no meio de 2021 a Paloma me acordou de madrugada desesperada no oitavo mês de gravidez falando que estava sangrando e naquele mesmo momento a gente partiu correndo pro hospital em menos de uma hora o meu filho tava nos nossos braços e esse Jacarezinho veio ao mundo por uma cesárea necessária de emergência porque a Paloma teve um sangramento por deslocamento de placenta por causa de uma placenta prévia que é um dos poucos motivos reais da necessidade de uma cesárea um dos poucos motivos agora você faz ideia de quantos partos no Brasil são cesáreas mais da metade
tem ideia do quanto que esse número é absurdo em 1985 um grupo de especialistas em saúde reprodutiva se juntou em Fortaleza no Ceará para uma reunião que foi promovida pela Organização Mundial da Saúde ali eles analisaram os dados disponíveis que tinha na época fizeram uma declaração que foi publicada no del lanet dizendo que abre aspas não existe justificativa para qualquer região do mundo ter uma taxa de cesárea maior do que 10 a 15% no nosso serviço privado essa taxa supera os 80% ironicamente isso acontece no país onde foi feita a recomendação de no máximo 15%
o que é um número que hoje é considerado até um pouco alto demais já que conforme os procedimentos se aperfeiçoam os profissionais da Saúde começaram a cobrar por uma revisão dessa recomendação E aí em 2014 a OMS fez dois estudos para poder atualizar revisar a questão e acabaram concluindo que o número mais preciso seria de 10% e não de 15% ou seja tinha que ser mais baixo ainda o que eles viram é que de 0 até 10% de cesáreas aumentar essa taxa reduz a mortalidade das Mães e dos bebês em nível populacional ou seja isso
salva vidas só que acima desse número não se tem mais ganho e o pior mais cesáreas aumentam o risco de problemas hoje por exemplo já se sabe que esse tipo de procedimento tá associado a mais dores apesar de muita gente ainda achar que o parto normal seria mais incômodo e a partir desses dados a OMS criou uma nova declaração onde não define oficialmente uma taxa mais específica até porque cada país tem o seu contexto mas reitera que superar aqueles 10% não traz benefícios numa grande escala só que a taxa de cesáreas só aumenta mundialmente se
em 1990 elas estavam na casa de 7% em 20221 pularam para 21% Quase três vezes mais no mundo todo e EMS estima que até 2030 os números devem chegar a 30% e Nesse quesito o Brasil tá bem aí à frente do seu tempo no sentido negativo mesmo porque por aqui como eu já disse no começo mais da metade dos partos são cesarianas e no setor privado supera esses bizarros 80% contra cerca de 40% no SUS tudo bem que esse dado faz parte de um estudo de 2012 mas esse levantamento que é o nascer no Brasil
da Fiocruz é super importante ele inclusive traz um outro dado que é o de que 70% das Gestantes brasileiras querem ter um parto normal E por que que elas não TM o que que separa essa vontade das Gestantes da realidade que é aplicada a elas por aqui as cesáreas foram feitas de um jeito ou de outro ao longo de grande parte da nossa história só que a mortalidade era altíssima por muito tempo até meados do século XIX porque era uma técnica que era quase que uma última tentativa desesperada de salvar a criança com alta mortalidade
para mães e filhos só que o desenvolvimento da anestesia da anatomia e também de técnicas de assepsia começaram a mudar para melhor essa história hoje em dia a cesárea é com certeza uma das cirurgias mais importantes a que a gente tem à disposição quando bem aplicada ela salva muitas vidas só que conforme a medicina foi se desenvolvendo começou a ter uma mudança de valores o que era uma solução para problemas urgentes passou a ganhar um ar de comodidade as cesáreas foram ganhando espaço enquanto o parto vaginal começou a ser visto meio que como uma coisa
arriscada e até de certa forma nojenta no livro parto normal ou cesárea as médicas Simone Dinis e Ana Cristina Duarte contam que no século XX o parto vaginal abre aspas aí foi tratado como uma patologia a ser remediada por meio de uma sequência de intervenções e não é só a cesárea que entra nesse leque de intervenções eu logo mais conto sobre outras também é importante destacar que o aumento Global do número de cesáreas tem uma ligação com o maior acesso a Serviços de Saúde O que é ótimo se um lugar não tem hospital nem Profissionais
