Não vejo nada de bárbaro ou selvagem no que dizem aqueles povos. E na verdade cada qual considera bárbaro que não se pratica em sua terra. Não me parece excessivo julgar bárbaros tais atos de crueldade, o canibalismo, mas que o fato de condenar tais defeitos não nos leve a seguir acerca dos nossos.
Estimo que é mais bárbaro comer um homem vivo do que comer depois de morto. E é pior esquartejar um homem entre suplícios e tormentos e queimar aos poucos ou entregá-lo a cães e porcos a pretexto da devoção de fé, como não somente o lemos, mas vimos ocorrer entre os vizinhos dos nossos conterrâneos. E isso, em verdade, é bem mais grave do que assar e comer um homem previamente executado.
Podemos, portanto, qualificar esses povos como bárbaros em dando apenas ouvidos à sua inteligência, mas nunca se compararmos a nós mesmos, que os excedemos em toda sua barbaridade. É assim que Montain começa a nos provocar sobre os limites do nosso julgamento. E ele estava mesmo à frente do seu tempo.
Se negava a chamar os nativos do Brasil de selvagens, porque eles tinham costumes diferentes dos europeus. Até aqui tudo certo, mas é agora que o bicho pega. Mesmo sendo considerado um sujeito à frente do seu tempo, não conseguiu se livrar da tendência de fazer do outro um reflexo seu.
E não só isso, perdeu até a noção de que o outro não é um espelho nosso, de que ele não tem uma visão que nos agrada ou nos conforta. Mas o que ele não conseguia escapar, e talvez a maioria de nós também não, é que ele ainda via o outro como alguém em comparação a si próprio. Esta é a alteridade, o nosso assunto do vídeo de hoje.
Afinal, ele diz que os nativos são valentes, sem subordinação, sem mentira ou inveja, mas nunca consegue chegá-los fora do jogo de contraste com a cultura europeia. E é isso que nos faz pensar, será que a gente consegue mesmo entender os outros? E aí, suave?
Tranquilo por aí? Eu me preparei muitos anos para escrever esse episódio, porque essa chave de análise mudou tanto a minha vida que eu fiquei meio travado para escrever esse roteiro. Vai entender?
é a tal alteridade. Muita gente não sabe o que é isso. E esse é o ponto de partida do nosso vídeo de hoje.
Vamos falar sobre autoridade, sobre os limites de tentar compreender o outro e, principalmente sobre o que acontece quando a gente acha que já entendeu tudo do outro, mas na verdade estamos apenas olhando para uma versão mais confortável de nós mesmos. Então vamos juntos explorar essa coisa chamada alteridade. E antes que alguém diga: "Ah, mas eu já entendo outro, é só se colocar no lugar dele.
" Deixa eu te dar o spoiler aqui. Empatia, só ela não é o suficiente. Quando olhamos pro outro, somos confrontados com o nosso próprio limite.
Mas até que ponto somos capazes de enxergar verdadeiramente esse outro ou até onde isso é apenas uma ilusão confortável do eu? Eu quero te mostrar hoje que a empatia pode ser uma cilada, a ilusão do eu e no mercado da escuta, na mercantilização das amizades e naquilo que estamos vivendo de aceleração do tempo do ea. Essa é a grande silada.
Compreender esse conceito simples vai mudar toda forma de ver o seu mundo. Então, vamos entender a relação do eu e do outro, porque não existe eu sem falar do outro. Hoje eu tô prometendo alto, não sou de prometer isso sempre, mas eu aposto que esse episódio tá diferente, tá realista.
Então anota aí, nós vamos construir essa série em três atos. O outro, a ilusão do eu e a tal relação eu, tu que você pode assistir na ordem que você quiser, porque eu te garanto que vai produzir diferentes sentidos. Se ajeita aí, pega um café, acende sua vela, porque esse é um dos episódios que a gente vai pisar fundo na filosofia.
vai ser cabeçudo. Se tiver difícil de entender, insista porque vale a pena. Like, sininho, inscrição.
E a pergunta que começa o nosso vídeo é: você tá pronto para olhar para além do espelho que você insiste em colocar na sua frente? Capítulo o outro. A era da identidade e o narcisismo contemporâneo.
Alteridade vem do latim alter, que significa outro, e itas, que remete a ser. Ou seja, em sua raiz, alteridade significa ser o outro. E talvez você nunca tenha parado para pensar sobre essa palavra, mas ela está em tudo.
Está no jeito que nos relacionamos, no modo que enxergamos os outros e até na maneira como nos definimos a nós mesmos. No nosso tempo, vivemos uma obsessão pela identidade. Nunca falamos tanto sobre quem somos, sobre qual é o nosso lugar do mundo, sobre como queremos ser vistos.
Redes sociais transformaram isso numa indústria, um catálogo infinito de perfis meticulosamente construídos, cada um tentando se destacar na multidão. A gente se acostumou a ver o mundo através do nosso próprio reflexo, mas tem um problema. Se tudo gira em torno do eu, onde é que fica o outro?
É fácil entender um outro quando o outro está muito próximo de nós. Algum amigo parecido, alguém com a mesma opinião e pequenas discordanças e tal, tal, tal. Mas isso não é alteridade, é apenas uma extensão do nosso próprio ego, uma forma disfarçada de narcisismo.
