Eu não sei o que desfigurou a sua vida desse jeito, mas talvez eu já tenha passado por isso. Nós podemos trabalhar juntos. Posso reabilitar você.
Não precisa ficar sozinho. Me deixe ajudá-lo. Essa cena pode até parecer boba, simples, afinal é só um desenho animado, né?
Mas não é. A verdade é que essa é considerada uma das cenas mais perturbadoras já escritas entre o Batman e o Coringa. E o mais curioso é que ela tem uma mensagem por trás que pouquíssimos conseguem pegar.
Mas eu vou te explicar, só que para que você entenda, eu preciso te contar rapidamente o que acontece com o Coringa antes dessa cena. Essa cena é do filme Batman A Piada Mortal, um dos raros filmes do Batman que ousa explicar a origem do Coringa. Na maioria dos filmes, ele já parece pronto como vilão do Batman.
Você pode me chamar Coringa, mas nesse filme é diferente. Vemos o seu passado, onde ele é apresentado como uma pessoa aparentemente normal, um homem comum com dívidas, aluguel atrasado, uma esposa grávida em casa e o desespero de quem sabe que o mundo real não tem misericórdia. Me desculpe, eu não queria descontar em você.
Já tá sofrendo bastante, casada com o otário. Amor, não é? É verdade.
Eu não consigo sustentar você. Ele tá claramente desesperado para encontrar alguma forma de fazer dinheiro para dar uma vida digna pro seu bebê e pra sua mulher. Eu tenho que tirar você daqui antes que o bebê nasça.
Eu só preciso de dinheiro para levar a gente para um bairro decente. Só que ele trabalha como comediante e não tem muito sucesso no que faz. Eu tenho que subir no palco e ninguém ri.
Com o bebê estando prestes a nascer, ele precisa rapidamente resolver sua vida financeira. E a forma que ele encontra é fazer um roubo, onde ele pretende pegar o dinheiro e nunca mais se envolver com isso. Não é o tipo de coisa que eu faria.
Senhor um motivo importante. Eu tenho que provar a mim mesmo como marido e como pai. Mas aí acontece algo terrível.
Enquanto estava fora de casa tramando com os capangas o roubo, dois policiais chegam para informar que um acidente doméstico tirou a vida da sua mulher e consequentemente do seu bebê. Ele fica completamente arrasado e diz que não tem mais motivo para cometer o crime, já que não precisa mais desse dinheiro. Não vai dar.
Eu não tenho mais motivo. Aini morreu. Mas os dois capangas não se importam.
Dizem que ele já havia se comprometido e que agora não tem mais volta. Se por acaso alguém ousar desistir, não vamos deixar barato. Se sentindo ameaçado, ele não recua e se apresenta à noite para cometer esse crime.
Só que durante o assalto dá tudo errado. Vocês aí parar sem imbecil. falou que não tinha seguranças.
Você vem perguntar as coisas. Eles são flagrados pela polícia e depois o Batman aparece. Meu Deus, o que que eu fiz para merecer isso?
Ele sem muita experiência e completamente perdido, se assusta e cai dentro de um tanque químico. Ele sai pelo esgoto infectado. Ai, tá tudo coçando.
E em meio ao desespero começa a chorar. Só que de repente esse choro se transforma em uma risada psicopata. Essa cena é simbólica.
O choro virando risada marca transformação. Ali morre o comediante que só queria dar uma vida digna pra esposa e pro filho, Inácio Coringa. Ele simplesmente desiste e se rende pra loucura.
Ele não aguentou. A dor era grande demais. A risada parece ser a forma que ele encontrou de lidar com tudo isso.
Sua única defesa contra o mundo que já não faz mais sentido. Rir para ele virou uma espécie de vingança, de responder ao absurdo do mundo com um absurdo ainda maior. Você só precisa de um dia uma coisa assim aconteceu comigo.
A questão é que eu fiquei louco. Uma vez transformado, ele dedica a sua vida a provar que o mundo inteiro é como ele, que só falta acionar o gatilho certo para que as pessoas revelem sua loucura. E para provar o seu ponto, o Coringa escolhe o comissário da polícia de Gotan como alvo.
Jan Gordon é o símbolo da justiça, da lei, e ele começa atacando sua filha, atira nela e enquanto ela agoniza no chão, ele tira suas roupas e a fotografa nua. Ela não morre, mas nunca mais vai andar na vida. Por que você tá fazendo isso?