de Saúde treinados não dá para fazer cesária direito Então nesse começo quanto mais infraestrutura médica maior a possibilidade de fazer cirurgias complexas como essa e aí as estatísticas podem e devem subir mesmo que é o indicativo de qualidade só que isso não explica o crescimento gigante no número de cesárias até porque aqueles dados da OMS que mostram que os países menos desenvolvidos e que poderiam estar puxando Esse aumento seguem com taxas muito menores de partos feitos desse jeito na África Subsaariana só 5% dos partos são cesarianas menos de 10 vezes o que se pratica aqui
no Brasil e um ponto importante aí é o modelo de financiamento do sistema de saúde que é um ponto feito pel pela própria OMS que ressoa com os temas de outros vídeos que a gente já fez por aqui com o Ciência suja que é o nosso parceiro desse vídeo aqui lembra que o setor de saúde privado é o que mais puxa as cesáreas no país então um ponto que influencia nisso é que os seguros de saúde repassam valores muito baixos para um parto Isso muda muito de acordo com o plano com região e afins mas
o valor médio fica em torno de 500 pra médica ou pro médico que fez o parto e por esse valor dificilmente um profissional tão especializado fica disponível pra demanda que um parto vaginal pede pensa comigo o dia do nascimento é uma caixia de surpresas o médico até dá uma data estimada só que a variação pode ser de semanas foi mais de mês no nosso caso o horário é outra incógnita tem partos que demoram mais outros menos ou seja o profissional tem que lidar com todas essas variáveis e ainda tá preparado ou preparada para desmarcar pacientes
e outros procedimentos de última hora para poder sair correndo e fazer um parto para comparar um parto normal no esquema particular pagando do seu próprio bolso mesmo sem o convênio fica na casa dos 15 a R 20.000 Isso é só a equipe se você resolver pagar o hospital também no particular vai mais outra grana e claro que esses valores podem variar Bastante e os números que eu dei são mais pra gente ter uma referência da diferença de caso de R 500 para R 20.000 também tem médicos profissionais de planos particulares que cobram a chamada taxa
de disponibilidade por fora para poder est disponível para fazer um parto normal esse valor varia mas tem relato sobre a cobrança de r$ 7000 e segundo a agência nacional de saúde suplementar a ins Isso é ilegal já o Conselho Federal de Medicina não vê problemas no acerto quer seguir com o parto que traz mais benefícios pra mãe e pro filho na maioria das vezes então dá para fazer só que aí tem que pagar mais no fim das contas o que isso faz é mercantilizar o parto vaginal que só fica disponível para quem pode e consegue
pagar e essa questão vai muito a além da equipe e do plano tem várias outras consequências hoje o sistema de saúde de maneira geral paga muito baseado no procedimento fez um exame paga-se x Não importa se o exame Foi útil ou se só atrapalhou fez um parto normal só com que era necessário paga Y agora fez uma cesárea usando um monte de equipamentos paga Y mais a cirurgia mais os procedimentos E aí se a instituição ou o fornecedor de insumos recebem mais por uma cesária do que por um parto normal eles podem priorizar a cesárea
ainda mais quando essa cesárea pode ser muito mais previsível e rápida para contornar esse tipo de incentivo tem pessoas que defendem a remuneração Com base no desfecho aí ao invés de pagar pelo procedimento seja ele Cesáreo ou parto vaginal o sistema pagaria pelo resultado então vai se pagar a mesma coisa por por exemplo nascimento da criança com cuidados adequados e preservando a saúde da mãe e não importa como isso aconteceu se o hospital abusa de cesáreas azar do hospital que vai gastar mais com um procedimento mais complexo para chegar no mesmo resultado e se tiver