E é claro, é bonito, soa bem e é belo dizer que pensa nos outros, mas é muito mais fácil aceitar o outro quando ele é uma extensão de nós mesmos. Difícil é enxergar o inimigo pelos olhos dele. O individualismo penetrou tanto em nós que o outro se tornou um obstáculo, uma barreira que precisa ser dobrada, ignorada ou pior eliminada.
Quando tudo é um reflexo do eu, o diferente é visto como uma ameaça. Entramos numa ação de cada um por si, cada um cuida do seu e acabou. Tudo aquilo que não cabe na nossa identidade vira um outro distante, estranho, incômodo.
E em vez de tentar enxergar essa diferença, tentamos domesticá-la, torná-la palatável, encaixá-la dentro daquilo que já conhecemos. E é aqui que surge o tal paradoxo da autoridade do nosso tempo. E sabe uma autoridade que tá faltando nos dias de hoje?
A autoridade de compreender o peso da calvofobia e o bullying contra os carecas que tá destruindo a autoestima dos sujeitos. Ohó, não. Ele vai fazer de novo isso.
Um gancho extremamente forçado e nada natural para voltar o momento pagar as contas. Sim, porque a Manuel tá de novo com a gente no canal e a minha eterna saga para não perder os cabelos voltou. Deixa eu te falar um papo sério aqui.
Primeiro que não sou, mas só eu da equipe que tá usando manual, porque a gente tá envelhecendo, você sabe como é. E então o que aconteceu foi que eu acabei me esquecendo, me atrapalhando e achei que não era mais necessário fazer o tratamento. E você acredita que a situação voltou a piorar?
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Eu usava manual, deixei de usar, deu ruim, voltei e voltou a dar bom. Então, larga a mão de autoestima baixa, vai se cuidar, não tem nenhum problema a gente se cuidar em 2025. E se você consegue entender isso, pronto, vamos voltar ao vídeo.
Muito obrigado por não ter pulado e é isso. Compre manual, ajude o canal, ajude sua cabeça e vídeo. [Música] Paradoxo da autoridade do nosso tempo.
Vivemos a era da tolerância, do respeito e da diversidade, mas essa diversidade precisa obedecer a certas regras. Queremos conhecer o outro, mas até o ponto em que ele não nos desafia. Então, como escapar desse ciclo de narcisismo contemporâneo?
Será que ainda somos capazes de enxergar o outro como o outro de verdade? A resposta para isso não é simples, mas existe um pensador que dedicou a vida inteira para essa pergunta. Emanuel Levinás.
Essa é a proposta de Levinás, um dos grandes teóricos da autoridade e da ética do nosso tempo. Emanuel Levinás é um daqueles pensadores que desafiam tudo que pensamos sobre moralidade e relações humanas. Nascido em uma família judaica na Lituânia, no Longinco 1906, Levinas viveu os horrores do século XX de perto, especialmente os traumas da Segunda Guerra Mundial.
ainda assim emergiu com uma proposta radical, a do respeito incondicional à alteridade. E a proposta dele é no mínimo, desconfortável: "O outro vem antes do eu, ou ainda o outro é o centro de tudo e não o eu. " E o que isso quer dizer?
Desde sempre, na filosofia ocidental, colocamos o eu no centro do pensamento. Desde Aristóteles, Decarte, chegando em Kant, a tradição filosófica se preocupou em entender o ser, a existência, a identidade, a ontologia e a metafísica. Mas Levinas vai propor uma virada radical a partir da pergunta.
E se a questão central da existência não for quem sou eu? Mas como devo agir em relação ao outro? A ontologia manifesta-se como uma filosofia do poder e reduz o outro a um mesmo, anulando a sua alteridade.
Do contrário, o ser humano é transformado em coisa com um mero objeto a ser utilizado por nós e para o nosso benefício. O que estáis jogo, portanto, não é apenas entender o outro, mas devolver-lhe a dignidade de ser rompendo com sistemas filosóficos que apagam as diferenças. E essa proposta de Levinas muda todo o jogo, porque se o outro vem antes do eu, então a existência do eu não é um ponto de partida, mas um efeito de causa e correlação em relação ao outro.
Não existe identidade individual isolada. O eu não se basta, ele se forma na relação, segundo Emanuel Levinas. Só que temos um problema.
Nós vivemos na era do ultraindividualismo, na era do cada um por si. O mundo moderno nos treina desde pequenos para enxergar o outro como um obstáculo ou, na melhor das hipóteses, como um reflexo de nós mesmos. A lógica do eu primeiro está embutido na nossa cultura, na política, no sistema econômico.
E o que acontece a partir disso? O diferente se torna uma ameaça. Levinas vai chamar esse efeito de redução do outro ao mesmo.
E essa redução do outro ao mesmo perpetua as injustiças do mundo, segundo ele. Porque se o eu é central, estaremos sempre condenados a uma batalha infinita de todos contra todos e cumprir os nossos desejos como se eles existissem de fato. E essa lógica é cúmplice da violência moderna, porque cada um quer levar a vantagem e para isso destrói o outro.
E no que isso incide? Na prática. Na prática isso significa que em vez de enxergar o outro como algo realmente diferente, a gente tenta encaixá-lo nos nossos próprios termos.
Tentamos assimilá-lo, domesticá-lo, reduzi-lo a algo que a gente já entende. Mas e se o outro for de fato irredutível? E se ele não puder ser transformado num espelho confortável do nosso próprio mundo?
