Você já deve ter saído de casa ignorando completamente os conselhos da sua mãe de passar protetor solar em um dia quente e insolarado. E eu digo terrível porque depois você tem que aguentar a dor excruciante de uma queimadura solar que não te deixa dormir por alguns dias. Mas o que é mais interessante é que mesmo com o Sol estando a 149 milhões de quilômetros da Terra, você conseguiu sentir os efeitos da radiação na sua pele.
E como dói. Se esse é o poder do Sol a 149 milhões de quilômetros de distância, eu não quero nem saber como deve ser chegar perto do Sol. Tocar nele, então, completamente fora de corritação, ao invés de tocar, na verdade, seria mais para uma cremação instantânea.
Mas se você pensa que é impossível tocar no Sol, você subestima a engenhosidade humana. Porque em 2021, nós tocamos o Sol com uma sonda. E como se não bastasse, chegamos ainda mais perto dele em 2024.
Essa é a história da sonda Solar Parker. A primeira e até agora a única coisa construída pela humanidade que foi capaz de dar um tapinha nas costas do Sol e viver pra contar a história. Qual tecnologia foi utilizada pra construir isso?
Como construímos esse objeto que parece ser saído de ficção científica? E por que não fomos de noite pra evitar o pior do calor? Roda a vinheta!
De novo não! Eu não costumo fazer isso, mas esse vídeo vai começar com um dos maiores mistérios da astronomia. E eu vou demonstrar ele usando essa vela.
Com a vela acesa, se eu aproximar minha mão, eu vou sentir o calor da chama na pele. E quanto mais próxima minha mão estiver, mais quente eu vou sentir. E eu nem preciso dizer o que aconteceria se eu encostasse na chama.
Mas o inverso é verdadeiro. Quanto mais distante da chama eu estiver, menos calor eu vou sentir. Calor é energia.
Perto da vela queimando, tem muita energia em pouco espaço. Então tem muito calor. Mas conforme eu vou me afastando da vela, a energia da chama vai se espalhando para as moléculas do ar.
E conforme a energia se espalha em um volume maior, cada porção de ar fica com menos energia e, consequentemente, menos calor. Isso faz todo sentido. Quanto mais longe de uma fonte de calor, mais frio fica.
E o Sol deveria seguir uma lógica parecida. Só que não. Eu sei que o que eu vou falar agora vai parecer estranho.
Mas de forma simplificada, nós podemos pensar no Sol como uma cebola. E cada camada do Sol-bola tem as suas próprias características. Na parte interna, temos o núcleo, a zona de radiação e a zona de convecção, que podem chegar a temperaturas de 7 milhões de graus Celsius.
Ao redor dessas camadas, nós temos a fotosfera, que é a região da nossa estrela que nós conseguimos ver. E aqui podemos chegar a temperaturas próximas de um inverno no Rio de Janeiro, cerca de 6. 000 graus Celsius.
E até aqui, nada muito estranho. Faz sentido que a camada mais externa de uma estrela seja mais fria do que as camadas mais internas, que é onde a fusão nuclear acontece. Eu não sei vocês, mas eu espero que a fusão nuclear seja a camada mais quente.
Mas depois da fotosfera, existe a cromosfera, que é uma camada bem fina em que as temperaturas vão de 5 a 25 mil graus Celsius. Ok, estranho. A temperatura abaixa e depois aumenta.
Mas calma que piora. A região mais externa do Sol, que é a coroa solar, atinge temperaturas de mais de 1 milhão de graus Celsius. Ela é uma das camadas mais quentes da nossa estrela.
A pergunta de 1 milhão de dólares é como? Como é que a coroa solar, que é a parte mais externa do Sol, fica mais quente do que as partes do núcleo. E se isso não ficou estranho o suficiente, deixa eu colocar da seguinte forma.
É como se acender uma vela no meio da sua sala, fizesse a cortina da janela pegar fogo. Se isso é surpreendente para você, imagine para a comunidade científica quando as observações começaram a mostrar temperaturas tão altas. Isso ficou conhecido como o problema do aquecimento coronal.
