No dia 5 de fevereiro de 2011, centenas de pessoas se reuniram em frente a farmácias de 70 cidades pelo mundo e exatamente às 10 horas e 23 minutos de cada país, tomaram quantidades gigantescas de um certo medicamento. Uma overdose coletiva proposital, para tentar provar que esse remédio era uma grande farsa. Mas o que aconteceu com elas?
Tiveram algum efeito colateral? Que medicamento era esse? E por que tomar às 10h23?
Hoje, no glo. . .
tô brincando, é no Ciência Todo Dia. Eu já vou explicar essa história com calma, mas pra você poder entender, primeiro a gente precisa falar sobre o conceito que está por trás desse protesto. O que os manifestantes queriam dizer é que esse remédio não passava de um placebo.
Esse termo vem do latim, placere. É daí que vem também a palavra prazer. Ela significa agradar, fazer bem.
É por isso que o dicionário médico Rupert define placebo como qualquer medicamento administrado mais para agradar do que beneficiar o paciente. Em outras palavras, placebo é o remédio que não possui um princípio ativo, uma substância que atua diretamente no organismo. É como se fosse um remédio de mentira, feito de farinha ou de açúcar, e que portanto não deveria causar nenhum efeito na saúde de quem toma.
Não deveria! Acontece que, por algum motivo, muitas vezes esses remédios causam sim reações nos pacientes. Respostas físicas mesmo, no corpo da pessoa.
Mas como isso é possível? Bom, esse é um mistério que a gente vai desvendar no vídeo de hoje. Só um aviso muito importante.
Nem todas as pessoas experienciam o placebo da mesma forma. Então jamais abandone uma terapia ou procure o placebo quando existem opções com evidência científica clara de benefício. E se vocês também quiserem usar essas camisetas daqui, as primeiras 10 pessoas a usarem o cupom PLACEBO na minha loja ganham 20% de desconto.
Eu iria rápido se fosse vocês. Link e regras aqui na descrição. A primeira investigação científica sobre os placebos aconteceu no final dos anos 1700.
Na época, alguns médicos usavam um aparelho formado por duas varetas de metal que eram encostadas nos pacientes e, teoricamente, eram capazes de curar as dores que eles estavam sentindo. Até que o médico britânico John Hagart desconfiou desse aparelho e ele decidiu fazer um teste. Ele construiu um aparelho idêntico, só que feito de madeira.
O resultado? Exatamente igual ao da versão de metal, com os pacientes também relatando que as dores diminuíram. E aí nasceu o conceito de placebo.
E também surgia ali a semente que daria origem a um dos tipos de pesquisa científica mais importantes da medicina. O teste duplo-cego. Esse teste foi utilizado de maneira oficial pela primeira vez nos anos 1940 na Finlândia, no desenvolvimento de um antibiótico chamado patulina.
Os cientistas dividiram os voluntários em dois grupos. Um tomou remédio de verdade, o outro tomou um remédio de mentira, ou seja, um placebo. Nem os cientistas nem os pacientes sabiam previamente qual deles estava tomando o que, e daí que veio o nome duplo cego.
Ao final do experimento, os pesquisadores não identificaram nenhum resultado diferente entre o grupo que tomou o placebo e o grupo que tomou o medicamento verdadeiro, e por isso ele foi descartado. O resultado, então, foi publicado num jornal médico e lançou as bases utilizadas até hoje no desenvolvimento de remédios e vacinas. Só que esse teste criou um dilema ético.
Se metade das pessoas doentes vão tomar um remédio falso, isso significa que elas vão estar deixando de ser tratadas. Por isso, nos anos 60, foi publicada a Declaração de Helsinki. O texto diz que o placebo em pesquisa só pode ser utilizado se o paciente não correr risco de danos graves ou irreversíveis por conta da falta de tratamento.
Assim, quem tomar o remédio falso não vai ter grandes problemas. Mas é aí que entra o ponto mais surpreendente dessa história. E quando um remédio falso causa um efeito real?
Isso parece estranho, mas em muitos casos a pessoa que toma um placebo realmente tem uma melhora. Apesar de aquele comprimido não ser um medicamento com princípio ativo, o paciente de fato fica bem. E eu não tô falando de pensar que ficou bem.
Eu estou falando de uma reação prática que alivia o problema de verdade. Esse é o chamado efeito placebo. Isso é possível porque o aspecto psicológico é fundamental para a nossa saúde física.
É só vocês perceberem que uma pessoa que está deprimida ou ansiosa, por exemplo, pode experimentar problemas reais no corpo, como dor no peito, taquicardia, dor de barriga, tensão muscular, tontura. E se isso pode acontecer pro mal, também pode acontecer pro bem. Quando a pessoa está se sentindo feliz e confiante, ela pode passar a perceber menos esses problemas.