Ateridade não é um processo simples de aceitar o outro, é reconhecer que o outro é absolutamente irreconciliável ao eu e ao mesmo tempo é muito necessário para a formação desse eu que acreditamos tanto. E é aqui que a coisa pega, porque isso implica em abandonar toda a segurança ilusória do eu sentir este outro por sua completude. Por mais estranho que ele pareça, por mais irreconhecível que ele te soe, este é o outro.
Pense, por exemplo, num bebê. Ele nasce sem noção de que existe um eu separado do mundo. No começo para o neném, tudo o que existe é continuidade.
O seio da mãe, o toque, a voz, é tudo um grande eu. Mas um dia o outro desaparece. A mãe sai do campo de visão e aí vem o desespero.
O bebê chora, grita porque não entende ainda que as coisas existem independentemente dele. E então o outro volta. Só que neste instante uma coisa mudou para esse bebê.
Ele percebeu que o outro não é ele. Essa é a primeira experiência de existência realidade, a constatação de que há um mundo fora de nós. Agora extrapola esse fato para todas as relações que a gente tem ao longo da nossa vida.
Desde pequenos aprendemos a lidar com essa ausência, com esse desaparecimento momentâneo do outro. E isso é que vai definindo a nossa forma de existir perante ao mundo. Temos que aprender a duras penas que o outro existe como algo fora do nosso controle, mas somos levados a resistir a essa constatação, não aceitar que essa é a verdade e buscamos encaixar as pessoas nos nossos próprios moldes, nos nossos próprios valores.
Portanto, é quase matemático. Se não há outro, não há eu. Se não tem um olhar externo, como é que eu sei que eu existo?
Para Levinás, a relação com o outro não é apenas um contato de troca, não é algo condicional. Isso porque nenhum sujeito nasce pronto e se constitui a partir da abertura para o outro. O outro é aquele que se apresenta com um rosto que vai além de uma mera aparência física.
É aqui que está o desafio da alteridade. Este rosto tem uma carga e uma história para você, mas é só para você. O outro tem uma história que você não conhece.
E o que você decide fazer com o olhar ao estranho, com um olhar a um outro irreconhecível, é o que se chama de ética. Se você construir sua ética sem a verdadeira relação com o outro, cairá na mera subjetividade das suas opiniões prévias, julgando o outro por aquilo que você projeta nele, por aquilo que te soa estranho. O outro se impõe, ele aparece e exige uma resposta.
E essa resposta é a base da ética. Isso significa que a ética não começa na razão, na lógica ou na conveniência. Ela começa no rosto do outro, naquela presença que nos desafia, naquele incômodo que nos tira do prumo, que nos obriga a sair do centro do mundo, do olhar sobre o seu umbigo para os outros e olhar o outro pela sua estranheza.
Levinás e a ética do outro. E essa relação é difícil para caramba mesmo de entender, porque se abrir pro outro de verdade exige renunciar ao controle, a segurança de um mundo fechado em si mesmo. É como se Levinás invertesse a lógica do eu e gritasse: "O ser humano só começará quando o egoísmo terminar".
Nós somos viciados em procurar padrões e colocar as coisas em caixinhas. Só que não é assim que as coisas funcionam. A cada frase que eu digo ou a cada palavra que sai da minha boca, você pensa em fatos diferentes dos meus, em autores diferentes que você leu e eu não, em traumas diferentes que você cultivou e eu cultivei outros.
E no limite nem o tempo de cada um é o mesmo, é relativo ao sujeito e ainda assim conseguimos conversar, dialogar e minimamente nos entender. Comunicação é então um milagre também, mas para além da magia da comunicação, há um fato. Por mais diferentes que somos, por mais diversas que sejam as possibilidades de acessar informações que nós temos, ainda temos algo em comum.
Por quê? Porque cada outro tem em comum o desejo de compreender como agir para o mundo. E isso basta.
ou nas poderosas palavras de Levinás, o outro é sempre um outro eu. Todo eu tem um outro para chamar de si, no sentido das infinitas possibilidades de existir. E por isso essa compreensão do outro mexe com o nosso agir.
Desse modo, a ética para Levinas não é então sobre seguir regras ou sistemas pré-estabelecidos, mas ser responsável por quem está à sua frente com a mesma responsabilidade que você gostaria de ter para ser compreendido. Não é um contrato do tipo: "Faça isso por você, você faz isso por mim" e tudo mais. É um chamado que vem da fragilidade de compreender que todos e cada um de nós somos um outro de alguém.
Se outrora havia a ética do medo, vou obedecer porque Deus pune, vou obedecer porque uma força maior manda em mim. E depois a ética da força, vou obedecer porque o poderoso manda. Vou obedecer porque o estado vem de cima para baixo.
A proposta de Levinas da ética é baseada no outro. uma ética do reconhecimento e da responsabilidade que em dos encontros com os outros. E isso é muito desconfortável, porque quebra a ideia de que todos nós somos iguais a partir da diferença.
Não. Para Levinás, a ética não depende de reciprocidade, não é baseada em um acordo. Ela é um compromisso gratuito e incondicional com o outro, um princípio imperativo para lidar com as relações que temos ao nosso redor.
Ser responsável pelo outro não exige que o outro seja responsável por mim. ou algo que possui ou se aplica como atitude de piedade ou de solidariedade. Ateridade é e ponto.
Por isso, cuidado. Ninguém tem autoridade. A autoridade não é um atributo ao que possamos possuir, é apenas algo que podemos compreender enquanto fenômeno das relações humanas.