complicação por causa da cesárea que é mais comum o custo vai ficar com quem tá oferecendo esse serviço porque esse resultado exigiria mais qualidade claro que isso também é super complicado e para funcionar de forma legal esse tipo de modelo exige entre outras coisas bons indicadores indicadores confiáveis para se medir o sucesso ou o fracasso de um tratamento de um procedimento e como se mede um Nascimento bem feito outra coisa importante é a transparência seria muito importante que todas as partes do sistema médicas médicos hospitais convênios mostrassem claramente Quais são as suas taxas de parto
normal cesariana para as pessoas poderem tomar decisões mais informadas e todo esse lado econômico também acaba interferindo nas normas culturais que são ligadas ao parto o que vale inclusive pro parto vaginal no podcast ciência suja que é o parceiro desse vídeo como eu já falei por aqui tem um episódio inteiro mostrando em detalhes como que o machismo estrutural foi moldando o que que é o parto ao longo do tempo então depois vai lá vai no canal deles aproveita apr isso tudo e nessa investigação eles trazem um caso muito interessante sobre a episiotomia a episiotomia que
também é conhecida como pique é um corte no períneo que é essa região que fica entre Vine anos que facilitaria a saída do bebê é um procedimento dolorido demais segundo as mulheres só que um dos argumentos médicos para se fazer isso era o argumento de que esse procedimento evitaria que depois do parto a vagina ficasse muito Ampla pro pênis do homem na hora do sexo basicamente o médico faria a episiotomia e depois do parto seria mais fácil de costurar a região o que inclusive tinha um nome terrível de ponto do marido para poder devolver isso
não se tem evidência nem de que esse tipo de procedimento deixa o sexo mais prazeroso pro homem que seria aí o interessado mas só de usar esse argumento já dá para você ter uma noção do grau de machismo que tá envolvido na Obstetrícia e de quem passa a ser a prioridade na hora de decidir um procedimento feito com o corpo da mulher que acabou de passar por um parto Lembrando que no passado a medicina era uma prática eminentemente masculina se teve uma utilidade da episiotomia foi a de causar uma revolta dentro do contexto do movimento
feminista que terminou com a exigência de evidências científicas de qualidade para defender o procedimento em 1979 no Reino Unido mulheres lideradas pela antropóloga e militante Sheila kitzinger organizaram uma pesquisa e enviaram formulários pelo correio e conseguiram relatos de mais ou menos 2.000 episiotomias E aí elas tabularam os dados e viram que muitas mulheres reclamavam do procedimento e publicar um panfleto meio na linha de olha ou vocês dão evidências de que isso é benéfico ou a gente vai começar a processar os médicos por conta da lesão corporal causada e esse movimento ajudou a estimular estudos sobre
a episiotomia que era feita sem estudos e os estudos mostraram que as mulheres tinham razão para variar hoje se sabe que a episiotomia pode causar perda sanguínea infecções incontinência urinária muito desconforto no pós-parto a piora da vida sexual e por aí aí vai em alguns países o procedimento já é considerado aceitável em situações muito específicas que é por exemplo quando o Perino não dilata o suficiente só que não é algo consensual cientificamente essa seria uma prática mais de último caso e que muitas vezes poderia ser substituída por um bom treinamento em parto normal vaginal só
que na prática a episiotomia Ainda é comum aquela pesquisa nascer no Brasil da Fiocruz mostrou que 53 % das entrevistadas que fizeram parto normal receberam tal do pique de novo mais da metade e isso é o que algumas pessoas chamam de medicalização do parto a episiotomia é só uma Entre várias outras práticas que acabam sendo usadas de forma exagerada a aplicação de oxitocina ou o tal do sorinho também é assim para quem não sabe esse é um hormônio que estimula a contração do útero e acelera o parto só que ele pode gerar dor intensa e
