando você perdeu o filho a esposa tá doente e agora tá agarrado nessa ideia maluca de que um moleque de rua é seu filho perdido ele se chama João e a mãe dele se chamava Marina A mesma Marina Artur ficou em
silêncio por alguns segundos depois respirou fundo e foi direto Tá E se for verdade vai fazer o quê vai assumir vai colocar o nome dele no testamento vai entregar tudo que o Henrique ia herdar para um garoto que apareceu do nada álvaro se levantou com raiva Não fala do Henrique nunca mais Você não tem o direito Eu tô tentando proteger você Álvaro e o legado da nossa família Não dá para agir com emoção Esse menino pode ser qualquer coisa pode ser um aproveitador um problema Você tá deixando a dor te deixar cego eu tô vendo
tudo com mais clareza agora do que nunca Artur se aproximou da mesa e apontou o dedo na cara do irmão Se você fizer alguma besteira eu vou impedir Pode ter certeza Você não vai jogar fora tudo o que construímos por causa de uma ilusão Álvaro bateu com força na mesa assustando até ele mesmo Isso não é ilusão é sangue é vida E se ele for meu filho você não vai ter poder nenhum para separar a gente Artur riu Aquele riso frio irritante que fazia Álvaro querer socar alguma coisa Tá apaixonado pela ideia né de ser
pai de novo de consertar o que não tem conserto Mas me escuta Álvaro se você seguir com isso eu juro por Deus que vou fazer de tudo para tirar esse moleque da sua casa Você não sabe do que eu sou capaz Infelizmente sei muito bem O clima pesou Os dois ficaram ali frente à frente respirando pesado se medindo com o olhar A tensão era tanta que dava para sentir no ar Artur ajeitou o palitó pegou a chave e foi saindo Não pense que isso acabou Álvaro respondeu sem olhar para ele Já acabou faz tempo Artur
Você só ainda não entendeu A porta bateu lá em cima no corredor Joãozinho tinha escutado tudo Ele estava voltando do banheiro quando ouviu as vozes no escritório Parou na escada quietinho e escutou tudo Cada palavra Sentiu o estômago virar o coração disparar Filho testamento sangue Voltou pro quarto correndo sentou na cama com a cabeça cheia de pergunta: "Quem era aquele homem bravo porque ele estava dizendo que Álvaro ia se arrepender e o que era aquilo de testamento herança?" Ele nunca quis nada só queria ficar ali Só queria um canto seguro Minutos depois Álvaro subiu bateu
na porta devagar João posso entrar o menino enxugou o rosto rápido tentando esconder que tinha chorado Pode Álvaro entrou sentou na beirada da cama e olhou para ele Quase falou mas engoliu Não sabia se era a hora certa Não sabia nem se o menino queria ouvir "Tá tudo bem?" perguntou Joãozinho olhou para ele com um olhar que misturava medo confusão e uma pontinha de esperança Quem era aquele cara álvaro demorou para responder Meu irmão o Artur ele não gosta de mim né não mas isso não importa O que importa é que eu gosto e você
tá seguro aqui Joãozinho ficou em silêncio por um tempo depois perguntou: "Por que ele falou que eu posso ser seu filho álvaro respirou fundo fechou os olhos por um segundo e disse: "Porque talvez você seja mesmo" Joãozinho arregalou os olhos Ficou parado sem saber o que dizer Ele não tava preparado para ouvir aquilo Ninguém tá ainda mais um menino de 9 anos que cresceu sem pai sem resposta para nada A sua mãe a Marina Eu conheci ela muito antes de você nascer e acho que ela nunca me contou a verdade mas eu vou descobrir E
se for verdade ele segurou a mão do menino Eu vou cuidar de você do jeito certo sem esconder sem fugir Joãozinho só assentiu com a cabeça Sentia um nó na garganta mas era um nó diferente Era tipo uma mistura de medo com vontade de acreditar vontade de que tudo aquilo fosse real Do outro lado da cidade Artur estava no carro com o celular na mão ligou para alguém Eu preciso de um favor E não não é legal mas preciso que você descubra tudo sobre esse menino Nome completo onde nasceu tudo Se tiver que cavar cava
eu pago bem A guerra tinha começado mas o coração de Joãozinho mesmo pequeno estava pronto para lutar pelo que ele nunca teve No dia seguinte a casa tava estranha Um silêncio que não era de paz era de peso Joãozinho mal saiu do quarto só apareceu rapidinho na cozinha pegou um pedaço de pão disse: "Bom dia baixo!" E voltou Rosa percebeu mas não perguntou Já tinha aprendido a respeitar o tempo do menino Lúcia por outro lado estava inquieta A cabeça não parava O colar ainda estava guardado no bolso do casaco e a foto com a imagem
de Marina ao fundo estava em cima da penteadeira bem na frente do espelho que ela evitava olhar Aquilo não era coincidência e ela sabia que estava na hora de conversar com Álvaro Esperou ele descer Ele veio com cara de poucos amigos como nos últimos dias Olhos fundos barba por fazer o pensamento longe A gente pode conversar Ela perguntou firme Álvaro assentiu sem dizer nada Sentaram na sala os dois no sofá um de cada lado Lúcia tirou o colar do bolso e colocou em cima da mesa de centro Isso aqui caiu do bolso do João ontem