E como tudo nessa vida, isso também gera um efeito colateral. E nesse sentido, a alteridade é o que realmente define o ser humano. A relação com o outro não é uma simples troca ou negociação de interesses, mas um verdadeiro desafio à nossa condição de existência.
E é exatamente aqui que a coisa se complica. Por quê? Se o outro é necessário para que a gente se reconheça, o que acontece quando esse outro é completamente recusado?
A alteridade, que poderia ser um caminho paraa expansão da humanidade, passa a ser brutalmente rejeitada em nome do poder e da dominação. E talvez nesse momento você esteja sentindo que esse vídeo tá muito aberto, muito filosófico demais e não esteja vendo aplicação prática disso. E como essa brisa maluca de eu e outro, que eu tô repetindo mil vezes, eu e outro, eu e outro tem implicação no mundo real.
Então vamos ao próximo capítulo com exemplos históricos a partir de um exemplo clássico da colonização ou da conquista da América, ou mais especificamente a partir do livro de Tsvedan Todorov, a conquista da América, a questão do outro, que mostra como a recusa sistemática da autoridade foi a base do colonialismo. Todorov e a recusa da autoridade. Esse livro é um daqueles clássicos dos cursos de história, porque ele consegue, com a linguagem acessível, mostrar o estrago que a humanidade faz quando falha em reconhecer o outro.
E eu tive muita sorte de ter um semestre todo baseado na ideia de autoridade a partir desse livro, que hoje eu sei que ele tem muitos problemas e muitas críticas, etc. Mas também me trouxe uma chave poderosa e é a partir dele que vamos falar daqui paraa frente. Nessa obra a conquista da América de Tsvedan Todorov, o autor vai discutir como foi possível a conquista do continente, principalmente na região do Caribe, do México, conhecida como a América pré-colombiana, e como a colonização europeia não foi um simples encontro entre culturas diferentes.
Estamos falando aqui de uma assimetria radical, onde um lado se vê como centro do mundo, que tem então como direito natural conquistar os outros, os outros territórios e reduzir o outro a um mero erro a ser corrigido como recurso a ser explorado por nós, os europeus, colonizadores, centros do mundo. Em a conquista da América, Dodor vai mostrar como o saber do conhecimento do outro é uma arma de conquista. Cristóão Colombo, por exemplo, ao prever um eclipse, usou seu conhecimento astronômico para manipular os nativos, dizendo que ele roubaria a Lua caso suas demandas não fossem atendidas.
Esse momento, mais do que uma demonstração de poder, revela como o saber europeu foi instrumentalizado para subjugar populações nativas. Nos relatos de suas viagens, Colombo escreve sobre os indígenas como quem avalia um produto. Abre aspas.
São bons trabalhadores, dóceis, podem ser convertidos e usados aos nossos propósitos. Nessa lógica, então, a autoridade é um espelho e como todo espelho, ele pode enganar e distorcer. O que que os europeus viram nos indígenas?
Algo diferente ou apenas uma versão que eles chamaram de primitiva deles próprios? O problema é que quando enxergamos o outro apenas dentro das nossas referências, esse outro nunca é verdadeiramente o outro. Ele vira apenas uma COP na acabada, um esboço, algo que ainda não chegou ao correto, ao completo.
E foi exatamente assim que os espanhóis justificaram a dominação das Américas. Se os indígenas eram humanos incompletos, cabia a Europa corrigir este erro ou salvá-los da barbárie. O que significa não somente outra coisa que não obrigar essas pessoas à base da força, a escravidão, a incorporar os signos, símbolos e práticas impostas pelos europeus.
Todorov explica que os espanhóis não queriam apenas derrotar os povos indígenas, queriam assimilá-los como um recurso a ser explorado. A conversão ao cristianismo, por exemplo, era vista como um gesto de salvação, mas na prática era a destruição total da cultura, da identidade, da espiritualidade dos indígenas que aqui moravam. Ou seja, a conquista da América não foi apenas militar, foi também uma conquista simbólica e de narrativa.
Todorav vai destacar, então, que os espanhóis souberam dominar não só com a espada, mas com a palavra. A guerra não foi só de armas, mas de comunicação. Eles entenderam os mitos e as crenças indígenas e viraram essas crenças contra os próprios indígenas.
Cristóão Colombo não estava interessado em entender o que as culturas do nosso continente significavam. Ele queria apenas dominá-las. O que ele queria era classificá-los, medir a sua utilidade e enquadrá-los dentro de uma lógica europeia.
Por isso, utilizou esse saber como arma. Ou seja, Colombo não nega a existência do outro. Ele apenas não reconhece o outro como um igual.
E aqui entra a lógica colonial que vai definir os séculos seguintes. O outro só existe na medida que pode ser apropriado. Já Ern Cortez, por outro lado, foi ainda mais longe ao compreender a cultura asteca.
Cortêz negou a diferença cultural entre europeus e astecas. Pelo contrário, ele estudou a cultura asteca para utilizá-las contra os astecas. Para Cortez, a conquista do saber levava ao poder.
Por exemplo, ele não negava a existência do outro, mas sim se apropriava dele. Usava dos próprios símbolos, crenças e mitos dos astecas para manipulá-los. Um exemplo claro disso foi o uso da profecia sobre o retorno de Kietalquatle.
Os astecas acreditavam que o deus Ketzalquatle retornaria para reivindicar sua terra. E nac explorou essa crença para se apresentar ele próprio como figura divina e assim minar a resistência dos astecas. Ele dizia ser ele próprio o retorno do mito fundador.