até possíveis complicações pro bebê se for usado sem necessidade até ficar na famosa posição litotômica que é deitada numa maca de barriga para cima com as pernas abertas e mobilizadas tem a ver com essa medicalização do parto hoje já tá claro que via de regra a gestante pode e deve se movimentar do jeito que achar mais confortável inclusive porque Isso facilita o parto só que deixar a mulher paradinha É mais confortável para quem mesmo então e tem um negócio aí que que é uma intervenção médica acaba puxando a outra muitas vezes começa com anestesia e
tudo bem tomar anestesia se a mulher quiser se ela precisar se ela realmente tiver informada e confortada pela equipe mas como a anestesia pode dificultar o movimento das pernas sem orientação a mulher acaba sendo colocada na posição litotômica e não sai de lá e aí vai receber oxitocina porque o anestésico pode inibir contrações e aí esse estímulo mais a perda de sensibilidade da anestesia mais a posição deitada pode terminar em mais laceração e na solução da episiotomia é tipo um pacote que vai chegando aos poucos com várias práticas que não priorizam quem tá parindo em
um parto e usar essas práticas de uma forma desnecessária Pode configurar violência obstétrica esse aliás é um termo que tá sempre em debate e tem instituições que nem gostam dele mas em resumo violência obstétrica é é uma agressão física ou psicológica à mulher durante o parto no sentido inclusive de tirar a autonomia dela e o protagonismo no momento que é dela e é justamente em oposição à violência obstétrica que se encontra Hoje o parto baseado em evidências científicas que em resumo é o tipo de parto que faz o mínimo de intervenções que busca intervenções que
são compatíveis com a segurança e com o bem-estar da mãe intervenções baseada no que os estudos mostram hoje em dia isso não quer dizer que o parto tenha que ser 100% natural a mulher tem o direito de receber a melhor assistência a melhor assistência possível A grande questão aí é que como a ciência várias vezes acaba mostrando intervenção demais muitas vezes não é uma boa e eu vou reforçar aqui que as cesáreas salvam muitas vidas entre elas a vida do meu filho que só nceu assim e também é importante dizer que muitos partos normais geram
experiências traumáticas para as mulheres seja por desrespeito de profissionais por falta de atenção ou até por falta de cuidado em certas situações e essas experiências acabam contribuindo para gerar esse clima de que o parto normal não é seguro de que ele é muito sofrido muito longo e tudo mais para poder enfrentar isso a gente precisa melhorar o atendimento do parto normal e na Esfera individual o plano de parto é um bom caminho que a gente recomenda sem peso aqui o plano de parto é um documento que tem validade legal onde a mulher pode enumerar todos
os seus desejos paraa hora de dar luz nesse documento ela pode dizer quais procedimentos não quer que sejam feitos nela ou ela não quer se submeter a eles Em quais condições ela quer que eles sejam feitos e esse documento também pode servir para falar sobre os outros Desejos da mulher como fazer o parto no local menos iluminado ou tá acompanhada e até para pedir que coloquem óculos nela assim que o bebê nascer para uma mãe que precisa de óculos conseguir ver a criança direitinho então é um guia de práticas com muitas utilidades aliás no episódio
do ciência suja a thí Manarini que apresentou o episódio conta como foi a experiência do parto dela e como foi montar esse plano e é interessante porque ouvindo ela você acaba entendendo que esse pode ser um dos recursos para voltar a humanizar o parto para refletir sobre ele o papel dele e até ajudar que a ciência seja menos desprezada numa hora que é tão importante se você quer mais conversas como essa aproveita se inscreve no canal recebe os próximos vídeos acompanhe o se se suja se inscreve por lá e saiba que esse vídeo aqui tem
um apoio do Instituto serrapilheira que é um instituto que entre outras coisas apoia a pesquisa no Brasil e divulgação Científica e apoia tanto ciência suja quanto esse canal por aqui e ajuda a gente a fazer vídeos como esse até o próximo