E é isso que explica a raiz do funcionamento do efeito placebo. Em resumo, a mente controla o corpo. Neurologistas explicam que a simples crença de que um determinado efeito vai acontecer já é o suficiente para ativar áreas cerebrais cruciais para a percepção da dor.
O ato de tomar o placebo na esperança de que ele cause um efeito benéfico ativa o córtex pré-frontal e desencadeia a liberação de substâncias de efeito analgésico, que bloqueiam a sinalização da dor. E dessa forma o efeito placebo é capaz de agir por várias vias nas nossas percepções e sentimentos, como por exemplo quando o estímulo oloroso como uma ferida aberta continua existindo. E é por isso que aquele beijinho que as mães dão nos joelhos ralados de crianças realmente podem ajudar a aliviar a dor.
E eu estou falando muito sério. Existem diversos tipos de placebo diferentes. Querem um outro exemplo?
A água com açúcar para tranquilizar quem está nervoso. Ou até mesmo o café. Pois é, o alimento mais consumido no Brasil também causa um tipo de efeito placebo.
Um estudo recente dividiu voluntários em dois grupos. Um tomou café de verdade e o outro bebeu água quente com cafeína. Cada grupo sabia exatamente o que estava tomando.
Até porque ia ser impossível não saber que você está tomando um café gostoso ou uma mistura aguada. Enfim, os voluntários passaram por exames de ressonância magnética antes e depois de tomarem essas bebidas. Nos dois grupos foi constatada uma redução da atividade da RMP, que é a rede de modo padrão.
Ela é acionada quando nós estamos relaxados e desligados. É tipo o descanso de tela do nosso cérebro. E essa consequência já era esperada.
É o efeito da cafeína. Mas houve uma diferença surpreendente. O grupo que sabia que estava tomando café teve um aumento de atividade na rede visual superior e na rede de controle executivo, áreas que são ligadas ao processamento da nossa visão e a nossa atenção.
Para os pesquisadores, isso foi uma prova de que uma parte do efeito que o café provoca no nosso corpo, de nos deixar mais ligados, é por efeito placebo. A gente fica mais desperto porque sabe que bebeu café. O próprio ritual de tomar a bebida influencia nos efeitos que ela provoca no nosso corpo.
E tem ainda muitos outros placebos famosos. Nós temos leis de exemplos antigos, como aquelas terapias florais que foram criadas há um século e que prometem usar substâncias de flores para tratar problemas de saúde, até casos mais recentes, como aquelas pulseiras que prometiam melhorar o equilíbrio e a força. Quem está na casa dos 30 certamente se lembra de alguém usando.
Ou se lembra de ter usado. No final, a fabricante precisou até reembolsar compradores em alguns países por causa da propaganda enganosa. Porque afinal de contas, era tudo efeito placebo.
Mas de volta à medicina, existem diversos tipos de substâncias que podem provocar efeito placebo, como tratamentos a laser ou injeções com soro fisiológico. E tem também substâncias que até desempenham uma função real no organismo, como a vitamina C, mas que são parcialmente consideradas um placebo, já que muita gente toma, por exemplo, para se curar de resfriados, o que não tem comprovação científica e pode até fazer mal em grandes quantidades. Na verdade, a pessoa já iria melhorar de qualquer jeito daquele resfriado, mas ela passa a se sentir mais disposta por saber que tomou a vitamina.
Tem uma frase que eu gosto bastante, que eu li num livro de estatística, que é, uma gripe não tratada dura uma semana, e uma gripe tratada passem sete dias. E existem até mesmo cirurgias placebo. Estudos mostram que operações ortopédicas falsas com anestesia e um corte superficial em determinadas partes do corpo podem ser tão eficazes quanto uma cirurgia completa para amenizar a dor de um paciente.
Mas dentre todos os tipos de efeito placebo, sem dúvida os casos mais tradicionais são os provocados por comprimidos. E isso inclusive varia de acordo com o tipo do comprimido. Pesquisas mostram que medicamentos azuis, por exemplo, tendem a causar um efeito calmante.
Já os vermelhos geram um efeito estimulante. E aí, qual você escolhe? O tamanho também interfere.
Pílulas maiores costumam ser vistas como mais efetivas. E até o preço faz diferença. Quanto mais caro o medicamento, mais o paciente tende a acreditar na própria recuperação.
E aí, por isso, ele realmente pode melhorar mais rapidamente. Mas existe um tipo específico de remédio que está sempre no centro das polêmicas quando o assunto é placebo. E eu estou falando dela, a homeopatia.
A homeopatia é uma terapia que surgiu há mais de 200 anos, e de maneira resumida ela consiste em pegar uma substância que causa algum sintoma no paciente e diluir em água ou álcool várias e várias e várias vezes. Os homeopatas, por exemplo, misturam uma parte da substância que causa uma alergia numa pessoa com outras 99 partes de água. Em seguida, agitam essa mistura.