Isso dialogava e era inteligível pra cultura asteca e serviu para dar sentido à conquista, encaixando os acontecimentos e uma lógica mitológica pré-existente. E Montesuma, o grande líder asteca do período, hospedou Cortez e sua comitiva em seu próprio palácio, oferecendo tratamento digno de reis, impressionado com a sabedoria que tinha Ernan Cortz. Mal sabia ele que estaria sendo usado para ser dizimado pouco tempo depois.
Toda a conquista da América é baseada na recusa a autoridade, seja por negação, como fez Colombo, ou seja por instrumentalização, como fez Cortez. A lógica colonial sempre trabalhou com a ideia de que o outro precisa ser moldado, dominado ou eliminado. Todorov tenta mostrar que a chegada dos europeus à América, então, não foi uma questão de descoberta geográfica, mas aconteceu por um choque existencial.
Os espanhóis não encontravam novos povos, mas precisavam se enxergar a partir deles. A questão não seria vencida apenas pela dominação militar ou econômica. O problema era mais profundo.
Como lidar com o outro que não cabe em sua visão de mundo? Isso tanto é verdade que a própria obra de Todorav já foi muito questionada. Os relatos pessoais de Colombo e dos conquistadores devem ser entendidos no contexto de patronagem e não pode ser tomados apenas como verdadeiros, porque é a visão do colonizador sobre os povos que queriam massacrar.
é o colonizador que conta a história porque é o vencedor. E Todorov também tem um limite. Ele é um europeu, portanto, fruto da colonização.
E isso vai gerar no livro dele imprecisões históricas que são tomadas como verdade. E a crítica de Todorov, a recusa da autoridade, também é vítima de ser um homem do seu tempo. Ele também esbarra nos limites da autoridade, nos limites da compreensão do outro, vivendo no tempo histórico que viveu.
E por mais que tentemos fugir disso, esse é o nosso limite, essa é a nossa barreira de liberdade. Somos sujeitos históricos, somos sujeitos do nosso tempo. Outra menção histórica que é interessante, vale a pena ser mencionada aqui nesse momento, é a de Michel Montain em seu ensaio Os Canibais, aquele que abriu o nosso episódio.
Montain é um filósofo considerado muito pra frente, à frente do seu tempo, vamos dizer assim. Nos seus ensaios, especialmente em dos canibais, Monten compara as culturas indígenas com a civilização europeia e questiona a superioridade europeia. Ele sugere que os europeus não são necessariamente superiores e que podem aprender com os modos de vida dos povos indígenas.
Ou seja, bem antes da gente começar a falar sobre relativismo cultural, Montain já tava ali no século X batendo na tecla de que não existe um único modelo de civilização. Mas ouça só esse pedaço. Cada um chama de bárbaro o que não é de seu uso.
Como em verdade não parece que tenhamos outro padrão de verdade, de razão, do que a ideia e as opiniões que vêm do país de onde somos. Lá sempre está a religião perfeita, o emprego perfeito e a sociedade mais acabada entre todas as coisas. Chamar o outro de bárbaro é só uma forma de dizer que ele não é como nós.
Mas quem disse que a nossa forma de ser é o padrão? Notou o pequeno deslize monumental de Montain? Lá estava um cara do século X argumentando que os europeus deviam reconhecer e respeitar a diversidade cultural, vem dos outros não como bárbaros, mas como seres humanos com valores e sistemas próprios.
Parece coerente, sim, mas com um detalhe. Ele ainda via os outros povos apenas em contraste com a Europa. Ele não conseguia enxergar os indígenas pelos indígenas e a partir dos indígenas.
Montain continuava colocando estes povos existindo apenas sob o contraste barbárie versus civilização. Afinal, ele nos diz que os nativos são, abre aspas, valentes, sem subordinação, sem mentira ou inveja, mas nunca consegue enxergá-los fora desse jogo de contraste com a cultura europeia, que valoriza coisas como a não subordinação, a valentia e assim por diante. Por mais que Montain fosse considerado o as da sabedoria, havia um limite, o seu próprio tempo histórico.
A nossa eterna condenação de análise se circunscreve na existência maior que nós só conseguimos enxergar os outros a partir do contraste e dos valores do nosso tempo histórico. Chamar o outro de bárbaro não é só uma forma de dizer que ele não é como nós. Esse pensamento de Montain relativiza a ideia de que existe uma única forma de viver ou de organizar a sociedade.
E ele nos alerta quando diz que somos, abre aspas, escravos dos nossos costumes, opiniões e hábitos que tendem a circular entre nós, aos quais nós participamos via educação, via tradição. E os ensinamentos aplicados desde o nosso nascimento, seja pelos nossos tutores ou pelos grupos nas quais nos relacionamos, nos escraviza e nos coloca dentro de uma jaula de análise que é o tempo histórico. E como historiador, eu sinceramente acho que a grande ferramenta de poder que a nossa profissão tem não é sobre guardar o passado como faz crer o senso comum, mas é algo além.
O historiador é aquele que consegue colocar as coisas no seu tempo de modo duplo, a seu tempo para ler a conquista da América a partir do olhar do colonizador, mas também a seu tempo sem crase, ou seja, se questionando o que do seu tempo histórico está transbordando na leitura do passado, que na verdade revela muito mais sobre o presente e a atualidade do que sobre esse passado. No limite, não existe história do passado. Toda história é uma história do presente, porque aquilo que salta aos nossos olhos, independente do período histórico que estamos estudando, diz muito sobre o nosso tempo, sobre os nossos valores, sobre aquilo que nós vamos buscar nesse passado para falar do presente.
