Se você pensa que cachaça é água, cachaça não é água não. . .
Ainda bem, né? Ainda bem porque água vem do ribeirão e no Brasil o ribeirão tá tudo podre, é o ribeirão preto, né? Então vamos mexer aqui e tentar achar outra música.
"Eu bebo sim, estou vivendo Tem gente que não bebe e está morrendo". Nem sei se tá morrendo ou não, né? Talvez esteja só fingindo, né?
Pode estar só obstruído. Mas o fato é que sabe quem é que tá vivendo, quem é que tá vivendo a vida louca? Claro, os membros do canal Buenas Ideias, que por míseros oito reais recebem os vídeos antes, podem conversar comigo, mil coisas, e ainda escolher qual o último episódio do mês.
E aí a gente fez uma votação: cerveja, vinho, erva mate, cachaça! Ganhou quem? Bando de cachaceiro, ganhou a cachaça, mas cara, não é só porque eles são cachaceiros, é porque os membros do canal Buenas Ideias são tementes a Deus e eles seguem o papa.
E o que que o papa falou? O papa falou que os brasileiros são um monte de cachaceiros. Então vamos lá, vamos lá seus bagaceiros, vamos lá, vamos conhecer a história da cachaça.
"É bagaceira, é bagaceira, mas acima de tudo a cachaça é brasileira". Bagaceira. Cara, tem um monte de mito em torno das origens da cachaça, da palavra cachaça, mil explicações, dizem que os escravos esconderam ali e aí ela subiu, evaporou e começou a pingar do teto, por isso que chama "pinga" e era "água ardente" porque ardia nas feridas dos escravos.
. . uma balela.
Não tem nada a ver com isso. Cara, os destilados, as bebidas destiladas acompanham a humanidade desde sempre, né? Porque o homem nunca quis viver só assim, né, só de pão, né?
Nem só de pão vive o homem. Também precisava de caviar e um pouquinho da purinha. Hm, boa essa aqui aliás.
E aí em Portugal, como em todos os países do mundo, já tinha a bagaceira. A bagaceira era feito com os bagaços de uva, era um fermentado de uva chamado depois de aguardente do reino. E os portugueses trouxeram muito cedo a cana de açúcar pro Brasil.
O Pero Capico, o Pero Capico, que tu na tua ignorância nem sabe quem é, foi o primeiro governador das partes do Brasil. . .
Vai lá ler "Náuticos, traficantes e degradados", tem a história do Pero Capico lá, chegou em 1516 e começou a plantar cana em Itamaracá, na ilha de Itamaracá. Depois o Martim Afonso de Souza, em 1532, também começou a plantar cana lá no engenho dos Erasmos, né, junto com o Erasmo Schetz, que era um flamengo, mas era vascaíno, ahm tal. Mas essa não é a história, não é a história do açúcar, essa é a história do destilado de açúcar, essa é a história da Geribita, se bem que geribita é mais um termo africano, que nem "cachaça" talvez seja africano também.
A etimologia de "cachaça" nós não vamos entrar aqui porque se não nós vamos ficar meio tonto assim. O fato é que desde 1580 já se fazia cachaça no Brasil, com certeza. Em 1584 o Gabriel Soares de Sousa, naquele maravilhoso livro, "Notícias do Brasil", que tu deveria ler, diz que havia, em Pernambuco, oito engenhos de cozer mel, vinho de mel, como chamava, ou aguardente da terra, e aí cara Portugal começou olhar assim, dizendo "que que esses brasileiro tão produzindo essa bebida aí?
" e começou a bloquear, proibir a produção da bebida porque queria que os colonos portugueses importassem vinho, vinho do porto e vinhos feitos em Portugal. Em 1647 foi criada a Companhia Geral de Comércio, em Portugal, que era responsável por praticamente todo o comércio entre a metrópole e a colônia e então proibiu, mandou proibir a produção de cachaça e da construção de alambiques no Brasil para que os colonos importassem o vinho e ela ganhasse dinheiro com vinho. Claro, começou a haver uma revolta cada vez maior, mas essa revolta vai estourar mesmo é na chamada "Revolta da cachaça", que tu na tua ignorância constrangedora mal sabe que aconteceu, e os professores não nos contam na História a revolta da cachaça pra não estimular o consumo da branquinha, mas eu vou te contar a história da revolta da cachaça.
Já tinha havido uma proibição em 1645 Ia começar a piorar em 1647, mas a proibição de fato se dá em 1659, quando a Coroa determina que todos os alambiques da região ali próxima do Rio de Janeiro deveriam ser levados até a cidade, esmagados e destruídos. E quem toma essa atitude é o Salvador Correia de Sá, que toma a tua ignorância constrangedora nem sabe quem era, o cara que era o dono do Rio de Janeiro, era incrível porque o Rio de Janeiro teve um governador corrupto, tu acredita? Esse governador era autoritário, era corrupto e era um escroto, como é que pode o Rio de Janeiro ter tido um governador escroto e corrupto?
Ainda bem que isso foi há muito tempo. E o Salvador Correia de Sá lá e proibiu, destruiu os alambiques e houve o quê? Uma revolta, uma grande revolta que começou aonde?
