O que aconteceria se o Sol virasse um buraco negro? Essa pergunta é tão popular que ela até já virou uma questão do Enem em 2022. As alternativas iam desde isso afetaria a órbita dos planetas fazendo-os espiralar em direção ao buraco negro, até eles passariam a precessionar mais rapidamente.
A resposta, no entanto, era simplesmente que as órbitas iam permanecer inalteradas. Isso pode soar estranho, mas como a única coisa que interfere nas órbitas é a massa dos corpos, se o Sol fosse trocado por um buraco negro de mesma massa, nada mudaria pra gente aqui na Terra. Além da escuridão eterna e do frio congelante, é claro.
Tem isso daí. . .
Mais uma pergunta que eu aposto que você nunca se fez é e se existir um buraco negro no centro do Sol? E não, eu não tô falando de um buraco negro surgir no centro da nossa estrela agora, nem nada do tipo. Eu estou falando de e se existir um buraco negro no centro do Sol que sempre esteve lá e nós nunca fizemos ideia?
Você muito sabiamente provavelmente argumentaria que o Sol já teria sido engolido há muito tempo. Mas recentemente essa ideia começou a ser tratada com seriedade e inclusive nós temos um nome para as estrelas que possuem um buraco negro interno: estrelas de Hawking. Recentemente dois artigos foram publicados fazendo justamente essa pergunta: e se existe um buraco negro no centro do Sol?
A proposta dos autores era investigar essa questão com seriedade, fazendo simulações e seguindo o embasamento teórico. E o que eles descobriram foi uma surpresa. Não só seria possível existir um buraco negro dentro do Sol, como também seria extremamente difícil de nós detectarmos qualquer diferença se esse fosse o caso.
O melhor de tudo é que, de acordo com os artigos, é muito provável que existam estrelas com buracos negros no centro. E quem sabe o próprio Sol poderia ser uma delas. Mas calma, vamos dar um passo pra trás.
Eu sei que provavelmente você deve estar se questionando se tudo que você aprendeu sobre estrelas ou sobre buracos negros era uma mentira. E a resposta é que não. Mas talvez existam coisas sobre buracos negros que você ainda não sabe.
E é por isso que nós vamos começar respondendo o que é um buraco negro. Mas eu prometo que dessa vez vai ser de uma forma que você nunca viu. Então vamos lá?
O que é um buraco negro? Antes de responder eu só preciso de 15 segundos para falar uma coisa. Essas camisetas que eu uso nos vídeos são da minha loja, a Loos.
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E agora sim eu posso responder o que são buracos negros. Buracos negros são regiões do espaço-tempo que têm uma curvatura tão extrema que nem mesmo a luz consegue escapar. Isso porque curvatura do espaço-tempo é o que nós interpretamos como campo gravitacional.
Nós estamos presos na superfície da Terra porque a massa dela distorce o espaço-tempo. E esse conceito vem da Relatividade Geral de Einstein. E de acordo com a teoria, matéria e energia distorcem o espaço-tempo, criando o efeito de campo gravitacional.
Colocando dessa forma, fica até difícil de chamar buracos negros de objetos, já que eles são regiões do universo onde tudo que entra não sai, nem mesmo a luz. O problema com essa explicação, e o nome buraco negro, é que ela traz a ideia de que eles são buracos no espaço-tempo que sugam tudo o que eles veem pela frente. Mas a verdade é completamente diferente.
Buracos negros são muito chatos para comer. Quando digo isso, eles são realmente chatos. O processo de acreção, que é quando um buraco negro engole algo, é extremamente complicado e até hoje nós temos diversas perguntas em aberto.
Por muito tempo, uma dessas perguntas era se um objeto ao redor de um buraco negro tem um momento angular, então ele sempre vai permanecer naquele raio, naquela velocidade, porque o momento angular é conservado. Só que nós sabemos que buracos negros se alimentam, então isso significa que os objetos estão caindo dentro dele. Em outras palavras, esses objetos perderam o momento angular.
Então, como é que objetos podem perder o momento angular se ele precisa ser conservado? Foi só na segunda metade do século passado que astrofísicos entenderam que o momento angular tem que ser transportado da parte mais interna para a mais externa. E isso faz com que uma nuvem de gás se torne um disco, onde a parte interna perde o momento angular e cai dentro do buraco negro, enquanto a parte externa se afasta.
E esse disco recebe o nome de disco de acreção. Mas o que causa esse transporte de momento angular? A resposta só veio em 1991, foi quando surgiu a hipótese de que campos magnéticos causam fricção, e eles transportam o momento angular.