Ou seja, não basta o reconhecimento do outro. Sem a ética, a autoridade pode se tornar um instrumento poderoso de opressão a partir da captura de símbolos e da ação na força dos desejos de uma certa comunidade, como vimos com ele na Cortez. Isso se repetiu muitas vezes ao longo da história.
Em cada expansão imperialista, em cada política de segregação, em cada ideologia que divide o mundo entre nós e eles, o que há é uma falta e uma recusa à alteridade. Por último, vale citar aqui um outro livro clássico para aprofundar mais essas questões e os processos de autoridade. É O espelho de Heródoto, de François Hitog.
Já ouviu falar nele? Heródoto é tido como muitos como o pai da história ou o pai do fazer historiográfico e teria nascido aproximadamente entre 480 e 420 a de. Crist, em uma área de colonização grega e por isso presenciou as duas principais guerras envolvendo os gregos, as guerras médicas entre Gregos e Persas, e a guerra do Peloponeso, conflito entre Atenas e Esparta.
Toda vez que você enuncia o outro, você cria uma diferença. É matemático. São dois termos A e B, onde A não é B, mas A precisa de B para existir.
Existem os gregos e os gregos, nós e os bárbaros, os atenienses e os espartanos. As narrativas de viagem de Heródoto se utilizam ainda do método comparativo e analógico, uma vez que analisa uma dada civilização comparando com elementos de outras. Heródoto se dizia um investigador neutro, um observador do mundo, mas na prática sua narrativa sempre reafirma a identidade grega.
François Hog então usa de Heródoto para mostrar e desconstruir o tal mito da neutralidade e olhar sobre o outro a partir do olhar do outro. O nome do livro de Hog não é à toa. Ele sugere que quando o Heródoto descreve o outro, ele está, na verdade, segurando um espelho diante do seu próprio povo.
Ou seja, Heródoto constrói o grego a partir da negação do outro. O grego nasce a partir do descobrimento do que é o não grego. Além disso, Aitog apresenta uma leitura de Heródoto que vai além da simples narrativa histórica.
Ele sugere que Heródoto não só descrevia esse outro, mas traduzia esse outro, as culturas desse outro, os povos diferentes que existiam para um público grego. Quando Heródoto descreviu os egípcios, por exemplo, ele frequentemente utilizava a inversão, ou seja, eles são como nós, mas fazem tudo ao contrário. Quando ele fala dos costumes dos egípcios ou das cidades que os gregos nunca tinham visitado, ele vai construir uma cidade grega e a partir do que não é essa cidade grega, ele vai construir a cidade egípcia.
Tá entendendo? Outro conceito que também é fundado e é importante pro fazer historiográfico e tá lá desde Heródoto é o conceito de toma, uma ideia grega que pode ser traduzida como maravilha, como espanto. Heródoto usava desse espanto como ferramenta narrativa, criando nas descrições dos povos bárbaros um certo deslumbramento para, de certa forma, reforçar a ideia de que aqueles povos eram fundamentalmente diferente dos gregos.
Mais ou menos o que eu tô fazendo aqui agora. Essa estratégia, ao mesmo tempo que desperta a curiosidade, também afasta qualquer possibilidade de compreensão verdadeira e igualitária do outro. O espanto cria uma aura de exotismo, que, embora fascinante, limita o entendimento genuíno de outra cultura.
E se você quer pôr isso na prática, é só ver como os brasileiros enxergam os japoneses como algo exótico, como algo místico. E isso diz muito mais sobre os brasileiros do que sobre os japoneses. Ou seja, as descrições de Heródoto não conseguem ser neutras porque seus olhos são seus olhos e não os olhos de quem ele descreve.
Toda descrição é uma forma de ver o outro. E quando Heródoto escreve, ele não tá apenas registrando fatos, mas construindo um discurso de forma que o leitor do mesmo mundo de Heródoto consiga aceitar. E nós, quando vamos ler esse discurso, adicionamos uma camada que são os nossos olhos.
Então, somos nós olhando para Heródoto, olhando para os egípcios. E isso não diz nem a respeito dos egípcios, nem de Heródoto, mas sim sobre nós, olhando para tudo isso. Tá entendendo?
Segundo a visão de Heródoto, os gregos então atribuem uma visão negativa ao Oriente Bárbaro, que antes, no século VI e no século VI antes de Cristo, era visto como um objeto de admiração pelo seu caráter exótico, seja pelos gregos ou seja pela elite grega. desde Heródoto, ou seja, 500 anos antes de Cristo, que a palavra bárbaro passa a indicar não só os persas, mas todos os não gregos, criando um estereótipo da figura de Bárbaro, como também indica Hard Dog em seu livro. A partir daí é que os gregos passam a se definir enquanto gregos e se preocupar com a sua identidade.
Há nos escritos de Heródoto uma estratégia narrativa de inversão, ou seja, toda vez que você anuncia o outro, você está criando uma diferença. É uma questão matemática. Dois termos A e B, em que A não é B e B só existe em função da existência de A.