Quero provar uma coisa, um brinde ao crime. Depois ele sequestra a Gordon, também deixa ele pelado, coloca uma coleira nele e o arrasta como se fosse um cachorro por um parque temático que ele transformou num manicômio. Ele o expõe a uma série de absurdos, aberrações, insanidade, caos, dentre eles as várias fotos que tirou da sua filha Nua.
Me diz o que eu estou fazendo aqui. Você tá fazendo o que qualquer homem são, nas suas circunstâncias graves, faria? enlouquecendo.
Ele não quer matar J Gordon. Seu único objetivo é quebrar um homem bom, destruir a mente de alguém íntegro, exatamente como aconteceu com ele. É isso que uma dose de realidade faz com você, comissário.
Oi, tem alguém em casa? Quando o Batman chega para salvar Gordon e pegar o Coringa, ele se depara com uma cena deplorável. Eu apresento o homem comum.
Gordon parece destruído, todo encolhido, pelado dentro de uma jaula. O Coringa parece ter realmente acabado com ele, mas quando Batman lhe oferece ajuda, a forma como Gordon lida com a situação é surpreendente. Vou ficar com você até não.
Eu vou sobreviver. Vai atrás dele. Eu quero ele preso.
Eu quero seguir as regras. Temos que mostrar a ele que a lei funciona. Gordon é a prova viva de que o Coring estava enganado.
Gordon continua um homem íntegro, acreditando naquilo que sempre defendeu. E logo que encontra o Coringa, o Batman faz questão de relatar isso. Eu falei com o comissário Gordon antes de entrar aqui.
Ele disse que queria seguir as regras. Apesar do seu jogo maligno, cruel e doio, ele ainda está como sempre. O Coringa parece ficar ainda mais irritado, mais agressivo, não só por conta de Gordon, mas porque o Batman também não parece estar enlouquecendo.
Por que você não vê a graça nisso? A resistência do Batman o revolta tanto que vemos pela primeira vez ele tentando matá-lo. Até esse momento, sua única preocupação era provar que todos são como ele e podem sim enlouquecer, mas depois do que vê, ele parece desistir de provar seu ponto e decide simplesmente eliminá-lo.
Mas quando aponta a arma para ele e aperta o gatilho, que porcaria. E aqui, finalmente chegamos na tão esperada cena. E aí, o que está esperando?
Me chute logo até cansar e receba seus aplausos. Não, dessa vez o Batman não cede. Ele parece levar a sério o pedido de Gordon de mostrar que mesmo em meio ao caos, a lei ainda funciona, que mesmo depois de tudo que o Coringa fez e ainda de tentar matá-lo, ele se recusa a se rebaixar ao nível dele e ainda vai além, literalmente estendendo a mão e oferecendo ajuda.
Eu não sei o que desfigurou a sua vida desse jeito, mas talvez eu já tenha passado por isso. Posso reabilitar você. Nós não temos que nos matar.
Me deixe ajudá-lo. A situação é tão inusitada que o Coringa até fica meio sem reação. E vemos algo raro.
Vemos por um momento ele agindo como se fosse uma pessoa normal. Ele não ri, não zomba e ainda responde de forma séria, mostrando vulnerabilidade e tristeza na sua fala. Desculpe, mas não, não é tarde demais para isso.
O Coringa parece genuinamente decepcionado. Ele dizer é tarde demais para isso é como se em algum momento ele realmente tivesse considerado aceitar ajuda. Mas esse momento já se foi faz tempo.
Ele se afundou tanto que agora acredita que não tem mais volta, mostrando que por mais perverso que ele seja, por trás daquilo tudo existe um homem destruído. Mas isso não dura muito. Ele parece não aguentar ficar nessa posição de vulnerabilidade e então rapidamente volta a se esconder atrás do seu personagem, a se proteger atrás da armadura da loucura e responde com uma piada.
Isso me lembra de uma piada. Era uma vez dois caras presos juntos num manicômio e uma noite, uma noite decidiram que não gostavam mais de lá e decidiram fugir. Só que essa piada não é só uma piada, é uma metáfora.
Os dois loucos do hospício são ele e o Batman, que se cansaram de viver trancados dentro da própria loucura. Eles subiram até o terraço e lá do outro lado de um pequeno vão viram os telhados de toda a cidade, viram toda a liberdade. O primeiro cara pulou pro outro lado sem problemas, mas o amigo não mesmo, ficou com medo de cair.