Reconhece álvaro pegou o colar passou os dedos devagar pela letra A presa no cordão O coração dele disparou É igual ao que eu dei pra Marina anos atrás Ela usava sempre "Eu achei essa foto também" disse Lúcia mostrando a imagem dos dois no jantar da empresa Marina aparece ao fundo discreta com o colar no pescoço Álvaro segurou a foto com as mãos trêmulas Por um instante ficou em silêncio Depois falou baixo "Eu acho que o João é meu filho Lúcia." Ela respirou fundo não ficou surpresa Já sabia "E o que você vai fazer já pedi
o exame de DNA Vai chegar em alguns dias mas aqui dentro eu já sei E se for você vai assumir sim Ela abaixou os olhos fez um carinho leve no braço tentando se proteger da dor que vinha Doía claro que doía O marido dela teve um filho fora do casamento Um filho que agora estava ali dentro de casa comendo na mesma mesa dormindo no quarto ao lado Mas ao mesmo tempo ver Álvaro com o menino ver a casa voltando a respirar isso trazia alguma coisa boa também alguma coisa que ela não sabia explicar Eu não
vou mentir" ela disse "Eu tô tentando digerir tudo mas se ele for seu mesmo eu não quero que ele vá embora" Álvaro olhou para ela surpreso Você tá dizendo que que talvez Deus tenha trazido ele agora por um motivo no meio da dor da doença do luto Talvez a gente precise dele tanto quanto ele precisa da gente Joãozinho sem querer ouviu parte da conversa do topo da escada Não tudo só um pedaço Se for seu mesmo não quero que ele vá embora Aquilo bastou sentiu um nó na garganta sentou ali mesmo com a cabeça encostada
no corrimão Não sabia o que sentir mas uma parte dentro dele aquela que sempre teve medo de ser jogada fora começou a acreditar que talvez talvez ele tivesse encontrado um lugar Dois dias depois o exame chegou Álvaro estava no escritório quando recebeu a ligação da clínica anotou o número do protocolo agradeceu e desligou As mãos suavam o peito parecia que ia explodir Digitou o acesso no site e quando o resultado apareceu na tela ele travou Compatibilidade 99% Joãozinho era mesmo filho dele Ele ficou olhando pra tela por um tempo sem saber se ria se chorava
se gritava pegou o celular ligou paraa Lúcia deu positivo Ela não respondeu por uns segundos depois disse: "Calma então agora você sabe Eu preciso contar para ele." Joãozinho estava no jardim tentando ensinar truques pro cachorro do vizinho que tinha virado figurinha carimbada no portão Quando viu Álvaro vindo parou e ficou em pé O homem se aproximou devagar ajoelhou na frente dele e disse: "João a gente fez aquele exame aquele que eu te falei" Joãozinho assentiu com os olhos arregalados e ele deu positivo Você é meu filho O menino não respondeu Ficou parado olhando pro chão
com o coração batendo tão forte que dava para ouvir Depois levantou o rosto devagar e perguntou: "Você tem certeza?" absoluta Joãozinho deu dois passos para trás ainda sem saber o que fazer com aquilo A cabeça rodando a vontade de chorar de correr de gritar mas também uma alegria estranha nova esquisita que ele nunca tinha sentido antes Então você é meu pai de verdade Sou João e você é meu filho E nada vai mudar isso Joãozinho correu mas não para longe Correu para abraçar ele forte apertado como se estivesse guardando aquele abraço desde o dia que
nasceu Álvaro fechou os olhos e segurou o menino com força Sentiu o cheiro do cabelo dele o calor do corpo pequeno o coração batendo no mesmo ritmo E ali naquele abraço ele soube era real Do outro lado da casa Lúcia olhava da janela Com os olhos cheios d'água ela sorriu Pela primeira vez em muito tempo Artur chegou na empresa com o mesmo ar de sempre pressa pasta de couro debaixo do braço celular na mão e aquele terno que parecia mais uma armadura Entrou batendo a porta da sala do Álvaro sem avisar Já vi que você
resolveu ignorar tudo que eu falei" disse direto Álvaro não levantou da cadeira só olhou para ele com calma Eu fiz o exame Artur parou e Álvaro empurrou o papel paraa frente Um simples pedaço branco com letras pequenas mas que carregava um peso imenso Artur pegou leu rápido os olhos saltaram a boca travou Por um segundo ele teve que ler de novo mais devagar para ter certeza É verdade" falou quase num sussurro Álvaro confirmou com a cabeça Joãozinho é meu filho Artur jogou o papel de volta na mesa e andou pela sala como quem procura um
jeito de fugir de si mesmo E agora vai sair anunciando isso por aí vai levar pra imprensa vai colocar o nome do moleque nos papéis da família álvaro ficou em silêncio por uns segundos depois respondeu: "Sim tudo isso ele é meu filho Artur e vai ser reconhecido legalmente publicamente em qualquer papel que tiver que assinar eu vou assinar Arthur Rio nervoso Você perdeu o juízo Não pela primeira vez eu acho que tô vendo as coisas como elas são Artur parou respirou fundo e baixou o tom Álvaro escuta eu entendo que você tá mexido que perdeu
o Henrique que tá tentando lidar com tudo isso mas você tem noção do que vai causar a imprensa vai cair matando o conselho da empresa vai questionar os acionistas vão ficar em pânico eles que se virem A empresa é forte vai aguentar E a imagem da família você não pensa na nossa reputação Artur eu tô pouco me lixando paraa imagem Eu só quero fazer o certo E o certo agora é assumir meu filho Artur se aproximou da mesa mais calmo mas com o olhar duro E se eu disser que não vou deixar você não manda