Isso resolveu um problema, mas criou outro. Quando nós botamos campos magnéticos no meio disso tudo, nós percebemos que buracos negros não são simples. E, além disso, nós percebemos que, sob algumas condições que nem são tão raras assim, buracos negros simplesmente são impedidos de se alimentarem.
Uma dessas condições foi descoberta através do trabalho do físico Stephen Hawking, que na década de 70 propôs que buracos negros evaporassem. O mecanismo, que ficou conhecido como radiação Hawking, funciona através de efeitos quânticos na borda do buraco negro, fazendo com que eles percam energia. E como energia e massa são equivalentes, para um buraco negro perder energia, ele perde massa.
Só que no processo de perda de massa, o buraco negro emite radiação, Hawking. E ela dificulta o processo de acreção do buraco negro, porque a pressão de radiação empurra a matéria que está caindo em direção a ele para bem longe. É uma espécie de barreira.
Hawking, inclusive, encontrou uma relação entre a massa do buraco negro e a radiação que ele precisaria emitir para criar essa barreira. Buracos negros pequenos emitiriam radiação mais rapidamente e com comprimentos de onda mais energéticos, evaporando mais rápido, enquanto buracos negros maiores emitem mais lentamente, evaporando mais devagar. Na prática, isso significa que um buraco negro supermassivo levaria muito mais do que a idade do universo atual para evaporar, enquanto buracos negros pequenos já teriam evaporado há muito tempo.
E aqui, quando eu falo muito pequenos, é muito mesmo. Eu tô falando de buracos negros com tamanhos próximos de um átomo. Se você está pensando, buracos negros com tamanho de um átomo podem existir?
Você está fazendo a pergunta certa, porque essa foi a mesma pergunta que o próprio Stephen Hawking se fez. Na realidade, Hawking estava preocupado com outra pergunta, mas uma coisa levou à outra. A pergunta que ele se fez era se o início do universo poderia ter gerado buracos negros.
Durante os primeiros momentos do universo existiam flutuações de densidade aleatórias. Então, em alguns lugares, a densidade era maior do que em outros. Só que logo depois desses primeiros momentos, uma rápida inflação fez o universo ir de um tamanho de uma bola de tênis para o tamanho de uma galáxia.
E isso tudo entre 10⁻³⁶ e 10⁻³³ segundos. Hawking percebeu que durante esse processo, algumas dessas regiões com densidade maior poderiam ter colapsado e formado o que ficou conhecido como buracos negros primordiais. E aqui eu preciso ressaltar algo que pode gerar uma confusão.
É comum que buracos negros primordiais sejam interpretados como buracos negros muito pequenos, mas não é bem assim. Buracos negros primordiais podem vir de diferentes tamanhos, inclusive maiores. Mas nesse vídeo, hoje, nós vamos focar nos menores e o motivo já vai ficar claro.
Hawking concluiu que buracos negros muito pequenos, mesmo com massas menores do que 10 elevado a 15 gramas já tinham evaporado há muito tempo. Mas os maiores ainda poderiam estar entre nós hoje. Só tem um problema, eles nunca foram observados.
E acreditem, nós estamos procurando por eles. Eles são extremamente importantes para a física. Buracos negros primordiais são um dos candidatos para explicar a matéria escura.
Eles podem não ser os mais prováveis, mas eles são os favoritos por três motivos. Primeiro, que nós não precisamos de uma nova física para explicá-los. Segundo, que eles se formaram em um processo natural.
E terceiro, seria possível observá-los em diferentes intervalos de massa. Mas onde esses buracos negros estariam? Por que a gente nunca observou um deles?
Segundo as estimativas que o próprio Hawking fez, é possível que buracos negros primordiais com massas próximas a de um asteroide existam. Eles não evaporaram ainda. Mas cadê eles?
Como que nós podemos provar que eles são matéria escura ou até mesmo provar que eles não são matéria escura? Nós temos diversos motivos para acreditar que buracos negros primordiais existem, e em grande quantidade. Observações de galáxias muito distantes obtidas pelo James Webb podem ser explicadas através de buracos negros primordiais.
O próprio James Webb nos indica que a formação das galáxias foi muito mais rápida do que nós esperávamos. E essa permanece como a maior descoberta do James Webb até o momento em que esse vídeo foi gravado. Isso poderia ser explicado através de um processo que envolve buracos negros primordiais.
E até a combinação de buracos negros que foi observada recentemente, em que a massa de uns buracos negros originais não poderia ser explicada através da morte de estrelas, poderia ser explicada através de buracos negros primordiais. O meu ponto é, nós temos evidências muito fortes, tanto teóricas quanto observacionais, de que esses buracos negros existem? Foi usando essa argumentação de que eles podem existir que Hawking introduziu a ideia central desse vídeo.