É o que eles chamam de dinamização. E aí esse processo é repetido uma, dez, até mil vezes, fazendo com que aquela substância original fique extremamente diluída, praticamente inexistente. Inclusive, sabe aqueles manifestantes que eu falei no início do vídeo?
O protesto deles era exatamente contra a homeopatia. A crítica que eles fazem é de que as substâncias originais são tão diluídas que representam menos do que uma parte por mol da receita final. E se você não lembra do que é um mol, deixa eu lembrar.
6 vezes 10 elevado a 23. Aliás, é por isso que aquela overdose coletiva foi feita exatamente às 10 e 23. E, de fato, ela não causou nenhum efeito colateral nos participantes.
Mas então, como os homeopatas explicam o suposto funcionamento de um remédio feito com uma substância tão diluída. Eles alegam que a água é capaz de reter a memória da substância original, um pensamento baseado em estudos antigos que já foram refutados. Nas últimas décadas, uma série de novas pesquisas veio diluindo a credibilidade da homeopatia.
Até que uma revisão sistemática desses estudos, feita pelo médico alemão Edzard Ernst, já no início desse século, chegou à conclusão. Não houve nenhuma condição que respondesse melhor ao tratamento homeopático do que ao placebo ou as outras intervenções de controle. Nenhum remédio homeopático teve efeitos clínicos convincentemente diferentes do placebo.
E com isso, a maior parte dos cientistas hoje em dia afirma, a homeopatia é uma pseudociência. E uma possível melhora na saúde de quem se trata com essa terapia não passa de efeito placebo. Ou seja, a pessoa acredita que o remédio vai funcionar e isso, no fim das contas, pode ajudar ela a se recuperar.
Mas calma que as coisas ficam mais bizarras. E quando a pessoa sabe que o medicamento é fake? Será que um paciente pode ter consciência de que está tomando um placebo e ainda assim se sentir melhor?
Por incrível que pareça, a resposta é sim. Seres humanos são muito complexos. Essa descoberta foi feita graças à Escola de Medicina de Harvard.
Os pesquisadores conduziram o primeiro estudo sobre o chamado placebo open label, também conhecido como placebo aberto ou placebo honesto, em pacientes com a síndrome do intestino irritável. Metade dos voluntários tomaram um placebo e eles foram avisados disso. A outra metade não tomou nada e o resultado foi surpreendente.
O alívio dos sintomas foi relatado pelo dobro de pessoas do grupo do placebo na comparação com o grupo que não tomou nada. E isso pode ser uma boa notícia, por exemplo, para os atletas. Eles podem tomar um remédio sem um princípio ativo que seja considerado doping e mesmo assim experimentar uma melhora no desempenho esportivo.
E é por isso que existem remédios vendidos hoje que são assumidamente placebo. Você compra pela internet para tomar com o objetivo que quiser. Mas isso, é claro, não funciona para todo mundo.
Algumas pessoas só sentem os efeitos do placebo se não souberem a verdade. Um caso famoso na ciência aconteceu nos anos 50 com um homem identificado apenas como Sr. Wright.
Ele estava internado com um câncer nos nóbulos linfáticos e já estava bem abatido, sem esperança de cura. Até que surgiu uma nova droga experimental chamada Crebiozen. Logo depois de receber a injeção, ele teve uma pronta recuperação.
Ele passou a andar pelo quarto e começou a fazer piada com os enfermeiros. E dez dias depois, teve alta no hospital. Até que o Sr.
Wright leu nos jornais uma série de reportagens questionando a eficácia do Crebiozen, e com isso ele teve uma recaída. Os médicos então decidiram mentir pra ele. Disseram que tinha chegado uma nova versão do medicamento e aplicaram uma injeção sem nada, só pra ver qual seria o efeito.
E então o Sr. Wright realmente melhorou. Ficou inclusive mais disposto do que antes.
Até que alguns meses se passaram e ele ficou sabendo, novamente, pela imprensa, que o Crebiozen havia sido reprovado nos testes de eficácia. Alguém tira o jornal desse homem! Só que dessa vez não teve jeito, ele teve mais uma pior e acabou morrendo.
A gente não tem como saber se o Sr. Wright iria viver por muito mais tempo se continuasse acreditando na eficácia do remédio, mas o fato é que a esperança da cura serviu como um impulso vital nos últimos meses antes de ele morrer. E aqui eu preciso fazer uma nota importante.
Jamais, em hipótese alguma, suspenda o seu tratamento sem a supervisão e o acordo do seu médico. Afinal, o efeito placebo é tão forte que pode funcionar até, vamos dizer assim, à distância. E esse é o chamado placebo por proxy, ou procuração.