E, spoiler, até hoje nós não temos uma boa explicação. Só antes, um rápido agradecimento para a Alura, que não só é a maior escola online de tecnologia do Brasil, como também topou fazer esse vídeo comigo. Eu e a Alura temos uma longa história juntos e eu sempre recomendo para quem vem me perguntar onde podem aprender coisas novas.
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Voltando ao vídeo, eu estaria mentindo se eu desse a entender que esse é o único mistério solar. O Sol possui fenômenos como flares e formação de ventos solares, que têm um impacto direto na Terra e nas nossas vidas. É comum que o Sol tenha explosões na superfície que liberam energia e partículas para o espaço.
Quando essas partículas são liberadas para o espaço, elas são chamadas de ventos solares. E caso elas atinjam a Terra, causam as chamadas tempestades solares. Em 2024, várias tempestades solares aconteceram e afetaram desde aviões comerciais até redes de comunicação, além de causarem um dos melhores anos para assistir a auroras boreais.
E quanto mais tecnológico o nosso mundo fica, maior é a chance de uma tempestade solar afetar bastante o nosso dia a dia. Então entender a dinâmica do Sol e o que acontece nas suas partes mais externas é essencial para o bem-estar de uma civilização tecnologicamente avançada, que é o nosso caso. Percebam que eu não disse inteligente.
Também tem o bônus de que o Sol está aqui do lado, pelo menos quando falamos de escalas astronômicas. O que significa que ele é estudado e observado desde sempre. E mesmo assim, não descobrimos a explicação para o problema do aquecimento e nem entendemos direito toda a dinâmica dos campos magnéticos da nossa estrela.
Então, o que falta? Falta tocar no Sol! Só que a pedra no meio do caminho incomoda bastante.
Nós estamos falando de algo que aguente milhões de graus a coroa solar. A ideia de uma sonda capaz de ir para o Sol começou no final da década de 50. No final da década de 90, o projeto começou a sair do papel, mas corte de orçamento fizeram ele ser suspenso temporariamente.
Finalmente, em 2010, a NASA retomou a ideia completamente absurda de mandar uma sonda para o Sol. Essa era a sonda solar Parker. Mandar sondas para o espaço não é algo novo, e nós temos feito isso muito bem ultimamente.
O problema é criar uma sonda capaz de aguentar os milhões de graus Celsius e não fritar completamente todos os seus eletrônicos. O segredo é que temperatura não é tudo que importa. Na física, a temperatura é um conceito diferente de calor, apesar de, sim, estarem relacionados.
A temperatura é uma medida da energia do movimento das moléculas ou átomos de um ambiente ou de um corpo. E essa energia do movimento é chamada de energia cinética. Quanto maior a energia cinética média, ou quanto mais agitadas elas estiverem, maior será a medida que nós chamamos de temperatura.
Já o calor é a quantidade de energia que é transferida de um objeto mais quente para algo mais frio. E não depende só da temperatura, mas depende também de quanto material quente nós temos para transferir esse calor. Imagine que você está cozinhando e uma única gota de água 100 graus Celsius respinga na sua mão.
Essa gota tem uma temperatura alta e quando ela toca o seu corpo, parte da energia é transferida como calor para a sua mão. Você já deve ter feito isso com temperaturas ainda mais altas, como, por exemplo, ao retirar algo que estava assando no forno a 200 graus Celsius, e você saiu ileso, sem nenhuma queimadura. Mas isso não aconteceria se você botasse a mão em uma panela de óleo fervendo a 200 graus Celsius.
Isso causaria queimaduras extremas. Mas as temperaturas envolvidas são as mesmas. Então, por que óleo a 200 graus queima mais do que o forno?
A resposta é porque o que está a 200 graus no forno é o ar. E a densidade do ar é bem mais baixa do que a densidade do óleo. Então, mesmo que a temperatura seja a mesma, a quantidade de energia não é.
O óleo guarda bem mais calor por grau de temperatura do que o ar. Então existe bem mais energia para o óleo transferir para a sua mão do que o ar quente do forno tem. O perigo não está só na alta temperatura, mas no excesso de calor.
A nossa situação da coroa solar é parecida. As partículas estão se movendo rápido o suficiente para que a temperatura chegue a milhões de graus. Mas sem tão poucas partículas que o calor é relativamente baixo.