Em Niterói e São Gonçalo, onde 112 senhores de engenho, entraram na barca ali, Rio-Niterói. . .
Pior que foram de barco mesmo, meio que invadiram o Rio de Janeiro, aproveitando que o Salvador Correia de Sá tinha dado a ordem, mas estava em São Paulo, São Paulo sempre enchendo o saco, tinha uma rebelião lá, e tinha deixado um parente dele, um frouxo, no poder, e os caras foram, cara, destituíram o cara, atacaram a casa do governador, a casa do Salvador Correia de Sá e "cachaça, cachaça pra todo mundo, liberou a cachaça", tal, tatatá, tomaram o poder, botaram o tal Jerônimo Barbalho, que era o líder da revolta, no poder, no Rio de Janeiro, que maravilha, viva o povo de Niterói, viva o povo de São Gonçalo, e aí pá, tomaram o poder, mas o Salvador Correia de Sá, regimentou suas tropas, voltou em abril de 1661, tomou a cidade de novo, destituiu os caras, prendeu-os, mandou-os para o reino, com exceção do Jerônimo Barbalho que ele pá, cortou-lhe a cabeça e botou a cabeça exposta no Pelourinho, cara, no centro da cidade e disse "não tem lugar pra cachaceiro aqui", mas se deu mal, cara, se deu mal sabe por quê? Porque a rainha regente Luísa de Gusmão, que tu de novo na tua constrangedora ignorância nem sabe quem é, uma espanhola que era a mulher do Dom João IV, que tinha morrido, então estava de rainha regente na minoridade do Afonso VI, que assumiu o poder depois, e a maravilhosa rainha Luiza de Gusmão disse "pode produzir cachaça" e ainda meio que não destituiu, mas diminuiu muito muito muito o poder do corrupto, do canalha Salvador Correia de Sá, que aliás tinha conquistado Angola lá nas guerras de conquista entre o Brasil e a Holanda, e aí meio que começou. .
. Meio não, foi afastado, foi afastado, varrido, graças à revolta da cachaça. E o começou a produzir bastante cachaça até porque cara, agora que vai começar o episódio, agora que vai começar o episódio, porque os traficantes de escravos luso-brasileiros descobriram que a cachaça fazia grande, enorme, gigantesco, sucesso nas tribos da África.
Se diz, né, que foram os traficantes brasileiros que viciaram tribos inteiras em cachaça na África. Tudo bem, é verdade. Só que antes disso os próprios portugueses já tentavam trocar vinho do porto e vinho do reino por escravos na África.
Só que vinho, cara. . .
Quem é que vai se interessar por uma bebida boiola que nem vinho? Além de tudo, o vinho estragava, era de difícil transporte, não era aquele garrafão Sangue de Boi, entendeu? O vinho chegava lá, já tá, e o vinho não dava tanto barato quanto dava a cachaça.
Quando os senhores de escravos percebem que naquela labuta horrorosa, naquela "semelhança do inferno", como o padre Antônio Vieira falou, que era naqueles engenhos com aquela maquinaria sempre rangente, os engenhos funcionavam 24 horas por dia 365 dias por ano. 363 dias, porque eles paravam no Natal e no ano novo. Era uma máquina de moer cana e de moer gente, de moer escravos, o doce açúcar era produzido com muito, muito, muito amargor.
E aí, quando começou a ser produzida a garapa, quando começou a ser produzida junto com açúcar a aguardente de cana, é óbvio que os escravos começaram a beber, começaram a gostar, bebiam proibido, tal, mas alguns senhores de escravos até permitiam que os seus escravizados bebessem cachaça porque relaxava tal, alguns dizem até que se revoltavam menos, outros dizem "não, se revoltavam mais". O fato é que os escravos adoravam cachaça e quando os senhores perceberam isso passaram a exportar enormes, gigantescas quantidades de cachaça pra Angola pra troca-las por escravos. Eles já tinham tentado isso, como eu falei, com vinho, mas o vinho não colou e além de tudo a cachaça viajava numa muito mais boa, precisava de muito menos cuidado e tinha um efeito muito mais imediato, muito mais tchã do que o vinho, mas mesmo assim foi proibida a exportação da cachaça para Angola.
Era permitido produzir cachaça no Brasil a partir da determinação da rainha regente Luiza de Gusmão, mas não era permitido exportá-la para Angola. Justamente por ser proibido é que se começou a se exportar como nunca. E sabe quem era o principal exportador?
Era um dos governadores do Rio de Janeiro que substituiu o Salvador Correia de Sá. O João da Silva e Sousa. O João da Silva e Sousa foi governador do Rio de Janeiro de 1670 a 1675 e exportava exportava exportava uma montanha de cachaça pra Angola, uma quantidade enorme.
E aí de 1680 a 1684 ele virou governador de Angola. Ele mandava em Angola e ele que trazia pipas e mais pipas e mais pipas da cachaça pra troca-la por escravos, e ficou riquíssimo e tu nunca nem ouviu falar. Então como Portugal percebeu que não ia conseguir bloquear esse contrabando, resolveu taxá-lo, taxá-lo, é uma coisa mais interessante.