mais em nada aqui E mesmo que tentasse não tem o poder que acha que tem Você me obriga a reagir Álvaro Então age Artur olhou nos olhos do irmão por mais alguns segundos depois virou as costas e saiu Mas no fundo ele já sabia Aquela guerra tava perdida Enquanto isso Joãozinho estava na escola Era o primeiro dia Álvaro tinha insistido que ele precisava estudar Disse que ia ficar difícil no começo mas que ele ia ajudar Compraram mochila caderno lápis borracha tudo novo O menino andava com a mochila nas costas como se carregasse um troféu No
caminho para casa ele ficou olhando a paisagem pela janela do carro Pensava em tudo Ainda era difícil entender que aquele homem sério que antes era só um estranho agora era o pai dele Era estranho dizer meu pai Ele testava essa frase na mente como se fosse um sapato novo Ainda apertava um pouco mas dava vontade de usar Chegando em casa Rosa já esperava com o almoço pronto Frango grelhado arroz batata e salada Lúcia estava na sala enrolada na manta vendo TV Quando o menino entrou ela sorriu E aí como foi o primeiro dia legal A
professora é meio brava Mas falou que eu escrevo direitinho pro meu nível O Lúcia achou graça Pro seu nível foi o jeito dela dizer né que eu tô atrasado mas tô me esforçando Álvaro apareceu logo depois entrou colocou a pasta no sofá e foi direto pro Joãozinho Vem cá preciso te mostrar uma coisa Os dois foram até o escritório Álvaro abriu uma gaveta e tirou uma pasta azul Isso aqui é seu processo de reconhecimento Assinei tudo hoje Você vai ter meu nome agora Vai ser reconhecido como meu filho em todos os documentos Joãozinho ficou olhando
o papel sem entender tudo mas sentia o peso daquilo Era como se fosse um carimbo dizendo: "Você pertence a alguém agora E isso quer dizer o quê que você é meu filho de verdade no papel que ninguém mais pode dizer o contrário nem tentar te tirar de mim Joãozinho tentou segurar mas os olhos encheram de lágrimas Então agora eu tenho um pai mesmo Álvaro se abaixou colocou as mãos nos ombros dele Tem e ninguém vai te tirar de mim Eles se abraçaram de novo apertado forte do tipo que dura mais de 5 segundos Naquela mesma
tarde Lúcia desceu devagar com uma caixinha nas mãos sentou ao lado de Joãozinho e entregou Isso aqui era do Henrique Ele guardava as coisas dele aqui Cartas figurinhas recado de amigos E tem espaço para você colocar as suas também Só se quiser Joãozinho abriu a caixinha com cuidado Dentro vários papéis coloridos desenhinhos bonecos de papel Ele pegou um deles com o nome Henrique escrito em canetinha azul e ficou olhando por um tempo Ele era legal era o melhor menino do mundo respondeu Lúcia com um sorriso meio triste meio cheio de amor Eu prometo cuidar bem
das coisas dele ela passou a mão no cabelo dele com carinho Era a primeira vez que fazia isso Joãozinho fechou os olhos por um segundo queria guardar aquele momento Longe dali Arthur digitava furiosamente no computador pesquisava puxava arquivos antigos ligava para contatos até que achou um nome um dos exeguranças da empresa e junto uma informação Marina tinha recebido dinheiro antes de sumir Um depósito alto feito por uma conta que levava o nome de uma empresa fantasma E quem administrava aquela empresa ele mesmo Artur fechou o notebook devagar encostou na cadeira e respirou fundo Talvez ele
tivesse feito mais do que imaginava para sumirem com Marina na época Talvez ele tivesse cavado o próprio fim O tempo parecia correr diferente dentro daquela casa Joãozinho já se acostumava com os sons com os cheiros com o café da manhã quentinho e os bons dias que vinham com um sorriso Mas nos últimos dias o clima estava diferente Mais quieto mais lento Lúcia já não descia tanto Passava mais tempo no quarto dormia demais Às vezes não comia nada Outras vezes ficava só olhando pro teto sem falar Álvaro fingia que não via mas via E cada vez
que subia e via ela mais fraca mais pálida alguma coisa nele apertava Ele sabia Não precisava de exame nenhum nem de médico dizendo Ele sabia Lúcia estava indo embora Naquela manhã Rosa subiu com o café um copo de leite morno pão na chapa com um pouco de manteiga como sempre fazia bateu de leve na porta e entrou devagar Lúcia estava acordada sentada na cama mas não parecia estar ali Olhava pro nada um olhar calmo demais Rosa colocou a bandeja na mesinha e tentou sorrir Bom dia dona Lúcia Hoje tem sol O jardim tá bonito Ela
virou o rosto devagar e falou com a voz baixinha Hoje eu não vou sair da cama Rosa Pode deixar só o leite O pão dá pro Joãozinho Rosa assentiu sem discutir Saiu com o coração apertado Desceu olhou pro Álvaro na sala e só fez um gesto com os olhos Ele entendeu na hora Subiu entrou no quarto e sentou na beirada da cama Lúcia segurou a mão dele com uma leveza que assustava "Tá doendo?" Ele perguntou baixo Não hoje não Só tô cansada Álvaro ficou ali em silêncio Passou os dedos na mão dela como se quisesse
