Agricultores transformam deserto em floresta no Semiárido brasileiro

A gente tem acompanhado os impactos cada  vez mais intensos das mudanças climáticas. Mas hoje a gente vai falar de solução. Eu sou João Fellet, repórter da BBC News Brasil,  e a gente veio para Piraí do Norte, um município rural no interior da Bahia, visitar a fazenda de  um suíço que migrou para o Brasil nos anos 80.

Ele comprou uma área grande de 500  hectares, que estava muito degradada, e recuperou essa área com a técnica que  reconcilia produção agrícola e reflorestamento. A chamada agricultura sintrópica. O sucesso que ele teve fez  com que várias empresas, inclusive multinacionais, o procurassem para  tentar replicar esse modelo em maior escala.

Então vamos lá conhecer o Ernst. Bom dia, tudo bem? Bem vindo, seu João.

Ernst Gotsch decidiu já na  infância que seria agricultor. E foi um trabalho com aprimoramento  genético de plantas na Suíça que fez com que ele mudasse a forma de  enxergar a relação com a natureza. Um sistema agroflorestal sempre se espelha no ecossistema original da  região onde ele é implantado.

Essa é uma área de Mata Atlântica,  então as espécies que estão aqui ocupam todos os diferentes andares  da floresta como na Mata Atlântica. O carro chefe da produção do  Ernst é o cacau. O cacau é uma árvore que gosta de estar na sombra de outras.

Então em vez de ter uma monocultura em  que você só tem cacau ocupando uma área, você tem produção de cacau e de todas as  espécies que estão acima e abaixo dele. Hoje, o Ernst tem alunos que têm implantado  seus métodos em todas as regiões do Brasil. Hoje Ernst tem alunos que estão implantando  seus métodos em todas as regiões do Brasil.

Ele também já foi contratado pelo Grupo Pão  de Açúcar e pela Michelin para auxiliá-los a produzir alimentos e borracha em grande  escala seguindo os mesmos princípios. Uma coisa muito impressionante de  andar em um lugar como este é sentir os cheiros de floresta e dessa madeira  que já vai se decompondo, essa umidade, e é realmente o método deles, como eles fazem  podas muito intensamente, com muita frequência, é como se em um intervalo de tempo curto os  processos da floresta acontecessem muitas vezes. Então é como uma floresta com  um hormônio explodindo de ação.

O método de Ersnt dispensa o uso  de agrotóxicos e adubos químicos. E enquanto muitos agricultores veem insetos,  fungos e bactérias que muitos agricultores consideram pragas, ele os vê como amigos  avisando que há algum desequilíbrio no sistema. Quando o Ernst chegou nesta terra, 11 riachos como esse tinham desaparecido  por causa do desmatamento e da erosão.

Conforme ele foi replantando a  floresta original, a água voltou. E voltou a ser permanente ao longo do ano inteiro. É por isso que ele costuma dizer que a água  se planta, e se planta em qualquer lugar.

Agora a gente vai visitar uma área, na  região mais seca do Brasil, o semiárido, que também está plantando uma  agrofloresta para colher água. Quando a gente começou esse trabalho aqui, era uma área degradada, área que  antigamente era usada como pasto. Era roça, roça de mandioca, de milho.

E o solo duro compactado, resultado desses  processos que a gente está conhecendo, conhece, de cortar e botar fogo. Então o solo estava muito duro. E qual foi nosso primeiro trabalho aqui?

Abrir valetas nas curvas de nível,  para permitir a infiltração da água. Não eliminando os escoamentos de água. Então foi o primeiro elemento  que a gente fez aqui.

E depois a gente foi plantar intensamente  em espaçamento de 1,5 metro, mais ou menos, linhas de palmas, principalmente. Quando a gente botou, junto com a palma, sisal,  a veloz, a piteira, umburana, distaca, mandacaru, é o que a gente está chamando de que a  gente montou uma matriz fotossintética. São espécies que fazem fotossíntese  o ano todo, independente da chuva.

Três anos depois da implantação do sistema, a  melhora das condições e a presença de verde o ano todo já tem atraído animais que não eram vistos há  muito tempo na região, como o veado catingueiro. O solo está melhorando, a fauna tá presente, a  vegetação está aí. Ela não sofre impacto da seca.

É errado dizer que na caatinga tem seca.  Na caatinga tem um período de estiagem. Porque o conceito de seca vem da agricultura  da Mata Atlântica, da região úmida.

Quando vem a chuva, que todo mundo espera  como o elemento de salvação da agricultura, para mim não passa de um bônus. É aquele momento que vai dar um  ganho maior do que aquele ganho que você tem com a chuva diária,  como eu chamo, que é o orvalho.