E se os buracos negros primordiais forem engolidos por estrelas enquanto elas se formavam? O próprio Hawking responde essa pergunta no seu artigo dizendo que, para uma estrela como o Sol, buracos negros primordiais com massa de 10⁻¹⁶ massas solares poderiam ser capturados quando a nubem de poeira que formou o Sol colapsou. Como ele foi um dos pioneiros dessa ideia, essas estrelas ficaram conhecidas como Estrelas de Hawking.
Seria possível que, se um buraco negro primordial estivesse por perto, ou dentro de uma nuvem de gás e poeira que estivesse para colapsar, ele se tornasse parte da estrela que nasceu. Nós sabemos hoje que a formação de uma estrela acontece quando uma nuvem fria de gás e poeira colapsa, e o colapso pode ser por algum fator externo, como por exemplo, ondas de choque devido a uma supernova próxima. Durante a formação da estrela, o buraco negro extremamente pequeno, do tamanho de um átomo, seria empurrado para o centro dela.
E se você acha que isso seria um banquete para o buraco negro, não tanto. Existem duas barreiras que vão impedir que ele se alimente de todo o material da estrela. A primeira é a própria radiação Hawking.
A pressão de radiação se torna uma barreira e a acreção fica mais lenta como resultado. E a segunda é a radiação do processo de acreção. Quando um buraco negro se alimenta, o disco de acreção que se forma em torno dele brilha, ou seja, ele também emite radiação.
E essa radiação também cria uma barreira através da pressão de radiação. E é por isso que existe um limite de o quanto um buraco negro consegue se alimentar, mesmo quando a radiação Hawking não importa tanto, como no caso de buracos negros supermassivos. E esse limite, ou no termo mais técnico, taxa de acreção, é chamado de taxa de acreção de Eddington.
Para o buraco negro primordial, isso se torna um obstáculo. A massa da estrela cairia dentro dele muito lentamente. Então ele demoraria muito para crescer, algo na ordem de bilhões de anos, às vezes até mais do que a própria idade da estrela.
E além disso, a energia e luminosidade ao redor do buraco negro começariam a se somar com a luminosidade da própria estrela. Isso cria uma esfera dentro dela dominada pela interação com o buraco negro. E quanto mais ele cresce, mais essa esfera cresce.
No início da vida da estrela, a maior parte do raio dela é dominada pela fusão de hidrogênio. É igual ao que observamos no Sol atualmente e em várias outras estrelas. Não teria diferença nenhuma entre ver uma estrela comum ou uma estrela de Hawking estágio.
Mas conforme o buraco negro primordial vai se alimentando e crescendo dentro da estrela, a esfera de influência, chamada de esfera de Bondi, também cresce. E com isso, a própria luminosidade que o buraco negro emite quando se alimenta vai se igualando e até mesmo ultrapassando a luminosidade emitida pela fusão do hidrogênio. E isso é extremamente perigoso para uma estrela.
Elas vivem um delicado equilíbrio entre a gravidade que tenta fazê-las encolherem e a pressão de radiação que tenta fazê-las expandirem. Com mais luminosidade, ou seja, radiação, dentro dela, a estrela começa a inchar. Não o suficiente para se tornar uma gigante ou supergigante.
Ela se tornaria uma espécie de estrela menor do que uma subgigante vermelha. Ela pararia de crescer porque, conforme ela incha, volta a ficar difícil do buraco negro se alimentar. A matéria da estrela não cai mais com tanta facilidade.
Então, ela fica sendo empurrada para trás pela alta pressão de radiação. E, com isso, o buraco negro primordial atinge um platô, assim como a luminosidade que ele emite. Nesse ponto, a estrela viveria apenas da energia gerada através do buraco negro, porque a fusão nuclear já teria sido interrompida.
O que você veria olhando para uma estrela dessas é exatamente o que você esperaria de uma estrela gigante vermelha, com a exceção de que ela estaria dezenas ou centenas de vezes menor do que o normal. Se uma estrela de Hawking se pareceria normal durante toda a sua vida, então como nós podemos encontrá-los? Uma possibilidade seria procurar estrelas gigantes vermelhas muito menores do que o esperado.
Mas isso não seria uma garantia, porque existem outros processos naturais que também podem afetar o tamanho de estrelas. Então, só o tamanho não é garantia. Mas existe um fio de esperança em uma área da astronomia que você provavelmente nunca ouviu falar.
A asterossismologia. Ela estuda o espectro de frequências de estrelas. E o que essas palavras difíceis significam é que basicamente ela estuda como uma estrela vibra.
Uma estrela tem uma dinâmica bastante complexa no seu interior em que o plasma se movimenta junto com campos magnéticos. E esse movimento do interior faz com que ondas de pressão passem pela estrela. De uma forma simplificada, pegue um instrumento musical.