segurar mais tempo do que podia "O Joãozinho tá bem?" ela perguntou "Tá tá se saindo bem na escola Leu um texto inteiro ontem do jeitinho dele mas leu Lúcia sorriu um sorriso pequeno mas cheio de verdade Eu queria ter mais tempo para ver ele crescer ver você com ele Vocês dois merecem isso E você também Álvaro disse apertando a mão dela Ela fechou os olhos respirou fundo Eu já tive o Henrique Já tive você Já amei mais do que muita gente ama na vida toda Agora é só deixar ir Álvaro sentiu os olhos queimarem A
garganta travou Ele não queria chorar ali na frente dela Não queria que ela visse ele desabar Você quer ver o Joãozinho ele perguntou Quero mas quero sozinha Me dá um tempo com ele Álvaro saiu desceu as escadas devagar e foi até o jardim onde Joãozinho jogava a bola sozinho batendo contra a parede Filho a Lúcia quer falar com você sozinha Joãozinho parou olhou para ele meio desconfiado Eu fiz alguma coisa errada não ela só quer conversar Vai lá Joãozinho subiu as escadas com o coração acelerado abriu a porta do quarto com cuidado Tia Lúcia sorriu
Entra João Senta aqui do meu lado Ele foi até a cama sentou com as pernas penduradas ficou olhando para ela em silêncio Você tá doente mesmo né ela assentiu com calma Tô E tô cansada Mas antes de descansar eu queria te falar umas coisas Joãozinho ficou sério baixou o olhar Eu não sou sua mãe e nunca vou ser mas eu te amei como se fosse desde o dia que você chegou mesmo com raiva mesmo com ciúme meu coração foi se abrindo devagar e agora você é parte disso aqui Ela pegou uma folha dobrada no criado
mudo Isso aqui é para você Eu escrevi ontem antes de dormir É só uma carta com umas palavras que eu precisava deixar Joãozinho pegou a carta apertou contra o peito Posso ler depois claro quando quiser Ela passou a mão no cabelo dele devagar Promete que vai estudar que vai crescer virar um homem bom ajudar seu pai a seguir em frente Ele precisa de você João mais do que você imagina O menino engoliu seco Sentia uma coisa ruim subindo pela garganta algo que ele não sabia controlar Prometo Ela sorriu Fechou os olhos por uns segundos como
se aquele momento fosse o suficiente para deixar tudo em paz Joãozinho ficou mais um pouco segurando a mão dela sem falar nada Só ficou ali porque sentia que precisava No fim do dia Lúcia dormiu e não acordou mais Rosa entrou no quarto no começo da noite e viu Chamou Álvaro com o coração pesado Ele entrou se aproximou devagar e entendeu na hora sentou na cama pegou a mão dela e chorou baixinho Joãozinho ficou na porta olhando com os olhos marejados e a carta ainda fechada na mão O velório foi simples Lúcia não queria nada grandioso
nem homenagens exageradas A vontade dela era que tudo fosse leve sem dor espalhada no ar Mas é claro que mesmo assim doeu Rosa chorou o tempo todo em silêncio Joãozinho ficou do lado de Álvaro segurando a mão dele firme Era como se agora ele soubesse o que precisava fazer Ficar forte por quem ficou Álvaro não disse uma palavra o tempo todo só observava as flores os rostos os abraços vazios tudo passava como um filme mudo na frente dele Lúcia tinha sido a última base que ele ainda sentia de pé Agora era só ele e o
filho e isso bastava Doía claro mas ele sabia que não estava mais sozinho Quem chegou por último foi Artur Terno escuro óculos escuros a mesma cara fechada de sempre Cumprimentou dois ou três conhecidos e foi direto até Álvaro Meus sentimentos irmão falou seco Álvaro só balançou a cabeça sem olhar nos olhos dele Não queria conversa ainda menos naquele momento Arthur ficou ali por uns minutos calado depois foi embora Não se despediu de ninguém Na manhã seguinte Álvaro acordou cedo Tinha dormido mal de novo mas precisava cuidar de algumas coisas levantar os papéis cuidar dos trâmites
da herança e oficializar de vez a guarda e o nome de Joãozinho Não queria mais esperar O menino era dele de sangue de coração de tudo E agora sem Lúcia ele sabia que a responsabilidade dobrava Enquanto preparava os documentos com o advogado recebeu uma ligação do cartório Senr Álvaro houve um pedido de contestação na solicitação de registro de paternidade do menor João Duarte "Como assim?" Ele perguntou sem entender Um advogado entrou com pedido para suspender o processo Alegou possível instabilidade emocional do senhor e irregularidade no processo Álvaro não precisou pensar muito para saber quem era
Arthur desligou o telefone e foi direto pra empresa Entrou no escritório do irmão com o rosto fechado os olhos acesos Que é essa Arthur artur estava sentado na cadeira de sempre foliando um contrato Bom dia para você também Para de fingir Foi você que entrou com aquele pedido no cartório fui eu sim Álvaro se aproximou batendo a mão na mesa com força Qual é o seu problema o que você quer artur levantou com calma ajeitando o palitó Eu quero proteger o que é nosso Álvaro Nosso nome nossa história o legado da nossa família Você tá
agindo por impulso acabou de perder a Lúcia tá com a cabeça desmoronando e quer reconhecer um moleque que surgiu do nada como seu herdeiro Ele é meu filho É o que você acha Um exame não prova tudo Eu não confio nisso E sinceramente nem você devia confiar Álvaro deu um passo paraa frente com o peito estufado Você não tem esse direito Eu sou o pai O menino tá comigo A justiça vai ver isso Artur Rio debochado A justiça também vê histórico Álvaro Veio estrutura emocional estabilidade financeira risco à criança Eu já tenho um dossiê sobre