Não tem calor suficiente para aquecer a sonda Parker a milhões de graus. A sonda vai aquecer só até uns 1400 graus Celsius. Não é nada demais.
É só temperatura o suficiente para derreter cobre. E isso foi sarcástico, só para ser bem claro. Por referência, a temperatura de Vênus na superfície é por volta de 460 graus Celsius.
E isso já foi o suficiente para destruir todas as sondas que pousaram no planeta. Então, resistir a temperaturas de 1400 graus é um desafio e tanto. Para tolerar as temperaturas da coroa, os engenheiros do projeto introduziram um escudo térmico chamado de Thermal Protection System, ou TPS.
O TPS é um conjunto de materiais que protege um sistema em um ambiente onde a temperatura pode chegar a valores altos. E nesse caso, o escudo térmico possui dois painéis de compostos de carbono e carbono reforçado. No centro dos painéis nós temos uma espuma de carbono de 11 centímetros de espessura.
O escudo tem 2,4 metros de diâmetro e 115 milímetros de espessura, e ao todo pesa cerca de 70 quilos, o que é surpreendentemente leve para um escudo que precisa defender a sonda da radiação do Sol. Para ajudar a refletir parte da energia de volta para o espaço, o lado do escudo que fica voltado para o Sol tem uma camada esbranquiçada de um composto de alumínio e oxigênio. Todo esse mecanismo e componentes conseguem refletir e absorver boa parte da energia, mantendo a parte interna da sonda que possui equipamentos de observação a apenas 30 graus Celsius.
Eu acho muito engraçado que a gente aqui no verão brasileiro vive numa temperatura mais alta do que a sonda que tá literalmente no sol. Será que a NASA vende a tecnologia do escudo da mesma maneira que eles vendem travesseiros? Não, pera, tô brincando.
A NASA não vende travesseiros. A sonda também possui dispositivos que conseguem medir o fluxo de partículas eletricamente carregadas no vento solar, além de capturar algumas delas para fazer medições do campo magnético da nossa estrela. O mais interessante é que toda a comunicação com a sonda tem 8 minutos de atraso por causa da distância.
Então ela precisa ser praticamente autônoma. Ela precisa tomar decisões por conta própria, rapidamente, para evitar ser vaporizada ou danificar por algum evento inesperado. Todo cuidado é pouco quando se está em um ambiente extremo e sozinho.
É assim que eu me sinto quando estou nos rolês sociais. É hora de tocar no Sol! A sonda foi lançada no dia 12 de agosto de 2018, diretamente da Flórida para o Sol.
E após o lançamento, ela deu início a uma série de manobras que a fizeram ganhar velocidade para se aproximar do Sol, usando inclusive a ajuda da gravidade de Vênus. A sonda fez sete sobrevoos em Vênus nos últimos sete anos, que ajudaram a mudar cada vez mais o ângulo e formato da órbita, cada vez dando rasantes mais próximos do Sol. A órbita da sonda não é um círculo perfeito.
Muito pelo contrário, ela passa apenas uma fração da órbita próxima ao Sol, em mergulhos para coleta de dados, com cada mergulho chegando mais perto da nossa estrela do que o último. E por fim, no dia 28 de abril de 2021, durante o seu oitavo sobrevoo no Sol, ela conseguiu tocar o intocável. Ela encostou no Sol.
A sonda sobrevoou o Sol a uma distância de 13 milhões de quilômetros da fotosfera, o que foi o suficiente para ultrapassar a superfície de Alfvén, que determina onde a coroa termina e começa o espaço. Os pesquisadores perceberam que havia finalmente acontecido quando eles receberam dados que concordavam com a quantidade de partículas e o valor de campo magnético esperado na coroa. É uma região em que o campo magnético solar é dominante.
Então a NASA descreveu o momento como o dia em que a sonda solar Parker tocou o Sol. E foi a primeira vez que nós víamos como era dentro do Sol. Isso nos trouxe informações sobre como os campos magnéticos se comportam na coroa solar e qual é a dinâmica do plasma naquela região.