Gregos e não gregos, peças e gregos, nós e os bárbaros. Quando Heródoto vai descrever os egípcios, por exemplo, ele não diz apenas que eles são diferentes. Ele afirma que eles fazem tudo ao contrário dos gregos.
Abre aspas. Os homens carregam faos na cabeça, as mulheres carregam nos ombros, as mulheres urinam em pé, os homens de cócras. Eles preparam as comidas com os pés, mas amassam a argila com as manos.
Essa é uma tentativa de legitimar a ideia de cultura grega a partir do que é barbarizado. Ele vai apontar, por exemplo, que Atenas só se destaca a partir do momento em que substituiu a tirania pela democracia. Isto é, a democracia grega é justa e a tirania e a monarquia são formas ilegítimas e incorretas de governar, não porque são ilegítimas e incorretas per si, mas porque fazem parte do governo de outro povo.
Outro aspecto que indica a tentativa de mostrar a superioridade grega corresponde à teoria climática geográfica. Heródoto vai colocar que o norte grego quente seria desenvolvido, enquanto o sul frio é representado como estagnado, ou seja, bárbaro. O que é muito interessante porque muitos séculos depois a teoria se inverteu.
A partir da colonização, o calor era visto como algo preguiçoso e, portanto, os colonizadores que viviam na Europa mais fria é que tinham a capacidade de dominar aos outros. Isso mostra que não há verdade per si nessas afirmações. O que há é uma tentativa de se legitimar a partir da negação do outro.
Ou seja, ao tentar tornar o outro compreensível, Heródoto está, na verdade, domesticando o outro, apagando suas diferenças mais radicais e tornando-a apenas um reflexo exótico do grego. Essa tática lembra muito a maneira como hoje a mídia ocidental constrói as imagens do outro. Povos do Oriente Médio, ou são bárbaros fanáticos, ou são exóticos místicos.
Povos indígenas, ou são nobres selvagens, ou são primitivos atrasados. De acordo com Hog, abre aspas. Uma retórica da alteridade é no fundo uma operação de tradução.
E toda tradução, por mais perfeita que seja, como repetia o professor que me passou essa matéria durante a faculdade, toda tradução tem entropia. E entropia é perda de energia ou na expressão original tradutore, traditore. Um provérbio italiano que foi traduzido aqui no Brasil, como toda tradução, é uma traição para manter a rima.
Traduções são assimilações do outro, aproximações do outro, mas nunca vão se encaixar perfeitamente. Mas quanto mais eu souber sobre a cultura do outro, a língua dos outros, a forma de existir dos outros e assim por diante, maior será a minha assimilação desse outro e menor será a perda de sentido, de significados e significantes. Nós traduzimos o tempo todo.
Quando alguém nos fala uma frase exagerada, dizendo que está passando mal e morrendo e você sabe que é um resfriado. Quando alguém diz que morreria sem você e você sabe que não é bem assim. Viver é traduzir, é significar, adaptar, aprender, refazer, portanto, trair, ser literal ou fugir do original com uma licença poética.
Ou como diz no provérbio popular, quando Pedro me fala de Paulo, sei mais sobre Pedro do que sobre Paulo. E já que você nem eu, nem sabemos quem é o Pedro, nem a [ __ ] do Paulo, essa fofocaiada só faz saber mais sobre nós mesmos ou daqueles que nos enunciam uma fofoca. Isso nos faz aprender mais sobre o fofoqueiro ou sobre nós mesmos do que o fato em si.
Entendeu o jogo de sentidos que acontece na tradução? Então, na próxima vez que você se deparar com uma história qualquer, talvez agora deva surgir a pergunta: Como é que essas narrativas foram construídas? Como é que elas se mantém ao longo dos séculos?
A quem essas narrativas estão beneficiando e a quem elas estão traduzindo e, portanto, perdendo o sentido? e sobretudo o que elas dizem sobre o tempo histórico do autor quem escreveu as narrativas e sobre o nosso olhar da leitura sobre essa narrativa. Por isso, costumamos dizer: "Não existe história do passado.
O que existe é o presente ressignificando o passado. Quando olhamos uma história do passado, estamos apenas buscando aqueles valores que no presente nos saltam aos olhos. " Ou ainda a grande pergunta: "E quando o espelho se quebra?
tem como quebrar esse espelho e de fato enxergar o outro pela aparência do outro e não sobre o nosso olhar. Porque no final das contas é isso que faria nos conhecer de verdade. Sobre isso tem um texto muito bom do Labirinto da Solidão de Otávio Paz, que vai afirmar que o outro na verdade não existe.
Essa é a fé racional, a crença incurável da razão humana, a identidade como uma realidade, como se no final das contas tudo tivesse que ser absoluto e necessariamente o mesmo. Mas o outro não se deixa eliminar. subsiste, persiste, é osso duro de ruê, na qual a razão perde os dentes tentando entender a armadilha da empatia e os limites da autoridade.
Então, acho que tá ficando claro para você que existe um limite para compreender o outro. Mas esse limite não pode ser simplesmente colocar um espelho na cara do outro e só nos enxergar quando falamos com esse outro. E se até aqui falamos sobre alteridade como um confronto com a diferença, agora precisamos olhar pra forma como tentamos reduzir essa diferença a algo que caiba dentro do nosso olhar.
E é aqui que entra a tal armadilha da empatia. Veja, empatia, é claro, é um conceito bonito. Todo mundo quer se sentir compreendido, todo mundo quer acreditar que pode compreender o outro e tudo mais.