O primeiro louco, o que consegue pular é o Batman. Ele também já foi quebrado, viu o pior da humanidade. Mas o fato dele conseguir pular simboliza que ele conseguiu se integrar na sociedade, escapar da loucura e ser aceito.
Já o segundo louco é o Coringa. Ele até quer sair, mas não consegue voltar à sanidade. Tem medo de se perder no processo.
A loucura foi a forma que ele encontrou de lidar com tudo, com a dor, com a perda. E por isso ele tem medo de pular. Ele tem a sensação de que o mundo é absurdo demais para se viver em sã consciência.
Então, o primeiro cara teve uma ideia. Ele disse: "Aí, eu tenho uma lanterna aqui. Eu posso iluminar o vão entre os prédios e você atravessa pela luz e vem até aqui.
" Essa lanterna é a ajuda que o Batman está oferecendo. A mão estendida, uma chance de recomeçar, de se reabilitar. Mas o segundo cara disse: "Você pensa que eu sou o quê?
" Louco? Você vai apagar quando eu chegar na metade. Aqui o Coringa mostra o que realmente pensa.
Ele revela seu medo e desconfiança. Ele não acredita que alguém vá segurar essa lanterna até o fim. Não acredita que alguém vá acreditar nele por tempo suficiente.
Ele já se vê como uma causa perdida e acha que se tentar voltar, vão apagar a luz no meio e ele vai despencar de novo, talvez ainda mais fundo. Por isso, ele prefere nem tentar, prefere rir, porque rir é mais seguro do que confiar. É mais fácil do que esperar alguma salvação e se decepcionar de novo.
Me desculpe. E então ele começa a rir. E o mais estranho acontece, o Batman também começa a rir.
Mas de repente a câmera começa a descer. Ela para de filmar os rostos e o som vai mudando. A risada do Coringa vai sumindo.
Fica só a do Batman. E assim se encerra o filme. Pela imagem, não podemos ter certeza do que aconteceu.
A única certeza é que a risada do Coringa desaparece. Pode ser que o Batman achou a piada mais engraçada e por isso continuou rindo sozinho. Mas a hipótese mais provável é a de que o Batman com as mãos sobre o Coringa resolve enforcá-lo até a morte enquanto cai na gargalhada, usando a risada que sempre foi a arma do Coringa contra ele, fazendo justiça com as próprias mãos, porque percebe que não existe mais volta, que não tem redenção, que o Coringa não pode ser salvo, que ele é uma ameaça à sociedade e sempre será.
Uma hipótese que é mais provável por toda a narrativa que se constrói e até pelo próprio nome do filme, A Piada Mortal. Mas a questão por trás dessa cena não é apenas tentar descobrir se o Batman matou não o Coringa. É mais que isso, essa cena nos revela algo sobre nós mesmos.
Digo isso porque o Coringa representa para muitos algo que vai além da loucura. Ele representa uma espécie de catar-se, uma válvula de escape, um alívio emocional para quem tá cansado de fingir, para quem já teve vontade de chutar o balde, mandar tudo pro inferno e simplesmente se entregar a raiva, ao caos e a dor que sente nessa vida. E é por isso que muita gente se identifica com o Coringa.
Ao vê-lo em ação, logo pensa, mas esa aí, não dá para negar que ele tem um ponto, né? E é claro que ele tem um ponto. O coringa representa o nilismo, o absurdo, a constatação de que tudo que a gente acredita é frágil.
As leis, as regras, os dogmas, os valores morais. Tudo isso só existe porque decidimos acreditar. Não tem nada escrito no universo dizendo que a justiça vai prevalecer.
Na prática, o mundo é um lugar onde tragédia e injustiça acontecem o tempo todo. E o Coringa representa essa voz que surge quando a gente começa a encarar isso de verdade. A voz que olha para essa bagunça toda e pergunta: "Se nada disso importa de verdade, então por que seguir jogando esse jogo?
Se tudo é uma invenção, por que continuar fingindo que faz sentido? Para que manter a pose da sanidade? Por que não simplesmente enlouquecer?
" E é aí que entra o Batman. O Batman viu a mesma verdade que o Coringa teve o seu dia ruim. viu os pais serem assassinados diante dos seus olhos ainda quando criança, sentiu o mesmo vazio, mas fez uma escolha diferente.
