Olá, aqui é o Matheus Santana do Zona de Progresso, e você já se pegou em alguns momentos do dia simplesmente rolando a timeline do tiktok ou instagram sem ao menos perceber? É bem provável que sim. E isso pode acontecer em vários lugares e situações, como por exemplo entre um exercício e outro na academia, em um almoço em família, no trabalho, na faculdade e por ai vai.
Mas não para por ai. Já percebeu também como nos irritamos facilmente quando temos qualquer sinal de fome, por menor que seja? Ou então, como temos cada vez mais dificuldade em aproveitar momentos simples que deveriam ser agradáveis?
Pois é, isso não é só impressão sua. É algo que realmente está acontecendo cada vez mais. Além disso, há outras coisas importantes que também estão acontecendo com as pessoas.
Por exemplo, a nossa capacidade em nos manter concentrados está diminuindo - fazendo inclusive as pessoas suspeitarem que tem TDAH; temos cada vez menos paciência para realizar tarefas que exijam esforço mental, nosso paladar está cada vez mais exigente, e temos até menos interesse em manter uma conversa olho no olho com as pessoas. Afinal, estamos mais interessados na tela do celular do que em qualquer outra coisa. Bom, as fontes desses problemas podem variar, mas algo em comum entre todas elas, é a famosa dopamina.
No livro Dopamine Detox, o autor aborda muito bem a relação entra a dopamina e alguns dos comportamentos que citei. É um excelente livro. E por essa razão, usaremos ele como base daqui pra frente.
No início do século XX, Edward Thorndike organizou um experimento bastante curioso com gatos dentro de uma estrutura que ele chamou de "caixa-problema". Funcionou da seguinte forma. Primeiro, ele deixou um petisco do lado de fora da caixa para instigar a curiosidade dos gatos, com isso, os gatos começaram a ficar agitados e a buscar formas de conseguir escapar.
Após várias tentativas, os gatos encontraram uma alavanca, que quando pressionada, abria a porta instantaneamente. Então, por tentativa e erro, os gatos pressionavam a alavanca, a porta se abria, e logo em seguida comiam o petisco. E conforme o experimento era repetido, os gatos conseguiam fazer todo esse processo cada vez mais rápido até chegar num ponto de se tornar um hábito.
Inspirado por esse experimento, o psicólogo Burrhus Frederic Skinner decidiu realizar seus próprios experimentos. Experimentos esses que o ajudaram a fazer descobertas importantíssimas. Em seu primeiro experimento, um rato foi colocado em uma caixa que continha uma alavanca.
E sempre que o rato pressionava a alavanca, mesmo que aleatoriamente, ele aprendia cada vez mais que esse comportamento resultava em uma recompensa, que no caso, era a comida. O que ficou conhecido como reforço positivo. Em um segundo experimento, Skinner desenvolver uma caixa especial, que era dividida em duas partes por uma pequena barreira que um rato poderia facilmente saltar.
Além disso, ele aplicou um leve choque elétrico em uma das metades da caixa para causar desconforto no rato. Porém, rapidamente, o rato aprendeu que poderia escapar daquele desconforto saltando a barreira para o outro lado da caixa onde não havia choque. Com isso, o comportamento de saltar a barreira foi reforçado pelo fato de ter evitado o estímulo desagradável, que no caso, era o choque.
Este experimento exemplificou o conceito de reforço negativo, mostrando que quando um comportamento evita algo de ruim acontecer, ele tende a ser repetido no futuro. Em outro experimento, Skinner colocou um rato em uma nova caixa. E mesmo não estando com fome, o rato acabou pressionando a alavanca da caixa - provavelmente por curiosidade ou por ter associado a alavanca à obtenção de comida de experimentos passados.
No entanto, diferente dos outros experimentos, o rato não recebia comida a cada vez que pressionava a alavanca, na realidade, ele recebia comida de forma aleatória, fazendo com que o rato nunca soubesse quando exatamente a comida viria. Com isso, o rato passou a ficar viciado em pressionar a alavanca, pois cada vez que fazia isso, ele recebia uma descarga de dopamina que gerava a expectativa de que naquela vez a comida viria. Isso parece familiar não é mesmo?
Veja por exemplo as máquinas caça-níqueis e as redes sociais. Todas elas nos trazem recompensas imprevisíveis e aleatórias, pois assim como puxar a alavanca de uma máquina caça-níquel pode nos causar uma descarga de dopamina que aumenta nossa sede pela recompensa, rolar a timeline de uma rede social nos trás a mesma sensação, pois não sabemos exatamente o que virá em seguida. E isso é algo muito viciante.
As empresas por trás das redes sociais sabem muito bem como isso funciona, pois eles investem muito dinheiro para descobrir formas de fazer as redes se tornarem irresistíveis para o nosso cérebro primitivo. Então, enquanto um rato pode ficar viciado em apertar uma alavanca para receber comida de forma aleatória, nós também podemos ficar viciados em rolar uma tela de baixo pra cima pra saber o que vem em seguida. Bom, pode ser que você já esteja viciado no seu celular por causa disso, e a primeira coisa que o autor menciona em seu livro para resolver isso, é o jejum de dopamina de 21 dias, que basicamente significa se desafiar a ficar 21 dias se abstendo o máximo possível de coisas que causem grandes descargas de dopamina.