E a partir de 1695 fica decidido que cada pipa ia pagar 600 réis de imposto de saída do Brasil e de entrada em Angola. Cada pipa tinha 450 litros e o Brasil passou a exportar 690 pipas por ano pra Angola, o que dá 310 mil litros de cachaça, e aí cara, boa parte do tráfico de escravos passou a usar como moeda cachaça. O Luiz Felipe de Alencastro, um cara genial, que escreveu um livro fantástico, "Trato dos viventes", que tu deveria ler, diz que de 1710 a 1830 pelo menos um a cada quatro escravos trazidos pro Brasil foi trazido trocado por cachaça.
Meio trocado por tabaco, tabaco e cachaça, as duas drogas com as quais os traficantes de escravos luso-brasileiros viciaram tribos inteiras da África trazendo-os para plantar no Brasil cana de açúcar pra produzir cachaça e tabaco. Que negócio sensacional, é um negócio bem brasileiro. Olha que país empreendedor, maravilha, produz duas drogas, vicia um monte de gente e traz os caras escravizados pra produzirem.
Mas a relação da cachaça com os escravos não é só assim uma relação de dominação, não. Muitos, muitos escravos encontraram na purinha, na branquinha, na cachaça, uma forma de se aliviar das dores e dos horrores da escravidão. E outros estudiosos, ao contrário daqueles que dizem que não, dizem que a cachaça ajudou a fazer com que muitos deles se revoltassem.
Claro, é que aumentou muito nessa época o número de escravos, aumentando também o número de quilombos e quilombolas. Então alguns traçam uma relação imediata da revolta provocada pelo consumo de cachaça e outros dizem que não, que os caras tavam ali, tomavam, relaxavam, tal, usavam a diamba também, sabe comé, mas o fato é que mais ou menos nesse período são descobertas as Minas Gerais, né? As minas de ouro e tu sabe como é que esse lance de garimpeiro, né cara?
As cidades mineiras, né? Garimpo, cara, onde tem garimpeiro tem merdeiro, e aí os escravos são o levados pras minas e lá, começa a ser levado pra lá uma grande quantidade de cachaça, que era servida pros escravos pra aguentarem aquele tranco ali, e aí cara, tu sabe que a cachaça era branquinha, era purinha, era transparente e com o transporte em pipas ela chegava em Minas Gerais já mais assim com a cor do ouro, ó, douradinha, douradinha, vou beber mais um pouquinho. Essa aqui foi a abrideira né?
Agora já é a do meio aqui pra pá. E aí cara, a cachaça vai se espalhando pelo Brasil inteiro e mesmo assim era considerado depreciativo, era a bebida do marginal, era a bebida do pobre, era a bebida do desvalido, não era bebida dos senhores, não era bebida da burguesia que continuava lá com aquele vinho dele, então cara, nessa mesma época começam os movimentos de libertação do Brasil, de independência, né? Pré independência.
Em Pernambuco, que sempre foi insubmissa, que sempre foi rebelde, e que também é um dos berços, se não o berço da cachaça, e em Minas Gerais, pra onde a cachaça foi levada e onde caiu no gosto do povo. Então, surge a Conjugação, a Inconfidência Mineira e os caras, mesmo sendo assim da classe alta, pá, tomam uma purinha. E aí cara, o grande, o extraordinário Câmara Cascudo, escreveu o livro em 1967, chamado "Prelúdio à cachaça", né?
Foi contratado pelo Instituto Nacional do Açúcar e do Álcool, e produziu essa obra maravilhosa, assim que nem o Gilberto Freyre, que também escreveu um livro maravilhoso sobre a cachaça, e o Câmera Cascudo diz o seguinte, olha o que ele diz da cachaça: "a bebida do povo, áspera, rebelada, insubmissa aos ditames do amável paladar, a bebida de 1817 , [a Revolução Pernambucana], a bebida da independência, [porque o Dom Pedro I tomava junto com o Chalaça. Sim, o Dom Pedro I e o Chalaça tomavam cachaça. Viva, independência ou cachaça].
Atrevendo-se a enfrentar o vinho português, até então soberano, o líquido saudador da Confederação do Equador em 1824. A bebida dos liberais da praia, [da Revolução Praieira de 1848]. A patrícia, a patriota, a gloriosa, a cachaça dos nervos de Zumbi no Quilombo dos Palmares, [onde era produzida a cachaça, sim sim, o Zumbi também bebia cachaça] A cachaça do desembargador Nunes Machado de Pedro Ivo, a cachaça dos cabanos, a cachaça com pólvora dos cartuchos rasgados ao dente na guerra cisplatina e no Paraguai, a cachaça da revolta do quebra quilos, a cachaça do Clube do Capim, a cachaça conspiradora abolicionista, gritante e republicana.
A cachaça brasileira! " Ah, muito bem, muito bem, e essa é a nossa saideira! Viva a cachaça, tudo tem história, o canal Buenas Ideias embevecido e embriagado de história te diz: viva a bagaceira brasileira!