sua instabilidade Os sumiços as recusas na empresa os surtos que teve depois da morte do Henrique Posso provar que você não tem condições de cuidar nem de si quanto mais de uma criança Álvaro ficou vermelho mas não de vergonha de raiva Você tá passando dos limites Eu tô salvando o que ainda dá para salvar Você quer colocar esse menino como herdeiro direto como dono de parte da empresa sim E sabe por quê porque é justo Porque ele é sangue meu e eu não vou deixar você arrancar isso dele só para proteger seu ego nojento Artur
se aproximou agora também com a voz alterada Eu vi você destruindo tudo Primeiro com aquele caso depois com a morte do seu filho agora trazendo um bastardo para dentro da nossa história Você sempre foi fraco Álvaro Sempre E eu sempre tive que limpar sua bagunça Álvaro não respondeu Só olhou para ele como quem vê um estranho como se só agora entendesse o nível de podridão que o irmão era capaz de chegar Você vai se arrepender disso Arthur completou virando as costas Não mais do que você vai se arrepender quando a verdade vier à tona Álvaro
disse antes de sair Do lado de fora Álvaro respirou fundo Precisava de ar precisava de foco Pegou o celular e ligou pro advogado A gente vai entrar com um pedido de urgência para concluir o reconhecimento e garantir a guarda E se ele insistir em contestar vamos para cima com tudo Eu não vou perder meu filho Enquanto isso Joãozinho estava no quarto lendo a carta da Lúcia pela primeira vez Ele tinha guardado por dias com medo de doer demais mas agora com a saudade batendo forte sentiu que era a hora João se você estiver lendo isso
é porque eu já fui mas quero que saiba que foi um presente te conhecer Você entrou na minha vida quando eu só via dor e trouxe luz Mesmo sem perceber você curou pedaços meus que nem os médicos sabiam tratar Cuida do seu pai Ele é cabeça dura mas tem um coração lindo E nunca se esqueça do que eu te disse Você é amado muito mesmo por quem já foi Ele terminou de ler com os olhos cheios d'água dobrou o papel com cuidado e guardou debaixo do travesseiro Depois olhou pro teto e falou baixinho: "Eu vou
cuidar dele tia prometo." Na sala Álvaro chegou em casa Olhou pro alto da escada onde Joãozinho apareceu com os olhos vermelhos Os dois se olharam nenhum disse nada mas os dois sabiam Agora era um protegendo o outro até o fim O advogado de Álvaro chegou cedo na casa naquele dia terno escuro expressão séria e uma pilha de papéis debaixo do braço Sentaram os três na sala: Álvaro o advogado e Joãozinho que mesmo sem entender direito o que estava acontecendo queria participar A gente vai entrar hoje com o pedido de reconhecimento definitivo de paternidade e guarda"
explicou o advogado "Vai ser uma ação direta com base no exame de DNA e na convivência estável mas a gente tem que se preparar." O seu irmão entrou com uma contestação pesada Joãozinho arregalou os olhos "Ele quer me tirar daqui?" É isso que ele tá tentando Álvaro respondeu segurando firme a mão do menino Mas ele não vai conseguir O advogado puxou da pasta um monte de documentos relatórios cópias de e-mails uma lista de testemunhas Era coisa demais pra cabeça de Joãozinho mas ele ficava tentando entender tudo Queria saber o que iam dizer sobre ele e
principalmente o que iam usar para tentar separar ele do pai Vai ter audiência álvaro perguntou Sim E vai ter avaliação de assistente social Eles vão conversar com vocês visitar a casa ver como o João tá sendo cuidado É normal Joãozinho engoliu seco Eles vão vir aqui vão e vão conversar com você também Mas é tranquilo Só querem entender como é a vida aqui dentro Álvaro olhou pro filho É só falar a verdade a gente não tem o que esconder Na semana seguinte a assistente social apareceu Uma mulher simples sorriso no rosto pasta na mão Andou
pela casa viu o quarto do menino a mochila da escola o armário com roupas dobradas Conversou com Rosa que fez questão de contar que o menino ajudava em tudo que era educado respeitoso curioso Depois sentou com Joãozinho na sala E aí João me conta Como é morar aqui ele pensou um pouco É diferente Antes eu dormia na rua comia o que achava às vezes nem comia Aqui aqui eu tenho cama tenho comida e gente que olha para mim E você se sente seguro sim Pela primeira vez Ela anotou tudo Falou com Álvaro depois pediu alguns
documentos fez perguntas sobre rotina escola saúde saiu dizendo que entregaria o relatório em três dias mas Artur não tava quieto tava se mexendo movimentando contatos ligando pra gente influente tentava de tudo para atrasar o processo Disse que Joãozinho podia estar mentindo que o exame podia ser falso que Álvaro estava emocionalmente instável Na segunda audiência o juiz ouviu os dois lados Joãozinho ficou do lado de fora da sala esperando com o advogado Não podia entrar mas dava para ouvir algumas coisas O coração dele batia rápido Tinha medo de ser levado embora dali medo de perder tudo