Informações que não poderiam ser coletadas de outra forma. E essa não foi a última vez em que a sonda Parker fez 24 órbitas em torno do Sol, com o último mergulho no dia 24 de dezembro de 2024. E como se tocar o Sol não fosse o suficiente, ela também quebrou o recorde de objeto mais rápido criado pela humanidade, com velocidade máxima de 692.
018 km por hora no dia 24 de dezembro de 2024. Mas tudo bem, além de tocar no Sol e ser oficialmente o objeto mais rápido da história, essa missão e todo o investimento nos trouxeram algum retorno? E a resposta é que sim!
Graças à missão, nós tivemos dados para responder perguntas que seriam difíceis e até impossíveis de serem respondidas sem ela. Nós podemos ainda não entender completamente o mistério por trás do aquecimento coronal que eu falei no começo do vídeo, mas a sonda Parker iluminou algumas coisas. Campos magnéticos provavelmente são os grandes responsáveis pelas coisas mais estranhas que acontecem no Sol.
Por exemplo, um dos mecanismos responsáveis pelas extremas temperaturas da corona solar é basicamente um tipo de colisão de campos magnéticos com as partículas no vento solar. Só que esses campos magnéticos extremos são ejetados do Sol de alguma maneira que nós ainda não entendemos. Mas quando os campos entram em contato com a corona, eles podem mudar de direção rapidamente, oscilando meio que como a corda de um violão.
E essa mudança abrupta de direção do campo magnético pode aquecer as partículas na atmosfera do Sol de forma similar a como o micro-ondas aquece a sua comida, mas em escala estelar. Então a corona solar é super quente porque ela é frequentemente atingida por ondas de campos magnéticos e plasma, transportando grandes quantidades de energia. Além dessa descoberta, a sonda também mostrou que tem muito mais partículas energéticas escapando do Sol do que a gente pensava.
E isso porque algumas continuam presas nos campos magnéticos e não chegam até a Terra. Então as medidas que nós temos aqui não refletem quantas partículas o Sol emite de fato. E não pense que nós só descobrimos coisas sobre o Sol.
Vênus também foi estudado a cada sobrevoo da sonda. A sonda Parker conseguiu imagens da superfície de Vênus e encontrou um anel de poeira em torno do planeta. Mas o mais interessante foi que a sonda observou uma cauda de plasma no planeta.
É como se Vênus tivesse o sonho de ser um cometa algum dia. E falando em cometas, a sonda também já observou 19 cometas próximos ao Sol que nunca haviam sido encontrados antes, e foi possível estudá-los de forma mais detalhada. E curiosamente, a última aproximação da sonda com o Sol era para ser a última, mas ela saiu ilesa.
Ou seja, nós teremos novas aproximações em março e junho de 2025, e elas vão poder quebrar o último recorde de menor distância do Sol. Que aí sim, é improvável que ela sobreviva. Mas qual é o futuro dela?
O que vai acontecer quando o combustível e fluidos que mantém as partes internas chegarem ao fim? Provavelmente ela receberá o comando de virar completamente para o Sol sem nenhuma proteção térmica e vai queimar completamente, deixando apenas o escudo de carbono para trás. Tipo o Ícaro queimando por voar perto demais do Sol.
Só que diferente da figura mitológica, a sonda teve um sucesso estrondoso na sua missão. A sonda Solar Parker ficará marcada para sempre na história como o primeiro objeto construído pela humanidade a encostar no Sol. É curioso pensar que provavelmente não será o último objeto e em algum momento a humanidade vai retornar ao Sol.
Mas nós tivemos o privilégio de observar a primeira vez que isso aconteceu. E isso tem um peso ainda maior quando nós lembramos que o Sol é objeto de estudo desde sempre por seres humanos. E ele é celebrado por diversas culturas.
Ícaro ficaria orgulhoso de nós! E se você quiser acompanhar os resultados futuros da missão, não esquece de deixar um gostei nesse vídeo e de se inscrever no canal. E eu espero vocês no próximo vídeo!
E se vocês gostaram das transições novas que a gente usou no vídeo, deixa a gente saber nos comentários! Muito obrigado e até a próxima! Muito obrigado e até a próxima.