Para Paulo Freire, quando a gente analisa a diferença entre a ingenuidade e a criticidade, entre os saberes da experiência cotidiana e os conhecimentos científicos, a gente observa que o que ocorre não é uma ruptura entre essas duas formas de conhecimento. Mas uma superação. Isso ocorre na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, se torna mais e mais crítica através da educação.
E ao se tornar uma curiosidade epistemológica – ou seja, capaz de refletir sobre a natureza, as etapas e os limites do conhecimento – essa curiosidade se torna rigorosa em termos metodológicos e conquista as condições para uma compreensão mais ampla da realidade. Aquela curiosidade ingênua, associada ao senso comum, é a mesma curiosidade que, quando se torna epistemológica, aprende a se aproximar do conhecimento a partir de um método crítico. É uma mudança de qualidade, mas não de essência.
Quando a gente entende curiosidade como aquela abertura para se surpreender com as diferenças entre o que a gente já sabe e o que gente pode aprender, a gente observa que a curiosidade de trabalhadores rurais, por exemplo, tem a mesma natureza daquela curiosidade de cientistas e acadêmicos que se entusiasmem ao decifrar o mundo. A diferença é que cientistas superam o senso comum ao incluir métodos mais críticos na sua curiosidade. Aquela vontade irresistível de entender o mundo, de descobrir as coisas e compreender o que nos cerca é uma necessidade vital que desenvolvemos desde a infância.
Não haveria criatividade sem aquela curiosidade que nos põe inquietos diante tantas dúvidas sobre esse mundo que encontramos pronto, mas que, por estar em transformação, precisa da nossa participação. O mundo precisa da nossa curiosidade. Como somos sujeitos históricos, a nossa curiosidade também é historicamente construída e reconstruída.
Mas a questão é que a promoção da ingenuidade para a criticidade não é um processo automático. Por isso, uma das tarefas fundamentais da prática educativa é o desenvolvimento da curiosidade crítica, aquela que se aproxima do conhecimento sem se submeter a ele. Que não aceita aquele discurso autoritário do: "é assim porque eu digo", "é assim porque eu mando", e que se dispõe a pesquisar, a relacionar e a refletir sobre o que aprendeu com liberdade e autonomia intelectual.
É aquela curiosidade com que podemos nos imunizar contra os irracionalismos decorrentes de preconceitos, de dogmatismos e de fundamentalismos, por um lado, mas que, paradoxalmente, podem ter origem também no excesso de racionalidade das sociedades tecnológicas. Agora, Paulo Freire deixa claro que essa crítica não é uma uma rejeição automática à tecnologia e à ciência. Pelo contrário: essa é uma consideração de quem não sacraliza a tecnologia, mas por outro lado, não a demoniza também.
Quando um sujeito se aproxima de um conhecimento novo, mas se mantém prisioneiro dos saberes solidificados na sua imaginação, ele aprisiona também a sua curiosidade e se torna incapaz de aprender. Por tudo isso o aprendizado só pode ser crítico quando o ponto de partida é a curiosidade. O próximo vídeo vai discutir a necessidade da ética e da estética na sala de aula.
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