que tinha acabado de ganhar Lá dentro Arthur falou com frieza O Álvaro não tem condição emocional de cuidar desse menino Ele perdeu um filho A esposa morreu há poucos dias Tá abalado vulnerável E esse garoto apareceu num momento delicado se aproveitando disso Álvaro interrompeu O Joãozinho não se aproveitou de nada Ele estava na rua sozinho com fome Eu o acolhi porque senti que devia Depois veio a surpresa do exame e agora ele é meu filho e me recuso a deixar alguém arrancar ele de mim O juiz escutava tudo com atenção No fim pediu o relatório
da assistente social Quando o papel foi entregue o advogado leu em voz alta O menor se mostra adaptado ao ambiente familiar demonstra laços afetivos profundos com o requerente Apresenta melhora emocional significativa e desejo claro de permanência Indica o deferimento da guarda e reconhecimento da paternidade Artur travou Não esperava aquilo A audiência foi encerrada com pedido de novas análises mas tudo caminhava a favor de Álvaro Nos dias seguintes Joãozinho ficou mais quieto Sentia o peso das coisas Uma noite entrou no escritório onde Álvaro estava mexendo nos papéis Pai posso te perguntar uma coisa álvaro olhou para
ele com carinho Claro filho Fala E se o juiz disser que eu não posso ficar aqui álvaro se levantou foi até ele e se ajoelhou Eu não vou deixar isso acontecer Prometi para sua mãe que ia cuidar de você Prometi pra Lúcia E agora prometo para mim mesmo Você é meu filho Nada vai mudar isso Joãozinho se jogou nos braços dele Chorou baixinho Um choro de medo misturado com alívio Na terceira audiência o juiz pediu presença do menino Joãozinho entrou na sala com a cabeça erguida mas o coração acelerado Sentou na cadeira do lado do
advogado O juiz sorriu para ele João você sabe porque tá aqui sei É para decidir se eu posso continuar morando com meu pai E o que você acha disso joãozinho olhou pro juiz com firmeza Eu nunca tive nada nunca tive ninguém Agora eu tenho ele e não quero perder O juiz ficou em silêncio por um instante depois agradeceu e mandou ele sair da sala Do lado de fora Álvaro segurava as mãos Você foi perfeito Você acha que ele vai deixar acho que ele viu a verdade Arthur do outro lado da sala observava tudo com raiva
mas sem forças O plano dele estava falhando mas ele ainda não tinha desistido e ainda tinha um último trunfo escondido na manga A notícia chegou numa manhã qualquer Rosa estava colocando o café na mesa Álvaro ainda nem tinha descido e Joãozinho brincava com o cachorro no quintal O interfone tocou Rosa atendeu Era uma mulher Voz firme calma pediu para falar com Álvaro disse que era urgente e que tinha a ver com Joãozinho Álvaro desceu ainda com cara de sono mas foi direto pra entrada A mulher estava parada ali Vestia uma roupa simples mas estava arrumada
de cabelo preso olhar direto Estava com uma pasta fina na mão Sou Ana Paula Trabalhei com Marina na época da construtora Eu sei o que o Artur fez Álvaro ficou em silêncio por alguns segundos Pode entrar Sentaram os dois na sala Joãozinho ficou espiando do corredor sem entender quem era aquela mulher Álvaro pediu que ele esperasse no quarto por enquanto Ana Paula abriu a pasta devagar Lá dentro documentos cópias de e-mails antigos comprovantes bancários uma folha com um relatório impresso em papel envelhecido Entregou tudo na mão de Álvaro Marina nunca quis sair da empresa Ela
gostava do trabalho Era discreta fazia tudo certinho Mas um dia o Artur mandou ela para uma sala sozinho Ficaram quase uma hora lá dentro Quando ela saiu tava branca chorando pegou as coisas dela e nunca mais voltou Álvaro fechou os olhos lembrou de Marina sumindo do nada lembrou de perguntar para Artur e ele dizer que ela tinha resolvido sair Uns dias depois eu vi um extrato impresso numa pasta do financeiro uma transferência alta de uma conta que eu nunca tinha visto E o destino era uma conta no nome da Marina Era dinheiro para sumir Você
guardou isso esse tempo todo guardei por medo Mas quando eu soube que o menino dela estava aqui sendo disputado como se fosse nada eu não aguentei Tava na hora de falar Álvaro ficou alguns segundos parado segurando os papéis A mão dele tremia As peças todas começavam a se encaixar Marina não sumiu por escolha Ela foi forçada calada com dinheiro provavelmente ameaçada E Artur fez tudo isso Isso aqui muda tudo Eu sei e eu vou testemunhar se for preciso Joãozinho ouviu tudo encostado na parede O coração batia forte Cada palavra entrava como uma martelada Agora ele
entendia porque a mãe tinha desaparecido porque ele ficou sozinho porque a vida dele tinha virado o que virou No dia seguinte Álvaro e o advogado levaram os documentos ao fórum Pediram uma audiência urgente A juíza leu tudo com atenção O rosto dela foi mudando aos poucos do olhar neutro para uma expressão séria indignada O senhor tem certeza que essa testemunha está disposta a comparecer ela já assinou o termo e quer justiça A juíza marcou a nova audiência pro dia seguinte e dessa vez Artur foi intimado Na hora marcada a sala estava cheia Álvaro Joãozinho o