O problema é que a simpatia não é um verdadeiro encontro muitas vezes, mas é uma forma de domesticação. Quando dizemos: "Eu entendo o que você sente", estamos realmente entendendo ou apenas encaixando a experiência do outro dentro daquilo que nós já conhecemos? Se empatia significa tentar se colocar no lugar do outro, então o que garante que esse outro que enxergamos não seja apenas uma versão editada de nós mesmos?
E mais do que isso, por que nós precisamos encaixar o nosso eu na situação do outro para que a gente entenda as coisas? Essa é a provocação de Levinas. Ele nos lembra que o outro é infinito, porque ele nunca pode ser completamente absorvido por nós.
E esse é o grande ponto. A verdadeira alteridade não é confortável. Ela não se encaixa, ela desafia.
Ela nos obriga a lidar com o que não podemos controlar. Por isso, Levinas não fala de entender ou se colocar no lugar do outro. Ele fala de responder o outro pelo outro, apagando o eu e entendendo que o outro às vezes é radicalmente diferente de você e tá tudo bem.
A diferença então é brutal. Se eu entendo, significa que eu absorvi, que eu capturei a alteridade dentro dos meus temas. Se eu respondo ao outro, significa que eu reconheço que há algo no outro que escapa do meu entendimento, mas que ainda assim exige uma resposta ética da minha parte.
Nota que nesse ponto não tem mais o ego acontecendo, mas apenas a compreensão do outro pelo outro. Então a pergunta não é como é que eu posso compreender o outro? A pergunta mais correta seria como é que eu posso agir diante do outro mesmo sem compreendê-lo completamente?
E por que isso importa? Como é que isso tudo faz diferença na minha vida? Você pode estar pensando isso, muda tudo.
A subjetividade deixa de ser sobre eu sou, eu entendo e passa a ser eu sou para o outro. Não é sobre agir, mas é sobre ser afetado, ser transformado pelo encontro com o outro. E se nós temos um limite pra compreensão desse outro, há um caminho para que a gente se aproxime cada vez mais.
Quanto mais cultura nós conhecermos, quanto mais diferenças nós lidarmos, quanto mais o eu deixar de dominar o nosso comportamento, quanto mais eu for atrás de fontes que não digo a respeito apenas de eu mesmo, a coisa começa a mudar. Mas perceba que interessante, este outro visto pelos nossos olhos também está te olhando como um outro outro, refletindo sobre um eu olhando o outro. Ou seja, no limite também não há outro, ou pelo menos não há outro que não dependa da intrínseca relação da visão do eu que pinta e constrói esse outro a partir da estranheza.
Nossa subjetividade não é tão autônoma como nós gostamos de pensar. Nossas ideias, nossas opiniões, até mesmo os nossos desejos estão profundamente conectados com esse lugar maior, com esse lugar de encontro, onde eu e outros se encontram. É isso que molda as nossas identidades, é isso que cria os nossos limites.
É isso que define como a gente é parte de um grupo ou como a gente tá fora de um grupo. E no fundo a gente cai na cilada. Usamos espelhos como os de oródoto para definir quem são os outros e quem somos nós.
Diante desse dilema, temos então duas escolhas: rejeitar o outro ou encará-lo. Rejeitar o que é estranho é mais fácil, mas é o que a nossa sociedade vem fazendo nos últimos 10. 000 anos.
E sinceramente não deu muito certo. Por isso, é preciso prática compreender que a ética depende do outro, é para o outro e que necessita do outro para que nós existamos. Então, fechamos esse ato mantendo o questionamento iniciado por Montene.
Olhando a nossa história de frente para trás e vendo toda destruição que nós causamos quando negamos o outro, quando tratamos o outro como selvagem, para nos olhar no espelho e nos perguntar como é que nós enxergamos o outro pelo nosso olhar ou o outro pelo outro? A gente passa a vida acreditando que existe um eu sólido, único, autêntico. Será que isso é verdade?
Ou será que esse eu também é uma construção, uma ilusão mantida por nossos filtros, nossas máscaras, nossas relações? E aí é que vai começar a nossa segunda parte da jornada, entendendo que se toda vez que olhamos o outro, ele também tá olhando um outro e que, portanto, o outro não existe, aonde é que está o eu? Se aquilo que nós pensamos sobre nós mesmos é diferente do que o mundo pensa sobre nós mesmos, enquanto nós vamos nos transformando, o mundo também vai se transformando?
Onde é que existe esse eu sólido, fixo e permanente? Essas são as perguntas para te incomodar, te fazer pensar e continuar a nossa jornada semana que vem. Agora que compreendemos o outro, vamos compreender também que o eu é uma ilusão e que não existe nada tão fixo, sólido ou permanente que não se desmanche no ar e que não faça sentido apenas colado com o mundo todo ao nosso redor.
Eu sei, esse vídeo tá mais cabeçudo, esse vídeo é mais complexo, eu avisei, mas eu prometo que vale a pena durante essa semana para pr ver de novo. Vamos conversar nos comentários. E se você gostou, se isso tá lhe fazendo pensar, deixa o seu like.
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É nós. E falousda. Olha o gás, olha.
Olha o gás. Bom, oh. Não, ele vai fazer isso novamente.
Que propaganda farçada. Vai ser assim mesmo. Tá bom, você não quer ficar igual o nosso editor, não é?
É que ó, ele arranca o cabelo. Tá fazendo não. E a minha frase é justamente sobre o bolos e carecas.