É graças a esse fenômeno que até os animais podem se beneficiar do efeito placebo. Um dos experimentos mais famosos nesse sentido é o dos cães de Pavlov. No início do século passado, esse cientista russo decidiu dar comida para um grupo de cachorros e ao mesmo tempo tocar um sino.
Os animais então passaram a associar o alimento ao barulho desse sino, até que chegou um ponto em que os cães salivavam só de ouvir o sino, mesmo sem ver comida. Ou seja, a expectativa gerava uma reação física, chamada condicionamento clássico. Mas foi nos anos 80 que um novo estudo comprovou a existência do efeito placebo em animais.
Foi com um grupo de camundongos com predisposição genética a lúpus, uma doença em que o sistema imunológico ataca tecidos saudáveis do corpo. Os cientistas davam um remédio que reduzia a atividade imunológica e ao mesmo tempo davam uma água doce que os camundogos tomarem. Depois de um tempo eles passaram a dar só água doce e ainda assim a resposta imune foi a mesma, como se eles ainda estivessem tomando o remédio.
E falando em animais, o placebo tem, digamos, um irmão gêmeo do mal. É o nocebo. O termo também vem do latim noceo, que significa fazer mal, causar dano.
E é o que acontece quando alguém é picado por uma cobra não venenosa, mas sem saber que ela não é venenosa. E aí, só pelo medo de passar mal, a pessoa pode realmente se sentir enjoada, vomitar e até desmaiar. Ou seja, se o placebo faz você se sentir bem por acreditar que vai ficar bem, o nocebo faz você se sentir mal por acreditar que vai ficar mal.
Foi por isso que, durante a pandemia, por exemplo, muita gente relatou efeitos colaterais depois de tomar a vacina contra a covid. Uma pesquisa mostrou que dois terços das pessoas que sentiram efeitos adversos, como fadiga e dor de cabeça, sofreram essas reações por causa de fatores psicológicos. Um claro exemplo de efeito nocebo.
Mas ele aparece também em outras situações. Pode aumentar a dor que você sente ao ir no dentista, intensificar os efeitos de uma ressaca, deixar você se sentindo mal só de ler a bula do remédio que você está tomando. Ou até fazer você piorar de algum problema de saúde ao procurar o motivo dos sintomas no Google.
Sério, não procure sintomas no Google. Vai te dar um pico de efeito nocebo. O fato é que o nocebo e o placebo são tão poderosos que eles nem se restringem só às questões de saúde.
O placebo está presente em muitas situações do nosso dia a dia. É o caso, por exemplo, daqueles botões que tem no semáforo para fazer o sinal ficar vermelho. Muitos deles nem servem pra nada.
Uma reportagem já mostrou que em Nova York, por exemplo, só 9% dos botões realmente funcionavam. Mas o fato de apertar um botão faz muita gente sentir que tem nas mãos o controle da situação, reduzindo a ansiedade da espera. Tem também aqueles botões para fazer a porta do levador fechar mais rápido.
Vocês também já tiveram a impressão de que apertar esse botão ou não apertar nada é praticamente a mesma coisa? Pois é. Mas para algumas pessoas, pressionar esse botão também pode ser o suficiente para elas sentirem que estão poupando tempo.
E existe até o termostato placebo. Em algumas empresas o indicador mostra uma temperatura falsa, mas que já é o suficiente para causar nos funcionários a sensação de que o clima está agradável, permitindo que a empresa economize na conta de luz. É o capitalismo fazendo com você o que você fazia com o seu priminho, quando você dava o controle do videogame desconectado para ele achar que estava jogando.
Enfim, com todos esses exemplos, eu acho que já deu para perceber do que o efeito placebo é capaz. Em resumo, ele não pode eliminar um tumor ou consertar um osso quebrado, mas ele pode reduzir a sua percepção para alguns sintomas, aliviar a dor e fazer com que você realmente se sinta melhor. E por conta disso, consiga se tratar mais rapidamente de um problema de saúde do que você conseguiria em outra situação.
Isso nos leva a perceber como que o nosso corpo é fascinante. Afinal, a ideia de provocar reações físicas meramente com base numa expectativa abre um caminho para uma série de possibilidades e prova que nós somos capazes de muita coisa quando acreditamos o nosso potencial. E isso não é só papo furado, embora tenha soado que nem um coach.
Tudo o que eu trouxe até aqui comprova o que eu vou dizer agora. Ter esperança também pode fazer bem pra você. Agora eu gostaria de saber de vocês.
Em que situações da vida vocês já se depararam com efeitos placebo? Conta pra gente aqui nos comentários. Eu tô curioso pra ver o que a gente vai ver de resposta.
Muito obrigado e até a próxima. Conta pra gente aqui nos comentários. Eu tô curioso pra ver o que a gente vai ver de resposta.
Muito obrigado e até a próxima.