advogado a juíza a assistente social e Artur sentado do outro lado com cara de quem sabia que tinha algo errado mas ainda não sabia o tamanho da bomba Quando Ana Paula entrou ele ficou branco O que ela tá fazendo aqui perguntou tentando disfarçar a atenção A juíza respondeu firme: "Ela é testemunha." e trouxe informações importantes sobre o desaparecimento da mãe do menor Marina Duarte Artur engoliu seco Ana Paula contou tudo Do dia da conversa do dinheiro do extrato do sumiço da Marina logo depois mostrou os documentos o comprovante da conta e disse na frente de
todos Ele pagou para ela desaparecer e agora tá tentando apagar o filho dela também Arthur tentou falar mas a juíza o interrompeu O senhor terá sua chance de se defender mas a partir deste momento qualquer tentativa de contestação à guarda será suspensa Vamos abrir uma investigação criminal sobre o que foi apresentado aqui Joãozinho olhava tudo de longe segurando a mão de Álvaro o coração acelerado Mas pela primeira vez sem medo Arthur saiu da sala como entrou de cabeça erguida Mas por dentro ele sabia aquela guerra ele tinha perdido Na porta do fórum Álvaro se agachou
na frente do filho Acabou Ninguém mas vai tirar você de mim Joãozinho abraçou ele apertado com o coração cheio e com um sentimento novo nascendo ali alívio A primeira coisa que Joãozinho fez quando saiu do fórum foi respirar fundo Era um daqueles dias em que o ar parecia mais leve como se alguém tivesse aberto uma janela por dentro dele Álvaro saiu junto de mãos dadas com ele os dois em silêncio Não precisava dizer nada O que tinha que ser dito já estava ali na forma como eles se olhavam Uma mistura de cansaço alívio e aquele
tipo de felicidade que chega devagar mas quando chega muda tudo Do outro lado da cidade Arthur entrava na delegacia acompanhado de dois advogados Tentaram impedir ganhar tempo pedir mais prazo adiar o que não dava mais para adiar Mas não teve jeito A juíza foi clara fraude suborno coersão tentativa de ocultar uma criança e envolvimento direto no sumiço da mãe o suficiente para abrir processo criminal A prisão era temporária mas o suficiente para começar Artur foi fichado teve que tirar foto colocar as digitais O homem que sempre mandou sempre controlou agora sentava numa cadeira fria com
uma pasta no colo e o olhar perdido no chão Não dizia uma palavra porque no fundo ele sabia Tinha passado do limite faz tempo Só agora o mundo estava cobrando a conta Enquanto isso Álvaro e Joãozinho voltavam para casa Rosa preparou uma mesa com tudo que o menino mais gostava Arroz soltinho feijão fresquinho bife acebolado e batata frita crocante Tinha até suco de uva aquele que ele tinha dito uma vez que era o preferido "É dia de comemorar" Rosa disse enxugando o canto dos olhos Joãozinho sorriu largo depois olhou pro pai "A gente já pode
fazer meu novo RG Álvaro Rio." "Pode E a certidão também Agora você vai ter o nome completo João Duarte Souza O menino repetiu o nome em voz alta como se estivesse testando um super poder João Duarte Souza Soa bonito né álvaro completou Soa como meu nome de verdade Na manhã seguinte foram juntos ao cartório Álvaro segurava os documentos todos numa pastinha azul Joãozinho foi de camisa polo e tênis novo cabelo penteado nervoso mas animado Na fila ficou observando tudo Cada pessoa cada detalhe cada movimento tudo era novidade Quando chamaram entraram os dois na sala A
moça do cartório olhou os papéis digitou no computador e falou com um sorrisinho Prontinho João Agora é oficial Você tem seu nome completo com o do seu pai joãozinho segurou a certidão com cuidado Era um papel comum mas nas mãos dele parecia ouro Leu o próprio nome ali linha por linha sentiu o peito crescer Do lado de fora Álvaro tirou uma foto dele com o papel nas mãos Vamos mandar essa para colocar num porta-retrato lá no escritório Pode colocar na sala toda Joãozinho respondeu rindo Na volta para casa pararam numa banca de jornal Álvaro comprou
o jornal do dia Na capa uma foto de Artur entrando na delegacia Manchete em letras Grandes Empresário Artur Souza é investigado por suborno e fraude em caso de ocultação de criança Joãozinho olhou a foto Ficou sério ele vai ficar preso para sempre isso a justiça vai decidir mas agora ele vai ter que responder pelo que fez E se ele tentar de novo ele não vai conseguir E mesmo que tente você não tá mais sozinho Joãozinho assentiu Sabia disso Sentia isso Na semana seguinte Álvaro organizou uma reunião com o advogado da empresa Pediu mudanças no estatuto
Agora Joãozinho passaria a constar como herdeiro legítimo O novo fundo foi criado no nome dele com a ideia de garantir estudo saúde e tudo que ele precisasse para ter um futuro que nunca teve "Você quer fazer faculdade um dia?" Álvaro perguntou enquanto caminhavam pelo jardim "Quero mas nem sei o que ainda Tudo bem você tem tempo Agora é a hora de ser criança." Joãozinho parou pensou um pouco Nunca fui criança de verdade né agora vai ser Naquela noite sentaram na varanda Céu limpo estrelas visíveis Álvaro com uma caneca de chá Joãozinho com um copo de