Ou seja, isso vai te exigir ficar 21 dias sem usar redes sociais, sem assistir netflix, sem consumir álcool, cigarro, pornô, videogame, fastfood, ou qualquer coisa que traga uma recompensa muito apelativa para o seu cérebro. Vendo isso, você pode pensar que é algo muito difícil, e realmente é, mas os benefícios que isso vai te trazer valerão a pena. O autor sugere que, no lugar dessas coisas que citei, seja incluída atividades como correr, fazer alongamentos, meditar, ler ou simplesmente parar para pensar e refletir.
Ao se abster de atividades altamente estimulantes, seus níveis de dopamina começarão a voltar ao normal, e assim, consequentemente você voltará a sentir prazer nas coisas simples da vida, como as atividades que foram citadas. Isso é um aspecto importante a se dizer porque muitas pessoas estão com seu sistema dopaminérgico tão exigente, que elas não se contentam mais com coisas que causam descargas de dopamina à níveis normais. Na realidade, até mesmo os estímulos mais pesados podem se tornar leves e até sem graça com o passar do tempo.
Veja por exemplo um usuário de droga. No início, com apenas um pouco da substância ele já sentia altos níveis de prazer e euforia, mas com o tempo, essa mesma quantidade não traz mais tantos efeitos, fazendo com que ele tenha que recorrer a quantidades cada vez maiores da substância para manter aquele mesmo nível de prazer do começo. Então, assim como um viciado em drogas muitas vezes é levado a uma clinica de reabilitação para ficar em abstinência por vários e vários dias, nós também devemos ficar certos períodos em abstinência daquilo que está nos levando ao vicio, e 21 dias é um bom número para grandea parte das pessoas.
Agora, se você quer encarar esse desafio, mas considera quase impossível ficar tantos dias sem todas aquelas coisas que citei, você tem algumas opções: Fazer um desafio de 21 dias para cada coisa que deseja diminuir seu uso, Ou então, separar essas coisas em blocos de 2 ou 3 e fazer o desafio com cada bloco desse de forma individual. Com isso, se você tiver 6 coisas que deseja parar de fazer, você poderá separá-las em 2 blocos de 3 coisas e fazer um desafio de 21 dias para cada bloco. Entenda que você levou anos para adquirir esses hábitos, então não será tão fácil contê-los tudo de uma vez.
Imagine o seguinte, se colocarmos uma cenoura na frente de um burro de barriga vazia, ele vai ter motivação o suficiente para ser guiado por ela até onde quisermos. Mas se antes disso nós enchermos a barriga dele com outras coisas mais prazerosas para ele quanto a cenoura, assim que colocarmos a cenoura em sua frente, ele não vai dar um passo sequer, pois a cenoura ficará desinteressante. Agora, imagine que o nosso cérebro represente o burro, a cenoura o prazer não apelativo - como uma caminhada ao ar livre, e as outras coisas que encheram a barriga dele, os prazeres rápidos que consumimos diariamente, como as redes sociais, os fast-food e os jogos eletrônicos.
O fato de "enchermos nossas barrigas" diariamente com essas coisas faz com que não tenhamos mais vontade de fazer atividades simples que intrinsicamente deveriam nos trazer prazer e motivação, como uma caminhada por exemplo. Portanto, a estratégia do jejum de dopamina se baseia em fazer esse burro passar fome o suficiente para se sentir motivado a perseguir a cenoura. Da mesma forma, essa estratégia te ajudará a voltar a sentir motivação e prazer no simples ato de apreciar uma fruta, um pôr do sol, uma leitura ou qualquer outra coisa natural que não seja tão apelativa, pois a descarga de dopamina causada por essas atividades - apesar de pequena se comparado a um Tiktok por exemplo - já será o suficiente para te satisfazer.
Mas apesar de os benefícios valerem a pena, preciso reforçar que o período de abstinência pode ser algo brutal dependendo da intensidade do seu vício. Portanto, você precisa estar preparado para passar por isso de modo que não recaia ou simplesmente mude de vício como um mecanismo de compensação. Como o próprio autor disse, existem várias atividades que você pode começar a fazer afim de escapar da abstinência e das sensações ruins dessa fase, mas há uma em especial que gostaria de salientar, que é a escrita.
E um bom exemplo de pessoa que usou a escrita para processar melhor suas emoções em períodos difíceis, foi o imperador Marco Aurélio, pois além de ter sido um dos homens mais poderosos de seu tempo, também foi um homem capaz de suportar momentos extremamente difíceis, como a perda de sua esposa e vários filhos, a peste antonina - que matou milhões de pessoa na época, e todas as guerras e conflitos que aconteciam o tempo todo. O diário que Marco Aurélio manteve foi algo tão útil que chegou a ser transformado em um dos mais poderosos livros da atualidade chamado "Meditações". Então, em vez de recorrer a alguma outra fonte de prazer momentâneo e superficial como forma de se enganar, coloque seus pensamentos no papel e veja a mágica acontecer, pois essa será a sua principal ferramenta para completar o desafio de 21 dias em jejum de dopamina.