A forma como você movimenta as cordas ou como você bate em um tecido faz com que o ar vibre e uma onda de pressão passe por ele. Isso é o que nós conhecemos como som. Você consegue até mesmo com uma certa facilidade distinguir diferentes tipos de instrumentos que tocaram a mesma nota, que é o que nós chamamos de timbre.
E se o seu ouvido estiver muito bem treinado, você até consegue diferenciar qual nota está sendo tocada por qual instrumento. Uma estrela não é muito diferente. O plasma delas é um fluido assim como o ar.
Da mesma forma que você consegue saber características de um instrumento musical através da vibração, estrelas com características diferentes também vibram de jeitos diferentes. E essa vibração pode nos dar informação até mesmo sobre como que é o interior de uma estrela e quais são as suas propriedades. Então, sabendo como uma estrela normal vibra, nós podemos analisar esse espectro e comparar com as que nós suspeitamos serem estrelas de Hawking, porque as ondas passando pelos buracos negros seriam forçadas a se propagarem de um jeito diferente.
Da mesma forma que se você colocar uma fita adesiva nas cordas de uma guitarra, ela vai soar diferente. A asterossismologia poderia ser a forma como nós podemos encontrar estrelas de Hawking pelo universo. Mas e se essas estrelas não estiverem pelo universo?
E se elas estiverem mais perto do que nós imaginávamos? Tipo, no Sol? Toda análise que os artigos fizeram junto com as simulações são de estrelas iguais ao Sol.
Então tudo o que foi falado no vídeo também é válido para o Sol. O ponto é, nós não saberíamos se o Sol é ou não uma estrela de Hawking, já que visualmente as duas seriam iguais. Então, para nós, não faria muita diferença o Sol ter ou não ter um buraco negro primordial no seu centro, apesar de ser muito legal a gente poder dizer que orbitamos um buraco negro.
No entanto, a diferença estaria no final da vida do Sol. E isso, sim, poderia afetar a Terra. No final da sua vida, uma estrela de Hawking se torna uma espécie de gigante vermelha, que o Sol também vai se tornar no final da sua vida.
A diferença é que uma estrela de Hawking chega nesse estágio bilhões de anos antes do que uma estrela normal. Então, nesse caso, o Sol morreria muito antes do previsto, e aí a humanidade teria alguns bilhões de anos a menos do que o esperado. O lado bom disso tudo é que, atualmente, nós esperamos que no fim da sua vida o Sol se expanda até engolir a órbita da Terra.
Mas se ele fosse uma estrela de Hawking, ele pararia na órbita de Mercúrio. A vista aqui da Terra seria incrível, mas mortal. Tá, mas e aí?
O Sol é ou não é uma estrela de Hawking? A área da asterossismologia atualmente só consegue atingir até uma certa profundidade. Então, é certo que não existe um buraco negro muito maior do que um átomo dentro do Sol.
Se existir um buraco negro dentro do Sol, ele precisa ser um buraco negro primordial extremamente pequeno, que foge da profundidade que nós conseguimos alcançar atualmente. Então, para responder, nós vamos precisar entrar no domínio da probabilidade. Existe uma chance muito, muito, mas muito baixa de o Sol ser uma estrela de Hawking.
Primeiro que se o Sol acretou um buraco negro primordial durante a sua formação, a essa altura ele já seria relativamente grande, ao ponto de aparecer nas análises de asteroseismologia. É improvável que um buraco negro primordial passou todo esse tempo sem se alimentar, mesmo considerando as dificuldades que eu falei durante o vídeo. Segundo, que a chance de um buraco negro primordial ter entrado na nuvem no local que formou o Sol é baixa.
E isso nós podemos confirmar olhando ao redor. Nós vemos que as estrelas gigantes vermelhas próximas de nós têm tamanhos normais. Então, as probabilidades apontam para que o Sol não seja uma estrela de Hawking.
Se um dia a existência de estrelas de Hawking for confirmada, essa seria uma excelente forma de estudar buracos negros primordiais. Muito provavelmente, até conseguiríamos responder se eles estão ou não relacionados com a matéria escura, que hoje é um dos maiores mistérios do Universo. Mas uma parte minha não consegue deixar de achar incrível que, caso a existência deles seja confirmada, eles estavam escondidos bem debaixo do nosso nariz esse tempo todo, dentro de estrelas.
E isso só mostraria que nós sabemos muito menos sobre o universo do que nós pensávamos. E se você gosta de temas assim, não se esqueça de se inscrever aqui no canal pra eu fazer mais. Muito obrigado e até a próxima!