leite Falaram pouco mas os dois estavam ali juntos sem medo sem esconder nada Pai fala acha que a mamãe ia gostar de ver isso álvaro sorriu emocionado Acho que ela tá vendo e orgulhosa de você Joãozinho encostou no ombro dele Também tô orgulhoso de você pai Ali naquele silêncio bom eles entenderam A liberdade não era só ter um papel assinado era poder respirar sem medo Era saber que mesmo com tanta dor no caminho o amor tinha vencido O despertador tocou a sete em ponto um som baixinho mas o suficiente para Joãozinho abrir os olhos com
calma Já fazia quase três meses desde que tudo tinha mudado de vez Agora ele tinha horário para acordar mochila para arrumar uniforme para vestir e gostava disso Era diferente da correria da rua do acordar quando dá do dormir onde conseguir Ali na casa que agora era dele também ele sabia o que esperar do dia Se levantou colocou os pés no chão e sorriu Tava frio mas ele tinha meias foi até o banheiro lavou o rosto escovou os dentes penteou o cabelo tudo sozinho sem ninguém mandar Aprendeu rápido pegou o uniforme vestiu com cuidado passou o
perfume depois olhou no espelho e ficou encarando por uns segundos Tá ficando com cara de estudante mem ele disse para si mesmo com um sorrisinho Na cozinha Rosa já estava com o café pronto pão quentinho leite com achocolatado uma banana cortada no prato Dormiu bem João mã dormi sim E você dormi também mas estô mais animada é por causa da sua apresentação hoje Tá pronto ele assentiu mastigando Decorei tudo mas ainda tô com frio na barriga Isso é bom Quer dizer que você se importa Álvaro desceu minutos depois de terno cabelo arrumado mas com aquela
cara de quem já tinha passado por umas noites mal dormidas Bom dia filho Tá preparado tô sim pai Hoje é o dia Álvaro sorriu e deu um tapinha nas costas dele Tô orgulhoso de você Muito Saíram juntos Álvaro deixou Joãozinho na escola e prometeu voltar mais tarde para assistir a apresentação Era uma feira de talentos Joãozinho ia falar sobre coragem escreveu um texto simples com a ajuda da professora contando um pouco da própria história Ninguém ali sabia tudo mas sabiam que ele vinha de um passado difícil e que tinha superado muita coisa Enquanto isso Álvaro
foi trabalhar mas não conseguiu focar Sentava na frente do computador e lembrava do primeiro dia em que viu o Joãozinho sujo magro parado na porta da mansão pedindo comida Agora ele estava ali bem alimentado rindo indo pra escola falando meu pai com naturalidade No meio da manhã Álvaro recebeu uma visita inesperada Era o advogado com um envelope nas mãos Arthur vai ser condenado A promotoria aceitou o acordo de delação mas ele vai pegar pena em regime fechado pelos crimes cometidos Álvaro não disse nada de imediato só respirou fundo Era o fim de um ciclo Não
sentia raiva sentia pena Artur escolheu um caminho e seguiu até o fundo do poço com ele Pouco antes do meio-dia Álvaro voltou pra escola A quadra estava cheia de pais mães crianças Uma movimentação alegre barulhenta diferente de tudo que ele costumava viver Sentou no banco ao lado de Rosa que tinha ido também Os dois riram juntos quando viram Joãozinho no palco nervoso segurando o papelzinho amassado da fala O menino respirou fundo olhou pra plateia achou o pai com os olhos e começou: "Ah oi meu nome é João tenho 9 anos Hoje eu vim falar sobre
coragem Mas não aquela coragem de superherói Vim falar da coragem de levantar todo dia mesmo com medo de dormir sozinho num canto frio e ainda assim sonhar com um lugar melhor A coragem de bater na porta de um estranho e pedir comida mesmo achando que iam mandar você embora A coragem de acreditar que mesmo quando ninguém mais acredita em você pode dar certo Fez uma pausa O silêncio na quadra era total E eu tô aqui porque um dia eu bati numa porta e alguém me abriu e não só me deu comida mas me deu uma
vida nova Hoje eu tenho um pai tenho escola tenho amigos e tenho esperança Isso é coragem também ter esperança Quando terminou foi aplaudido de pé Álvaro enxugou os olhos sem vergonha nenhuma Rosa chorava feito mãe orgulhosa E Joãozinho desceu do palco correndo pulou no colo do pai apertando ele forte Você gostou eu amei filho Nunca me senti tão feliz Voltaram para casa rindo conversando trocando ideias sobre os outros colegas da apresentação Joãozinho contou cada detalhe Imitava vozes gestos fazia piada com a professora Era outro menino Não tinha mais o peso de antes no olhar Mais
tarde Álvaro chamou ele até o quarto do Henrique Agora o lugar estava mais aberto com luz com brinquedos guardados em caixas transparentes e alguns desenhos de Joãozinho colados na parede Tava diferente mas com respeito Um espaço para lembrar mas também para viver Aqui vai ser seu cantinho de leitura Se quiser pode usar tudo mas eu deixei uma coisa para você na prateleira de cima Joãozinho subiu na cadeira pegou a caixa e abriu Dentro um porta-retrato novo a foto dos dois rindo no jardim com a certidão de nascimento ao lado É o nosso começo Álvaro disse
Joãozinho olhou e sorriu Nosso novo começo Naquela noite enquanto o céu escurecia e a casa se enchia de silêncio bom Joãozinho olhou pela janela do quarto A rua lá fora era a mesma mas ele sabia Por dentro tudo tinha mudado Ele agora era João Duarte Souza filho aluno corajoso feliz e livre [Música]
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