Em vez de usar o sofrimento como desculpa para destruir, ele usou como motivação para proteger. Ele decidiu virar um símbolo da virtude diante do desespero. E o Coringa não aceita isso.
Ele se recusa a enxergá-lo como um homem virtuoso. Ele só vê um outro maluco disfarçado, um louco fantasiado de morcego, porque ele já perdeu a capacidade de acreditar. E para provar esse seu ponto, ele precisa fazer o Batman rir da própria moral.
Ele precisa quebrar o Batman. Precisa ver o homem incorruptível se corromper. E talvez ele tenha conseguido isso na cena final.
Se o Batman realmente o matou ali, ele viu o símbolo da virtude romper o próprio código moral. E nos seus últimos segundos ele pode ter sentido um gostinho de vitória, porque isso era tudo que ele queria desde o começo. E essa é a complexidade por trás dessa cena.
Não se sabe ao certo quem saiu vencendo, se o Batman fez o certo ou o errado, se ele foi o herói ou o vilão dessa história. E o que gosto desse final é que ele não nos dá uma resposta. Ele deixa você com um silêncio.
E nesse silêncio você é livre para pensar o que quiser. Você pode dizer que o Batman salvou o Gotham. Pode dizer que ele deshonrou o Gordon ignorando o seu pedido.
Pode dizer que ele foi forte, que ele foi fraco ou até que ele finalmente cedeu pra loucura. Perceba como uma única realidade pode ter infinitas interpretações. Tudo depende da história que você resolve contar, daquilo que resolvemos acreditar.
E na vida real é assim. Nem sempre temos uma resposta ou um sentido claro pra vida. E a beleza disso é que você tem a liberdade para interpretar isso da forma que quiser.
Eu gosto de uma frase que diz: "Quando Deus é silencioso, você pode interpretar o seu silêncio da forma que quiser. " E o silêncio nesse final representa isso. E por mais que ele incomode muita gente, às vezes ele é melhor do que mostrar a realidade, porque a realidade em alguns momentos acaba com qualquer esperança.
Ela pode ser dura demais para alguns. Aliás, essa mesma ideia já foi trabalhada no filme Batman Cavaleiro das Trevas. Nessa ocasião, o Coringa consegue corromper Harvey Dent, o grande símbolo de justiça de Goton em um dos momentos mais caóticos e sombrios da cidade.
O Coringa venceu. Qualquer chance que tenha nos dado de consertar a cidade, morre com a reputação do Harvey. As pessoas vão perder a esperança.
Não vão não. Eles nunca vão saber o que ele fez. O Batman decide esconder a verdade.
Assume a culpa pelos crimes de Harvey para proteger sua imagem, para que as pessoas continuassem acreditando em uma gota tão justa, porque naquele momento a verdade acabaria com a esperança das pessoas. E às vezes a verdade não basta. As pessoas merecem mais.
Às vezes as pessoas merecem ter a fé recompensada. Nem todos aguentam a verdade. Nem todos conseguem permanecer sãos diante das circunstâncias da vida.
Gordon na piada mortal é uma exceção. Mesmo depois de tudo, ele resolve continuar acreditando, mostrando que a grande questão não é sobre o que acontece com você, mas sobre como você reage depois que quebra. Porque no fim, em algum momento, todos nós quebramos.
E o que te define nesses momentos não é o que você sente, não é o que você pensa, nem o seu sofrimento, mas o que você de fato faz com tudo isso. Não é quem eu sou por dentro, sim o que eu faço que me define. Eu passei os últimos anos desenvolvendo minha primeira série reflexiva, a chave das três dimensões, uma jornada mental de 10 episódios e mais de 4 horas, onde você será levado a reflexões profundas, muito além do que eu consigo trazer por aqui.
Eu lancei recentemente e já tenho tido várias avaliações bem interessantes. Se quiser entender melhor, nesse vídeo rápido eu te explico tudo. E tem mais, para quem adquirir agora, eu tô liberando como bônus um módulo onde exploro táticas práticas de manipulação, sedução, leitura de comportamento, arquétipos do poder, perfis de manipuladores e muito mais.
Ele ainda tá em construção, mas para quem comprar agora, estou liberando o acesso não só aos episódios que estão prontos, como a todo o resto conforme eu for lançando.